Com a presença da ministra Maria do Rosário, da Secretaria dos Direitos Humanos, foi lançado nesta manhã, no Memorial do Rio grande do Sul, a segunda edição do livro Retrato da Repressão Política no campo- Brasil 1962-1985, das jornalistas e pesquisadoras da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Ana Carneiro e Marta Cioccari, publicado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
Esta nova edição trás algumas correções e atualizações de dados, e introduz novas referências num trabalho que, em mais de trezentas páginas, torna público a violência, a censura e demais arbitrariedades perpetradas contra os trabalhadores do campo.
Para a realização do livro, as jornalistas – entre agosto e novembro de 2010 – fizeram um ampla pesquisa onde – além de contar com o apoio de uma rede de acadêmicos e pessoas ligadas aos problema fundiários – viajaram por todo o Brasil recolhendo depoimentos das vítimas, familiares, e outros testemunhos. O resultado, além de chocar pelas atrocidades apuradas, comprovou que a repressão no campo não ocorreu somente no período da ditadura militar.
Trata-se também, segundo a co-autora, Marta Cioccari, “de uma homenagem a saga de homens e mulheres que ergueram a bandeira da reforma agrária e lutaram pelos direitos dos trabalhadores da terra”. Agora, também patrocinado pelo MDA e pela Secretaria dos Direitos Humanos, elas darão continuidade ao trabalho publicando biografias individuais sobre os “heróis da luta pela reforma agrária no Brasil”.
Entre os homenageados, presentes no lançamento, estavam o cearense Francisco Blaudes de Souza Barros – filho de Pio Nogueira, um falecido líder camponês – e João Altair do Santos, filho de João Machado dos Santos, o João Sem Terra.
Blaudes, como é conhecido, sobreviveu ao conflito que ficou conhecido como a “chacina de Japuara”, ocorrida em Canindé, Ceará, em 1971, na qual foram mortos quatro agricultores. Para ele: “mais do que relembrar as injustiças, os sofrimentos, as humilhações feitas por latifundiários, jagunços, pistoleiros, e agentes governamentais da repressão, o livro também é um espelho de pessoas corajosas, um legado para as novas lutas de hoje”.
Já para João Altair dos Santos, cuja história do pai já foi retratada no livro A saga do João Sem Terra, de Carlos Wagner – a narrativa de um homem perseguido e torturado pela ditadura, cujo auto-exílio durou 25 anos –, este nova publicação ajuda a superar o trauma moral que, para ele, iniciou na infância, quando ainda não tinha defesas ou respostas. Santos conta que: “era proibido falar o nome do meu pai. Ele se escondeu no interior de Goiás, mudou de nome, casou novamente, assim como a minha mãe. Os dois já faleceram e, infelizmente, meu núcleo familiar original nunca mais se reagrupou”.
Presente também a oficina do FST – Direito a memória, a verdade e a justiça e o acesso as informações – que antecedeu ao lançamento do livro, a ministra Maria do Rosário salientou que o trabalho de Ana Carneiro e Marta Cioccari enfatiza lições de vida e trabalho, e que os camponeses, na luta pela terra e pela participação política, ainda não tiveram por parte do estado a atenção devida. Segundo a ministra:
“terra e poder sempre estiveram associados no Brasil. A repressão contra os trabalhadores rurais ocorre desde o período colonial. Este modo de agir, que persegue líderes sindicalistas, ainda esta em vigência, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, mas não só lá. São métodos que continuam a desafiar a democracia no Brasil. Mas não permanecerão. O povo também tem suas formas de enfrentamento. E o poder judiciário precisar ser mais efetivo em suas ações contra a impunidade”.
Por Francisco Ribeiro