Campanha para arrecadação de alimentos para acampamento do MST

O Diretório Central dos Estudantes da UFRGS está encampando uma campanha que visa a arrecadar alimentos não-perecíveis para acampamento do MST.

O Acampamento do MST Jair Antonio da Costa, localizado em Nova Santa Rita, parou de receber cestas básicas. Embora os acampados recebam mantimentos de assentamentos da reforma agrária, a demanda por alimentos está sendo suprida com dificuldade. Por isso, o Diretório Central dos Estudantes da UFRGS abraçou uma campanha que visa a arrecadar alimentos não-perecíveis. Nesta semana, após a audiência pública de conciliação entre o MST, INCRA e MPF de Canoas, mais 50 famílias – que antes ocupavam uma área defrote à Fazenda Granja Nenê, também em Nova Santa Rita – se agregaram ao acampamento, o que agravou a situação. Agora totalizam cerca de 400 famílias acampadas ali.

Haverá um posto de recolhimento dos alimentos não-perecíveis no DCE da UFRGS nos campi da Saúde (Ramiro Barcelos, s/ nº, atrás da Farmácia Popular) e do Centro (Av. João Pessoa, 41, ao lado do Restaurante Universitário). Em nota, a Secretaria de Movimentos Sociais DCE-UFRGS e o Grupo de Apoio à Reforma Agrária (GARRA) afirmam que “acima de possíveis divergências que possam haver com o movimento, este é um momento crítico de solidariedade”. Mais informações podem ser obtidas através dos fones 3308 4032 ou 3308 4205.

Barrados na audiência pública

Por Ana Lúcia Mohr

Somente as partes e os jornalistas portadores de credenciais puderam assistir à audiência pública de conciliação entre MST, Incra e MPF realizada ontem no prédio da Justiça Federal de Canoas. Os demais integrantes do MST e os mais de 100 apoiadores presentes ficaram do lado de fora.
João Procópio tentou entrar para assistir a audiência. Presidente do Sindicato dos Comerciários de Alegrete, ficou indignado por ter sido barrado. “Quando o Lula disse que a justiça é uma caixa preta ele não foi racista: foi realista”, disse.
A audiência pretendia resolver os recentes problemas envolvendo o movimento e a entidade, em especial o destino das cerca de 350 famílias de trabalhadores sem-terra acampados no município de Nova Santa Rita (50 famílias defronte à Fazenda Granja Nenê e 300 famílias em área do Assentamento Santa Rita de Cássia 2). Quem ficou do lado de fora ouviu os discursos do vereadores de Nova Santa Rita José Rosales e Lebrão (ambos do PT), dos vereador de Canoas Nelsinho Metalúrgico (PT) e do deputado estadual Dionilson Marcon (PT), de João Procópio (CTB) e de Rodrigo Baggio (representando o DCE da Ufrgs).

Nas falas, o fechamento das escolas itinerantes foi lembrado por todos. “Onde está escrito na lei que é proibido ter ideologia?”, questionou José Rosales. O vereador também argumentou que as escolas foram colocadas na ilegalidade de maneira arbitrária: “Nem o juiz nem o promotor consultaram a população”. Baggio lembrou que os professores da Faculdade de Educação da UFRGS divulgaram uma nota na qual dão respaldo às escolas itinerantes.
“É muito fácil ser valente contra os pobres, eu quero ver ser valente contra os ricos. O MST é exemplo de como se deve enfrentar a pobreza: lutando”, gritava Nelsinho. Ele também reclamou o cumprimento da Constituição, em particular do Artigo V, inciso 23. “Eu quero ver o juiz fazer cumprir a parte que diz que a terra tem que ter função social”.

Marcon foi o único a dizer que a audiência pública deveria servir para trazer de volta o superintendente do Incra, Mozar Dietrich, retirado do cargo no dia 6 de maio.
Foi acordado que as famílias acampadas defronte à Fazenda Granja Nenê se deslocarão para a área do Assentamento Santa Rita de Cássia 2 em 48 horas. Na manhã de ontem o acampamento começou a ser desmanchado. O INCRA assumiu o compromisso de assentar 100 famílias em até 30 dias. O compromisso ainda prevê que outras 258 sejam assentadas até o final de 2009.  Conforme o acordo, o Acampamento Jair da Costa deve ser desfeito até o final do ano. Até lá, mais ninguém poderá se agregar ao Acampamento, muito menos se cadastrar para receber um lote de terra.
Leandro da Silva, do Coletivo de Imprensa do Acampamento Jair, diz que esse um ano dá aos acampados um tempo para pensar no que fazer. Ele afirma que o resultado da audiência constituiu uma derrota política do juiz Guilherme Pinho Machado e uma vitória do Movimento, que permaneceu no Acampamento, promoveu jejuns em 6 pontos do Estado e fechou estradas. Conforme ele, “em 25 anos de Movimento foi a primeira vez na história que a gente teve que cavar trincheiras em nossa própria casa”.
A greve de fome em frente à Justiça Federal de Canoas, que havia iniciado no dia 7, terminou no final da tarde de ontem, quando também o acampamento ali instalado se desfez.

MST transfere jejum para Canoas

O MST realiza agora um grande ato junto com as entidades estudantis e sindicais em frente ao Ministério Público Federal (MPF) anunciando a transferência do jejum, que já dura 4 dias. Os acampamento montado ao frente MPF em Porto Alegre, que conta então com 30 pessoas, será transferido para a frente do Judiciário de Canoas.
Nesta manhã, mais um jejuante precisou receber cuidados médicos, o Padre Rudimar Dalasta, da Comissão Pastoral da Terra. Ontem, o agricultor Carlito Zanfonato passou mal e recebeu atendimento médico. A greve deve continuar até que a ordem de despejo seja retirada, bem como até que as demais reivindicações sejam atendidas.
Os agricultores protestam contra ações de criminalização como o fechamento das escolas itinerantes, o despejo do Acampamento Jair Antonio da Costa de dentro de uma área de assentamento e pedem o cumprimento do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), elaborado pelo MPF e assinado pelo INCRA, que previa o assentamento de 2 mil famílias até o final do ano passado, o que não ocorreu. Em nota divulgada no final da tarde de ontem, o MPF alega que vem trabalhando para que o TAC seja cumprido. Conforme a entidade, até agora 1113 famílias foram assentadas, tendo o INCRA assumido o compromisso de, até meados de maio, assentar mais 726 famílias, totalizando 1839 famílias. Informou ainda que, “como resultado da execução do TAC deverão ser assentadas mais 148 famílias, totalizando 1987 famílias beneficiadas”. Estes números divergem dos do MST, segundo o qual até agora somente 500 famílias foram assentadas.
ARROZ – Na nota, o MPF também anunciou o afastamento do Superintendente do INCRA no Estado, Mozar Dietrich, que é acusado de ser cúmplice do “arrendamento irregular” de terras em Santa Rita de Cássia II, assentamento localizado em Nova Santa Rita. O MPF suspeita que Dietrich repassava o dinheiro da venda do arroz para o MST. Por isso, o grão está sendo confiscado. O MPF declarou ainda que “a atuação do Ministério Público Federal tem o propósito de fazer cumprir a Constituição, não compactuando com condutas irregulares, ainda que praticadas dentro de assentamentos”.
Em contrapartida, em 16 de abril, o Movimento afirmou em nota que é contra qualquer tipo de arrendamento em assentamentos: “Sempre pressionamos o INCRA para que estas práticas fossem combatidas e que as medidas necessárias fossem tomadas.” O MST também declarou que não recebeu qualquer dinheiro da venda do arroz.
No dia 23 de abril, os assentados em Santa Rita de Cássia II fizeram protesto na BR 386 contra o desvio da colheita do grão do assentamento. Segundo os assentados, arrendatários que plantaram de forma irregular colhem e retiram o arroz da área clandestinamente, com a cumplicidade da Polícia Federal.

Acampamento do MST resiste à ordem de despejo

As trincheiras do Acampamento Jair Antonio da Costa já estão cavadas; acampados não têm para onde ir

Por Ana Lúcia Behenck Mohr e Paula Bianca Bianchi
Faltam taquaras para a horta comunitária do Acampamento Jair Antonio da Costa, do MST. A maioria delas estão fincadas frente ao portão e ao redor dos 5 hectares do acampamento localizado na pequena Nova Santa Rita, a pouco mais de 20 km de Porto Alegre. Neste momento, as taquaras tem sido usadas para camuflar trincheiras. Placas de madeira com palavras de ordem espalhadas pelo chão fazem as vezes de escudo. Helicópteros da Polícia Federal sobrevoam com freqüência. Quase todos os dias P2 – policiais à paisana – passam pelo local, tiram fotos. Para os cerca de 500 acampados do Jair, a palavra de ordem é resistir.
Ali, do lado do portão, no início da tarde de sábado, sob um sol de rachar, um homem com um facão no coldre espera. Ele é membro do coletivo de segurança do Acampamento. Atrás do portão, outro homem, também da segurança, mantém a vigia. Do lado de fora, a reportagem tenta, sem sucesso, arrancar alguma informação do homem da faca. “Eu não sei de nada, companheira”, diz ele. Um pouco atrás, meninos do Assentamento Rita de Cássia 2, logo do outro lado da rua, pedem para entrar para jogar bola, também sem sucesso.
Após duas batidas na “cachorra” – uma placa de metal que serve como meio de comunicação entre segurança e o resto do acampamento -, surgem algumas pessoas que finalmente chamam os responsáveis por recepcionar a imprensa. Entramos. O MST dá entrevistas para todos os veículos de comunicação, com exceção da RBS, como nos explicam depois. No momento os acampados do Jair têm evitado receber a “grande mídia”. Segundo eles, é comum que as suas declarações sejam distorcidas.
Se depender do Ministério Público Federal, os acampados do Jair devem deixar a área, cedida pelo Assentamento Santa Rita de Cássia 2 e encurralada entre a BR 116 e a floresta, o mais rápido possível. No dia 24 de abril venceu o prazo dado pela entidade para que as famílias desocupassem o local.
O MPF alega que o acampamento está em uma área de proteção ambiental, argumento rebatido pelo MST. “Estamos na área comunitária do assentamento”, explica Leandro, 18 anos, parte da equipe de comunicação do Jair. No Rio Grande do Sul, 20% do terreno dos assentamentos é separada pelo Incra como zona de proteção ambiental, enquanto o resto é dividido entre as zonas de moradia, produção e comunitária. Para Leandro, o motivo real do despejo não tem nada de ecológico. “O problema é que o acampamento está numa ‘área de risco’, do lado da BR, o que facilita as manifestações”, afirma.
Pouco antes do dia 24 as famílias que vivem no local se reuniram e decidiram resistir. “Estamos aqui há três anos. A gente já levou bala de borracha, cacetada. Não vamos ir embora.”, diz Luciana da Rosa, a outra responsável pela comunicação do acampamento. “Em 2007 foi assinado um acordo que garantia o assentamento de duas mil famílias até o fim de 2008. Foram assentadas 500. Se acontecer alguma coisa, é culpa do governo”, alega. Luciana se refere ao TAC (Termo de Ajuste de Conduta) assinado pelo Incra em novembro de 2007, cujo cumprimento deveria ser cobrado pelo Ministério Público.
A ordem de despejo não é exatamente uma novidade para os membros do Acampamento, que nasceu em 2005 numa beira de estrada em Nova Hartz. Em 2006, menos de um ano após a ocupação, os integrantes foram colocados para fora devido a uma ação de reintegração de posse e acolhidos pelo recém fundado Santa Rita de Cássia 2. A diferença entre os dois despejos é que, ao contrário de 2006,  hoje os acampados não têm para onde ir.
Enquanto a situação não se resolve, 30 integrantes do  Jair fazem greve de fome, acampados em frente a sede do MPF em Porto Alegre. Eles fazem coro a Luciane: “se acontecer alguma coisa, a culpa é do governo federal”, afirma a acampada Michele. O protesto é uma forma de forçar a entidade a revisar a decisão.

Trabalhadores sem-terra fazem greve de fome em frente ao MPF

Jejum continua por tempo indeterminado

“Vamos ficar aqui até quando o MP tiver uma resposta para nós”, diz Gisele, uma das 30 pessoas acampadas defronte à sede do MPF. A ação visa a chamar atenção para a criminalização dos movimentos sociais, bem como para o caso específico do Acampamento Jair Antonio da Costa, localizado em Nova Santa Rita, onde os acampados resistem à ordem do despejo vencida em 24 de abril.

Ontem o procurador-geral conversou com os integrantes do Movimento. “Ele disse que ia juntar as peças, que ia falar com o procurador de Canoas porque não estava reconhecendo isso”, relata Gisele.
Enquanto isso, no Acampamento Jair Antonio da Costa, os acampados vivem momentos de tensão. Conforme Gisele, até mesmo as crianças já sabem que o despejo está prestes a ocorrer. “Quando os helicópteros passam, eles se abraçam em nós e choram”. “As crianças não conseguem mais brincar”.
Além de membros do MST, também um padre e uma freira da Pastoral da Terra jejuam. Os Sem-Terra tem apoio do DCE da UFRGS e de diversos movimentos sociais da cidade, que devem entregar em breve uma carta de repúdio a ação do MPF as autoridades.

MST e Zapatistas estão “conectados”, diz Le Monde Diplomatique


“Mulheres zapatistas”, por Jorge Ignácio Medina Silva.
Galeria de criadores do Ministério da Cultura da Venezuela
Os dois principais movimentos sociais da América Latina unidos para conquistar a opinião pública.
Por Carlos Matsubara
Matéria publicada na edição brasileira do jornal Le Monde Diplomatique desta terça-feira (28) destaca que a Internet vem sendo utilizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e pelo mexicano Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) na tentativa de alinhar seus discursos.
Conforme o jornal, essa constatação é resultado de uma pesquisa qualitativa, feita em 2005, que analisou textos virtuais e entrevistas com representantes dos dois movimentos em questão para a realização da dissertação de mestrado Movimentos sociais e a Internet da autora da reportagem, Neblina Orrico.
Para ela, o cotejo entre o discurso do MST e do EZLN mostrou que os dois movimentos sociais utilizam maneiras diferentes para atingir a sociedade por meio da rede mundial de computadores.
Neblina argumenta que o discurso emancipatório dos movimentos sociais, agora veiculado também pela Internet, representa uma nova maneira de lutar pela mudança social. Enquanto os zapatistas preferem uma linguagem muito mais poética e metafórica, que resgata elementos da linguagem indígena dos Chiapas, mas que, mesmo assim, é simples e transparente, o MST investe na objetividade e em textos jornalísticos para alcançar o internauta.
“Os sites dos movimentos se tornaram verdadeiros cartões de visita, apresentando e divulgando a bandeira de luta do movimento, seja pela realização da reforma agrária, seja por justiça social e por democracia. Graças à Internet, eles obtêm visibilidade pública e angariam simpatizantes”, afirma.
Além disso, de acordo com Neblina, esses dois movimentos passaram a atuar em rede entre si e com outros atores sociais e construíram uma forma de luta, coordenando e conduzindo suas ações com o uso da Internet.
“Foram capazes de criar novas oportunidades de se apresentar ao mundo, de legitimar as ações, de divulgar as demandas pelas quais lutam, de pressionar os meios de comunicação tradicionais a noticiarem com menos parcialidade fatos ligados a eles e de eles próprios noticiarem fatos ligados às suas lutas”, diz.
Assista A Tomada de Chiapas pelos Zapatistas – 1994 (em inglês)