A CPI que investiga o incêndio da Pousada Garoa, ouviu Elton Bozzetto, da Pastoral do Povo da Rua, nesta segunda-feira (24/03).
No incêndio, ocorrido há quase um ano, morreram 11 pessoas que estavam no local, na avenida Farrapos, no centro de Porto Alegre.
As circunstâncias da tragédia ainda não foram devidamente esclarecidas, embora o inquérito policial tenha indiciado três pessoas por “homicídio culposo”.
O albergue fazia parte de uma rede contratada pela prefeitura para abrigar pessoas em condições de vulnerabilidade.
Irregularidades e negligências foram constatadas, tanto na fiscalização do contrato, quanto nas condições oferecidas para a hospedagem.
A diretora-geral do Instituto-Geral de Perícias (IGP), Marguet Mittmann, que também havia sido convocada para depor, não compareceu.
“O IGP informou que eles já prestaram suas informações à Polícia Civil e que por ser algo muito reservado, do ponto de vista da tragédia, eles têm a prerrogativa de não se manifestar”, esclareceu o presidente da CPI, Pedro Ruas.
Além disso, a EPTC* informou que não tem mais as imagens daquele período do incêndio e a Guarda Municipal disse que tem imagens de algumas horas antes e depois do ocorrido, e que, posteriormente, deve disponibilizar o material à CPI.

Em seu depoimento, Elton Bozzetto, contou que trabalha com a população de rua, por uma missão e convicção pessoal, há mais de 30 anos.
“É condição mínima para a garantia da dignidade humana que a gente acolha as pessoas, e depois de acolhê-las, atender às suas necessidades básicas e mais importantes. E esta é a orientação que nós trabalhamos na Pastoral do Povo da Rua”, declarou.
Bozzeto confirmou que conhecia cinco das 11 pessoas que perderam a vida no incêndio: “Tem duas ou três pessoas que nós acompanhamos depois no atendimento, que inclusive usou um codinome para não ser identificado”, por receio de qualquer tipo de retaliação, revelou.
Conforme Bozzetto, a partir das 23h, na Pousada Garoa, as portas eram fechadas e não tinha mais acesso e nem possibilidade de saída. Também falou que as portas dos quartos da pousada eram trancadas pelo lado de fora.
O relator da CPI, vereador Marcos Felipi (Cidadania), perguntou como as pessoas conseguiram sair da pousada na noite do incêndio. A testemunha afirmou que, segundo relatos recebidos daquela população, que as pessoas saíram pulando as janelas.
O relator também pediu a avaliação de Bozzetto do serviço prestado pela Garoa. “A Pousada Garoa está neste rol de dificuldades que nós temos de implantação da política pública em Porto Alegre para a população em situação de rua”, analisou.
“O acompanhamento a essa pessoa tem que ser integral, o espaço para pernoitar é apenas um item”, disse.
Ele completou que nunca soube de conflitos entre as pessoas que estavam na Garoa quando ocorreu o incêndio, ou de qualquer atuação de facções dentro da pousada.
Quanto ao atendimento dado aos sobreviventes do incêndio pelo município, Bozzetto afirmou que foi falha a tentativa de contato com os familiares das vítimas, pois não havia um cadastro das pessoas e seus parentes.
Apontou ainda que foi negligenciado o atendimento psíquico e emocional tanto para as vítimas quanto suas famílias.
Por fim, foi questionado como as pessoas em situação de rua são atendidas hoje na cidade, após a interrupção do serviço da Pousada Garoa. A testemunha relatou a redução do número de vagas dos albergues que prestam serviço de acolhimento à população de rua. “Qual é o argumento? A falta de RH adequado para o atendimento. Isto é uma confissão pública de que a política do município não está funcionando para a população em situação de rua e para a assistência social, e nós temos 5.300 pessoas na rua”, criticou.
Ele repetiu: “A partir das 23h era cessada essa possibilidade”, relatando ainda que as portas dos quartos eram trancadas pelo lado de fora.
Bozzetto também citou relatórios de equipes do programa Ação Rua, entregues ao município antes da tragédia, e que apontavam más condições sanitárias e de segurança nos prédios dos albergues”.
A CPI vai convocar mais 23 pessoas para depor. Os três indiciados pelo incêndio – Cristiano Roratto, ex-presidente da Fundação de Assistência Social (Fasc); Patrícia Mônaco Schüler, fiscal de contratos da Fasc na época; e André Kologeski da Silva; dono da rede de pousadas, serão os últimos a serem ouvidos, em 2 de junho.
*Empresa Pública de Transporte e Circulação
