O sociólogo português Boaventura de Souza Santos afirmou que é fundamental mudar o ativismo político, a democracia e o desenvolvimento social para um modelo de autodeterminação. Um modelo ecologicamente sustentável que não é a economia verde. “O capitalismo nunca será verde exceto nas notas de dólar dos Estados Unidos”, ironizou. Para ele, alguns podem acreditar que tudo não passa de uma utopia.
“No entanto, todas as utopias têm seu horário, que vem da crise, das oportunidades que as tornam possível. Esse é o horário das utopias realistas para a transformação do mundo. Nesse horário não podemos faltar”, disse Santos.
Para ele, as instituições democráticas já não satisfazem as aspirações dos cidadãos, mas existe algo mais do que isso. Entende que é um momento de crise profunda das instituições democráticas, que pode levar a uma nova forma de barbarismo, mas de oportunidades também. “Como construir esse novo momento não é fácil porque a democracia representativa virou as costas para as populações.
A esquerda social democrática esqueceu-se da distinção entre esquerda e direita. Assim, não nos surpreende que o anarquismo seja a única tradição europeia que ainda sobreviva no movimento dos indignados, que os movimentos dos indígenas e dos quilombolas nesse Continente nos perguntem qual a diferença entre esquerda e direita se ambas os golpeiam da mesma forma.”
Segundo Santos, o continente americano é o único local que se pode falar de socialismo no século 21. “Em nenhum outro Continente se fala disso hoje. Mas é também aquele Continente onde o DNA da esquerda continua sendo o extrativismo, a destruição da nossa terra mãe. Isso golpeia pequenos agricultores, indígenas e quilombolas e a destruição é cada vez mais grave e mais séria.
Portanto, temos que encontrar outro modelo e não pode ser de maneira leviana. Hoje 60% na economia do Equador, por exemplo, é do extrativismo. Não pode mudar de um dia para outro. Precisamos de uma nova teoria de transição.
Contra teorias elitistas
Não é a transição do feudalismo para o capitalismo, absorvido pelos movimentos de esquerda e teoria marxista.” Souza acredita numa transição do desenvolvimento insustentável para um modelo que não é de desenvolvimento, mas de autodeterminação dos povos a nível local, regional e nacional. Uma forma de defesa da globalização neoliberal.
Para isso, a sociedade terá várias tarefas pela frente, conforme ele. A primeira é um novo ativismo político do século 21, contra teorias elitistas de democracia. Para ele, a maioria esmagadora dos cidadãos é da sociedade civil não organizada, desprezada pelos movimentos sociais durante muito tempo.
“Os únicos espaços públicos que não estão colonizados pelo capitalismo financeiro são as praças, as ruas da Europa, do norte da África e Estados Unidos. Sabemos que neste momento a alternativa não é de partidos e movimentos sem o envolvimento das presenças coletivas nos espaços públicos para mostrar que a democracia em muitos países está nas mãos de falsos democratas. Portanto, temos que encontrar outras formas de refundar a democracia e o próprio estado.
A grande maldição da esquerda no século 20 foi transformar os militantes em funcionários. Por isso, temos que pensar na refundação dos partidos e da democratização interna dos movimentos sociais. Ou a democracia começa dentro dos movimentos sociais e dos partidos ou não começa nunca. A direita não precisa pensar porque o sistema econômico mundial pensa por ela, mas a esquerda tem que pensar e deixou de pensar já há algum tempo.”
Boaventura de Souza Santos participou do debate Os Sentidos da Democratização, na sexta-feira, 27, no teatro Dante Barone, na Assembleia Legislativa, com a presença do governador Tarso Genro; ministro da Secretária-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho; diretor geral do Le Monde Diplomatique e um dos construtores do Fórum Social Mundial, Bernard Cassen; representante Comitê Internacional do FSM, Francisco Whitaker, e o deputado estadual do PT, Adão Villaverde.