Tarso Genro diz que toda a grande mídia é de oposição ao governo

O governador do RS Tarso Genro, candidato a reeleição, disse que toda a grande mídia é oposição ao governo liderado pelo PT e isto não é uma ofensa, mas uma opção política. “As grandes redes defendem os interesses da iniciativa privada e são contrárias as estatais, investimentos na qualificação da máquina pública, mecanismos de participação popular como os conselhos populares e gabinete digital, um Fundo Operação Empresa do Estado do Rio Grande do Sul (Fundopem/RS) descentralizado e aberto as pequenas e médias empresas.” Ressalta que o governo não é contra as Parcerias Público-Privadas (PPPs), mas o negócio deve privilegiar o interesse público e não somente determinadas empresas.
Ele cita o exemplo do Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR) criada em seu governo, que não renovou os contratos com empresas privadas que controlavam a arrecadação de diversos pedágios. A partir daquele momento todas as estradas sob controle da EGR passaram a ser intransitáveis, conforme a mídia Lacerdista.
“Na realidade a Empresa Gaúcha de Rodovias tem 18 equipes trabalhando na recuperação e restauro em cerca de de 900 quilômetros de estradas que estão sob o seu cuidado e executa as melhorias com o dinheiro arrecadado em 14 praças de pedágio. No entanto, esta postura não é pessoal, contra o governador, mas porque eles querem que os pedágios fiquem nas mãos da iniciativa privada”, observou.
Tarso explicou que o projeto que cria o Conselho Estadual de Comunicação, está parado desde 2012 na Casa Civil porque não tem maioria na Assembleia Legislativa e seria derrubado caso fosse à votação. “Integrantes da própria bancada do PT não querem se indispor com a mídia e preferiram não provocá-la neste momento”, acrescentou.
O Conselho Estadual de Comunicação é uma instância pública e de caráter independente, como órgão consultivo, de assessoramento e aconselhamento do Poder Executivo. O caráter de instância pública independente será assegurado pela presença, em sua composição, de representantes da sociedade civil.
Em sua palestra nesta quarta-feira, 6, no Tá na Mesa da Federasul, Tarso falou sobre os números de seu governo e a dívida pública. Segundo ele, para ampliar os investimentos e acelerar o crescimento do RS é necessária a aprovação, pelo Senado Federal, do Projeto de Lei Complementar nº 99/2013, que trata da renegociação da dívida de Estados e municípios com a União, e que irá permitir ao RS, já a partir de 2015, abrir um espaço fiscal para novas contratações de financiamento para investimentos, além de sair de um pagamento de dívida por prazo indeterminado para, enfim, encerrá-la em 2027.
Questionado sobre a posição contrária ao projeto pelo Banco Central, disse que é natural esta manifestação por parte da área financeira, “mas o governo se comprometeu com o projeto e isso me fez aceitar ser candidato a reeleição.”
Disse, ainda, que as reformas Tributária e Política precisam passar no Congresso, mas lembrou que São Paulo é contra a primeira e os estados do Nordeste, contra a segunda. “Estas reformas só acontecerão se houver a união dos demais estados.”
O Tá na Mesa, da Federasul, terá ainda como palestrantes para falar sobre os desafios do Rio Grande, José Ivo Sartori, candidato ao Governo do Estado pela coligação “O novo caminho para o Rio Grande” (PMDB / PSD / PPS / PSB / PHS / PT do B / PSL / PSDC), em 13 de agosto. Nas quatro semanas seguintes os palestrantes serão os candidatos ao Senado pelas mesmas coligações: Olívio Dutra (PT), em 20 de agosto; Lasier Martins (PDT), 27 de agosto; Simone Leite (PP), 3 de setembro, e Beto Albuquerque(PMDB), 10 de setembro.
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Tráfico: empresário leva 25 anos para provar inocência

Por Renan Antunes de Oliveira |

N
ão existe caso de erro judicial no Brasil igual ao do empresário carioca José Germano Neto, de 65 anos, dono de uma revenda BMW no Rio de Janeiro. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) acaba de absolvê-lo de um crime nunca cometido.
Germano foi perseguido pela polícia como narcotraficante por 25 anos.
Ele enfrentou seis processos. Puxou cadeia aqui, nos Estados Unidos e na França.
O ponto de partida da perseguição foi uma denúncia fria feita por um alcaguete da polícia carioca, em 1989.
O homem queria revanche porque o empresário o acusara do roubo de um Chevette de segunda mão. Ele se vingou acusando Germano de chefiar o tráfico no Morro do Vintém.
Com base na denúncia fria Germano foi preso e fichado como chefão. Aí começou aquele conhecido desfile de delegados e promotores divulgando suspeitas como fatos, fofocas como verdades.
Tudo era reproduzido na imprensa, sem filtros. O linchamento de Germano não teve precedentes: o caso da Escola Base só aconteceria em 1994, cinco anos depois. Os jornais o moeram e jogaram na lama.
A ficha suja dele circulou entre policiais dos três países por mais de duas décadas. Só aqui o processo teve 40 volumes, 30 adendos e 6 mil páginas.
PERSEGUIÇÃO SEM FIM
A fama de narco lhe rendeu três processos no Brasil (1989, 1996 e 2002), dois na França (1994 e 2000) e um nos EUA (1998).
Foram quatro anos de cadeia, um pouco em cada país. E um quarto de século de idas e vindas a tribunais.
Germano foi investigado sem sucesso pelas polícias Civil e Militar do Rio, pela Federal, DEA (agência antidrogas americana), Nacional Francesa e até pela CPI do Narcotráfico.
A sentença (leia neste link) do STJ que o absolveu foi divulgada apenas nos meios forenses e em juridiquês.
O trânsito em julgado do processo aconteceu em junho – agora ele é inocente de uma vez por todas. Os bens apreendidos e o passaporte já podem ser devolvidos ao dono. José Germano Neto está limpo outra vez.
ENFRENTANDO A BMW
A absolvição chegou aos 45 do segundo tempo: o empresário está com câncer e botando pontes de safena.
Se não morrer e se ganhar indenização de R$120 mi da multinacional BMW, talvez Germano ainda aproveite o limão que a vida lhe deu.
A indenização é muito possível. Germano processou a montadora na 5ª Vara Cível do Rio porque a empresa cassou a concessionária dele na Barra da Tijuca enquanto estava preso nos EUA, em 1998.
Para cassá-lo, a multi alegou que o nome sujo dele respingava na imagem da marca.
Os advogados da BMW, Tozzini, Freire, Teixeira e Silva, ilustraram sete páginas da defesa dela com reportagens sobre Germano como bandido.
O Germano agora com nome limpo pede a concessionária de volta, mais lucros dos últimos 16 anos. O cálculo dos milhões foi feito por peritos legais. O caso está na 9ª Câmara Cível do Rio, a passos de cágado.
MINHA APOSTA
Entrei no caso Germano quando era repórter do Estado de S.Paulo em Nova York, em 1998. O cônsul brasileiro me ligou avisando da prisão pela NYPD de “um carioca condenado na França por narcotráfico”.
Era ele. Foi preso na happy hour de uma convenção da BMW.
Fui conferir. A polícia americana me disse que o prendeu para extraditá-lo à França, para cumprir 12 anos de cadeia, conforme mandado da Interpol. Lá, Germano fora condenado à revelia.
Ele passou semanas sendo interrogado pela DEA, no cadeião federal de Manhattan. Num ponto qualquer, os americanos se desinteressaram dele.
O Brasil abriu mão do direito de pedir primazia na extradição. Ele foi então para uma cadeia no Upstate NY aguardar transferência à França.
Meses depois, consegui autorização para entrevistá-lo na prisão. Ele não acreditava na nova acusação de narco, ainda mais na França. Parecia atordoado. Só repetia “sou inocente”.
Estávamos na área comum de visitas aos presos. Eu olhei para a turma em volta e disse, como nos filmes: “Claro, aqui dentro todos são inocentes”.
Me perguntou: “Você acha que se eu fosse um traficante condenado não saberia? Aí eu não viajaria para o Exterior. Viajei porque não sabia”.
Passei o trator nele: Você fumava? Cheirava? Comprava? Vendia? Germano negava tudo. Tentei ver a alma nos gestos, para a sentença de repórter: bandido ou mocinho?
Como bandido, ele já tinha a fama feita. No Rio, figurou nas páginas policiais até o esgotamento.
Como mocinho, ainda não dava para acreditar nele. No texto, fiquei em cima do muro.
Com a prisão nos Estados Unidos ele voltou às manchetes por alguns dias. Minha entrevista rendeu meia página no Estadão.
Em 2000, Germano desistiu de se defender nos EUA e pediu para ser extraditado à França. A DEA não viu nada importante nele e o deportou.
SACANAGEM DIPLOMÁTICA
Meses depois da entrevista no Upstate, reencontrei o cônsul num regabofe. Ele me puxou para um canto e soprou: “Sabe o Germano? Fizeram uma sacanagem com ele”.
O cônsul me explicou: “A Polícia Federal queria vê-lo na cadeia, mas não conseguia. Então, foi feita uma armação para entregá-lo aos americanos”.
Ele disse que a Interpol francesa expedira o mandado de prisão por canais sigilosos. Só a PF sabia. Aí, ela passou ao NYPD dia, horário, flight number e hotel dele, resultando numa prisão fácil pros tiras americanos.
O cônsul me sugeriu investigar outra vertente da sacanagem. Ele achava que o convite da BMW para a convenção fora só para tirá-lo do Rio e assim cassar a concessão dele (mais tarde, a multi negou envolvimento na trama).
A PF não informou Germano do mandado francês porque o queria na cadeia, não importando onde. Ela usou o artifício porque a Constituição proíbe a extradição de brasileiros.
A própria condenação na França derivou de uma informação errada dela, PF, aos franceses. Eles investigavam uma conexão Rio-Paris, em 1994. A PF mandou a ficha de Germano como sendo o chefão do Morro do Vintém. Vapt vupt, o empresário foi condenado, sem saber que era réu em Paris.
Bem mais tarde Germano processou a PF, mas ela foi absolvida da mancada, considerada ossos do ofício.
Germano teria tido uma chance de voltar dos EUA para o Brasil sem ser extraditado para a França, se o Itamaraty tivesse pedido a repatriação dele, coisa que não fez.
Consultei o cônsul: “Nós não pedimos porque o Governo não deixou. A gente não sabia o motivo. A PF dizia que ele era bandido. Só agora o pessoal do Itamaraty está dizendo que ele é inocente”.
Corri para o telefone. Liguei para meu chefe, Laerte Fernandes. Pedi para ele acionar nosso correspondente em Paris para checar o caso. A resposta foi gelada: “Não vamos atrás de cachorro morto”.
Liguei para a jornalista francesa Valerie di Chiappari, uma amiga de anos. Sem avisar o Estadão, ofereci 200 dólares para ela ir ao Tribunal de Paris descobrir alguma coisa.
Val não teve sorte. Informou apenas que Germano continuaria preso, aguardando julgamento. Pela lei local, quando um condenado à revelia aparece, anula-se o anterior e abre-se um novo processo.
Mandei uma nota para o Estadão. Tomei mais um balde frio: “Renan, esquece o caso”. Desta vez a ordem veio de um assistente do diretor Pimenta…perdi o reembolso dos 200 dólares.
MALANDRAGEM POLICIAL
Ainda fuçando, liguei dos Estados Unidos para a Corregedoria da Polícia Federal no Rio. Fiz uma longa entrevista com um delegado. Ele disse que a investigação de Germano tivera problemas e que, em consequência, o responsável pelo caso fora afastado.
Mandei uma matéria com o sinal de alerta bem grande: o empresário José Germano Neto pode ser inocente.
Surpresa: o delegado-fonte processou o Estadão dizendo que não tinha falado comigo. Não era uma dúvida sobre um ponto ou outro do texto. Era uma negativa total. Como seu eu tivesse pirado e inventado a conversa com ele. Aí, pediu grana de indenização.
Juntei o papo do cônsul e a ação do delegado para começar a suspeitar fortemente … da inocência de Germano.
Raciocinei: se um delegado PF faz uma pilantragem dessas, o bandido deve ser o mocinho da história.
Em 2001, fui posto pra rua do Estadão. Voltei pro Brasil e fui trabalhar na Gazeta do Povo, de Curitiba.
No final de 2002, recebo um telefonema no jornal. Uma voz rouca, grave, arfante: “Aqui é o José Germano”. Ele me contou que tinha sido absolvido e deportado da França.
Estava no Rio. E, surpresa, prestes a ser preso de novo pela PF.
Por quê? “Por causa da primeira condenação na França.”
Com frieza, respondi que o caso dele não interessaria ao meu jornal. Ele me lembrou, com delicadeza: “Só liguei porque você pediu para te avisar quando saísse da cadeia”.
O PRIMEIRO DELEGADO
Fast forward para o final de 2004. Saí da Gazeta. Ganhei uma passagem e 24 horas de hotel grátis no Rio, pra cerimônia do Prêmio Esso.
Do aeroporto, fui primeiro para o escritório dos advogados de Germano. Eles me vieram com o papo de polícia incompetente perseguindo seu cliente inocente, arruinando o negócio com a BMW. Queriam me mostrar uma sala cheia de documentos.
Desconfiei deles. Pedi para procurarem na papelada apenas o nome do primeiro delegado a prendê-lo, em 1989. “Foi o doutor Júlio Mulatinho, da Polícia Civil do Rio”, lembrou Germano, mesmo 15 anos depois.
Encerrei a reunião. Rápidos telefonemas, achei o doutor Mulatinho. Era o titular da delegacia de Maricá. Peguei um táxi e levei uns recortes de jornal para o papo com ele.
O homem mal viu a primeira foto, virou a cara e fez tsk tsk tsk: “Ah, este coitado (Germano). Não é bandido. Foi caguetado por um vagabundo”.
Pedi uma prova: “Posso não ter provas da inocência, mas duvido que encontrem da culpa”.
O delegado me contou que o prendeu “por uma denúncia fria”. Para ele, Germano estava limpo. “Quando a PF assumiu o processo, eu tentei avisar o pessoal dela, mas ninguém se importou.”
Estaria o delegado no bolso de Germano? Como ele lembrava de tudo, 15 anos depois? “Deu tanta notícia na época que foi impossível esquecer.”
PERDAS
Balanço do caso entre 1989 e 2004: Germano passou quatro anos na cadeia. A BMW lhe cassou o negócio. Prenderam a mulher dele, a leiloeira oficial Zalfa Nassar, acusada pela PF de cumplicidade. Ela perdeu o cargo e abortou na cadeia. Eles se mudaram de um apê de luxo na Barra para o subúrbio de Campo Grande – uma condenação dentro da condenação.
A perseguição já era do tipo ovo ou galinha: na França, acusado de ser traficante no Rio, no Rio, acusado de traficante na França.
Mesmo que Germano quisesse retomar sua vida, ela continuaria parada na 8ª Vara Criminal do Rio de Janeiro por mais10 anos. Estava com seus bens congelados, sem passaporte, obrigado a viver no eixo casa-advogado-casa.
POLÍCIA BANDIDA
Em 2005, no Jornal Já, re-re-reinvestiguei o caso. Contratei um frila no Rio para ir à PF checar as acusações contra ele. Era o estudante Breno Costa, depois top repórter na Folha de S.Paulo.
Breno chega ao processo, mas é detido pelo delegado do caso. Ele ameaça mandar o repórter para um cadeião carioca.
Telefonemas frenéticos. Mobilizado o sindicato do Rio. O presidente Aziz Filho liga, me dá uma dura por mandar um estagiário, resgata Breno ileso.
O repórter ficou sem a matéria, mas eu reforcei minha dúvida: a PF não tinha nada para provar a acusação contra Germano. Quando policial tem, solta em off. Quando não tem, acusa: “Você é amigo do bandido?”
Neste estágio, boquirrotiei: contei para Milton Coelho da Graça, do Observatório de Imprensa, que estava preparando uma história sensacional.
NA TOCA DO LEÃO
Para escrevê-la, voei para o Rio, numa manhã de domingo. Fui de surpresa à casa de José Germano. Ele e Zalfa estavam na varanda. Liam jornais. Pareciam calmos e confortáveis na rotina morna do casamento sem filhos.
Saímos para almoçar numa churrascaria vagabunda. O papo rolou sobre colesterol e pontes de safena. Ele estava pesando 120 quilos. Eu idem, então tive intimidade suficiente para apelidá-lo de Gordo.
Passamos a tarde com Faustão e futebol. Ele roncou na poltrona. Zalfa remexia nas pilhas de volumes dos processos. Furunguei na papelada.
Aos poucos, a mulher começou a tagarelar. Contou dos dias presa em 1989: “Para me soltar, queriam que eu incriminasse o Zé.”
Zalfa perdeu o cargo de leiloeira, mas fez uma limonada: foi estudar. Deu tempo para formar-se em Direito e advogar para o marido.
Fingindo orgulho, ela mostra sua foto na capa do Extra sob o título “Linda, rica e procurada”. Dobra o papel amarelado e ironiza: “Já não me procuram, não sou mais rica e esta foto tem 15 anos”.
Num momento de fraqueza ela confidencia sobre o aborto do bebê que os dois queriam, durante os interrogatórios da PF. Não houve violência física, ela acha que foi pelo estresse da coisa. Zalfa agora chora. Bem baixinho, para não acordar o Gordo.
Seguro a mão dela alguns segundos, num gesto de conforto. Ela recolhe a sua, seca os olhos com meu lenço: “Ele não gosta que eu fale mais nisso”, diz, apontando com a cabeça para o dorminhoco. “O Zé acha que faz mal pra gente lembrar coisas ruins.”
Anoitece. Mais TV, entramos no Fantástico. Eu já estava quadrado de tanto sofá. Tentava sacar a rotina da casa. Notei que os telefones não tocaram uma única vez.
Perguntei: “Ué, os comparsas de vocês não ligam mais? Cadê o resto da quadrilha? Quanto tempo vocês vão disfarçar?” Conclusão: “Não sabia que vida de traficante aposentado era tão calma”.
Eles receberam como piada, numa boa. Me convidaram para dormir na casa, porque era longe do meu hotel e “perigoso sair à noite”. No dia seguinte, tomamos café juntos e eles me largaram no aeroporto.
Mais alguns meses se passaram. Voltei ao Rio. Zalfa me liga querendo processar o governo francês na Corte Europeia de Direitos Humanos para pedir indenização pela cana puxada em Paris.
Pergunta minha opinião. Achei bobagem. Mas, foi aí que tive a ideia: se a investigação não andava no Brasil, poderia tentar via França.
EXPEDIÇÃO PARISIENSE
Fomos à agência de viagens deles. Comprei uma passagem para Paris. Eu paguei cash, preocupado com a possibilidade de a PF ainda estar na cola dele e me acusar de tomar dinheiro de “traficantes”.
Desci em Paris e fui direto para a sede da Policia Nacional Francesa.
Me encostei no balcão e pedi para falar com o chefe da narcóticos. Dois guardas me levaram à sala do capitão Marc Geny. Pelo papo, percebi que ele achava que eu vinha fazer alguma denúncia.
Mostrei uma reportagem antiga assinada no Estadão. Geny conferiu o nome com meu passaporte. Pareceu frustrado, depois relaxou. Jogou-se para trás na cadeira, dispensou os guardinhas e me ofereceu café.
Eu retruquei oferecendo off the record. O capitão disse que não trabalhou no processo, mas sabia dele: “Tudo o que eu posso dizer é que foi um caso kafkiano. Usamos uma informação da polícia brasileira para condená-lo, sem nunca ter apreendido drogas com ele”.
REPÓRTER OU CÚMPLICE?
Depois do papo, voltei de Paris com a certeza da inocência de Germano.
Claro, aquele tipo de certeza de jornalista: sempre recheada de dúvidas. No fundo, eu procurava provar que ele era o bandido que diziam.
Eu já tinha tentando entrevistar o alcaguete que fez a primeira denúncia, sem sucesso. Era um ex-cabo da PM carioca. Só achei o nome e a caguetada nos autos do processo. Ele morreu em 1997.
Re-re-entrevistei o Gordo. Fizemos o balanço de quantas vezes ele foi investigado sobre o mesmo assunto. Não dava para lembrar. Só a PF continuava na cola dele, disposta a provar o improvável.
Seria ele tão esperto a ponto de conseguir enganar todo mundo o tempo todo? E eu teria cruzado a barreira de repórter a cúmplice de bandido?
Cansado, voltei as baterias contra Germano. Pedi para me confessar tudo. Ofereci a ele uma chance de redenção: garanti que não publicaria nada se ele me dissesse a verdade.
Para os registros: “Não quero comprometer minha carreira defendendo um bandido”.
Nada o demoveu de jurar que era inocente.
CAÇADO
Em 2007, eu andava frilando no moribundo Jornal do Brasil. Pude contar toda história de Germano até ali, desta vez já cravando a inocência dele. O editor Mário Marona caprichou na capa: “O homem que foi caçado por 18 anos”.
Despejei tudo em duas páginas internas. A repercussão foi zero. Mesmo assim, Germano tirou cópias e distribuiu para os amigos. Era sua declaração de inocência na imprensa que tanto o castigara.
Saí do JB e voltei para Porto Alegre. O tempo voou. Germano teve câncer. Tremeu nas bases. Começou a me ligar, depressivo. Queria processar tudo e todos para provar sua alegada inocência.
Ele bolou até um protesto: sentar na frente do Cristo Redentor com uma placa de “inocente” no pescoço. Seria o único jeito de contar sua história para o mundo. Ri da ideia: “Além de bandido, vão te chamar de louco”.
NÃO DEU NO FANTÁSTICO
Aí, para dar uma força ao doente, cometi uma ingenuidade indesculpável. Sugeri para ele contar seu caso kafkiano no Fantástico (o pessoal mais velho deve lembrar de quando este programa tinha Ibope).
Seriam 10 minutos de alívio na telinha, depois de 18 anos tomando chumbo. Ele ligou se oferecendo. Não quiseram.
Minha besteira foi deixar de ser pro e mandar um e-mail para o repórter Eduardo Faustini. Ele conhecia o caso. Eu só sugeri que desse uma nova olhada. Dei os telefones de Germano e dos advogados daquela sala cheia de documentos.
Faustini ficou com um pé atrás. Nunca procurou Germano. E começou a me interrogar. Só então percebi o óbvio: se algum jornalista me ligasse com essa história eu também pensaria como ele deve ter pensado: “Compraram este cara para limpar a barra de um traficante.”
Pior fez Germano: ele esperou horas por Larry Rother no escritório do New York Times. Não foi recebido. Deixou recortes de jornais e um patético pedido de ter sua história de injustiça brasileira contada mundo afora.
VIRADA
Em 2010, Germano foi absolvido pela 8ª Vara Criminal do Rio. Absolvido, sob o estrondoso silêncio da mídia. Nenhuma linha, nenhuma notinha, nada de nada.
O juiz se convenceu da inocência quando interrogou seu principal acusador, o delegado da Polícia Federal Luiz Dórea. Obteve dele a resposta que mudou o jogo, lançada nos autos: “Nunca (em 18 anos) houve qualquer depoimento, ou qualquer flagrante, ou qualquer apreensão de drogas que o implicasse com o tráfico”.
Aí o delegado PF Aldeir Gonçalves sepulta de vez a acusação. Explica ao juiz que para processar Germano em sua volta ao Brasil “tudo que (a polícia) tem contra (ele) é apenas a sentença francesa”.
Da absolvição na 8ª Vara o caso subiu para o TRF4 (Tribunal Regional Federal) por recurso do MPF, mas já sem muita margem para mudança.
No TRF foi confirmada a absolvição das acusações de tráfico e formação de quadrilha. Mas, o MPF ainda queria salvar a cara e insistia que os bens de Germano seriam fruto de enriquecimento ilícito. O MPF então recorreu ao STJ tentando esta condenação indireta como traficante.
Germano provou que tinha riqueza lícita de berço. O avô foi um industrial judeu pioneiro da metalurgia. Ele herdou do pai vários imóveis no subúrbio.
A Receita Federal demoliu a acusação, anexando uma certidão nos autos. Só então o MPF capitulou, mandando um ofício ao STJ desistindo das acusações.
O caso caiu no buraco negro, à espera da sentença do STJ. Foram mais três anos parado, até outubro de 2013.
Germano ainda não podia comemorar porque um ministro poderia derrubar o pedido de desistência do MPF e ele mesmo mandar reinvestigar tudo. Aí a roda continuaria: STJ-MPF-TRF4- 8ª Vara-PF-Rio-Paris, tudo de novo.
Em junho, o caso foi para os arquivos, desta vez para sempre.
BIOGRAFIA MANCHADA
Com o caso encerrado, liguei para o Gordo pela última vez.
– E aí Germano, como vão teus dois processos ?
– Perdi o da BMW em primeira instância, mas na segunda vou vencer.
Ele parecia empolgado com a derrota.
– E o do narcotráfico ?
– Ganhei (sua voz não tinha nenhuma emoção).
Pedi licença para publicar sua saga de 25 anos.
– Deixe pra lá, estarei sujo para sempre.
Ele parecia amargurado na vitória.
O motivo da amargura é a tecnicalidade da sentença. Ela não diz “absolvido”. O STJ o absolveu porque o MPF desistiu de persegui-lo.
Os promotores não disseram “inocente”. Ou “demos uma mancada”. Ele não levou sequer um pedido de desculpas.
Numa frase ? Foi inocentado porque não provaram que era bandido.
Assim, o volumoso, complicado e demoradésimo processo União x José Germano Neto acabou com um suspiro.
Agora ele vai tocar sua vida, parada desde os 40 anos. Aos 65, não terá mais energia, nem tempo, para processar o governo por indenização.
E a mancha nunca vai apagar: muita gente ainda vai achar que ele é um narcotraficante esperto que conseguiu enganar a todos o tempo todo.

O triste fim do irreverente terrorista da internet

Por Renan Antunes de Oliveira
Ilustração de Enio Squeff | Fotos de Celso Martins e TV UFSC
A
porta já estava aberta quando o padre Elizandro procurou pelo blogueiro Mosquito na rua dos Maracanãs. Ele entrou e deu de cara com o corpo dele pendurado na escada, enforcado num lençol. A cena parecia de suicídio.
Eram quase cinco da tarde da terça 13 de dezembro. Em minutos a notícia da morte do destemido e temido jornalista catarinense de 52 anos caiu na blogosfera. Tornou-se trending topic no Twitter antes das 10 da noite. A suspeita de assassinato bombou na internet.
A morte dele encerrou a era do “terror midiático” imposta pelo blog ‘Tijoladas do Mosquito’ à política catarinense desde 2008.
As tijoladas eram críticas irreverentes e desbocadas disparadas contra tudo e todos por qualquer motivo e até sem motivo – Mosquito gostava de se apresentar como sendo “o primeiro terrorista midiático” da internet.
Nesta semana, 87 dias depois da morte de Amilton Alexandre, apelidado Mosquito, o Instituto de Perícias de SC confirmou a tese inicial de suicídio. Amigos e familiares acreditam que ele se matou por temer a prisão depois da segunda condenação por difamação.

O Tijoladas conduzia uma feroz campanha moralista contra autoridades, políticos e empresários. Muitas das denúncias eram frias, mas os textos tinham irreverência, humor e bastantes palavrões. Ofendeu gaúchos, negros, judeus – e até os vizinhos da rua Maracanãs, no condomínio onde foi encontrado morto, o Pedra Branca, na pacata Palhoça, Grande Floripa.
Seus maiores alvos foram a hoje ministra das Relações Institucionais Ideli Salvatti, o ex-governador Leonel Pavan, o prefeito de Floripa Dário Berger e Fernando Marcondes de Mattos, dono do resort Costão do Santinho. Na política nacional deu uns pitacos, agredindo a presidente Dilma com baixarias impublicáveis – Brasília fez vista grossa.
“Ele acertava na dimensão universal de seus ataques contra poderosos, privilegiados e sacanas”, diz o sociólogo Remy Fontana, professor da UFSC, amigo dele por 33 anos. “Mas, algumas vezes foi inconsequente e injusto, expondo reputações à execração pública”.
O blog tinha como lema “jamais se calar”. A operação toda era apenas Mosquito, um netbook Asus e um modem da Claro. Não tinha anunciantes. Ele postava de uma mesa do bar Kibelândia, a central de fofocas da Ilha, onde garimpava notícias entre bebuns e barnabés fora do expediente.
Pela distribuição das tijoladas Mosquito enfrentou 22 processos e a invasão de hackers. O delegado Hudson Queiroz lhe deu uns sopapos e ameaçou matá-lo. Os demais preferiram processos por calúnia, com pedidos de indenização em dinheiro.
MANEZINHO
Amilton Alexandre era nativo, descendente dos colonizadores açorianos. O pai, seu Amadeu, tinha índole mansa. Criou quatro filhos consertando refrigeradores. Mosquito, agitado desde pequeno, foi o primeiro dos Alexandre com diploma universitário. Fez Administração na UFSC.
Em 1979, no episódio conhecido por “Novembrada”, virou herói dos manezinhos: imagens dele liderando a passeata de estudantes de Floripa contra a ditadura militar apareceram no Jornal Nacional.
Ele e mais seis foram presos pela Polícia Federal. Dez dias de cana, um ano de processo na Auditoria Militar de Curitiba e a apoteótica absolvição dos sete estudantes catarinenses o transformaram numa celebridade local.
No episódio, o papel dele foi de mero agitador, sob ordens dos comunistas do Partidão.  Um dirigente queria sua participação reexaminada por psicólogos. Alguns companheiros o acusaram de ter colaborado com a polícia, mas o ex-senador Nelson Wedekin, advogado no histórico processo, garante que não.
mosquito2
A redemocratização tirou um pouco do brilho popular dele. Magrinho e elétrico na juventude, daí o “Mosquito”, virou obeso na vida adulta. Conseguiu seu primeiro emprego público na prefeitura do PMDB, gestão Edson Andrino. Cuidava de um projeto de cinema na periferia, com expediente nos findis – fosse outro, na certa seria chamado de funcionário fantasma pelo blog Tijoladas.
FAVORECIDO
Em 1987 Mosquito obteve do então senador Jaison Barreto (do Partidão, no PMDB) uma ajudinha pra comprar uma casa de três andares no Centro Histórico.
A bancada do PMDB-SC em Brasília intermediou o pedido à Caixa de financiamento habitacional fora das regras para o herói da luta contra a ditadura. Foi maracutaia. Fosse outro o beneficiado e teria levado uma tijolada daquelas.
Com o dinheiro Mosquito montou o bar Havana – point dos anos 80 e 90 com pouca política, boa música, excelentes feijoadas e carnavais memoráveis. Lá, rompeu com os amigos do PMDB.
O diploma de administrador não lhe serviu para muita coisa. Todos os negócios em que se meteu fracassaram. Transformou a casa da Caixa num sebo de livros. Depois restaurante, loja de informática, mais tarde em loja temática do time do Avaí – no fim, era só um cafofo para as namoradas.
Bolava promoções avançadas demais para Floripa, como vender computadores na feira livre. Fazia bicos. Durante eleições usava as suas capacidades de agitador profissional – chegava nas cidades do interior antes dos candidatos, armava o palanque e esquentava o eleitorado.
Ele era um solteirão convicto. Seu relacionamento mais duradouro foi com Elaine, 17 anos mais nova. Em 2000, tiveram Júlia. Ele sumiu por seis meses, até reaparecer e se dizer pronto para uma família.
Não estava. Sumiu de novo. Foi e voltou por 11 anos. Elaine disse que era louca por ele, mas que não poderia esperar tanto tempo. Meses antes de morrer, Mosquito pedia para juntarem os trapinhos outra vez. Aí ela não quis mais: “Não era homem para família, gostava de viver isolado”.
Ela conta que os dois se mantiveram bons amigos a vida toda. “Mosquito era generoso, quando tinha, tudo era de todos”. Não pagava a pensão de Júlia, mas a mãe não cobrava “porque ele mal podia se sustentar”. Os três almoçavam juntos quase todos os domingos na casa de Palhoça.
NEOPETISTA
Quando começou a Era Lula, Mosquito se filiou ao PT. O Havana já não existia mais. Vapt vupt e ele passou seis meses no Nordeste. Tinha avisado aos amigos que trabalharia num dos novos governos petistas – mas voltou de lá duro, desempregado e mais gordo, quase 130 quilos para 1m78.
Começou então a cavar embaixo dos pés: durante o caso do Mensalão foi num debate com José Dirceu na Assembleia Legislativa/SC e botou a boca nele. O PT viu no neopetista o mesmo Mosquito errático dos tempos do PMDB.
Endividado, vendeu a casa da Caixa. No Kibelândia, adotado como segundo lar, anunciou planos grandiosos com a grana. Iria abrir um jornal em Palhoça. Primeiro passo: comprou na cidade a casa onde morreria.
Ele disse que o plano furou porque os vizinhos do condomínio seriam uns “burgueses egoístas” – isto por não apoiarem seu natimorto jornal.
Logo o dinheiro acabou. De volta ao ócio no Kibelândia, pediu emprego ao PT, então já coligado com o PMDB. Ganhou um, para fiscalizar o programa Luz Para Todos, numa empresa terceirizada pela estatal Eletrosul – se fosse um adversário o beneficiado com o emprego teria sido chamado de aproveitador pelo blog.
Ali ele deu uma tijolada no próprio pé. Denunciou maracutaia na Eletrosul. Como ainda não tinha o blog, enviou para jornais um dossiê com fotos de propriedades rurais de dirigentes do PMDB que supostamente estariam se beneficiando de ligações de energia ilegais. Batendo no aliado, mordeu a mão dos petistas que o nomearam.
Ele foi demitido da Eletrosul. Estava convencido que sua cabeça foi pedida pela então senadora Ideli Salvatti. Recorreu à Justiça do Trabalho para reintegração, dizendo-se perseguido político “por ter feito a coisa certa”.
O juiz trabalhista mandou as denúncias de corrupção para o Ministério Público apurar, mas deram em nada. Mosquito levou só uma indenização de R$ 30 mil. Ele achou pouco e por isto brigou feio com a advogada, fechando uma era: Rosângela “Lelê” de Souza era amiga da primeira hora, uma dos sete da Novembrada.
Fora da Eletrosul e da política, recolheu-se de vez ao Kibelândia. Foi ali, no final de 2008, que ele criou seu Tijoladas. Se achou. E se fechou: “Vinha visitar a mãe e não saia da droga do notebook”, diz o irmão Ênio, eletricista. “Não via mais nada, só aquele blog”.
IRREVERENTE
Mosquito adorava o papel de jornalista blogueiro que criara para si mesmo. De sorriso aberto, gestos largos e em voz alta, dominava os ambientes recontando as tijoladas que dava e as que daria nos ‘inimigos’ – seu discurso público era do tipo “quem não está comigo está contra mim”.
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Uma das primeira tijoladas foi sucesso de audiência no blog e reproduzida pela mídia tradicional. Mosquito postou o vídeo da desembargadora Rejane Anderson, do TJSC, gravado por um policial de trânsito. Ela aparecia dando carteiraço para evitar que o carro do filho fosse apreendido.
Os advogados dele acreditam que ali ele fez inimigos poderosos no Judiciário: “As ações contra Mosquito tramitavam mais rápido do que as outras”, garante Edson Silva Jardim, que vê no cliente um herói.
Mosquito bateu tanto em Ideli Salvatti que ela conseguiu uma ordem judicial para impedir que ele citasse seu nome. A mesma decisão ordenou ao Google que suprimisse tudo dele.
Aí ele foi para cima do vereador Marcos Souza, aliado de Ideli. Negro, brindado com o clássico “não faz na entrada faz na saída”. E disparou a tijolada mentirosa de que Souza empregava filha e genro em seu gabinete na Câmara de Floripa.
“Eu o conhecia desde os oito anos e por isso nunca lhe respondi. Ele era um provocador, desbocado e racista. Para crescer, precisava de alguém para bater”, disse o vereador. Souza ganhou na Justiça e Mosquito fez acordo para um pedido público de desculpas – mas morreu antes de se retratar.
Ele também bateu pesado no ex-governador Leonal Pavan. Denunciado pelo MP às vésperas de tentar reeleição em 2010, desistiu da candidatura. No dia em que Mosquito morreu, Pavan obteve uma vitória tardia: a Justiça rejeitou as denúncias.
Quem ele pegou para Cristo foi o empresário Fernando Marcondes de Mattos, do Costão do Santinho. Mattos foi preso pela PF na Operação Moeda Verde, acusado de subornar vereadores e órgãos ambientais para favorecer seu hotel.
Mosquito só chamava o empresário de “meliante”. Processado, pegou dois anos de cadeia por difamação – pena substituída por serviços comunitários.
A juíza admitiu que Mattos poderia ser condenado. Mas isto não daria a ninguém “o direito de se arvorar em salvador da pátria”. Ela sentenciou: “O blogueiro confunde liberdade de expressão com ofender a honra alheia”.
PERSEGUIDO
Mosquito fez a mesma coisa com o prefeito de Florianópolis Dário Berger. Cheio de processos, mas sem nunca ter sido condenado, Berger se considerava ficha limpa. Os dois se enfrentaram na Justiça.
Audiência, 18 dias antes da morte: juíza, promotor e advogado viram o blogueiro no banco dos réus quase prostrado. Respirava com dificuldades depois de sobreviver a quatro enfartes. Estava pressionado pela condenação anterior, financeiramente quebrado, com o blog esfacelado por hackers.
O queixoso viu ali uma oportunidade de ouro para dobrar seu algoz. Aí lhe perguntaram candidamente se ele confirmava as afirmações contidas no blog de que o senhor prefeito era corrupto. O velho Mosquito voltou lá do fundo como um vulcão. Apontou o dedo para o rosto de Dário Berger, manteve o escrito e ainda berrou: “Corrupto”!
Bafafá na sala de audiências. Mosquito foi preso na hora. Pagou fiança e saiu gritando da audiência, dizendo-se vítima de um complô legal. Seria “retaliação pelo que publico” – seus advogados ajudaram na piração descrevendo a cena como prova de que o Judiciário era contra ele.
O ponto alto da carreira de Mosquito foi uma baixaria e uma maldade. Ele jogou no blog todos os detalhes sórdidos de um estupro cometido por dois adolescentes de Floripa – naquele dia obteve 75 mil acessos e se tornou ícone do jornalismo blogueiro independente.
O Tijoladas escancarou o nome dos estupradores, entre eles o filho de um dos donos da RBS, e o da vítima, afrontado a lei que protege menores.
No episódio da RBS Mosquito ganhou o apoio do programa Domingo Espetacular da Rede Record. O jornalista Paulo Henrique ficou alguns dias no Kibelândia para repercutir as denúncias dele contra a afiliada da Globo. Elogiava seu entrevistado como “um Quixote” – Mosquito se sentia supervalorizado e ia mais fundo na briga dos cachorros grandes.
SONHADOR
Em algum momento Mosquito acreditou que seria convidado para ser diretor da Rede Record no Espírito Santo. Estaria na etapa de discutir salários e a contratação de duas secretárias, tudo testemunhado por dona Cristina, garçonete do Kibe. Até que ele confidenciou ao compadre João Vianney ter demorado demais para acertar. Lamentou-se: “Perdi a chance”.
Em 2010 ele entrou noutra briga sonhando grande. Estudantes x polícia, no protesto contra o aumento de passagens de ônibus. Mosquito correu para o terminal e quis assumir a liderança do movimento.
Seria uma novembrada em maio. Os estudantes não entenderam nada. Então enxotaram do caixote aquele velhinho agitador, barbudo, gordo e careca – muitos nem sabiam quem era. Ele se achava vereador sem mandato, já sondava o PSOL para concorrer este ano.
Para se sustentar Mosquito passou a vender camisetas do Tijoladas. Ficava furioso quando os amigos não compravam. Achava que era obrigação deles manter a “mídia alternativa democrática” e ajudá-lo na luta contra a “corrup-i-ção”, como dizia com seu sotaque ilhéu.
“Menos”, diz o ex-presidente da Fenaj Sérgio Murillo de Andrade, amigo dele por 30 anos. “Mosquito não era jornalista, foi só um agitador”.
Ele passou então a viver de achaques. Aos amigos pedia que lhe pagassem contas de luz, telefone, o rango no bar. Às vezes, não tinha nem o dinheiro da passagem para Palhoça – mas, teimoso, recusava-se a vender a casa.
Queixou-se uma vez que “o blog fez sucesso, ficou famoso, e eu ia levando, sem lastro econômico, minhas roupas acabando”.
Um certo Jairo Viana postou na internet o extrato da dependência dele em 2011: “…pude dar a ele uma cordinha de varal, grampos pra varal, comprei uma camiseta e paguei uma diária de hotel quando ele esteve em Criciúma. Dias depois depositei uns créditos no telefone dele”.  E Viana ainda ficou feliz de ter ajudado aquele “maluco beleza que queria reformar o mundo”.
ATOLADO
Aqui vão trechos da última correspondência de Mosquito com um amigo, onde admitiu que “a ficha demorou a cair… outro dia fui ver e tinha passado meses com 500 pila (reais)”. Logo ele descobriu o que todo mundo sabe: “Não dava para viver apenas pagando água, luz e comida”.
No fim: “Sou um cara que atolou o pé na lama e não sabe como sair”. A turma de fofoqueiros que o conhecia do bar espalhou que o atolado estava sendo sustentado pelo deputado federal Esperidião Amin (PP). Parecia verdade porque Mosquito já tinha declarado voto nele para prefeito.
“Nunca lhe dei um tostão”, disse Amin. “Me deve três úlceras que deu na minha mulher (a ex-prefeita Ângela) de tanto bater por causa dos ônibus”.
No Kibelândia, passou a ser levemente hostilizado. O psiquiatra Heitor Bráulio de Freitas, que bebe por lá todos os dias, disse que viu nele o perfil suicida: “O ego dele era grande demais, não poderia viver sem o blog”.
Desesperado em busca de emprego pediu ao compadre para trabalhar como consultor de educação à distância, mas ouviu um não: “Ele nunca tinha feito isto. As tijoladas assustavam todo mundo e ninguém o empregaria”.
Mosquito então apelou para o amigaço de infância Paulinho Carreirão, sócio da Brognoli PrestServ, a maior do ramo na cidade. Ele não lhe faltou. Ofereceu vaga de pintor de paredes ou fiscal de obras, oferta rejeitada.
ENCURRALADO
Mosquito anunciou o fim da carreira em 9 de dezembro. Fechou o blog e deletou suas 1298 postagens: “Não tenho mais como enfrentar as ameaças e retaliações pelo que publico” – fiel ao personagem vítima de poderosos.
Em seguida, num gesto teatral, destruiu o HD do laptop a marretadas, sumindo com as “provas de corrupção de vários casos” – quem viu sabe que era uma pilha de recortes digitalizados, alguns documentos apócrifos e sua coleção particular de fofocas recolhidas no Kibelândia.
Quatro dias depois ele estava morto. Por todos os relatos de amigos ele se sentia sem perspectivas. “Mosquito parecia transtornado quando o encontrei na quarta (7 de dezembro) na esquina da rua Osmar Cunha”, conta a amigaTatiana Lino, dona do café Trajano. “Conversamos bastante, tentei acalmá-lo, mas ele se despediu de mim dizendo que iria se suicidar”.
Na manhã do sábado, 10 de dezembro, ele iniciou a jornada sem volta. Encheu a banheira no andar superior de casa e tentou afogar-se nela.
Às 16h, chorando, chamou a ex-mulher. No telefonema de uma hora explicou para Elaine que fracassou “por covardia”.
Ele avisou que tentaria se matar com outro método. Mosquito ainda disse para Elaine ter destruído o HD do computador com o qual erguera seu reino de quase 1200 dias na internet.
Aquele telefonema choroso era o lado do Mosquito que poucos conheciam. Elaine fez o de sempre nas deprês dele: ouviu, confortou, incentivou. No fim do papo, desligou o telefone: “Achei que seria como das outras vezes”.
A menina também falou com ele. Apesar da pouca idade, deu conselho de gente grande: “Pai, sai dessa, parte pra outra”.
TRAÍDO
Mas, Mosquito estava sem perspectivas. “Ele fez muitas escolhas erradas na vida, inclusive a última”, analisa o ex-senador Wedekin, decepcionado com o cliente que tanto ajudou.
O professor Fontana vê uma trágica coerência na trajetória dele. Em gravação de 50 minutos do jovem estudante para o livro Novembrada, em 1980, recolheu a bravata de que Mosquito nunca iria “integrar-se ou entregar-se” ao sistema: “Foi se inviabilizando como pessoa, mas atacava alguns caras que mereciam. Fez mais bem do que mal à sociedade”.
Mosquito tentou explicar suas atividades num dos últimos posts. Eram quase como abraçar o mundo com as pernas: “O blog foi construído com o objetivo de denunciar corrupção, tratar de assuntos ligados à cidadania e versar sobre os mais diversos temas da blogosfera”.  E postou sua prestação de contas: “Contribui para tentar sanear a política catarinense”.
De Brasília, o poeta Emanuel Medeiros Vieira botou o cara nas alturas. Eis trechos de “Mosquitadas”, para “os amigos dos sonhos de antigamente”, criticando o sistema – sistema que teria provocado a morte dele:
Em silêncio, eu sei, muitos se rejubilam com a tua morte.
Eram inimigos fortíssimos, de vários matizes – fortes não pelo humanismo (são carecedores dele), mas pelo poder mesquinho e pela pecúnia.

Mais do que os processos, a falta de dinheiro, era insuportável enxergar quase todos fechados em si mesmos, a mídia imbecilizante, o egoísmo velhaco, o mundo dirigido pelos financistas, o país dos nossos sonhos na lata de lixo.
CARENTE
Cacau Menezes, colunista mais popular do Estado, escreveu no Diário Catarinense que reconhecia o direito dele de se indignar com tudo e todos.
Os dois foram amigos na juventude, mas adversários na web. Ele viu Mosquito dizendo “coisas que a grande mídia não tem coragem… mídia e política estão cada vez mais juntos no que eles querem”.
O colunista deu a entender que Mosquito cometeu suicídio como sua última tijolada, de um jeito que deixaria os desafetos como suspeitos de crime – crime que não aconteceu, de acordo com o perito policial Milton Silva, autor do laudo de suicídio.
As dúvidas surgiram porque vizinhos invadiram a cena antes da chegada da polícia, logo depois que o padre Elizandro descobriu o corpo. A simples presença do padre na casa do ateu confesso já provocara especulações entre os que acreditavam em assassinato.
O padre chegou lá por acaso. Um amigo comum, o blogueiro religioso Nahor Lopes, distante 100 km, pediu para Elizandro, da paróquia do Aririu, a dois quilômetros da Pedra Branca, para dar uma checada em Mosquito, já quando ele não atendia mais o telefone nem emails.
Depois do susto de ver Mosquito morto o padre correu para a rua pedindo socorro aos vizinhos. Um psicólogo e um funcionário da Brasil Telecom que consertava fones no pedaço entraram na casa. Deram uma de CSI. Notaram que um dos pés do morto estava no chão. Foi o psicólogo que espalhou na vizinhança a teoria do assassinato.
Depois deles, um delegado aposentado da polícia gaúcha deu seu pitaco: “O lençol estava amarrado como quem tem caxumba, apenas no queixo”, portanto, seria crime. Mais: “A panturrilha esquerda dele tocava num banquinho, se fosse suicídio teria esperneado e o derrubaria”. Segundo a perícia, as teorias do psicólogo e do delegado são furadas.
SEM SAÍDA
Antes de morrer, Mosquito também falou com o irmão. Ênio fez mais do que Elaine: o convidou para voltar à casa da mãe, onde nada lhe faltaria: “A gente tinha diferenças, mas eu o amava”, disse, com os olhos marejados, sentindo-se culpado por não ter notado que daquela vez era sério.
Os últimos contatos dele foram com o blogueiro Canga. Pediu emprego, numa mensagem desesperada. Queria que o amigo encontrasse a oportunidade entre gente que ele teria ajudado com suas tijoladas, a quem “nunca pedira nada em troca” – enfim o blog apresentava sua fatura.
Canga não tem dúvida de que o amigo se suicidou. Levou sua opinião ao delegado Attilio Guaspari – encarregado do inquérito e autor da singular tese de suicídio porque o homem estava muito pesado: “Precisamos de cinco para baixá-lo do lençol, logo, teriam que ser cinco ou mais para pendurá-lo”.
Depois que a polícia retirou o corpo da casa dona Elaine foi lá e queimou os arquivos do blog. “Ele era muito organizado com papéis, tinha até o manual de uma batedeira que não existia mais”.
Num momento de ternura e fraqueza, ela balança a cabeça e tenta negar o suicídio. Pergunta ao repórter se não teria sido possível alguém ter forçado Mosquito a se matar mediante ameaças à filha – ela lembra que meses atrás a menina foi seguida por um desconhecido que se dizia fotógrafo.
Ela mesma responde “possível, mas improvável”. Elaine pareceu levemente paranoica com a segurança da filha: “Tenho medo que alguém queira vingar-se nela”.
Elaine não quer mais voltar na rua Maracanãs. Deu o dog Ventania para uma amiga e botou a casa para alugar na Imobiliária Brognoli.
Amilton Alexandre foi sepultado no cemitério do Itacorubi. E ali deu a prova definitiva de nunca ter se integrado no sistema: os amigos tiveram que fazer uma vaquinha pelos R$ 2.600 devidos à funerária São Joaquim.
Um videomaker gravou o enterro para um documentário. O corpo do filho inquieto foi entregue ao infinito na mesma carneira do pacato seu Amadeu.
A viúva e a filha jogaram flores na cova. Amigos fizeram discursos emocionados. A última a falar foi Lelê, enfim reconciliada. Ela o descreveu como sendo “do bem”.
E alguém fez a homenagem símbolo do personagem: jogou um tijolo no caixão.

Farda nunca mais

Por Renan Antunes de Oliveira |
Ele era um pracinha que amava a banda Restart e usava calças coloridas como as dos ídolos, mas pro pelotão dele seu gosto é coisa gay. Durou três meses no quartel, até o estupro na frente de 14 colegas – nenhum o ajudou. IPM sob medida recomenda expulsá-lo do Exército.
O pracinha gaúcho de iniciais DPK, 19, enfrenta o Exército na Justiça Militar. Ele tem poucas chances de ganhar, mas pelo menos honra a tradição de luta do uniforme verde-oliva.
DPK está ameaçado de pegar cadeia depois de denunciar ter sido estuprado no quartel por quatro dos 19 colegas de alojamento – os demais disseram que não viram nada acontecer.
“Eu fui violentado e quero Justiça”, afirma DPK, 120 dias depois do incidente, acontecido em 17 de maio no quartel do Parque de Manutenção do 3º Exército, em Santa Maria (RS). Um inquérito policial militar (IPM) concluiu que foi sexo consensual. O caso corre em segredo na 3ª Auditoria Militar.
A ministra dos Direitos Humanos Maria do Rosário mandou o ouvidor nacional de DH Domingos Silveira investigar o IPM. Ela quer “verificar a situação desta violência que está sendo tratada com tamanho desrespeito”.
Durante entrevista no sábado 17, o soldado afirmou que enfrentará a acusação no tribunal. Ele disse que o Exército convenceu seus quatro agressores a mentirem no IPM, oferecendo para eles penas menores em troca de acusá-lo de homossexualismo – o objetivo seria isentar a instituição da responsabilidade sobre o suposto estupro.
Pelo relato, seu pesadelo começou quando se apagaram as luzes do alojamento do 3º Pelotão, às 10 da noite: “Eu fui atacado de surpresa pelos quatro e não tive como reagir”. Um quinto soldado ficou vigiando a porta e, nos beliches, outros 14 assistiram tudo e nada fizeram.
O soldado revive o drama numa sala também lotada, por advogados, amigos e familiares, inclusive uma prima adolescente. Olha para o chão e continua: “Eles me jogaram de bruços na cama e taparam minha boca pra não gritar”. Exames de DNA comprovaram que três dos quatro acusados o penetraram.
Dia 15, o Ministério Público Militar (MPM) acatou a versão do IPM, denunciando DPK e os demais envolvidos pelo crime de “pederastia e outros atos libidinosos”, artigo 235 do Código Penal Militar, passível de um ano de cadeia e expulsão (no CPM só existe estupro se for entre pessoas de sexos diferentes). A turma dos beliches escapou.
O Exército jogou pesado contra DPK durante o IPM. Oficiais, sob a condição de anonimato, foram revelando aos poucos para jornalistas partes escolhidas do inquérito sigiloso, difamando o jovem como homossexual, aidético, suicida e mentiroso.
Na versão militar, DPK teria inventado a violação para obter indenização financeira. Toda argumentação do IPM tem base nos testemunhos dos recrutas acusados. Ficou a palavra de um contra quatro. DPK passou de vítima a réu.
Dona Ester, 40 anos, mãe do soldado, comanda a defesa dele e partiu para o ataque. Quer responsabilizar o Exército e pedir indenização. Ela contesta a tese central do IPM: “Meu filho não é gay, nunca tentou o suicídio, nem é aidético” – neste caso, exames deram negativos.
Ela afirma que o resultado do IPM teria sido manipulado porque foi antecipado em 70 dias pelo general comandante da guarnição de Santa Maria: “Os militares fizeram uma campanha de mentiras para condenar meu filho” (os citados nesta reportagem foram procurados, mas o único a falar foi o comandante).
A mãe do soldado disse que DPK se queixava de assédio no pelotão desde fevereiro, quando foi ao quartel pela primeira vez usando calça justa e colorida, à moda da banda Restart, a favorita dele.
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Segundo o IPM, 20 soldados estavam no alojamento na hora do incidente, contando com DPK. Um ficou de sentinela. Os quatro acusados pelo ataque encostaram três beliches, improvisando a cama onde deitariam DPK. A sessão de sexo durou 30 minutos.
Os outros 14 recrutas, interrogados pelo capitão Newmar Schmidt, disseram não ter visto nem ataque nem orgia. “Muitos viram e nenhum me ajudou”, insiste DPK. “Durante três meses os carinhas do pelotão fizeram piadas, passavam a mão na minha bunda, mas nunca pensei que chegariam a tanto”, relembra. Ele acha que o assédio começou mesmo por causa do figurino Restart. “O pessoal aqui diz que minha roupa é coisa de gay”.
Peritos encontraram esperma dos soldados JS, JPR e VRS nas ceroulas de DPK (os nomes completos não podem ser citados por causa do segredo de Justiça).
O último a ser ouvido no inquérito foi DPK. Ele manteve que foi violentado. No interrogatório, Schmidt perguntou se para subjugá-lo os supostos agressores usaram “correntes, cordas, fios de luz ou de nylon”? Resposta: não. Para intimidá-lo, se usaram “baioneta, faca, pistola, revólver, fuzil, escopeta, metralhadora”? Resposta: não.
O capitão relata nos autos um exame feito pelo enfermeiro do hospital da guarnição, que levantou as cobertas e deu uma olhada no traseiro do soldado. A conclusão deste perito: “Seu corpo não exibe marcas compatíveis com a resistência que teria oferecido”. Exames independentes feitos pela família não foram aceitos pelo IPM.
Juntando os nãos, a ausência de marcas no corpo e a confissão dos acusados por DPK, o IPM fechou redondo na tese da orgia gay.

Foi brincadeira de rapazes, diz general
“Houve crime, mas não foi estupro”, disse em entrevista na segunda-feira o general Sérgio Etchegoyen, comandante da 3ª Divisão do Exército, em Santa Maria. “O IPM foi conduzido de forma isenta pelo oficial encarregado”.

Uma versão completa do incidente já tinha sido dada pelo general em sigilo aos deputados da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa gaúcha, em sete de julho. Lá, ele disse que tudo fora “uma espécie de luta corporal de brincadeira entre os rapazes”. Etchegoyen disse ainda que apenas “constatou-se lesão leve no ânus do soldado DPK, o que por si só não comprova o alegado estupro” – falava 50 dias depois do ocorrido, antecipando em 70 o resultado do IPM.
O depoimento foi distribuído aos jornais por um deputado petista. A revelação enfureceu o general. Na segunda, por telefone, ele lamentou que “um tema tão sórdido tenha sido levado a público pelo deputado. Ele diz o que quer porque tem imunidade, mas eu tenho um compromisso com a privacidade com meus subordinados”.
Na batalha pela mídia, tudo já indicava que DPK seria transformado em réu no IPM. A boataria na cidade cresceu tanto que em 29 de agosto, duas semanas antes da conclusão do inquérito, o MPM divulgou uma nota preventiva, isentando o Exército das acusações de tentar “abafar o caso ou descaracterizá-lo”.
O promotor Jorge César de Assis, o mesmo que depois aceitou a denúncia, afirmou que “… as Forças Armadas estão entre as instituições que detém a maior credibilidade perante a opinião pública” e que “não há nenhum indício de que estejam fazendo isto” (abafando ou descaracterizando).
A escaramuça do hospital
Depois do ataque, DPK não quis mais sair da cama. No dia seguinte, quarta 18 de maio, um sargento estranha sua apatia e logo descobre tudo, alertando superiores. O soldado é internado no hospital da guarnição, onde seria periciado pelo tal enfermeiro. Um aspirante a oficial anota que ele parecia deprimido e suicida, receitando antidepressivos.
Um recruta do mesmo pelotão é destacado para vigiá-lo no leito, mas piora as coisas porque o ameaça: “Se falar, você vai se ferrar”.
Dia 19 de maio. DPK liga pra mãe, mas não conta nada: “Eu tive vergonha”. No quinto dia, 22 de maio, a mãe ouve boatos de um estupro no quartel. Num palpite, ela manda o marido apurar – a fama do quartel é ruim desde 2006, quando dois soldados foram expulsos por violentar um terceiro na padaria da guarnição.
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Seu Luiz encontra o filho escondido sob cobertores, com as mãos no rosto. Chorando, DPK conta tudo pro pai. Dona Ester se materializa no hospital. Em modo de combate ao lado do filho, interroga todos que vê pela frente. O subtenente Jorge Bernardes faz o papel de assistente social. Ele explica candidamente aos pais que “o menino participou da ‘cerimônia do sabonete’ durante o banho. Caiu, quem se abaixa para juntar já era”. E que não tinha dúvidas: “O filho de vocês é gay”.
Dona Ester diz uns palavrões para Bernardes, acampa no quarto do filho e expulsa de lá o sentinela. Os militares tentam tirá-la do quartel, mas ela se recusa a sair. O general Etchegoyen oferece transferir DPK para o QG, promete que lá seria tratado como filho por oficiais mais velhos. Dona Ester também não aceita. O general disse que cedeu às exigências dela porque “era compreensível o sentimento de mãe”.
No último dia dele no hospital, 25 de maio, um capitão aparece com ordens para transferi-lo em carro oficial e fardado para outra unidade militar. Dona Ester bate pé: “Daqui ele só sai comigo e vai para casa”. Ela ganhou de novo. Licenciado, sempre recebendo o soldo de R$ 473 mensais, o filho está desde então na casa dos pais.

De volta pra casa

E como vai indo o soldado DPK?”Tô maus, mas vou levando, vou superar”.Na entrevista ele vestia calça justa, tênis Nike e jaqueta escura – nada colorido. Seu cabelo é o moicano estilizado da hora. Magro, 1m80, pele bem morena, apesar do sobrenome e sangue de imigrantes alemães. O soldado fala baixo, com voz grave. Tem um tique nervoso que o faz jogar os lábios muito pra frente ao falar, fazendo biquinho.Seus melhores amigos são as irmãs de 9 e 7 anos. A mãe conta que ele ainda brinca com elas de esconde-esconde.
E Samuel, com quem vai ao culto da Igreja Quadrangular nas quartas.Na sala lotada, DPK se vê forçado a responder se é gay ou não – mesmo que quisesse sair do armário seria difícil, ainda mais com a curiosa prima adolescente refestelada numa poltrona.Ele demora segundos. Todos na sala com respiração suspensa. Mas a voz grave e firme vem do biquinho: “Sou hétero”. Ao lado dele, o pai relaxa os ombros, parecendo respirar aliviado.”Meu filho não é gay” atesta dona Ester, percebendo que a tese do homossexualismo é central na disputa jurídica. Ela ainda desafia: “E se fosse? Poderia ter sido estuprado?”.
Os advogados dele querem provar que o soldado é retardado mental e que o Exército falhou em perceber isto nos exames de ingresso. Se for declarado incapaz, voltará a ser considerado vítima de violação.
A mãe concorda. Ele ouve ser chamado de retardado e nem pisca. O pai ajuda: “Meu filho nunca conseguiu ser aprovado na escola depois da 5ª série do primeiro grau”.
Pais e advogados desencavaram pareceres de professores, laudos de exames neurológicos e testes psicológicos extras do menino lá na escola primária. Um psiquiatra de Santa Maria atestou retardamento e déficit de atenção por hiperatividade.
O pai quer que o drama termine logo para mudar-se da cidade e fugir do escândalo.
DPK revela o sonho que tinha de permanecer no Exército depois do serviço obrigatório, mas sabe que agora não será mais possível.
A mãe fecha o papo: “Esta farda você não veste mais”.

Jovens, pobres e malditos

Por Renan Antunes de Oliveira |

Com Ana Lúcia Mohr, Carlos Matsubara, Daniela de Bem e Paula Bianchi
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ona Suzana disse que o neto avisou um dia antes de morrer que todos os problemas acabariam no feriado do Dia do Trabalho: “Acho que ele sabia o que aconteceria”, conta ela, sem derrubar uma lágrima sequer pelo menino que criou.
Maicon morreu mesmo no dia anunciado, primeiro de maio. Sexta, perto das duas da tarde. Sua morte virou notícia destacada na Zero Hora do sábado 2, véspera do dia em que faria 19 anos. O texto da reportagem reproduzia as informações oficiais do b-ó , como se diz para “boletim de ocorrência”, o registro obrigatório de incidentes policiais.
Resumo: “Um jovem e uma adolescente morreram durante perseguição na Cidade Baixa. A dupla bateu num ônibus quando tentava fugir de motociclistas da Brigada Militar (a PM gaúcha) numa moto roubada”.
O jovem era Maicon Gerônimo Cruz Teixeira de Ávila, lavador de carros, jornaleiro, pé rapado. A adolescente, Fabiana Bitencourt, 17 anos, de Livramento, filha de uruguaios. Faxineira, de mãe faxineira, neta de faxineira, grávida de quatro meses.
Os perseguidores eram dois PMs do 9º Batalhão, de Porto Alegre. Quando iniciaram a perseguição eles ainda não sabiam que a moto era roubada e muito menos que Maicon tivesse o que a Polícia Civil depois divulgaria como sendo uma “extensa ficha criminal”.
Foi um alívio para os PMs a revelação da ficha. Sem ela, eles teriam de alguma forma provocado a morte de dois inocentes – a conta fica em apenas um inocente porque Fabiana tinha 17 e ficha limpa. Ela (foto abaixo) estava na carona na hora errada: é provável que não tenha tido tempo de descer.
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A imediata revelação da ficha de Maicon pela polícia não o torna um criminoso, como parece. Tratavam-se de infrações cometidas quando menor de idade – portanto, deveriam ter sido mantidas com o sigilo determinado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
Por que perseguir até a morte dois suspeitos ? As ações da Brigada foram corretas? Para responder estas perguntas a Polícia Civil abriu o inquérito de praxe. Se foi rápida na cortesia profissional de revelar a ficha criminal do guri, está lenta em apurar sua morte: passados 40 dias o inquérito ainda estava parado.
A única versão do incidente é a da Brigada Militar. Por ela, os soldados Junior Rabelo e Kenni tentaram abordar Maicon na esquina da avenida Borges com a Riachuelo, no Centro da capital. Maicon dirigia uma Honda Twister amarela 250 cilindradas, com Fabiana na garupa. Os PMs usavam motos menos potentes, duas Yamaha 225 cilindradas.
Os PMs alegam que notaram que a placa da Honda estava dobrada, coisa que fazem criminosos para impedir a identificação das roubadas – embora a maioria não o faça porque ao dobrá-la apenas levanta suspeitas mais facilmente.
Os soldados afirmam que quando deram ao motoqueiro “voz de abordagem” – seja lá o que for este comando verbal – Maicon teria arrancado em disparada.
Não se sabe qual dos PMs chamou o número 190 para verificar se a placa era de um veículo roubado, mesmo porque a tal placa estaria dobrada. Nem quando eles chamaram: se antes da abordagem ou depois que a moto disparou. O fato: quando Maicon arrancou, os PMs saíram atrás no pega pega.
“A Brigada existe para coibir delitos”, justificou o major Gelson Guarda, do 9º BPM, que minutos mais tarde seria acionado por rádio e também participaria da caçada mortal. “Se há um delito em andamento, e no caso era uma moto roubada, é obrigação da PM tentar restituir o bem para seu dono. E quem foge, é porque tem algo errado, é porque teme”.
O jornal Diário Gaúcho relata o incidente exibindo uma ilustração com um PM de arma na mão no momento da abordagem – se tal arma foi sacada, já daria motivo para qualquer um fugir, culpado ou inocente. Só no ano passado, 168 pessoas se queixaram à Corregedoria da Brigada de abordagens violentas de PMs contra jovens pobres na periferia.
O major Gelson não vê importância na forma da abordagem: “A perseguição foi uma operação policial tecnicamente perfeita”. Ele disse que “várias viaturas espalhadas pelo centro foram acionadas para “acompanhamento” – por alguma razão, o major não queria que a reportagem usasse a palavra “perseguição”.
Mais do major Gelson: “Não tem como perseguir de outra forma, não há como fazer alguém que está fugindo da polícia parar, a não ser atirando, derrubando da moto, e isso nós não fizemos. A gente não atira, não derruba”. Na tese dele, “Maicon provocou a própria morte e a da menina na garupa”.
A perseguição que começou perto das duas da tarde na Borges acabou quase 15 minutos depois na esquina da José do Patrocínio com Joaquim Nabuco. A moto bateu num ônibus da linha Cruzeiro.
O motorista Otoniel Araújo conta que estava saindo da parada, na segunda marcha, quando ouviu o estrondo: “Eu nem quis saber e nem quero saber quem era o menino. Ele tinha roubado a moto. Então morreu alguém que só fazia mal para os outros” – como fica óbvio, Otoniel não teve nenhuma problema de consciência porque deu entrevista depois de ser informado pela polícia que Maicon seria do mal.
Maicon morreu na hora. Fabiana foi socorrida pelos PMs que a perseguiam. Recolhida pelo SAMU, foi levada pro HPS, inconsciente desde a queda. Morreu às 16h05, com fraturas na coluna cervical e na bacia. Os médicos constataram gravidez e a morte do feto.
Aos médicos, a polícia, ainda sem identificar Fabiana, disse que a adolescente seria uma mulher assaltante. Uma assistente social do HPS repassou a informação à família de Fabiana. A mãe protestou, reclamando mais da insensibilidade do que da acusação falsa, mas a assistente firmou posição pró-polícia: “Tem mãe que é cega”.
A moto foi mesmo roubada. Na noite de 28 de abril, em Ipanema. “Eu a comprei para minha filha”, diz o dono, o barbeiro Arno Manfroi, 62 anos. “Dois homens a renderam quando ela chegava da faculdade” – o capacete da filha foi encontrado com Maicon.
O barbeiro contou que por três dias chegou “a desejar a morte dos ladrões, mas quando soube do acidente fiquei com pena”. Uma moto vale duas vidas ? Seu Arno pensa um pouco. Em seguida, reage indignado: “Pensando bem, a gente não pode ter pena. Fiquei com 18 prestações para pagar, quase 12 mil”.
Um pouco de Maicon e Fabiana, além do boletim de ocorrência
Maicon era filho do romance de dois adolescentes. Pai e mãe não viveram juntos, nem com ele. Foi criado pela avó materna num bairro barra pesada.
No geral era um cara pra cima, mas nos últimos tempos andava com o papo de ser amaldiçoado e que iria morrer cedo.
Seus azares começaram quando largou o colégio na sexta série. Na era da Internet, ele só era bom em cuidar de bicicletas. Autodidata, estava estudando mecânica de motos – ao que tudo indica, nas motos de outros.
Tinha três fotos conhecidas. Numa, de roupinha amarela, é um bebê loiro e gordinho. Nas outras duas já estava interno na Febem.
Ele foi parar lá aos 16, depois que participou de um assalto com um bandido adulto. O homem pegou cadeia. Ele passou dois anos internado, saiu em novembro, em liberdade assistida.
Maicon só conheceu o pai em fevereiro. Seu Flávio é empregado de um lavajato lá perto do Hospital Conceição. Disse que antes não tinha podido falar com o menino porque a família da mãe não gostava dele – talvez porque a única coisa que deu pra Maicon em vida foi, como admitiu, um pacote de fraldas e um creme para assaduras, isto em 1991.
Apesar de uma vida separados, pai e filho estavam começando a se dar bem. O pai lhe deu trabalho, mas Maicon parece que não gostava do batente. Ficava olhando seu Flávio lavar os carros e não atinava nem em passar uma água com a mangueira.
Maicon trabalhou algumas semanas como jornaleiro, vendendo Zero Hora. Com o dinheiro obtido nas vendas comprou uma casa no Jardim Ipê. A avó não é boba e logo intuiu que ele estava roubando – drogas ele usava desde os 14.
A partir de então, cada vez que o neto entrava em casa ela o revistava: “Ele ficou intratável, dizia que já era um homem e não queria mais dar satisfações”, diz a senhora, resignada.
Ninguém da família sabia direito o que ele fazia, mas uma pista está numa frase dele mesmo: “Quando eu saio pra fazer as minhas tretas posso não voltar”.
O intratável e cada vez mais desregrado Maicon tinha um primo trabalhador, Rudinho,18 anos, porteiro de um edifício na Independência. Os dois cresceram na mesma rua, mas tomaram rumos diferentes na adolescência: “Ele tinha a turma dele, eu a minha”, disse Rudinho, demonstrando desprezo.
Enquanto Maicon foi para a Febem, Rudinho vivia o melhor dos mundos – levou para morar com ele uma menina que tinha largado a sétima série, de apenas 16 anos: Fabiana.
No ano passado Fabiana engravidou, mas perdeu o bebê. Depois disto, as coisas entre eles desandaram. Ela se queixava para as irmãs que ele trabalhava muito, que estava sempre cansado. Rudinho era de ficar em casa – ela, de sair à noite.

Rudinho, Fabiana, a irmã Fiama e um amigo de Rivera

Dos tempos bons ela guardou uma foto onde aparece com Rudinho, a irmã Fiama e um amigo de Rivera. Quando Maicon saiu da Febem, no final do ano passado, Fabiana começou a sair com ele.
Pouco depois do Carnaval Fabiana deixou a casa de Rudinho. Foi pra mãe, numa pensão fuleira na avenida Salgado Filho. Dona Mariela, faxineira do Unibanco, a acolheu no quarto já dividido com as irmãs Vitória, bebê, Mariele, 11, e Fiama,16.
No dia da morte de Fabiana, as irmãs experimentaram blusas, tentaram diferentes maquiagens. Estavam se divertindo. Em momentos assim a mãe sempre ironizava delas: “Vocês são as legítimas PPs”. Patricinhas pobres.
Às duas da tarde as três irmãs estavam de saída da pensão para o show do Padre Marcelo na Praia de Belas quando tocou o celular de Fabiana. Sabe-se agora que era Maicon. “Vão na frente que eu alcanço vocês lá”, disse, sem saber que sua vida já estava amaldiçoada.
“Eu olhei pela janela e vi o carinha na moto, mas não sabia quem era”, conta dona Mariela. “Perguntei, a Fabi disse pra mim não me preocupar e saiu voando”. Vestia calça jeans, blusa verde listrada, tênis Fila e prendia o cabelo com uma pequena piranha rosa. A mãe ainda viu a menina colocar um capacete preto antes de partir em direção à avenida Borges.
Minutos depois, na Borges, se deu a abordagem da moto pelos brigadianos.
Enquanto isto, Fiama e Mariele caminharam até a Praia de Belas. Quando o Skank começou a tocar elas decidiram ir embora: “Não gosto do rock deles”, resumiu Mariele.
“Liguei pra Fabiana pra avisá-la”, lembra Fiama. Um dos PMs que tinha feito a perseguição atendeu o celular. Eram quase três e meia da tarde. O soldado fez várias perguntas. Queria identificar Fabiana – sinal que então a polícia soube quem era a moça na garupa da “moto roubada” por aquele bandidinho de “extensa ficha criminal”.
O PM avisou Fiama que Fabiana tinha sido levada pro HPS. Lá, a assistente social insensível deu pra família aquela versão policial de que Fabiana era cúmplice de Maicon em assaltos, acrescentando ofensa à dor.
Na pensão: Fiama, Mirele com Vitória, uma vizinha e dona Mariela

Fiama queria ver a irmã acidentada. Uma médica pediu que descrevesse a roupa, pra saber se era a mesma pessoa que ela atendera. Fiama tinha o figurino patricinha pobre na ponta da língua: calça jeans, blusa verde, tênis Fila, piranha rosa. A resposta foi em tom delicado: “Ela já não está entre nós, seu coraçãozinho parou de bater”.

Lula quer Dilma lá e Rigotto aqui

O presidente Lula já disse para todo mundo que a ministra Dilma Rousseff é sua candidata à presidência em 2010. O que ele disse apenas para um pequeno grupo de assessores – e para o próprio interessado – é que seu preferido para suceder Yeda Crusius ao governo gaúcho é o ex-governador Germano Rigotto.
O presidente escolheu Rigotto da mesma forma e baseado no mesmo impulso com que escolheu Dilma.  A única diferença é que ele já conhecia e admirava Rigotto, enquanto Dilma virou candidata só depois de entrar na equipe palaciana – ela mostrou desempenho sem lhe fazer sombra. Lula gosta dos dois, ponto final.
Lula e Rigotto já traçaram a estratégia e se falam de vez em quando. O presidente não quer que Rigotto se exponha até a hora certa, daí o papo do ex-governador de que estaria estudando a vaga ao Senado.
O presidente já tinha mandado recado ao PT gaúcho, em abril, na última visita do presidente nacional Ricardo Berzoini ao Rio Grande, que quer uma candidatura do PMDB/PTB ao governo do estado. O objetivo conhecido é viabilizar o projeto Dilma (com ela  na cabeça e o PMDB de vice).
O PMDB tem para oferecer, além de Rigotto, o prefeito de Porto Alegre José Fogaça, mas cuja panela está flertando com o governador mineiro Aécio Neves, pré-candidato do PSDB.
Lula não aceita Fogaça. No seu desenho de uma aliança mais ampla, quer Rigotto e,  para não humilhar demais o PT, o vice do PTB – ao PT sobraria a vaga ao Senado.
A missão Berzoini demorou a ser digerida – mas assim que foi provocou a reação de Tarso Genro, lançando-se pré-candidato a governador.
Novo recado presidencial mais duro tem sido repassado aos líderes locais: se os petistas  seguirem sozinhos numa candidatura regional prejudicando a aliança nacional,  a consequência da derrota de Dilma será o expurgo pelos vencedores dos cerca de 4 mil petistas gaúchos em cargos federais. (RAO)