Bióloga encontra caramujos africanos em Porto Alegre e alerta para os riscos à saúde e ao meio ambiente

Por Cleber Dioni Tentardini

A bióloga Janine Arruda, especialista em moluscos do Museu de Ciências Naturais do Rio Grande do Sul/SEMA, encontrou nesta quinta-feira, 16, vários exemplares do caramujo gigante africano Achatina fulica, no bairro Cristal, em Porto Alegre.

Janine gravou um vídeo no instante em que localizou os caramujos e divulgou em suas redes sociais para alertar a população.

“Para quem encontrar essa espécie no Rio Grande do Sul por favor registrar no aplicativo InvasorasRS. A página @invasorasrs contém informações técnicas e atualizadas. Sigam a página e ajudem na identificação e combate de espécies exóticas invasoras (…)”

O molusco é considerado uma das cem piores espécies exóticas invasoras do mundo, causa sérios danos ambientais e quando infectados por vermes, são potenciais transmissores de doenças aos animais e aos seres humanos.

 

 

 

 

As doenças

A meningite eosinofílica é a única que teve casos registrados no país. Ela é causada pelo verme Angiostrongylus cantonensis, que passa pelo sistema nervoso central, antes de se alojar nos pulmões, num ciclo de transmissão que envolve moluscos e roedores.

Já a angiostrangilíase abdominal, que ocorre no país, porém sem registro de transmissão pelo caramujo africano, é causada pelo parasito Angiostrongylus costaricensis. Muitas vezes é assintomática e em alguns casos pode levar ao óbito, por perfuração intestinal e peritonite.

Além da espécie competir com as nativas, é muito voraz, come tudo o que vê pela frente, plantações, jardins, e há registros dela comendo jornais e revistas e até outros moluscos, configurando o canibalismo.

“Onde aparece um, normalmente existem muitos outros porque eles se reproduzem em larga escala. E como são grandes, assustam, chamam a atenção nas lavouras, em pátios, lixões. Devoram tudo por onde passam”, afirma Janine.

Ela adapta-se muito facilmente. Carrega consigo uma concha marrom escura com listras esbranquiçadas, no formato de um cone. Os indivíduos adultos podem pesar meio quilo e chegar a 20 cm de comprimento.

Os indivíduos são hermafroditas, podendo realizar até cinco posturas por ano, com 50 a 600 ovos por postura. Ativo no inverno, resistente ao frio e à seca, geralmente passa o dia escondido e sai para se alimentar e reproduzir à noite ou, durante e logo após as chuvas.

Os ovos, que podem chegar a centenas de uma só vez, são pouco maiores que uma semente de mamão, branco-amarelados, que serão enterrados ou depositados em uma superfície, como folha, ou sob uma pedra.

Praga do caramujo

O caramujo africano (Achatina fulica) foi introduzido no Brasil na década de 1980, na busca de uma alternativa mais barata ao escargot. O primeiro registro no Brasil, no entanto, foi um trabalho científico de 1975, relatando a ocorrência em Juiz de Fora, Minas Gerais.

Quando descobriram que a espécie era imprópria para o consumo humano, os caramujos foram libertados no ambiente. Sem predadores naturais no país, esses animais, que são hermafroditas, encontraram aqui o lugar perfeito para se proliferarem, sem controle algum. O molusco se transformou em uma praga.

Museu é referência no estudo de moluscos

Janine é uma taxonomista, pesquisadora capacitada a descrever novas espécies, no caso, de moluscos. Teve entre seus mestres dois dos maiores malacólogos brasileiros: José Willibaldo Thomé e Maria Cristina Dreher Mansur. A professora da UFRGS é a maior especialista em moluscos bivalves de água doce, animal caracterizado por possuir uma concha que se divide em duas partes, muito comum também em espécies marinhas.

Já, o professor Thomé, foi seu orientador nos dois cursos de pós-graduação, mestrado e doutorado em Zoologia na Faculdade de Biociências da PUC gaúcha. Thomé faleceu em 20165. Era uma referência no estudo dos moluscos terrestres no Brasil. Foi um dos fundadores do então Museu Rio-Grandense de Ciências Naturais,  ao lado de nomes como os professores Ludwig Buckup, Thales de Lema e o padre jesuíta Balduíno Rambo.

A coleção de moluscos do MCN está entre quatro maiores do Brasil, com mais de 41 mil lotes. Fica atrás de coleções dos museus da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto de Oceanografia da Universidade Federal de Rio Grande – Furg, e se equivale a do Museu Nacional, no RJ.

Acervo do Museu. Fotos: Cleber Dioni

 

 

 

 

Durante a gestão do professor Thomé na direção do Museu foram adquiridas peças de um malacólogo amador, o uruguaio Eliseu Duarte, com cerca de 20 mil lotes, com recursos federais do CNPq.

Janine. Fotos Cleber Dioni
Órgão reprodutor de molusco

 

 

 

 

 

Uma parte da parede da sala da Janine no Museu é coberta de cópias de vários sistemas reprodutores dos moluscos da espécie Omalonix, que ela pesquisa. Isso porque as maiores características que diferenciam as espécies são o pênis.

Os moluscos são hermafroditas, ou seja, não precisam de outro indivíduo para se reproduzirem. “Mas, preferem o acasalamento, a troca de variabilidade genética”, garante a pesquisadora.

Não existe uma frequência determinada para colocarem ovos, mas Janine acredita que a frequência aumente em épocas mais quentes.

“Os moluscos não fazem mal a ninguém. Estão ali se alimentando, são herbívoros, suas fezes como a de outros animais servem de adubo. Eles próprios servem de alimento para os lagartos e as saracuras. Mas a infestação do caramujo gigante africano tras muitos riscos”, alerta.

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