Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo – Sociólogo e professor da PUCRS
Conheci Plínio Alexandre Zalewski Vargas no final dos anos 80. Ele integrava na época a chamada Nova Esquerda, grupo político formado por ex-integrantes do PRC, entre os quais Tarso Genro, Marcos Rolim e José Genoíno. Convivi mais proximamente com ele quando fundamos o movimento PT Amplo e Democrático, em 1992, que defendia uma mudança radical na estrutura interna do partido, arejando e democratizando os espaços de poder com o fim das estruturas de tendências internas, a desburocratização e a ampliação do diálogo com a sociedade numa perspectiva democrática, superando os vícios de estruturas políticas ainda marcadas pela luta armada contra o regime militar e padrões marxistas-leninistas de organização. Não tivemos sucesso, e o próprio PT Amplo virou uma tendência.
Por essa e por outras acabei me afastando da militância partidária, enquanto Plínio, no final dos anos 90, desistiu do PT e foi primeiro para o PPS, depois para o PMDB.
Discordei e discordo das opções políticas dele, e durante a última década continuei apoiando candidatos do PT para diversas esferas de poder, considerando que o partido era a possibilidade mais avançada de democratização do Estado e inversão de prioridades na implementação de políticas públicas de distribuição de renda e acesso a direitos. Mas reconheço que Plínio sempre manteve a coerência na tentativa de construir um espaço político democrático no contexto do Brasil e do Rio Grande do Sul. Há muito havia revisto suas ideias, e seu pensamento era muito influenciado pela filósofa Hannah Arendt, muito mais próximo de uma social democracia.
Lembro que em nosso último embate nas redes sociais, algumas semanas atrás, ele acusava a campanha de Raul Pont de estimular a violência juvenil contra o patrimônio em manifestações, e dizia que isso era inaceitável. Eu contrapunha dizendo que, em que pese a necessidade de evitar a utilização da violência como método de ação política, o processo de destituição da Presidente da República, pelo grau de ilegitimidade que continha, havia aberto a porta para a degradação da disputa política democrática, retrocedendo no processo de institucionalização dos conflitos sociais, para o qual o PT havia contribuído.
Naquele momento, ele ainda acreditava que o adversário no 2º turno seria Raul. Se deu conta logo depois, talvez tarde demais, que o desgaste do PT e a divisão da esquerda em Porto Alegre apontava para o risco real de que ficasse de fora da disputa, que seria entre dois grupos que até então estiveram aliados na Prefeitura e no Estado, um deles, representado por Marchezan, buscando aproveitar a onda conservadora e dispensar as parcerias com o centro (parte do PMDB e PDT) para governar sozinho e com um projeto de poder para o estado e o país de absoluta exclusão da esquerda dos espaços políticos e da participação social na gestão pública.
Logo após a sua morte, sites da direita tem espalhado a notícia de que Plínio era um “comunista”, e com isso procuram justificar a ação do MBL de perseguição a ele. Ao contrário, Plínio foi um dos artífices do projeto político que levou à derrota do PT na prefeitura de Porto Alegre depois de 16 anos no poder municipal, com marcas importantes e internacionalmente reconhecidas como o orçamento participativo, amalgamando forças políticas do centro até a direta para a constituição de uma nova hegemonia política na cidade. Brilhante estrategista, Plínio é parte de uma geração que buscou incessantemente a boa política, e sua morte empobrece a política gaúcha.
Na sexta-feira passada, encontrei com Plínio pessoalmente, depois de muitos anos, para declarar meu apoio à chapa Melo/Juliana, e conversar sobre os rumos da campanha no 2º turno. Não imaginava que seria nosso último encontro. A serem comprovados os fatos até agora divulgados, que apontam para uma linha investigativa voltada para a comprovação do suicídio, justificado pela pressão exercida sobre ele, já que o monitoravam e ameaçavam por vários meios, teria o sentido de um recado. Que sejamos capazes de ouvi-lo, para nos darmos conta do que de fato está em jogo nas eleições em Porto Alegre.