MÁRCIA TURCATO/ Viva a polarização!

Márcia Turcato

Bater na polarização e defender uma opção com nomes já conhecidos significa uma forma disfarçada e covarde de defender o inominável, inelegível e apenado.

Polos opostos. Norte e Sul. Não é à toa que a geografia mostra o antagonismo natural do planeta Terra. Hemisfério Norte e Sul. Ocidente e Oriente. Porque na geopolítica seria diferente?

Alguns veículos de imprensa, e também jornalistas em seus blogs, têm usado a palavra “polarização” na política como se fosse um palavrão. Como uma coisa condenável. Mas os opostos facilitam nossa vida, mostram com qual polo nos identificamos.

Vejo no linkedin, e também em outras redes sociais, a polarização ser esmurrada até ser colocada em nocaute a favor de uma tal saída pelo meio. Essa saída se mostra liderada pelo deputado federal Aécio Neves, o mesmo que deu início ao golpe de estado legalista contra a presidenta Dilma Rousseff ao questionar no TSE o resultado das urnas, e também por Michel Temer, ex-vice presidente, que deu o empurrão para o golpe seguir em frente ao tornar pública uma carta em que se queixava do comportamento da presidenta.

Com sessões plenárias contínuas, seguindo a técnica do torturador de abalar a vítima com interrogatórios ininterruptos, o golpe contra a presidenta democraticamente eleita foi concretizado, abrindo as portas das instituições brasileiras a quatro anos de descalabros conduzidos pelo inominável, inelegível e agora apenado. Sob sua presidência, as instituições foram militarizadas, as vítimas da covid-19 foram ridicularizadas, medicamentos nocivos à saúde foram comprados e ministrados, a legislação foi mudada para facilitar a aquisição de armas de fogo, jornalistas foram perseguidos e agredidos, a ciência foi atacada, eleitores foram barrados na hora de votar e negociatas ainda sob investigação foram realizadas, algumas culminando na venda de presentes dados ao Estado. A lista é grande, acrescente aqui outras delinquências cometidas pelo apenado.

Como não louvar a polarização? Do outro lado, temos um presidente eleito pelo voto popular e que tirou novamente o país do mapa da fome, vai alterar o imposto de renda para livrar do pagamento quem ganha até R$ 5 mil, ampliou os atendimentos feitos pelo SUS, ampliou o número de pessoas empregadas, determinou a igualdade salarial para homens e mulheres na mesma função, fixou a meta de desmatamento zero para a Amazônia, elevou o PIB para 4,1%, criou vários programas para pessoas em situação de vulnerabilidade e incentiva a cultura e o esporte. Acrescente aqui outras excelentes ações do governo. A lista é grande.

É impossível admitir a crítica à polarização e a defesa de uma opção dita mais palatável. Não existe essa possibilidade no atual momento político que o Brasil vive. As tais possíveis opções mais palatáveis defendidas por parte da imprensa são Aécio Neves, Michel Temer, Eduardo Leite (governador do RS), Tarcísio de Freitas (governador de SP),  Romeu Zema (governador de MG) e Cláudio Castro (governador RJ), todos eles simpatizantes e/ou cabos eleitorais do inominável. E não sou que digo isso, são os próprios.

Bater na polarização e defender uma opção palatável com os nomes já conhecidos significa uma forma disfarçada e covarde de defender o inominável, inelegível e apenado.

PAULO KLIASS/Juros do trilhão

Por Paulo Kliass*

Longe de aparentar uma contradição, esta imagem evidencia a tragédia de um patamar de SELIC em 15%, provocando a morte de empresas, pessoas e projetos de mudança. E, por outro lado, ela também nos apresenta um projeto de política econômica em que o governo segue cavando lentamente a sua própria cova.

Já Fernando Haddad, no Ministério da Fazenda, mantém a ferro e fogo o garrote da austeridade fiscal a qualquer custo. Em sua verdadeira obsessão por limitar severamente a capacidade de gasto e investimento do Estado, o Professor do INSPER traça uma estratégia de imposição de limites, tetos, bloqueios e contingenciamentos que fazem corar os mais ortodoxos e monetaristas dos velhos (e nem tão velhos assim) tempos.

Suas adesões – tão inflexíveis quanto incompreensíveis – aos cânones do Novo Arcabouço Fiscal (NAF) têm impedido Lula de cumprir com suas promessas de campanha. Já estamos entrando em seu 33° mês do terceiro mandato, de modo que faltam menos de 14 meses para que ele consiga realizar “mais e melhor do que fez entre 2003 e 2010 e também tomar providências para fazer 40 anos em 4.

Ocorre que todo o esforço por ele desenvolvido para limitar as despesas orçamentárias se restringe à esfera das chamadas “contas primárias”. Pela metodologia do financês, isso significa que as contenções se limitam às contas não-financeiras.

Ou seja, as despesas financeiras, aquelas que se relacionam ao pagamento de juros da dívida pública, estas seguem livres e soltas para cresceram o que for do desejo dos responsáveis pela condução da política econômica do governo. Uma loucura!

É mais uma prova cabal de que os responsáveis pela administração pública seguem operando, de forma explícita e descarada, a favor dos interesses do topo de nossa pirâmide da desigualdade. As rubricas com políticas sociais vão sendo cada vez mais contidas e esmagadas pela lógica da chamada “responsabilidade fiscal”, ao passo que os dispêndios com o serviço dos títulos do endividamento público crescem a olhos vistos e sem nenhum instrumento de controle.

Juros seguem no comando

O BC divulgou há poucos dias seu Relatório da Política Fiscal relativo ao mês de julho. De acordo com a publicação, durante o sétimo mês do atual exercício foram dispendidos R$ 109 bilhões a título do pagamento de juros da dívida pública. Trata-se do segundo maior valor mensal desde que a série foi iniciada.

Esse montante só é um pouco mais reduzido do que os R$ 112 bi que foram gastos a este mesmo título em outubro do ano passado. Para se ter uma ideia da dimensão comparativa deste valor, basta relacioná-lo ao total que será executado com as emendas parlamentares o longo de todo o ano de 2025. De acordo com o estabelecido pelo Decreto 12.566, o total inicial previsto para os gastos a serem realizados pelo legislativo foram reduzidos de R$ 81 bi pra R$ 46 bi.

Assim, o que se depreende dos números é que, em apenas um único mês, o Estado brasileiro gastou com juros da dívida pública mais do que o dobro do que vai ser aplicado nas emendas parlamentares durante os 12 meses do presente ano. Aquilo que se considera como uma alocação equivocada e escandalosa de recursos públicos se revela como muito menos relevante do que os gastos realizados com os valores que são religiosamente pagos aos detentores dos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional.

Considerando-se que julho contou com 23 dias úteis em seu calendário, o que se pode calcular é que foram pagos R$ 4,7 bi de juros em cada um deles. Ou seja, em apenas 10 dias de julho foram gastos valores que se equivalem ao total das emendas atribuídas aos 513 deputados e 81 senadores ao longo de todo o ano de 2025.

Ao mesmo tempo em que o governo corre feito maluco e se desgasta politicamente cortando recursos da saúde, da educação, da previdência social, da segurança pública, do reajuste do salário-mínimo, da assistência social e outros, o orçamento sem controle das despesas financeiras bate recorde atrás de recorde.

Ora, já se falou que governar é estabelecer prioridades. Neste caso, o mais relevante para o governo parece ser o atendimento dos interesses da Faria Lima, da Febraban e das elites de forma generalizada.

A rota vergonhosa

Computados os valores de julho, o total acumulado com o pagamento de juros em 12 meses segue se aproximando perigosamente da marca trágica de R$ 1 trilhão.

Entre agosto de 2024 e julho de 2025 esse valor somou R$ 941 bi. Se considerarmos apenas o período ao longo dos primeiros sete meses deste ano, o total com juros alcançou R$ 526 bi.

Esse valor é um pouco mais baixo do que o gasto com essa rubrica em igual período do ano passado – R$ 535 bi. Ocorre que a tendência é que as despesas nos próximos meses sejam mais elevadas do que o ocorrido nos últimos 5 meses de 2024. Afinal, naquele período a taxa oficial de juros esteve entre 10,75% e 12,25%, enquanto atualmente está em 15% ao ano. Como a SELIC é a principal remuneração de base para os títulos da dívida púbica, o mais provável é que o montante de juros seja ainda maior até o final do presente ano. Esta é a principal razão para que analistas considerem a possibilidade de que o total atinja marca trilionária em breve.

Ao longo deste terceiro mandato, o governo Lula já destinou ao pagamento de juros da dívida pública o equivalente a R$ 2,1 tri em 31 meses (janeiro de 2023 a julho 2025).

De acordo com dados da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), o total destinado a esta mesma rubrica durante os 96 meses de seus dois primeiros mandatos (2003 a 2010) a valores presentes foi de R$ 2,6 tri.

É bem verdade que os números podem esconder a realidade de um estoque de dívida pública que cresceu entre os dois períodos comparados e também podem ocultar as variações distintas na taxa SELIC ocorridas ao longo dos anos.

Assim podemos utilizar o conceito do impacto do fluxo de juros pagos em relação ao PIB de cada ano. Neste caso, veremos que essa proporção alcançou uma média de 4,5% durante os oito anos dos mandatos iniciais. E que essa média anual sobe para 6,4% para o biênio 2023/24.

Ou seja, não apenas o volume de juros pagos cresceu em termos reais (descontada a inflação) na comparação tão proclamada por Lula durante a campanha eleitoral, mas também esse índice se elevou em mais de 42% em termos do impacto de juros sobre o Produto Interno.

Fonte: STN

A insistência em operar a política econômica mirando apenas no resultado primário tem provocado há mais de 3 décadas um enorme prejuízo na capacidade de o Estado brasileiro cumprir com suas obrigações constitucionais e oferecer serviços públicos de qualidade à maioria da população.

Além disso, ao priorizar o foco na busca de superávit nas rubricas não-financeiras, o setor público termina por promover uma auto redução na capacidade de investimento governamental, contribuindo para tornar impossível a promessa de Lula de realizar quatro décadas em apenas um mandato.

Esta impressionante distorção fica mais bem compreendida com a informação oferecida pela STN de que foram transferidos do Orçamento da União exatamente R$ 11,3 trilhões a título de pagamento de juros da dívida pública desde o início da série estatística em janeiro de 1997 até julho de 2025. Uma total insanidade!

Lula: assuma o comando da política econômica

Apesar do pouco tempo que ainda resta para as eleições e para a necessária reeleição, é essencial que Lula promova uma mudança de orientação em termos da essência e dos rumos de sua política econômica. Isso passa por definir uma meta de inflação mais realista (por exemplo 4,5% ao ano), com a retirada de argumentos do COPOM para manter a SELIC na estratosfera.

Além disso, é necessário romper com o dogmatismo ortodoxo e monetarista do NAF, liberando recursos do Estado para recompor as políticas públicas e para retomar a capacidade de investimento governamental em um Plano Nacional de Desenvolvimento (PND).

Isso significa redefinir o volume e a orientação das despesas financeiras, de modo a impedir que tal carga de juros de natureza parasitária e improdutiva impeça a realização das necessárias e urgentes despesas no setor real da economia e da sociedade.

*Paulo Kliass é doutor em economia e membro da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental do governo federal.

 

MARCIA TURCATO/Em Fux eu não confio

O Ministro Luiz Fux é um divergente. Um estranho no ninho. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) é um alinhado golpista, ou um alinhado antidemocrático. Para usar um termo do próprio durante o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e sua quadrilha, “a mão precisa encaixar na luva” para que se caracterize um fato, a mão de Fux coube muito bem na luva de apoio a todos àqueles que atacaram a democracia, às instituições e depredaram patrimônio público tombado.

Apesar de todas as provas exaustivamente documentadas e expostas ao longo do processo, além de um vídeo exibido no dia do julgamento, o ministro negou todas as evidências para admitir responsabilidade penal somente para o general Braga Netto e o ajudante de ordens tenente coronel Mauro Cid. Aqui o ministro Fux admitiu o crime e pediu a condenação de ambos. Mas ele não admitiu a existência do crime para os demais réus, que agora podemos chamar de apenados.

Os ataques de Bolsonaro e sua equipe são anteriores a sua posse como presidente da República. Durante a campanha eleitoral, em 2018, ele já ameaçava fechar o STF e intimidava adversários políticos. Ao assumir a presidência, as ameaças eram quase diárias e passaram a ser também contra outras instituições públicas, além da imprensa. Seu governo foi totalmente militarizado, todos os órgãos passaram a ser dirigidos por militares, incluindo o Ministério da Saúde, nas mãos do general Passuelo.

Ou seja, ele colocou um militar em todos os postos estratégicos. Isso já era o início do golpe. Que só não se concretizou porque ele perdeu as eleições seguintes no voto. Mas não aceitou, insuflou seus seguidores para tentar explodir o aeroporto de Brasília e depredar o centro da capital da República no dia 12 de dezembro de 2022, dia da diplomação do presidente eleito Lula da Silva.

O apoio às manifestações violentas prosseguiram e culminaram com a depredação de órgãos públicos, incluindo o Palácio do Planalto e o STF, no dia 08 de janeiro de 2023. Tudo documentado, tudo filmado. As Forças Armadas recuaram e o golpe não se concretizou. E o ministro Luiz Fux não reconheceu os fatos e passou 12 horas lendo um arrazoado de falácias para fazer a defesa da turba. Não é à toa que o então aliado de Bolsonaro, Sérgio Moro, cunhou a frase “in Fux we trust” (em Fux nós confiamos).

O ministro deve explicações à sociedade. Um dia, espero, as motivações que o fizeram ser um divergente virão à tona em detalhes. E, talvez, seja a vez dele sentar no banco dos réus.

Quinhentos jornalistas credenciados para o julgamento de Jair Bolsonaro

Mais de 500 jornalistas acompanham o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e mais sete aliados pela tentativa de golpe depois da derrota nas eleições de 2022.

O grupo faz parte do núcleo da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

Cerca de dois anos e meio após os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, a Corte realizará um julgamento histórico, que pode levar para a prisão um ex-presidente da República e generais do Exército pela acusação de golpe de Estado, medida inédita após a redemocratização do país.

Para garantir a tranquilidade do julgamento, o Supremo preparou um esquema especial de segurança para restringir a circulação de pessoas nos edifícios da Corte, além de varredura com cães farejadores em busca de bombas e uso de drones.

O julgamento terá ampla cobertura jornalística. A Corte recebeu 501 pedidos de credenciamento de profissionais da imprensa nacional e internacional interessados em noticiar o julgamento.

Em um procedimento inédito, o Supremo também fez o credenciamento de pessoas interessadas em acompanhar a deliberação de forma presencial. Segundo a Corte, foram 3.357 inscrições de interessados, entre advogados e cidadãos.

Apesar do grande número de inscritos, somente os primeiros 1.200 pedidos serão atendidos, devido à limitação de espaço.

Os contemplados vão acompanhar o julgamento na sala da Segunda Turma da Corte, por meio de um telão, e não poderão ficar na Primeira Turma, onde o será o julgamento. O espaço será destinado somente aos advogados dos réus e aos profissionais de imprensa.

Foram disponibilizados 150 lugares para cada uma das oito sessões de julgamento, marcadas para os dias 2, 3, 9, 10 e 12 de setembro.

Nos dias 2,9 e 12, as sessões serão realizadas no período da manhã e da tarde, com pausa para o almoço. Nos dias 3 e 10, o julgamento ocorrerá somente pela manhã.

Saiba os horários das sessões
2 de setembro – 9h e 14h;
3 de setembro – 9h;
9 de setembro – 9h e 14h;
10 de setembro –9h;
12 de setembro – 9h e 14h.

Quem são os réus?
Jair Bolsonaro – ex-presidente da República;

Alexandre Ramagem – ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);

Almir Garnier- ex-comandante da Marinha;

Anderson Torres – ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança do Distrito Federal;

Augusto Heleno – ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);

Paulo Sérgio Nogueira – ex-ministro da Defesa;

Walter Braga Netto – ex-ministro de Bolsonaro e candidato à vice na chapa de 2022;

Mauro Cid – ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;

Rito
O rito que será adotado no julgamento está previsto no Regimento Interno do STF e na Lei 8.038 de 1990, norma que regulamenta as regras processuais do tribunal.

No dia 2 de setembro, às 9h, primeiro dia de julgamento, a sessão será aberta pelo presidente da Primeira Turma, ministro Cristiano Zanin.

Em seguida, o ministro chamará o processo para julgamento e dará a palavra a Alexandre de Moraes, que fará a leitura do relatório com o resumo de todas as etapas percorridas no processo, desde as investigações até a apresentação das alegações finais, última fase antes do julgamento.

Após a leitura do relatório, Zanin passará a palavra para a acusação e as defesas dos réus.

Acusação
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, será responsável pela acusação. Ele terá a palavra pelo prazo de até duas horas para defender a condenação dos réus.

Defesas
Após a sustentação da PGR, os advogados dos réus serão convidados a subir à tribuna para as sustentações orais em favor dos acusados. Eles terão prazo de até uma hora para suas considerações.

Crimes 
Todos os réus respondem no Supremo pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.

A exceção é o caso do ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem, que, atualmente, é deputado federal. Ele foi beneficiado com a suspensão de parte das acusações e responde somente a três dos cinco crimes. A regra está prevista na Constituição.

A suspensão vale para os crimes de dano qualificado pela violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima e deterioração de patrimônio tombado, relacionados aos atos golpistas de 8 de janeiro.

Ramagem continua respondendo pelos crimes de golpe de Estado, organização criminosa armada e tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito.

Votos
O primeiro a votar será Alexandre de Moraes, relator da ação penal. Em sua manifestação, o ministro vai analisar questões preliminares suscitadas pelas defesas de Bolsonaro e dos demais acusados, como pedidos de nulidade da delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonardo e um dos réus, alegações de cerceamento de defesa, pedidos para retirar o caso do STF, além das solicitações de absolvição.

Moraes poderá solicitar que a turma delibere imediatamente sobre a questões preliminares ou deixar a análise desses quesitos para votação conjunta com o mérito.

Após a abordagem das questões preliminares, Moraes se pronunciará sobre o mérito do processo, ou seja, se condena ou absolve os acusados e qual o tempo de cumprimento de pena.

Sequência de votação
Após o voto do relator, os demais integrantes da turma vão proferir seus votos na seguinte sequência:

Flávio Dino;
Luiz Fux;
Cármen Lúcia;
Cristiano Zanin;

A condenação ou absolvição ocorrerá com o voto da maioria de três dos cinco ministros da turma.

Pedido de vista
Um pedido de vista do processo não está descartado. Pelo regimento interno, qualquer integrante da Corte pode pedir mais tempo para analisar o caso e suspender o julgamento. Contudo, o processo deve ser devolvido para julgamento em 90 dias.

Prisão
A eventual prisão dos réus que forem condenados não vai ocorrer de forma automática após o julgamento e só poderá ser efetivada após julgamento dos recursos contra a condenação.

Em caso de condenação, os réus devem ficar em alas especiais de presídios ou nas dependências das Forças Armadas.

Oficiais do Exército têm direito à prisão especial, de acordo com o Código de Processo Penal (CPP). O núcleo 1 tem cinco militares do Exército, um da Marinha e dois delegados da Polícia Federal, que também podem ser beneficiados pela restrição.

Núcleos 
A denúncia da trama golpista foi dividida pela PGR em quatro núcleos. O núcleo crucial, ou núcleo 1, formado por Jair Bolsonaro, será o primeiro ser julgado. As demais ações penais estão em fase de alegações finais, última etapa antes do julgamento, que deverá ocorrer ainda este ano.

(Com reportagem da Agência Brasil)

Rodoviária de Porto Alegre: funcionários temem mais um verão em instalações improvisadas

No site do Plano Rio Grande consta que “o governo do Estado assinou, em 4/6/2025, a ordem de início dos serviços para reforma da Estação Rodoviária de Porto Alegre com a empresa Nacon Engenharia. O investimento estimado é de R$ 19,8 milhões”.

O dinheiro, do governo federal, já está disponível, conforme comentam os funcionários que trabalham nos guichês, mas eles continuam amontoados em instalações provisórias desde que a rodoviária voltou a operar depois da enchente de maio de 2024.

Ainda são visíveis os vestígios da enchente, muitas áreas fechadas, instalações provisórias.  O temor dos funcionários´é ter que enfrentar mais um verão naquelas condições, num local improvisado, pouco espaço, sem ar condicionado,  tendo que atender milhares turistas.

Muitas áreas continuam fechadas desde a enchente.

.

Risco de guerra aberta na América Latina

HENRIQUE CASANOVA*

Sob o pretexto de combater o narcotráfico, os Estados Unidos decidem aumentar sua presença militar na América Latina.

A manobra visa reforçar sua dominância e influência em territórios tradicionalmente vassalos. O movimento
ocorre, porém, com políticas extremadas com as quais precisamos tomar muito cuidado.

Caça a Nicolas Maduro
Trump coloca a cabeça de Nicolas Maduro literalmente a prêmio, num episódio de relações internacionais que beira o absurdo para as tradições latinoamericanas.

As razões dessa tensão são, porém, há muito conhecidas. A Venezuela reúne dois fatores que a colocam em irremediável rota de colisão com os Estados Unidos: primeiro, ela possui as maiores reservas de petróleo
do mundo, mais até que a Arábia Saudita ou o Iran; segundo, o setor foi estatizado por Hugo Chaves em 2009 e até hoje as empresas norteamericanas não puderam se apropriar do importante recurso venezuelano.

É famoso o discurso de Trump, em 2023, num comício do partido Republicano na Carolina do Norte, onde ele diz que durante seu primeiro governo a Venezuela estava a ponto de colapsar e ele poderia ter se apropriado do petróleo, criticando o governo Democrata que ainda precisava comprá-lo.

Terrorismo na América Latina
Por outro lado, os EUA pressionam as legislações do continente, inclusive as do Brasil, a classificar as facções do crime organizado como “Terrorismo”.

Isso não é mero debate técnico. Segundo a lei dos Estados Unidos eles podem “legalmente” fazer intervenções militares em qualquer outra nação se a causa for o “combate ao terrorismo”.

Importante lembrar que mesmo em meio às turbulências do tarifaço ao Brasil, existe um exercício militar do exército norteamericano marcado para novembro na caatinga brasileira.

Por que agora?

É interessante pontuar os contextos dessa investida norte-americana contra nosso continente. Lembremos primeiro da retumbante derrota da Otan na Guerra da Ucrânia e de como os EUA parecem finalmente dispostos a cessar o
conflito sem que a Rússia tenha sido fragilizada economicamente.

Já no Oriente Médio, o Imperialismo norte-americano parece ter ficado surpreso com a capacidade destrutiva dos contra-ataques iranianos a Israel, de modo que o cessar fogo não deverá ser quebrado naquele conflito nos
próximos meses e quem sabe anos.
A questão do Taiwan, onde os EUA esperavam poder iniciar uma guerra por procuração contra a China, semelhante ao que fazem na Ucrânia contra a
Rússia, perdeu força em função do Genocídio em Gaza e a ideia de guerra aberta contra a China parece ter sido temporariamente abandonada pela Casa Branca.
É nesse contexto que os EUA voltam-se ao seu quintal, tentando garantir seus interesses na América Latina e, com presença militar, atrapalhar os negócios da China no continente além de, quem sabe, finalmente emplacar as desejadas trocas de regime nos países que tem mostrado maior resistência aos seus interesses (a Venezuela com seu petróleo, principalmente).

*Jornalista e Geógrafo

Armazenagem: um gargalo que ameaça o futuro do agro

Paulo Bertolini*

O agronegócio brasileiro vem crescendo a cada safra, ampliando constantemente sua capacidade de produção. De acordo com as informações divulgadas pela Companhia Nacional de Abastecimento, a safra de grãos 2024/2025 está estimada em 330,3 milhões de toneladas. Se confirmado, será o maior volume já registrado na série histórica da companhia. Isso representa um aumento de 32,6 milhões de toneladas na comparação com o ciclo 2023/2024.

No entanto, por trás desses expressivos números esconde-se um gargalo estrutural crônico e perigoso: a incapacidade do país de armazenar adequadamente o que é produzido.

Com uma capacidade estática de armazenagem de só 210 milhões de toneladas, considerando toda a infraestrutura construída até hoje, o Brasil enfrenta um déficit alarmante de 120 milhões de toneladas.

Esse número não é só uma estatística, é um freio ao nosso potencial e um risco à segurança alimentar e econômica do Brasil.

A matemática é clara e preocupante. Para evitar que o déficit aumente, o Brasil precisaria investir cerca de R$ 15 bilhões por ano em novas estruturas de armazenagem. Contudo, estamos longe de alcançar essa meta.

A cada colheita recorde, o problema se agrava e ignorar essa necessidade compromete a rentabilidade do produtor e a estabilidade de preços para o consumidor. A capacidade de formar estoques reguladores é uma ferramenta vital para controlar a inflação de alimentos e garantir o abastecimento, especialmente em tempos de instabilidade climática e geopolítica.

O PCA (Programa de Construção e Ampliação de Armazéns) foi criado para mitigar esse problema, oferecendo linhas de crédito como o “PCA Grãos”, com juros de 7% ao ano e prazos estendidos para estruturas de até 6.000 toneladas. Na prática, porém, o acesso a esses recursos é um desafio, principalmente para os pequenos e médios produtores.

A falta de recursos suficientes alocados ao programa e a excessiva burocracia dificultam o acesso ao financiamento por quem mais precisa. O custo elevado da implantação, cerca de R$ 1.500 por tonelada de capacidade, considerando equipamentos, montagem, energia e obras civis, contribui para a perpetuação do déficit.

Outro agravante é a má distribuição geográfica das estruturas de armazenagem. Só 15% dos silos estão dentro das fazendas, onde seriam mais eficazes. Os 85% restantes concentram-se em áreas urbanas, complexos industriais e portos. Essa distância entre a colheita e o armazenamento causa perdas significativas de grãos, eleva substancialmente os custos logísticos com frete e cria um fluxo ineficiente em toda a cadeia produtiva.

O produtor, sem a possibilidade de estocar a safra na origem, fica pressionado a vender rapidamente durante o pico da colheita, muitas vezes a preços inferiores, sobrecarregando o sistema de transporte e perdendo poder de negociação.

O contraste com outros grandes produtores agrícolas, como os Estados Unidos, é enorme. Lá, a capacidade estática de armazenagem supera a produção de uma safra inteira, com mais da metade dos silos localizados dentro das propriedades rurais. Esse modelo confere maior eficiência e controle ao produtor, beneficiando o país como um todo.

É preciso encarar com seriedade o fato de que o deficit de armazenagem é um dos maiores entraves ao desenvolvimento sustentável do agronegócio brasileiro. Não basta produzir em volumes recordes se não formos capazes de administrar essa produção de forma eficiente, estratégica e inteligente.

A expansão da capacidade de armazenagem, especialmente nas propriedades rurais, deve ser tratada como uma prioridade nacional. Isso exige mais recursos para programas como o PCA, desburocratização do acesso ao crédito e novos modelos de incentivo e investimento público-privado.

Superar o gargalo dos silos é fundamental para destravar o pleno potencial do agro, garantir a segurança alimentar e fortalecer a economia brasileira. Manter o cenário atual é aceitar um futuro de ineficiência, perdas e vulnerabilidade.

*Paulo Antonio Pusch Bertolini, 57 anos, é empresário, presidente da Abramilho (Associação Brasileira dos Produtores de Milho e Sorgo).

Em dois anos, 17 milhões tiraram a nova identidade com número do CPF

Chega a 17 milhões o total de brasileiros que neste dezembro de 2024 possuem a nova Carteira de Identidade Nacional (CIN).

Em janeiro, pouco mais de três milhões haviam providenciado o novo documento, instituído um ano antes, em janeiro de 2023.

Ao longo deste ano triplicou o número dos que aderiram, chegando aos 17 milhões agora apontados. O prazo para todos os brasileiros fazerem a troca do documento vai até 2032, sendo gratuita a primeira via.

O balanço foi divulgado nesta segunda-feira (16) pelo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos.

O governo pretende antecipar a meta, principalmente porque a nova carteira de identidade é peça essencial  no projeto de uma Infraestrutura Pública Digital (IPD) de identificação civil, para automatizar os serviços públicos.

“Essa IPD utilizará a base de dados da CIN e a identificação em meios digitais do Gov.br”.

Em nota, o ministério garante que “a nova Carteira de Identidade Nacional reduz as fraudes, melhora os cadastros administrativos e qualifica o acesso a serviços públicos digitais, pois possibilita um acesso mais seguro aos mais de 4,5 mil serviços digitais disponíveis no Gov.br”.

A utilização do CPF como número único de identificação, em substituição ao registro geral (RG), está prevista na Lei 14.534, sancionada em 11 de janeiro de 2023.

A lei teve origem no PL 1.422/2019 ,  apresentado pelo deputado Felipe Rigoni (PSB-ES) e, no Senado, teve relatoria de Esperidião Amin (PP-SC). A mudança, segundo Amin, ” facilita a vida do brasileiro”.

— A numeração do CPF será protagonista, e os indivíduos não mais terão que se recordar ou valer-se de diferentes números para que os diversos órgãos públicos, bases de dados e cadastros os identifiquem. Portanto, a ideia é mais do que saudável, é necessária e econômica.

A lei deu 24 meses para que os cadastros e bases de dados das unidades da federação estejam funcionando de modo interconectado.

Os prazos, porém, já estavam sendo cumpridos pela maioria dos estados, que já emitiam as novas cédulas de identidade mesmo antes da data limite de 11 de janeiro de 2024.

Em audiência da Comissão Mista de Orçamento, no fim de 2023, a ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, afirmou que a unificação de registros deve diminuir a falsificação de documentos e a confusão nos números de identidades (RGs) gerados por estados diferentes para uma mesma pessoa.

— Hoje, você pode ter 27 carteiras de identidade. Isso gera problema de falsificação, mas, também, um processo de cidadania, de modo que consigamos conhecer os cidadãos brasileiros e pensar políticas públicas para eles. Temos trabalhado, com cooperação federativa grande, para que todos os estados possam começar a emitir essa nova carteira. Estamos conversando com os estados para antecipar o prazo legal de 10 anos, para que, ao longo do mandato do presidente Lula e dos governadores atuais, todos os brasileiros tenham a nova carteira. (Com informações da Agência Senado e Agência Brasil) 

Foto: Agência Senado

ELMAR BONES: O papel do papel na era digital

O senso comum acredita que o jornal e a revista impressos morreram (ou vão morrer) por causa da internet e dos meios digitais.

Não se leva em conta que esse é (também e principalmente)  o discurso dos “donos da tecnologia digital”, com seu viés de dominação e colonização cultural.

Na história da evolução (ou involução?) humana, não há o caso de uma tecnologia que tenha eliminado a outra.

Assim como a sofisticada tecnologia do radar não extinguiu os balões de investigações atmosféricas e o telefone não extinguiu o telégrafo, é improvável que o digital extinga o impresso.

O uso do papel como plataforma para difusão de informações remonta a 1.500 anos, pelo menos 300 anos na forma de jornais e revistas.

O papel impresso chegou a ser o principal meio de difusão de informações,  as ideias veiculadas nas primitivas gazetas revolucionaram o mundo.

Foi superado pelos meios eletrônicos do Século XX, mas não perdeu sua relevância, básicamente por suas faculdades de síntese, de portabilidade, de documento.

Será totalmente descartado, agora, com a emergência das novas tecnologias digitais do século XXI,  que além de plataformas ilimitadas oferecem  a difusão instantânea, sem limites de informações?

“O novo transforma o antecessor em forma de arte, “, dizia Marshall Mcluhan, E exemplificava: “Quando escrever era novo, Platão transformou o velho diálogo oral em forma artística”.

O  impresso terá, portanto,  que se adaptar  à nova realidade e, quem sabe, tirar proveito dela.  O papel e o digital podem ser plataformas complementares, com alta sinergia.

Para ficar no local:

A Zero Hora “print’, como diz Nelson Sirotsky, tem 40 mil assinantes, contrariando até as expectativas da Casa. Não é indicativo que existe um mercado?

Considere-se que a ZH é um caso exemplar de uso inadequado do papel como plataforma para difusão de informações.

O papel não tem mais como dar conta do “noticiário”, os fatos estão na internet em tempo real, ao vivo, a cores e com imagens, assim como as opiniões e os pitacos dos “influencers”.

O impresso vai sobreviver na medida em que ganhar um novo conteúdo, capaz de identificar e fixar as conexões que são voláteis e dispersas na internet. Tem que tirar proveito de suas qualidades, da permanência e da prova.

Teremos nós,  jornalistas, que aprender a produzir esse novo conteúdo na prática, porque ainda não há uma teoria. Isso é o que intimida.

É mais fácil (ou cômodo) acreditar que o dono da tecnologia está certo.

 

Varsóvia e Gaza: dois guetos, a mesma estupidez

Luiz Cláudio Cunha

Os primeiros comentários sobre a reação de Israel ao ataque terrorista do Hamas, mencionando nazismo, me pareceram sem propósito.

Afinal, falar em ‘judeu nazista’ parecia uma clara contradição em termos, pura antinomia. Como assim, judeu nazista?

Ao longo dos dias, enquanto se intensificavam os bombardeios de Israel sobre Gaza, ampliando as mortes de crianças, mulheres e civis inocentes, a expressão se naturalizou pela brutalidade crescente da impiedosa ação militar das tropas de Netanyahu.

Comecei a procurar, então, o fio que dava nexo àquela expressão aparentemente esdrúxula. Gaza, cercada por muros, cercas eletrificadas e tropas armadas, é tecnicamente um gueto onde vivem confinados 2 milhões de palestinos. Dentre os 400 guetos criados por Hitler na Europa ocupada, na Segunda Guerra Mundial, o maior deles era o de Varsóvia, onde vivia a maior comunidade judaica do continente.

Seus 350 mil habitantes foram confinados numa área de 3 km² – um drama humano semelhante aos 2,2 milhões de palestinos virtualmente encarcerados em 365 km².

Com esses números perversos, foi possível estabelecer a simetria terrível entre Varsóvia e Gaza, com um detalhe assustador: a macabra inversão de posição entre os judeus perseguidos de 1943 e os judeus perseguidores de 2024. A estupidez é a mesma, os uniformes é que são distintos.

Durante três meses, pesquisei arduamente em arquivos de jornais e sites de museus em Israel, Alemanha e Estados Unidos dedicados aos massacres de judeus.

Selecionei 90 fotos dramáticas que contam, graficamente, um pouco do terrível drama humano vivido por milhões de pessoas no cerco inclemente que Israel faz contra mulheres e crianças.

Um drama que passa batido pela distante e fria imprensa brasileira, que não foi e não está lá. Nenhum dos três grandes jornais do país mandou um enviado especial para sentir, de perto, o calor e o sofrimento vivido por civis inocentes. Uma das páginas mais vergonhosas do jornalismo brasileiro!

Humanitas, respeitada revista on line da Unisinos, teve a rara coragem editorial e a aguda percepção histórica para acolher esse texto, que é inédito na imprensa brasileira – pelo tom, pela abrangência e pelo recorte histórico, que ajudam a entender melhor o massacre que ocorre em Gaza.

Leia neste link a íntegra do ensaio publicado pela Humanitas para captar a brutalidade de Netanyahu que a imprensa brasileira, por comodismo ou conivência, esconde.


*Jornalista, é autor de Operação Condor: o Sequestro dos Uruguaios (ed. L&PM, 2008) e foi consultor da Comissão Nacional da Verdade (CNV), no grupo de tarefa que investigou a Operação Condor e as conexões repressivas do Cone Sul ao tempo da ditadura.