Trump fica acima das regras internacionais desde seu primeiro mandato

O comércio mundial está em alvoroço com as idas e vindas do tarifaço que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, aplicou em vários países em razão de seu déficit comercial. Como afirma o governo chinês, o “América em primeiro lugar” não pode privar outras nações dos direitos de desenvolvimento e ficar acima das regras internacionais. Um esforço dos Estados Unidos para conter a China, líder do BRICS, resistindo a uma mudança para uma ordem multipolar com esferas de influência distintas.

A China eleva as tarifas adicionais sobre produtos importados dos EUA de 84% para 125%, a partir deste sábado, 12,  anunciou a Comissão de Tarifas Aduaneiras do Conselho de Estado. Considerando que não há mais possibilidade de aceitação no mercado de produtos estadunidenses exportados para a China sob os níveis tarifários atuais, se os EUA continuarem a impor tarifas sobre produtos chineses exportados para os EUA, a China ignorará a medida, de acordo com a Comissão.

Na quarta-feira, 9, o Ministério do Comércio da China já havia anunciado que iria aumentar a tarifa adicional sobre produtos americanos de 34% para 84%, como resposta à taxa adicional que o governo Trump impôs sobre bens chineses e que já entrou em vigor, elevando a taxa cumulativa anunciada este ano para 104%.

Além disso, a China colocou mais 12 empresas estadunidenses  em uma lista de controle de exportação, de acordo com o ministério, e irá apresentar uma queixa à Organização Mundial do Comércio (OMC) contra as tarifas adicionais de 50% que o governo norte-americano impôs nesta semana.

A China expressou sérias preocupações com as “tarifas recíprocas” dos EUA, que excedem em muito as alíquotas consolidadas e que se comprometeram na OMC. Para os chineses, a imposição de tarifas discriminatórias viola o princípio da Nação Mais Favorecida (NMF), um princípio da OMC que proíbe a discriminação entre os países membros, e representa o unilateralismo, o protecionismo e a coerção econômica dos EUA.

Na primeira sessão anual do Conselho de Comércio de Bens da OMC, em Genebra, a China instou os EUA a cumprirem as regras para evitar impactos adversos na estabilidade econômica global e no sistema multilateral de comércio.

A China destacou que o sistema multilateral de comércio centrado na OMC serve como base institucional para o comércio global, e o compromisso tarifário multilateral baseado no tratamento da NMF garante que todos os membros da OMC conduzam o comércio e a cooperação em um ambiente transparente, previsível e não discriminatório, conforme a agência de notícias chinesa Xinhua.

Medidas protecionistas

Durante sete anos o diretor-geral da OMC foi o brasileiro Roberto Azevêdo, que assumiu a chefia da agência em 2013 e foi reeleito para um segundo mandato em 2017, que expiraria em 2021. Ele renunciou ao posto e saiu do cargo em 31 de agosto de 2020.

Naquele momento estava ocorrendo uma mudança de fase no jogo econômico e político do comércio mundial, durante o primeiro mandato como presidente dos EUA de Donald Trump, de 2017 a 2020.  Azevêdo resolveu sair ante as medidas protecionistas. A pandemia acelerou as tendências antiglobalização potencializadas por Trump. O protecionismo em alta é totalmente contrário ao espírito negociador da OMC.

Em sua despedida, o embaixador contou que a OMC foi tomada por “fortes ventos políticos” e tensões sobre o comércio internacional. Para Azevêdo, muitas políticas socioeconômicas dos países não fizeram tudo que poderiam para assegurar os benefícios do comércio para todos. Para ele, muito ainda precisa ser feito.

Em 2021, Joe Biden assume a presidência dos EUA prometendo o desmonte das políticas de Trump na OMC. Nada mudou. A OMC e seu antecessor, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, foram estabelecidos sob a liderança dos EUA. Agora, os norte-americanos, cada vez mais preocupados diante do desenvolvimento da China, começaram a sentir que a OMC é aproveitada pelos chineses. O governo dos EUA também tem se tornado cada vez mais impaciente com a entidade, e muitas vezes mostra extrema resistência em compartilhar as devidas responsabilidades.

Desde 2019 os EUA vêm bloqueando a nomeação de novos juízes para o órgão de apelação da OMC, o principal tribunal de revisão do comércio mundial. Portanto, não tem uma forma legal formal de dizer se algum país violou as regras ou não.

Depois de ter sido barrada para o cargo na primeira gestão de Donald Trump, a economista nigeriana Ngozi Okonjo-Iweala, graduada e doutora pelas universidades Harvard e MIT, se tornou, em fevereiro de 2021, a primeira mulher, a primeira africana e a primeira pessoa negra a dirigir a OMC. Seu mandato vai até 31 de agosto de 2025.

Com os conflitos entre China, Rússia, União Europeia e Estados Unidos, a OMC tem perdido sua capacidade de atuação num contexto cada vez mais desafiador para o comércio multilateral. O presidente russo, Vladimir Putin, afirmou que os políticos ocidentais que impuseram sanções contra a Rússia simplesmente “jogaram fora” os princípios da OMC. “Os políticos [ocidentais] não estão interessados ​​na diminuição do bem-estar e da qualidade de vida dos cidadãos comuns, particularmente na Europa. Sem mencionar coisas como a adesão aos princípios da Organização Mundial do Comércio – eles foram simplesmente jogados fora”, disse.

A OMC expressou preocupações significativas em relação às tarifas impostas pelo presidente Trump. Ngozi Okonjo-Iweala alertou para o risco de uma guerra tarifária com ciclos de medidas retaliatórias, o que agravaria ainda mais a situação econômica global. No entanto, sua capacidade de mediação está atualmente restrita.

O comércio global pode encolher de 3% a 7% e o Produto Interno Bruto (PIB) global, 0,7%, sendo os países em desenvolvimento os mais afetados, disse Pamela Coke Hamilton, diretora executiva do Centro Internacional de Comércio, agência conjunta da OMC e das Nações Unidas. “Isso é enorme e se essa escalada entre China e Estados Unidos continuar, resultará numa redução de 80% no comércio entre os países, e o efeito cascata disso em toda a linha pode ser catastrófico.”

Com Global Times, Reuters, Valor Econômico e Xinhua