Naira Hofmeister
Em uma sessão tensa, ocorrida na véspera do feriado de 12 de outubro, o representante do Sindicato das Indústrias da Construção Civil do Estado (Sinduscon-RS) no Conselho do Plano Diretor, Sérgio Korem, emitiu parecer favorável ao projeto de revitalização do Cais Mauá, em Porto Alegre.
“Cumpre com todas as definições do Plano Diretor”, justificou Korem, para em seguida completar: “Eu tenho vontade de ter esse porto na cidade, para os meus filhos desfrutarem”.
Antes mesmo da abertura da reunião já era possível notar a apreensão dos presentes na sede da Secretaria de Urbanismo – na semana anterior, quando os representantes do consórcio compareceram ao Conselho para introduzir o debate, integrantes de coletivos contrários à construção de shopping, espigões e estacionamento na área foram barrados porque a sala estava com a lotação esgotada.
Dessa vez o público externo era menor, embora os militantes tenham marcado presença. Também havia representantes dos poderes Executivo e Legislativo, o que intrigou o conselheiro Diaran Laone Camargo, da RP7: “Quando são projetos de interesse da prefeitura, a sala fica cheia. Mas se é para a comunidade…”.
A apresentação do voto tomou cerca de 50 minutos da reunião, o que provocou protestos: “Presidente, todo mundo quer falar”, interferiu Paulo Jorge Amaral Cardoso, da RP5.
O relator foi instado a acelerar sua leitura, mas não cedeu à pressão e leu todas os condicionantes apontadas pelas secretarias municipais ao licenciamento do projeto e o parecer do Conselho do Patrimônio Histórico Cultural sobre a restauração dos armazéns tombados.
“Minha obrigação como cidadão era fazer uma análise bem detalhada, não só porque o projeto exige, mas porque estamos esperando por isso há muitos anos”, argumentou Korem.
Voto de minerva permite fala da comunidade
O momento mais tenso, entretanto, se deu quando um representante da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) e do coletivo A Cidade que Queremos pediu a palavra para criticar o empreendimento.
Embora previstas no regimento do Conselho do Plano Diretor, intervenções do público devem primeiro ser aprovadas pelo pleno – e os 18 conselheiros que votaram dividiram-se; nove concordaram com a abertura, outros nove foram contra.
O voto de minerva coube ao vice-presidente do colegiado, o representante da Associação Gaúcha dos Advogados de Direito Imobiliário Empresarial, José Euclésio dos Santos, que assumiu os trabalhos na ausência do titular, o secretário de Urbanismo José Luiz Fernandes Cogo. “A mesa decide conceder a palavra”, anunciou.
O eleito pelo movimento para falar por três minutos foi o procurador do Estado Silvio Jardim, que provocou os conselheiros: “Vocês sabem que há uma recomendação do Ministério Público de Contas para que não se liberem intervenções na área? Que o contrato entre o Estado e o empreendedor já está na sua quarta versão e que nenhuma das disposições contratuais foram cumpridas até hoje? Que esse consórcio já mudou sua formação diversas vezes e que tem entre seus integrantes empresas envolvidas na Lava a Jato e na operação Fundo Perdido, da Polícia Federal? Que não há dinheiro nem para restauras os armazéns?”.
Embora estivesse presente na sessão o diretor de Operações do Cais Mauá, Sérgio Lima, coube ao titular do Gabinete de Desenvolvimento e Assuntos Especiais da Prefeitura Municipal (Gades), Edemar Tutikian, rebater as acusações.
Além de informar aos presentes que o pedido de liminar referido por Jardim não foi acatado pelo conselheiro do Tribunal de Contas Alexandre Postal e que as indagações do MP de Contas “vão tramitar normalmente”, Tutikian defendeu o consórcio.
“Se houver problemas com a empresa, ela vai se manifestar no momento adequado. Sobre os recursos para a obra, não há como fazer a captação sem que o licenciamento esteja concluído. Nosso debate aqui deve ser sobre o uso do solo. Ao Estado cabe fiscalizar”, defendeu.
Processo está a disposição da população
Ao final, embora houvesse inscrições de conselheiros para comentar o voto do relator, o pleno decidiu não iniciar o debate na noite de terça, uma vez que houve um pedido de vistas da RP1, conforme havia sido combinado previamente. As representantes da Metroplan e da Ufrgs também haviam solicitado vistas, e a decisão da mesa foi conceder vista compartilhada a todos os conselheiros.
“Além disso, gostaria de esclarecer que qualquer cidadão pode entrar em contato conosco para analisar o processo”, anunciou o conselheiro da RP1, Daniel Nichelle, que está com a guarda dos papéis.
A RP1 agendou uma reunião aberta para debater o projeto com a comunidade na próxima segunda-feira, 17 de outubro, no Plenarinho da Câmara de Vereadores.
O conselheiro tem até 15 dias para entregar seu parecer sobre o projeto, que pode ou não ser acatado pelo relator. “Mas é possível pedir diligências também, o que aumentaria o prazo”, explica o vice-presidente, José Euclésio dos Santos.
Como o tempo da sessão foi extrapolado pelo debate sobre o Cais Mauá – e outros projetos também importantes para o conselho, como o novo modelo de cálculo do Solo Criado que está sendo proposto pelo colegiado – a apresentação do Estudo de Viabilidade Urbanística do Parque do Pontal (antigo Pontal do Estaleiro) ficou agendada para a próxima semana.
Tensão marca voto favorável do relator ao Cais Mauá

Embora o representante do consórcio estivesse na reunião, coube ao secretário Tutikian fazer a defesa do empreendimento