Como o Mais Médicos vai à sanção de Dilma

O Senado aprovou nesta quarta-feira (16) o projeto de lei proveniente da medida provisória (MP 621/2013) que criou o Programa Mais Médicos, que permite a contratação de médicos estrangeiros e brasileiros formados no exterior para atuar em áreas pobres e remotas. Apesar do consenso a favor da matéria, governo e oposição divergiram quanto à forma de registro provisório dos profissionais vindos do exterior para o programa.
Na forma como foi aprovado pela Câmara dos Deputados, o texto do projeto (PLV 26/2013) transfere ao Ministério da Saúde a incumbência de fazer o registro dos médicos estrangeiros inscritos no programa. O dispositivo foi criticado pela oposição, que, através do senador José Agripino (DEM-RN), apresentou requerimento de destaque pela supressão dos parágrafos do projeto que tiravam dos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) a autoridade para emitir os registros.
O senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) chegou a classificar o dispositivo como avanço inconstitucional do Executivo, Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) enxergou “intervenção estatal nunca vista”, e, para Agripino, o projeto representa “humilhação” aos CRMs.
– É uma forma engraçada de deixar o CRM encostadinho. Por que isso? Por que respeitamos o Crea, respeitamos a OAB, mas deixamos isso? – indagou.
Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) sublinhou que o projeto resulta de entendimento do Congresso com a categoria e que o Conselho Federal de Medicina (CFM) manifestou satisfação com o Mais Médicos. Por sua vez, Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) lembrou que o texto original da MP dava poder aos CRMs para registrar os médicos estrangeiros, mas as entidades estaduais, em sua avaliação, impunham exigências excessivas para emissão dos registros e impediam o exercício profissional de centenas de médicos.
Submetido a votação nominal, o requerimento recebeu 42 votos contrários e 15 favoráveis.
O texto mantido estabelece que apenas a fiscalização do trabalho dos participantes do programa continuaria sendo feita pelos CRMs, e os médicos estrangeiros participantes do programa não poderão exercer a medicina fora das atividades do Mais Médicos.
Médicos cubanos
Mais 4 mil médicos
O consenso a favor do Mais Médicos não impediu questionamentos à oportunidade da vinda de médicos cubanos – o Executivo espera trazer 4 mil profissionais de Cuba até o fim do ano por meio de um acordo intermediado pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). Esses profissionais trabalharão nas regiões com menos proporção de médicos por habitante, com bolsa de R$ 10 mil, mais ajuda de custo para despesas de instalação (no valor de até três bolsas) e o pagamento das despesas de deslocamento até a cidade de trabalho.
Cássio Cunha Lima encaminhou voto a favor da matéria, mas classificou o Mais Médicos como parte de uma “engenhosa manipulação” do PT e enxergou o risco de que os cubanos atuem para doutrinar ideologicamente a população mais pobre. Mário Couto (PSDB-PA) criticou o acordo com Cuba, salientando que trata-se de uma ditadura, e declarou que a presidente Dilma Rousseff está “fora da realidade” do país por apresentar o Mais Médicos como solução para o atendimento de saúde.
João Ribeiro (PR-TO), que classificou o Mais Médicos como “grande tacada” de Dilma, opinou que será necessário trazer médicos do exterior enquanto o Brasil não formar profissionais em número suficiente. Ele lembrou o sucesso da vinda de 300 médicos cubanos para atuação em Tocantins. Eduardo Suplicy (PT-SP) acredita que os médicos brasileiros aprenderão com a experiência dos estrangeiros, e Humberto Costa (PT-PE) declarou que uma atenção básica organizada resolve 80% dos problemas de saúde de uma comunidade.
O caráter emergencial do Mais Médicos foi assinalado por Jader Barbalho (PMDB-PA), que, no entanto, lamentou a impotência dos médicos diante da pobreza dos pacientes. No mesmo sentido, Inácio Arruda (PCdoB-CE) lembrou que 700 municípios estavam sem profissionais de saúde, o que, em sua avaliação, prevalece sobre eventuais conflitos entre governo e médicos. José Agripino disse que o Mais Médicos é “um pedacinho” da solução, e Cristovam Buarque (PDT-DF) acredita que ainda seja “muito pouco” diante das carências.
Plano de carreira
Waldemir Moka (PMDB-MS) considera enganoso que a população pense que esses novos médicos serão a solução para o problema dos hospitais. Ele defendeu um plano de carreira que estimule a fixação de médicos no interior. Mário Couto acredita que os médicos têm vontade de atuar no interior, mas são desestimulados pelos baixos salários.
Antônio Carlos Valadares (PSB-SE) afirmou que, ao apoiar a medida provisória, o Congresso deu uma lição de comprometimento com a saúde. Para ele, o Mais Médicos constitui um apoio importante para as cidades do interior.
– Temos que elogiar a coragem da presidente Dilma sua identificação com os mais pobres – afirmou.
Para Valadares, as críticas ao Mais Médicos vêm das mesmas forças políticas que, em 2008, derrubaram a Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras (CPMF), o que, em seu cálculo, prejudicou o financiamento da saúde.
Cássio Cunha Lima considerou “falacioso” o argumento da falta de recursos, argumentando que o governo tem batido recordes de arrecadação de tributos. Ele disse que votaria novamente contra a CPMF avaliando que o povo paga demais ao governo.
Agripino pediu atenção ao problema do dinheiro para custeio do setor e pediu apoio à regulamentação da Emenda Constitucional nº 29, que estabelece percentuais mínimos a serem investidos na saúde pela União, estados, Distrito Federal e municípios. Jader Barbalho criticou a redução do investimento da União em saúde, o que sobrecarrega as unidades federadas, e culpou os parlamentares por aprovarem orçamentos inadequados. Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Aloysio Nunes também criticaram o subfinanciamento da saúde.
Revalidação
Um dos pontos mais polêmicos nos debates sobre a MP foi a necessidade de revalidação do diploma do médico estrangeiro. Segundo o texto aprovado, o estrangeiro não precisará revalidar o diploma nos três anos do programa.
Os médicos estrangeiros somente poderão participar da prorrogação de três anos do Mais Médicos se integrarem “carreira médica específica”, cuja definição depende de regulamentação em projeto de lei.
O registro dos médicos vindos do exterior será feito pelo Ministério da Saúde em substituição aos CRMs. Apenas a fiscalização do trabalho dos participantes do programa continuaria sendo feita pelos conselhos. Os médicos estrangeiros participantes do programa, porém, não poderão exercer a medicina fora das atividades do Mais Médicos.
Diferentemente do que estabelecia a redação original da MP, os médicos aposentados foram incluídos na categoria prioritária de contratação do programa.
A medida provisória ainda modifica as regras para formação médica no Brasil. Os programas de residência médica deverão viabilizar, até 31 de dezembro de 2018, a oferta anual de vagas equivalentes ao número de graduados em medicina do ano anterior, consideradas as vagas de residência em medicina geral de família e comunidade e em residências médicas de acesso direto (genética médica, medicina do tráfego, medicina do trabalho, medicina esportiva, medicina física e reabilitação, medicina legal, medicina nuclear, patologia e radioterapia).
Quanto ao internato – espécie de estágio exigido para a conclusão do curso de graduação – o texto estipula que ao menos 30% de sua carga horária serão destinados à atenção básica e ao serviço de urgência e emergência do SUS.
Com informações das Agências Câmara e Senado

Um pouco mais sobre os médicos cubanos

Parece que o último argumento contra a contratação dos médicos cubanos é a remuneração que vão receber. Pois é ridículo, quando prevalecem fatos, indicadores internacionais e números, falar mal do sistema de saúde e da qualidade dos médicos de Cuba. A revalidação de diploma também não é argumento, pois os médicos estrangeiros trabalharão em atividades definidas e por tempo determinado, nos termos do programa do governo federal. Não tem o menor sentido, também, dizer que os cubanos não se entenderão com os brasileiros por causa da língua? primeiro, porque vários deles falam o português e o portunhol, segundo porque os médicos cubanos estão acostumados a trabalhar em países em que a lingua falada é o inglês, o francês, o português e dialetos africanos, e nunca isso foi entrave.
Resta, assim, a forma de contratação e, mais uma vez sem medo do ridículo, falam até de trabalho escravo. Essa restrição também não tem procedência, nem por argumentos morais ou éticos (e em boa parte hipócritas), nem com base na legislação brasileira e internacional. Vamos a duas situações hipotéticas, embora ocorram rotineiramente.
1a: Uma empreiteira brasileira é contratada por um governo de país europeu para uma obra. Essa empreiteira vai receber euros por esse trabalho e levar àquele país, por tempo determinado, alguns engenheiros, geólogos, operários especializados e funcionários administrativos, todos eles empregados na empreiteira no Brasil. Encerrado o contrato no país europeu, todos voltarão ao Brasil com seus empregos assegurados. Quem vai definir a remuneração desses empregados da empreiteira e pagá-los, ela ou o governo do país europeu? É óbvio que é a empreiteira.
2a: Os governos do Brasil e de um país africano assinam um acordo para que uma empresa estatal brasileira envie profissionais de seu quadro àquele país para dar assistência técnica a pequenos agricultores. O governo brasileiro será remunerado em dólares pelo governo africano. A estatal brasileira designará alguns de seus funcionários para residir e trabalhar temporariamente no país africano. Quem vai definir a remuneração dos servidores da empresa estatal brasileira e lhes fará o pagamento, a estatal brasileira ou o governo do país africano? É óbvio que é a empresa estatal brasileira.
Por que, então, tem de ser diferente com os médicos cubanos? Eles não estão vindo para o Brasil como pessoas físicas, nem estão desempregados. São servidores públicos do governo de Cuba, trabalham para o Estado e por ele são remunerados. Quando termina a missão no Brasil (ou em qualquer outros dos mais de 60 países em que trabalham), voltam para Cuba e para seus empregos públicos.
Não teria o menor sentido, assim, que esses médicos, formados em Cuba e servidores públicos cubanos, fossem cedidos pelo governo de Cuba para trabalhar no Brasil como se fossem pessoas físicas sendo contratadas. Para isso, eles teriam de deixar seus postos no governo de Cuba. Como não faria sentido que os empregados da empreiteira contratada na Europa ou da estatal contratada na África assinassem contratos e fossem remunerados diretamente pelos governos desses países. Trata-se de uma prestação de serviços por parte de Cuba, feita, como é natural, por profissionais dos quadros de saúde daquele país.
A outra crítica é quanto à remuneração dos médicos cubanos. Embora menor do que a que receberão os brasileiros e estrangeiros contratados como pessoas físicas, está dentro dos padrões de Cuba e não discrepa substancialmente do que recebem seus colegas que trabalham no arquipélago. É mais, mas não muito mais. Não tem o menor sentido, na realidade cubana, que um médico de seus serviços de saúde, trabalhando em outro país, receba R$ 10 mil mensais. E, embora os críticos não aceitem, há em Cuba uma clara aceitação, pela população, de que os recursos obtidos pela exportação de bens e serviços (entre os quais o turismo e os serviços de educação e saúde) sejam revertidos a todos, e não a uma minoria. O que Cuba ganha com suas exportações de bens e serviços, depois de pagar aos trabalhadores envolvidos, não vai para pessoas físicas, vai para o Estado.
A possibilidade de ganhar bem mais é que faz com que alguns médicos cubanos prefiram deixar Cuba e trabalhar em outros países como pessoas físicas. É normal que isso aconteça, em Cuba ou em qualquer país (não estamos recebendo portugueses e espanhóis?) e em qualquer atividade (quantos latino-americanos buscam emigrar para países mais desenvolvidos?). Como é normal que muitos dos médicos cubanos aprovem o sistema socialista em que vivem e se disponham a cumprir as “missões internacionalistas” em qualquer parte do mundo, independentemente de qual é o salário. Para eles, a medicina se caracteriza pelo humanismo e pela solidariedade, e não pelo lucro.
É difícil entender isso pelos que aceitam passivamente, aprovam ou se beneficiam da privatização e da mercantilização da medicina e da assistência à saúde no Brasil

Projeto de ampliação do HPS será conhecido nesta terça

A proposta de ampliação do Hospital de Pronto Socorro revelou uma situação absurda nas instalações do principal hospital de emergências da região metropolitana de Porto Alegre: os estoques de oxigênio e outros gases estão junto de uma caldeira, sob risco de explosão.
Esse é um dos problemas gerados pela falta de espaço e que a ampliação das instalações pretende resolver. Mas a ampliação também causa problemas.
Para acrescentar mais 1.400 metros quadrados ao prédio do HPS, terão que ser desapropriados seis sobrados da avenida José Bonifácio, nos fundos do hospital.
Em outubro, os moradores e comerciantes atingidos criaram a associação SOS Rua do Brique. Eles criticam a ampliação, por entender que vai descaracterizar o entorno do parque.
Contestam a falta de discussão pública sobre o projeto e propõem um plebiscito para escolher onde deveria ser construído outro hospital de pronto socorro.
Assinaturas estão sendo colhidas para um documento que será entregue ao prefeito.
A pedido da associação, a Comissão de Saúde e Meio Ambiente reuniu-se pela primeira vez para debater o assunto. Ficou decidido que o projeto, estimado em R$ 53 milhões, será apresentado à comunidade no dia 9 de novembro.
Nos sobrados ameaçados de desapropriapção funcionam: um café, uma estética, uma escola infantil e uma Ong. Além destes, há um quinto imóvel já alugado para o HPS (onde funciona a associação dos funcionários) e outro que é uma residência.
“É uma bomba, um perigo”,
alerta o diretor do HPS

A situação ilegal em que se encontram os depósitos de gases é o principal argumento do médico Julio Ferreira, que assumiu a direção do HPS este ano, para expandir o prédio em mais 1400 metros quadrados, anexando a área dos imóveis dos fundos.
“Temos um enorme estoque de oxigênio, que é uma bomba, um perigo, que ficou ao lado de uma caldeira”, exemplifica. Este depósito de oxigênio deveria estar isolado num raio de cinco metros, mas não há espaço.
A ampliação serviria ainda para deslocar todas as áreas de apoio, como lavanderia, cozinha, refeitório e almoxarifado. Isso desobstruiria o acesso das ambulâncias.
“Se houver um grande acidente na cidade e chegarem várias ambulâncias juntas, não há como acessar os pacientes, pois os veículos só conseguem entrar em linha”, afirma a arquiteta Marília Goulart, da Engenharia do HPS.
“Outra realidade é a superlotação das UTIs”, diz Ferreira. O projeto de ampliação também prevê aumentar a área de diagnóstico, triplicar o atendimento de urgência e criar mais leitos nas UTIs.
Hoje o HPS registra 360 mil atendimentos por ano, em 22 especialidades médicas.
Obras de modernização do HPS estão em andamento. Estão sendo gastos R$ 22 milhões, do Qualisus1, programa federal de qualificação de hospitais, com 20% de contrapartida municipal.
Para começar, foi reformado o quadro de força, que era o mesmo da época da fundação do hospital, há 66 anos. Esta etapa consumiu R$ 1,5 milhão e está em fase de conclusão. Agora, estão sendo licitados mais R$ 8,4 milhões, para reformas no andar térreo.
Uma obra para a Copa de 2014
Uma preocupação da Prefeitura, segundo o secretário de Gestão, Newton Baggio, é como atender os turistas que virão para a Copa de 2014.. “Como gestor técnico para a Copa, verifiquei que havia o decreto tornando os imóveis de utilidade pública, e que havia o projeto de ampliação, não cabia a mim questionar”, disse Baggio. “Mas, como arquiteto, acho importante que sejam discutidos os impactos urbanísticos.”
O diretor do HPS, médico Julio Ferreira, e o secretário adjunto da Saúde, Marcelo Bósio, argumentam que, mesmo que todo o sistema de saúde pública fosse aperfeiçoado, ainda assim o HPS não pode continuar funcionando nas condições em que se encontra.
“A construção do bloco anexo, na Venâncio Aires, foi a primeira etapa da ampliação, e já naquela época previa-se a necessidade de desapropriação dos imóveis dos fundos”, diz Bósio. “Já alugamos uma das seis casas, por quase R$ 10 mil, acima do preço de mercado, é um absurdo continuar assim”, protesta Ferreira.