A grande imprensa nunca confiou em Leonel Brizola.
– Se reconhecesse nele, enquanto vivo, metade do que lhe atribuiu enquanto morto…presidente da República é o mínimo que ele teria sido, escreveu PC de Lester após a morte do líder trabalhista.
Na verdade, enquanto ele viveu, e mesmo nos últimos anos quando já era uma figura histórica, recebeu um tratamento hostil, quase sempre.
Brizola foi eleito prefeito de Porto Alegre e governador do Estado enfrentando cerrada oposição da imprensa conservadora, tendo à frente o poderoso Correio do Povo, de Breno Caldas.
Sua política pioneira de reforma agrária foi torpedeada por furiosos editoriais, as encampações de telefonia e energia idem.
Mesmo em 1961, na Legalidade, tão decantada, ele teve que tomar à força com a Brigada Militar os transmissores da Rádio Guaíba para organizar a rede com que resistiu ao golpe.
Em 1964, quando era deputado federal e não tinha, portanto, a polícia militar às suas ordens, ele nada conseguiu fazer. Os meios de comunicação faziam parte do golpe.
Nos anos em que Brizola viveu no exílio, a imprensa zelosamente o esqueceu. Luis Fernando Veríssimo é testemunha do zelo dos editores em não deixar o nome de Brizola ser nem citado de passagem em crônica.
Quando ele retornou do exílio, decretou-se que ele era caudilho, dinossauro, apegado a ideias do passado. Foi ridicularizado quando perdeu a sigla do PTB para Ivete Vargas numa manobra do governo, hoje revelada.
No Rio de Janeiro, teve a oposição sistemática da Rede Globo, antes e depois de eleito, duas vezes. Na campanha presidencial de 1989, então, nem se fala. Mesmo assim, ele perdeu para Lula por 0,04% dos votos. Hoje, todos sabemos que ele teria vencido o Collor.
Vinte anos depois da morte de Brizola, Juliana, sua neta, ex-deputada estadual e candidata a prefeita de Porto Alegre pelo PDT, tenta minar a polarização entre as candidaturas de Sebastião Melo (MDB/PL) e Maria do Rosário (PT/PSol).
As eleições no Rio Grande do Sul, às vezes, surpreendem. Houve casos em que os candidatos que ocupavam a terceira posição em todas as pesquisas foram eleitos.
Pedetistas históricos reconhecem que é uma tarefa difícil. Juliana não reuniu forças com os partidos de esquerda e buscou coligação com o União Brasil, antigo DEM e PSL, portanto, de direita. Pegou mal.
Alguns torceram o nariz também com a mudança das cores do partido nesta campanha eleitoral – do vermelho, azul e branco para o amarelo e azul -, e com o sumiço da rosa vermelha sustentada pela mão esquerda de um trabalhista.
– Deve ser coisa de marqueteiro, sugeriu um brizolista ferrenho.
A rosa vermelha era símbolo do PDT desde sua fundação, marca da social-democracia pelo mundo e da Internacional Socialista, criado pelo francês Didier Motchane, e da qual Brizola foi seu presidente.
A marca do PDT já havia sido repaginada em 2022, durante a campanha eleitoral de Ciro Gomes, quando acrescentaram o verde e o amarelo nas folhas da flor, uma referência à bandeira do Brasil. E agora, sumiu.
Mas, quis o destino que o trabalhismo raiz despertasse na cidade em que Brizola passou a infância e começo da juventude: Passo Fundo. O ex-prefeito Aírton Dipp – trabalhista histórico, como foi seu pai, Daniel Dipp, também ex-prefeito na década de 1950 – quer voltar a administrar aquela cidade do norte gaúcho de 215 mil habitantes.
Pesquisas internas das legendas indicam que, neste momento, há uma ligeira vantagem do atual prefeito, Pedro Almeida, do PSD. Estariam tecnicamente empatados.
Jornalistas locais não arriscam um vencedor e concordam que a disputa é acirrada. O prefeito tem uma coligação com vários partidos e a máquina pública a seu favor, porque a legislação eleitoral não obriga deixar o cargo para concorrer à reeleição municipal. Dipp tem a memória de quem aprovou suas gestões e realizações e o apoio da maioria dos servidores públicos municipais, segundo alguns comunicadores.
A coligação “Sim, Passo Fundo pode mais” tem vinte dias para convencer os eleitores de que o administrador Almeida não merece um novo mandato. Nada impossível para quem venceu três eleições que disputou para prefeito.
Por ironia, o candidato do PL de Bolsonaro, o advogado Marcio Patussi, pode acabar ajudando os trabalhistas caso “roube” eleitores do prefeito.
Engenheiro civil como o ex-governador, prestes a completar 74 anos, Aírton Dipp é a última trincheira de Leonel Brizola.
(Cleber Dioni Tentardini)