Projeto prevê condominio de luxo de 20 andares

A história de um terreno 3.500 metros quadrados na rua Germano Petersen Júnior, no bairro Auxiladora, é um caso exemplar de como se dá o “desenvolvimento urbano” de Porto Alegre.
Os registros mais remotos, revelam a ocupação da área por famílias negras, depois da libertação dos escravos em 1889.
Ninguém sabe ao certo como, mas aos poucos essas famílias foram expulsas dali e, anos mais tarde, um antigo morador, conhecido como “Polaco”, obteve a propriedade da área por usucapião.
Na década de 1970 a Associação dos Moradores conseguiu reverter a situação, o usucapião foi anulado e o terreno foi gravado como Área de Interesse Especial, para ser uma praça, já que o bairro não tinha nenhuma.
Passaram-se quase 40 anos, a prefeitura nada fez.

Há pouco mais de um ano, a Associação dos Moradores da Auxiliadora ficou sabendo do projeto da Maiojama, para erguer no local um prédio de 20 andares. “Foi uma surpresa para toda a comunidade”, diz João Volino, o atual presidente da AMA.
Desde então ele e seus companheiros da diretoria tentam obter informações sobre o processo de venda do terreno, bem como a aprovação e o licenciamento da obra.
Pedidos já foram encaminhados à Secretaria Municipal de Obras e à Secretaria de Meio Ambiente, sem resposta até agora. “O que sabemos é que em quatro meses a Maiojama conseguiu aprovar tudo, mas não conseguimos detalhes do processo”, diz Volino.
“Já pedimos à SMOV cópia do processo, mas eles alegam que precisam de autorização do proprietário e ainda não liberaram”. Em novembro último, a Associação recorreu ao Ministério Público para obter as informações.
O processo está com o promotor Fabio Roque Sbardelotto, da Promotoria de Defesa da Habitação e da Ordem Urbanística, que deu prazo até a próxima semana para a prefeitura liberar as informações sobre Estudo de Viabilidade Urbana e as demais licenças para a obra.
localizacao
Enquanto isso, a empresa instalou um show-room no local e, segundo a Associação, já vendeu 70% dos apartamentos do novo condomínio de luxo.
Liberação da área ocorreu em 2001
Resumo do processo de desoneração do terreno de nº 409 e 439 da rua Germano Petersen Júnior, segundo informações obtidas pela Associação dos Moradores:
– Na década de 1970, a comunidade do bairro Auxiliadora, através de sua associação que se reunia no salão de festas da Igreja Nª.Sª da Auxiliadora, reivindicou junto ao executivo municipal uma área de lazer no bairro, visto que, de acordo com os padrões urbanísticos,o bairro era totalmente carente de área de lazer,pois não há uma praça num raio de 2 km que este abrange.
– Atendendo à reivindicação, o prefeito Guilherme Sócias Vilella tornou um terreno situado na rua Germano Petersen Jr,nº409/439, objeto de reserva para equipamento de lazer público.
– Na época, o lançamento de um empreendimento com 5 pavimentos em terreno lindeiro a esta área, onde o projeto contempla todas as janelas das salas(de grandes dimensões) dos apartamentos, totalmente voltadas para a futura praça, foi argumento de venda da construtora,tal a garantia que a comunidade havia recebido da prefeitura.
– A partir da década de 80, o proprietário, através de inúmeros pedidos e pelo intermédio de vários profissionais arquitetos e engenheiros, solicitou a permissão para construção no local de uma garagem, no que não obteve êxito.
– Sucederam-se outros pedidos para os mais diversos usos comerciais, mas como envolviam construções, também não vingaram, pois a área estava reservada.
– Em 1986, vem novamente uma solicitação de estudo de viabilidade para atividade de garagem e estacionamento, o que foi indeferido e no despacho vem a justificativa de que a área objeto faz parte de reserva de área verde,destinada ao lazer público.
– Em 1987, o proprietário solicita permuta por índice – indeferido.
– Em 1988, o proprietário solicita uma certidão à prefeitura que ratifique o ônus da área. A certidão foi emitida em março/1989, e está no processo e diz que a área objeto da certidão está totalmente (o grifo é do documento) vinculado à equipamento comunitário(lazer público).
– Em 1999, entra novamente, através de outra profissional arquiteta um pedido de estudo de viabilidade para garagem e estacionamento, e é novamente indeferido.
– Em Julho de 2000, entra com pedido de desgravame da área. Estão juntados a este pedido no processo, inúmeros despachos de técnicos engenheiros e arquitetos da SMOV, indeferindo a liberação, ou desoneração da área para quaisquer atividades.
– Um dos despachos solicita informação sobre a possibilidade de se fazer a transferência de gravame, o que é respondido negativamente por não haver área disponível para tal. Em fevereiro de 2001, novo despacho indeferindo o pedido devido à carência de praça no bairro.
– O proprietário insiste através de outros pedidos. Logo, no decorrer do processo, vê-se um despacho enviando o processo para reunião do Conselho do Desenvolvimento Urbano para substituir o gravame desta área por outra que é um próprio da prefeitura,defronte a esta área e que se destinava à construção de uma Escola Municipal.
– O processo conclui com a reunião do Conselho em 10 de setembro de 2001, aprovando o desgravame da área e liberando-a para o proprietário.
– O curioso é que na ata da reunião do Conselho não se reconhece uma só assinatura de seus membros, muito menos uma identificação
dos mesmos.
– Resumindo, a área para uma escola foi permutada por um gravame de terreno fronteiro que era destinado a uma praça e foi liberado para ser um espigão de 20 pavimentos.
– O que também causa espécie é o fato de o empreendimento estar tramitando, ou seja, ainda não foi aprovado e a obra já iniciou com
suas instalações, galpões de obra, e show-room de vendas. O processo está na SMAM “em tramitação”. Processo nº 002 315669 00 9 00000
Associação pediu audiência ao prefeito

Exmo. Senhor Prefeito,
A AMA AMA/Associação dos Moradores e Amigos da Auxiliadora de Porto Alegre inscrita sob o CNPJ nº 10.532.338/0001-48 vem encaminhar pedido de Audiência Pública, de acordo com Código Estadual do Meio Ambiente: Art. 85 (*), com o objetivo de resguardar o Princípio de Publicidade pelo Poder Público junto à comunidade do bairro Auxiliadora, a cerca do desgravamento de Área de Especial Interesse Cultural e Ambiental (processo SMOV nº 2.226.075.00.1.000), destinada a praça pública, para construção de prédio de 20 andares, volumetria em flagrante desacordo com o PDDUA de Porto Alegre.
Outrossim, a AMA solicita que sejam sustadas as licenças emitidas como ação prudente que estanque o início da obra, haja vista andamento de Inquérito Civil (nº 94/2009) pela Promotoria de Justiça da Habitação e Defesa da Ordem Urbanística do Ministério Público Estadual.
Atenciosamente
João Volino Corrêa, presidente
Maria Rosa Fontebasso, Vice-presidente
(*) A convocação e a condução das audiências públicas obedecerão aos seguintes preceitos: I – obrigatoriedade de convocação, pelo órgão ambiental, mediante petição encaminhada por no mínimo 1 (uma) entidade legalmente constituída, governamental ou não, por 50 (cinqüenta) pessoas ou pelo Ministério Público Federal ou Estadual;
Nota da Redação: a carta não obteve resposta até o momento.