GERALDO HASSE
Dizem os comentaristas, e muitas pessoas repetem, que a presidenta Dilma Rousseff foi reeleita pelo Brasil “preto e pobre”, “comprado” pelo dinheiro do Bolsa Família e os subsídios do Minha Casa Minha Vida e algumas bolsas de estudos do Prouni etc.
É uma visão estreita do resultado eleitoral. Estreita, elitista e repleta de mágoa. Querem nos provar que o pobrerio “roubou” de Aécio Neves uma vitória estrondosa que traria de volta o modo neoliberal de governar, privilegiando as finanças e recolocando os trabalhadores no lugar subalterno que lhe cabe na história do capitalismo.
Dizem que temos um país dividido. Quem o diz são os perdedores. Desde quando somos um país unido?
O que emergiu das urnas foi o país que sobrou da abolição da escravatura, que jogou na miséria quase a metade da população brasileira da segunda metade do século XIX.
O resgate sociocultural e econômico mal começou. Temos pela frente 300 anos de medidas compensatórias para equalizar o Brasil rico e o Brasil pobre. Esses dois brasis já deviam estar mesclados e unido, mas seguem separados pela insensibilidade das elites.
O resultado das eleições de 2014 nos traz de volta o humorista Henfil. Há 40 anos ele foi morar em Natal para ver melhor as diferenças com o Sul maravilha, expressão inventada por ele para enfatizar a distância econômica do Nordeste pobre. Henfil, como seu irmão Betinho, era um atormentado pela justiça social, tarefa elementar que mal começou.
Os cidadãos bem plantados na vida podem ignorar as vissicitudes dos esquecidos e deserdados, mas os governos não podem fechar os olhos para a realidade. Dar oportunidade aos desvalidos é um preceito constitucional, além de ser um ato humanitário elementar.
A equalização se impõe não apenas no acesso à comida, mas aos direitos elementares da cidadania. Enquanto o Brasil rico não entender isso, continuaremos a ser um país dividido, mas não pelas urnas.
O Bolsa Família é o degrau mínimo para tocar pra frente o milagre da distribuição de benesses e oportunidades do progresso. Junto com o pão, o Estado tem de oferecer escola, posto de saude, remédios, emprego, casa própria, lazer. É o trivial variado dos discursos eleitorais. Os candidatos prometem e depois esquecem.
Não foi por acaso que no discurso da vitória Dilma falou em “solidariedade”. É a palavra certo no momento exato. Como dizia Aécio Neves, ela vai “aprimorar” os programas sociais. Se esquecer os pobres, queima seu filme.
É hora de estender a mão aos caídos pelo caminho. Aos derrotados de ontem, por que não?, mas também e principalmente aos de 1964, 1888, 1789 e todos os 500 anos de nossa História.