Vergonha para o Brasil

Luiz Cláudio Cunha
A Itália faz o que o Brasil nunca fez: botou no banco dos réus os militares brasileiros envolvidos com a Operação Condor, a multinacional repressiva que nos anos 1970 coordenou a caçada a dissidentes no Cone Sul do continente, dominado na época pelos generais das ditaduras que assolavam a região.
Nesta quarta-feira, 29, o papel criminoso do Brasil, membro ilustre da Condor, estará sob investigação na Itália, na sala principal da 1a Corte Penal do Tribunal de Roma, que julga três coronéis do Exército brasileiro e um delegado do DOPS envolvidos no desaparecimento de um argentino, Lorenzo Viñas, sequestrado e desaparecido em solo brasileiro desde 1980.
Caçado como militante do movimento guerrilheiro Montoneros, Viñas decidiu sair da Argentina e procurar a segurança de um país europeu. Embarcou em um ônibus em Buenos Aires com destino ao Rio de Janeiro, onde aguardaria a mulher, Cláudia Allegrini, para juntos viajarem à Europa sob a proteção do Alto Comissariados das Nações Unidas (ACNUR). Em 26 de junho, o ônibus atravessou a fronteira de Paso de Los Libres com a cidade gaúcha de Uruguaiana – e ali Viñas desapareceu, aos 25 anos. Tornou-se uma das vítimas sem destino final da Condor, que coordenava a caça, prisão, tortura e morte de dissidentes em todas as fronteiras do Cone Sul.
O time verde-amarelo
No Natal de 2007, quase três décadas após a queda da ditadura do chileno Augusto Pinochet, onde nasceu a Condor, a juíza Luisanna Figliola, do Tribunal Penal de Roma, expediu uma ordem internacional de prisão contra 146 ex-governantes e agentes públicos das ditaduras camaradas do sul do continente. Em sua maioria, eram militares de alta hierarquia, além de policiais e alguns civis, acusados pela detenção ilegal, tortura, morte e desaparecimento de 25 pessoas, italianos ou seus descendentes. Viñas, com pais italianos, era um deles.
Na penca de denunciados, os bandos maiores eram de argentinos (61), uruguaios (32), chilenos (22) e brasileiros (13). O time verde-amarelo de brutamontes era formado por seis generais, quatro coronéis, dois policiais federais e um policial do DOPS. A mão pesada da juíza Figliola atendia a um pedido do procurador-geral da República italiana, Giancarlo Capaldo, que preenchia o renitente vazio de justiça dos países sul-americanos pós-ditadura: “Esse processo nasceu na Itália porque os países unidos em torno da Operação Condor decidiram não abrir investigações sobre o assunto. Queremos evitar a impunidade, para que operações como essa não tornem a acontecer”, justificou Capaldo.
O único fracasso da Condor
O calendário e a inércia livraram os brasileiros do tacão da justiça italiana. Do bando dos 13, dez dos denunciados em Roma já morreram. Entre eles, os quatro mais graduados: João Baptista Figueiredo (o último general-presidente dos cinco da ditadura), Walter Pires (ministro do Exército de Figueiredo), Octávio Aguiar de Medeiros (chefe do SNI) e Antônio Bandeira (ex-comandante do III Exército, em Porto Alegre).
Dos 13, pelo menos dez tiveram algum tipo de envolvimento em alguma etapa do sequestro dos uruguaios Universindo Díaz, Lilián Celiberti e seus dois filhos, na capital gaúcha, em novembro de 1978. Um inédito fracasso da Condor que teve repercussão internacional, quando a operação foi flagrada pela aparição de dois repórteres da sucursal da revista Veja em Porto Alegre, que denunciaram o caso e o envolvimento do DOPS gaúcho na ação binacional da Condor brasileiro-uruguaia.
O diretor do DOPS, na ocasião, era o delegado gaúcho Marco Aurélio Reis, chefe do notório delegado Pedro Seelig, que comandou o sequestro dos uruguaios. Reis, um dos 13 denunciados em Roma, também escapou do juízo italiano ao morrer em junho de 2016, gozando as delícias de uma serena impunidade em uma praia do litoral gaúcho.
Os outros três brasileiros denunciados em Roma, todos coronéis do Exército e também gaúchos, são os únicos sobreviventes da lista original. São o cel. João Osvaldo Leivas (secretário de Segurança do Rio Grande do Sul quando Viñas foi sequestrado em Uruguaiana), o cel. Áttila Rohrsetzer (o temido diretor da DCI, Divisão Central de Informações, que fazia a ligação entre o DOPS e a repressão do III Exército) e o cel. Carlos Alberto Ponzi (chefe da Agência de Porto Alegre do SNI).
O brasileiro que não esquece
A lista original da Condor denunciada em Roma era originalmente maior. Tinha quase 200 autoridades. O quórum foi baixando ao se constatar que o rigor do tempo e a pena de morte natural já havia executado alguns dos futuros denunciados. O rol de brasileiros só chegou lá graças ao empenho de um gaúcho teimoso, incansável, dono de uma respeitável cabeleira branca, Jair Krischke. Aos 78 anos, casado, cinco filhos, Krischke é o mais respeitado ativista de direitos humanos do país, na condição de presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH) que ele fundou em Porto Alegre, um ano após o sequestro de Lilián e Universindo.
Depois de ouvir o testemunho de Krischke em Roma, o procurador Capaldo decidiu ampliar sua lista com os brasileiros, a partir dos nomes, postos, datas e conexões fornecidas pelo ativista de Porto Alegre.
Foram suas informações que incluíram o caso de Vinãs entre as vítimas, além de outro ítalo-argentino, Horácio Domingo Campiglia, um líder Montonero sequestrado no aeroporto do Galeão, com o beneplácito da Aeronáutica brasileira, em março de 1980. Alheio à soberania nacional, o governo do general Figueiredo liberou o pouso e decolagem na base aérea do Rio de um Hércules C-130, levando a bordo um comando do Batalhão 601, a tropa de elite que operava como o braço longo da Condor argentina no exterior. Campiglia e sua companheira, Susana de Binstock, também Montonera, foram levadas a Buenos Aires, sem deixar rastros. Foram vistos ainda com vida em El Campito, o centro clandestino de detenção — um dos 600 da ditadura argentina — de Campo de Mayo, o maior quartel do país, onde sucumbiram às torturas e desapareceram para sempre.
Krischke irá contar essas histórias às 10h da manhã desta quarta-feira, 29, no tribunal de Roma. Por vídeo-conferência, vão depor a viúva de Viñas, Cláudia, e a militante Montonera Sílvia Tolchinsky, sequestrada na cidade de Las Cuevas, na fronteira da Argentina com o Chile. Ela é autora de uma cara enviada a Cláudia, anos depois, contando ter encontrado Viñas, ainda vivo, em uma prisão clandestina do país.
São horrores que já não fazem parte da agenda das autoridades brasileiras. Mas, ainda preocupam a atenta Justiça italiana.
Afinal, há juízes em Roma.

Chapecoense, um ano de dor: Sofremos, reagimos, perseveramos

MARCOS A. BEDIN
No dia 29 de novembro, os chapecoenses vão cerrar os olhos, elevar seus pensamentos aos céus e pronunciar uma prece silenciosa em memória das vítimas do acidente com o avião que transportava a delegação da Associação Chapecoense de Futebol a Medellín, na Colômbia. Muitos ouvirão o magnífico e pungente Toque do Silêncio magistralmente interpretado por um músico imaginário. Os olhos transbordarão de lágrimas, os corações serão tomados pela aflição. No firmamento, 71 estrelas nos observarão em silêncio.
Não haverá tribuno, nem discurso, nem mensagem capaz de interpretar esse momento. As palavras serão inúteis. Os discursos serão dispensados. As pompas serão canceladas. Somente o abraço forte e emocionado, o beijo carinhoso, o olhar compungido e, acima de tudo, a presença solidária serão aceitas como verdadeiras manifestações de um pesar profundo.
Quantas emoções cabem em um ano? É pouco tempo para a fenda profunda cicatrizar. Ainda nos assombra e jamais sairá de nossa memória a tragédia. A ausência desses inesquecíveis jogadores, dirigentes, técnicos, empresários, tripulantes e jornalistas constituem um capital humano cuja perda jamais será reparada nas famílias, nas empresas e nas organizações onde seus talentos brilhavam.
Passamos por várias fases. Do choque, da revolta e da reação. O choque da perda de 71 vidas foi potencializado pela constatação de uma cadeia de erros na gestão da navegação aérea internacional e o protagonismo de um piloto viciado em voar sem combustível – ou seja, fatores previsíveis e evitáveis. Alia-se o fato da Chapecoense catalisar a admiração de boa parte do País como um Clube jovem, despretensioso e feliz que vivia uma fase de excelentes resultados sob o comando firme do presidente Sandro Pallaoro e do técnico Caio Júnior. O impacto foi planetário. Povos de todos os continentes choraram com os brasileiros a perda que calou fundo na alma dos chapecoenses.
O mundo parou de uma forma jamais vista naqueles lancinantes e perturbadores dias de 29 de novembro a 4 de dezembro de 2016, acompanhando o resgate, os preparativos, o traslado para o Brasil e as cerimônias de despedidas. Chapecó se transmutou na capital mundial da solidariedade e, a Chape, tornou-se o segundo clube de milhões de torcedores em todas as nações.
A revolta pela incompreensível perda foi inevitável, os dias ficaram longos e as horas, amargas. Eram muitas emoções para viver, muitas informações para processar, muitas incertezas a elucidar. O apoio do Clube, da comunidade, da imprensa, das empresas e de milhares de voluntários permitiu articular uma reação gradual e determinada para vencer o imobilismo da dor e do desespero. Com muita transparência e espírito público, a diretoria da Chape,  à frente Plínio David De Nês Filho, conduziu a reação, amparou as famílias, assegurou indenizações e adotou todas as providências cabíveis.
O conceito e a convicção no associativismo/cooperativismo prevaleceram. A própria Chape, um produto da ação cooperativa dos torcedores, empresários e patrocinadores, exercitou mais uma vez essa política com um plano de reação, de reconstrução e de compromisso com o futuro. A ação em lugar da resignação. A retomada a partir do marco zero. Todos foram chamados a contribuir nessa obra de reconstrução, ainda inconclusa, mas que segue em linha reta e ascendente rumo ao seu desiderato.
O primeiro ano pós-tragédia foi angustiante, tortuoso e torturante. Os percalços dessa jornada de recomeço não empanam o brilho de uma vitória e de um desafio conquistados – o de permanecer na série A do Campeonato Brasileiro. É dessa forma que honramos todos os que partiram dessa dimensão.
Futebol é a atividade humana mais impregnada de paixão e, onde predomina a paixão, não se deve exigir lucidez e racionalidade. Por isso, é preciso relativizar os eventuais exageros de torcedores e outras personagens do universo da bola que, nesse interregno de 12 meses, às vezes foram anjos, às vezes algozes…
Eu também ouço o músico imaginário interpretando Toque do Silêncio e reflito Por quem os sinos dobram, lembrando estrofes do poeta inglês Jonh Donne: “Nenhum homem é uma ilha isolada. Cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra; se um torrão é arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar dos teus amigos, ou o teu próprio. A morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. Por isso, não me perguntes por quem os sinos dobram… eles dobram por ti!”.
Chapecó e a Chapecoense tem uma mensagem ao mundo. Sofremos, mas, reagimos e perseveramos.

Gosto da Rua

Ele começara cedo. Aos quinze anos já trabalhava duro. Agora, acolhido pela cadeira confortável jogou seu corpo para trás. Através da janela gradeada do edifício, distanciou o olhar, em retrospectiva. Continuava trabalhando, apesar de seus muitos anos. “Por que parar? Sempre trabalhei!”.
A conversa se alongou: “Não entendo esse achaque que se faz sobre quem trabalha. Não me peçam dinheiro. Vão trabalhar!”
Ela nunca começara. Estava como sempre estivera: a espera de alguma coisa. Espera quase sem pressa, daquelas que o tempo estica e não rompe. De vez em quando reunia forças e pedia alguma esmola. Ao seu redor, um salgadinho e uma caixinha de suco. Vazios. “Não é a melhor coisa para se comer, mas é o que se encontra, o que me dão.” E continuou: “preferia algum trocado. Mas está difícil. Preferem dar o que lhes sobra, ou que já enjoaram.”
Perguntada do porque estar na rua e não acolhida em algum albergue, respondeu: “Cansei. É bom um banho, uma sopa, uma cama. Mas cansa. Gosto da rua”.
Um pouco adiante, dobrando a esquina uma menina mãe estendia o braço. Mostrava entalhes de jaguaretê e mudas de bromélias. Ao seu lado um menino dormia na calçada e uma menininha escondia o rostinho indígena na busca por aconchego. “Quanto custa?” “Dez” “Os filhos estão bem?” Não veio resposta.
As vezes silêncios são maiores que gritos. Silêncios de imigrantes, de estrangeiros em seu próprio planeta. Gritos das pessoas vendendo jornal, pipoca, espetinhos, cadarços, camisetas do Grêmio e do Inter, radinhos, antenas… Rente, lojas quase escondidas tentando expor camisas, sapatos. Muitas farmácias. Uma quase junto à outra. Músicos também. Anunciadores de fotos: “Foto, foto!” Gente, indo, voltando, circulando, andarilhando, sofrendo, vivendo. Cachorros acostumados, pombas ligeiras, baratas escondidas. Brisa de alguma árvore com saudade do rio. Gente com sacolas presas nos braços, ou sacolas com gente amarrada. Tem mais sacolas carregando gente do que gente com sacolas. Tudo e muito mais. Nada e quase nada.
Como não gostar da rua? A rua não julga. Acolhe. É solidária. Na rua não cabem cadeiras estofadas. Tiram muito lugar.
José Alberto Wenzel – analista ambiental

2017: da “pós verdade” à “pós-mentira”

mariano Senna
A Oxford Dictionaries elegeu “pós-verdade”(post-truth) como a palavra de 2016.
Segundo a editora inglesa, a expressão se refere a uma condição em que fatos objetivos influem menos na formação de opinião do que apelos a emoção e crenças pessoais. Ela surge como efeito da eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, mas também serve para entender muitos acontecimentos recentes pelo mundo.
Para o aclamado jornalista britânico, Robert Fisk, tal condição surge hoje como resultado de dois fatores combinados. O primeiro deles, o surgimento das redes sociais como amplificador da voz dos ignorantes ou dos mal-intencionados.
O outro, a falta de credibilidade dos jornais causada pelos próprios profissionais de mídia. “Jornalistas veem mentido para seus leitores há anos”, escreve ele.
Exemplos não faltam. O ataque a um mercado natalino na capital alemã ocorrido na véspera do Natal passado é um caso excepcional para ilustrar tal crise do mainstream internacional. Semanas após a tragédia, o noticiário repetia o ocorrido como fato consumado e esclarecido.
O foco já estava nos desdobramentos e a retórica de alguns argumentos aproxima o jornalismo da propaganda política de direita.
Na grande mídia o atentado foi obra de um imigrante ilegal Tunisiano, que as autoridades insistem em chamar de refugiado. Anis Amri, de apenas 24 anos, teria sequestrado e matado o motorista da carreta com que invadiu o mercado de Natal. Dali ele fugiu a pé, não se sabe para onde. Apareceu três dias depois em Milão na Itália onde foi morto pela polícia.
As autoridades supõem que o jovem Tunisiano tenha fugido da Alemanha de trem. Passou primeiro pela Holanda. Depois França e finalmente Itália. Olhando com cuidado para os detalhes da história contada e repetida exaustivamente pela mídia, toda essa versão parece ser conveniente demais para ser verdade.
Primeiro que são todos fatos de origem oficial. Toda apuração é exclusivamente baseada em informações das autoridades, dando grande credibilidade ao relato. Não há filmes ou fotos de Amri próximo ao local do ataque.
Mais ainda, nenhum veículo de comunicação estabelecido se atreveu até agora a questionar a prova que incriminou Anis Amri: um documento negando o seu pedido de asilo que ele misteriosamente esqueceu dentro do caminhão que usou para patrolar uma esquina do mercado de Natal.
“Esses terroristas vivem esquecendo documentos por aí”, ironiza Junet A., dono de um comércio em Berlin e criado nas redondezas onde o atentado aconteceu, em Berlim Ocidental. Como muitos, ele não acredita na versão da policia.
Lembra que a área é talvez uma das com o maior numero de câmeras e sistemas de observação e controle de todo país. São hotéis, casas de show, cinemas, restaurantes, zoológico e a estação de trens juntos em três quarteirões ao redor da praça atacada. “Seja quem tenha feito aquilo era alguém profissional e muito bem preparado. Coisa de agente secreto de filme, não de um garoto que andava ilegal por aí”, finaliza o comerciante, lembrando os últimos cinco casos de terrorismo internacional em que a policia solucionou a questão da mesma forma.
Em todos a versão oficial é repetida com tamanha intensidade e insistência que se torna verossímel, indubitável.
Foi assim no 11 de setembro, onde um dos terroristas foi identificado pelo passaporte chamuscado encontrado nos escombros das torres gêmeas.
No ataque ao Charlie Hebdo, na França e outros. No final nenhum dos suspeitos foi preso ou capturado, todos acabam mortos, como se não houvessem profissionais dentro das melhores polícias do mundo. Só os terroristas é que são profissionais e por isso assassinos implacáveis que não deixam alternativa entre matar ou serem mortos.
Para os mais conservadores e oficialistas, tudo isso é apenas teoria conspiratória. Esquecem apenas de ver que a lógica, a verossimilhança e a probabilidade passam muito longe das versões oficiais desses eventos.
Mais do que uma meia verdade ou uma pós-verdade, trata-se de uma pós-mentira extraída e lapidada exclusivamente dos relatórios oficiais.
O impacto político, calculado ou não, é hoje muito claro. Assim como os atentados de 11 de setembro serviram para justificar uma nova onda intervencionista norte-americana pelo mundo, o atentado de Berlim e outros Europa afora servem para justificar uma politica desumana dos europeus para com os que procuram refúgio de conflitos armados.

Se assediam juízes, o que não farão com os trabalhadores?

Jorge Luiz Souto Maior*
O lado bom da compreensão histórica das relações sociais é o de que o tempo não para e, portanto, aquilo que até determinado momento não se conseguia ver, diante das novas correlações que são criadas, vai se tornando claro.

Concretamente, está cada vez mais evidente que o país vivencia, em grau que vem se acentuando, um momento de ruptura democrática, com o aumento do poder do grande capital e a fragilização das instituições, incluindo a própria classe política.
Obviamente, as forças que se uniram para aproveitar do ambiente antidemocrático instaurado, inclusive para aprovar uma lei para chamar de sua, não querem que essa realidade seja revelada, mas se entregam, de forma renovada, a cada manifestação ou a cada ato.
Com efeito, o argumento de que a lei não era para reduzir direitos vai ficando pelo caminho, como revelam: a) a edição da Portaria 1.129, de 20 de outubro de 2017, que, da noite para o dia, em uma canetada, pretendeu eliminar o conceito de trabalho em condições análogas às de escravo e inviabilizar a fiscalização estatal a respeito; b) a declaração de surpresa – e de indignação – de um investidor internacional quando soube que os juízes estavam dispostos a obstar a retirada de direitos trabalhista[i]; e c) o reconhecimento de um dos maiores defensores da “reforma” de que, na sua visão, a qual embalou o advento da lei, só seria possível combater o desemprego reduzindo “um pouquinho” os direitos sociais[ii].
É também revelador, tanto da lógica autoritária quanto dos propósitos a atingir pelo advento da “reforma”, o intenso assédio público que estão promovendo contra os juízes do trabalho, sob o falso fundamento de que os juízes estejam cometendo alguma ilegalidade ao dizerem que vão aplicar a lei em conformidade com a ordem jurídica.
Ora, quando promovem essa campanha midiática estão, primeiro, reconhecendo que consideram que a lei da “reforma” lhes pertence, ou seja, que foi uma lei feita para atender aos seus interesses. Segundo, estão assumindo que existe uma intenção com a aplicação da lei para além daquela da mera “modernização” da regulamentação das relações de trabalho, adaptando-as aos avanços tecnológicos. Terceiro, que as alterações feitas, ao contrário do que se disse, ferem a Constituição Federal e reduzem direitos trabalhistas; isso porque se não fosse nada disso não precisariam atacar os juízes quando estes dizem que vão preservar a efetividade das normas constitucionais.
Aliás, é bastante curiosa a posição assumida por esse segmento, pois sustenta que os juízes não podem interpretar a lei, mas, com isso, já partem de uma interpretação prévia. Na verdade, não estão dizendo que a lei não pode ser interpretada; o que estão dizendo é que não pode ser interpretada em sentido diverso daquele que já atribuíram à lei, embora nunca cheguem, concretamente, a dizer qual seria.
De fato, sequer estão tratando do assunto em uma perspectiva efetivamente jurídica. Estão, isto sim, fazendo uma demonstração de seu poder, tentando colocar o Poder Judiciário – último bastião institucional da defesa democrática – aos seus pés.
Levando a argumentação desses assediadores a uma avaliação concreta, seria o caso de indagar quais são, afinal, os sentidos da lei dos quais estão falando? “Modernização”, desculpem-me, é muito vago; não é uma proposição normativa! Aliás, chego mesmo a desconfiar que os assediadores, a maior parte deles, sequer leram, em seu inteiro teor, a Lei nº 13.467/17. Pessoas que, mesmo sem saber o que está escrito na lei, entram no embate com o propósito único de ameaçar juízes e, assim, vislumbrar um aumento de seu poder.
O portal UOL, atuando em plantão 24 horas sobre o tema, atento, claramente, aos interesses de seus anunciantes, publicou, hoje, 07/11/17, nova reportagem, com a qual tenta difundir a ideia de que a “reforma” – como se houvesse um estatuto aprofundado, coeso e bem delimitado para um novo arranjo socioeconômico nas relações de trabalho por meio da Lei nº 13.467/17 e não um emaranhado de normas, que é o que efetivamente representa a referida lei – está sob risco, em razão de uma suposta atuação ilegal de juízes[iii].
A reportagem enganosa faz alusão a existência de um tal “Documento”, que teria sido expedido pela Anamatra – Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, para instruir os juízes a atuarem contra a reforma.
Trata-se de uma grande mentira! A Anamatra não editou documento algum e é uma enorme irresponsabilidade um jornal de grande circulação difundir isso e alguns profissionais da área jurídica ainda repercutirem a falácia.
O que a Anamatra fez foi organizar um evento jurídico, como tantos outros, em que se debateram e se explicitaram compreensões técnicas sobre temas do Direito, compreensões estas que não são o posicionamento da instituição – que apenas organizou o evento – e sim das pessoas que dele participaram (juízes, procuradores, auditores fiscais e advogados) e se manifestaram em votação democrática.
O que há, portanto, é meramente a publicação dos Enunciados que foram aprovados. E com o que alguns não se conformam é que os sentidos atribuídos a artigos da Lei nº 13.467/17 não foram os sentidos que eles queriam que fossem adotados. E vale registrar, ainda, que a Anamatra não recomenda nada a nenhum juiz, pois, enquanto entidade representativa de juízes, um dos seus primados é o respeito à independência funcional. Assim, nenhum juiz está vinculado ao teor dos Enunciados em questão.
E um dos entrevistados da reportagem do UOL veio com a seguinte intriga: “Eu não vejo essa grandeza de inconsistências na nova lei como foi apontado pela Anamatra”, como se a Anamatra, institucionalmente, tivesse feito alguma avaliação própria da lei. O entrevistado, ao menos, reconhece que existem “problemas” na nova lei, mas com uma autoridade superior, conferida sabe-se lá por quem, considera que são apenas os “problemas” por ele vislumbrados que devem ser considerados, embora nos furte de dizer quais e quantos são. E termina com uma contradição insuperável, aduzindo: “Na hora de julgar, o juiz deve aplicar a lei, sem ser influenciado por opiniões políticas ou pessoais. O Judiciário não questiona norma. Aplica.”
O problema é que o entrevistado certamente sabe que o que o juiz faz é aplicar o Direito e a lei é apenas uma de suas formas de expressão, sendo que a Lei nº 13.467/17 está longe de se constituir a completude das normas jurídicas, tratando-se, meramente, de mais uma lei dentre todas as demais que integram o Direito. Além disso, se, como ele mesmo diz, o juiz não pode ser influenciado por ninguém, sua tentativa de influenciar a atuação dos juízes acaba sendo inócua.
A mesma reportagem indica que existe uma campanha da Confederação Nacional do Transporte – CNT, para que empresas que se sintam prejudicadas por decisão de algum juiz, que, ao seu ver, se recusar a aplicar a lei da “reforma” (seja lá o que venha a ser isso), façam uma reclamação “disciplinar” contra o juiz perante o CNJ.
O grotesco dessa situação é que não se sabe o que querem dizer quando estão falando em “aplicação da reforma”, principalmente mais quando baseiam sua indignação na aplicação estrita da lei e não apontam – porque não há, a não ser nos casos estritos de Súmulas vinculantes – uma lei que obrigue o juiz a adotar um entendimento jurídico específico, ainda mais um entendimento que afronte a Constituição Federal. Ou seja, em nome da legalidade estão dispostos a cometer a ilegalidade de tentar punir juízes em razão do conteúdo de suas decisões.
O interessante é que ao fazerem essa apologia, os arautos da legalidade se comprometem a respeitar todas as leis – e não somente a Lei nº 13.467/17 –, no que se inclui, naturalmente, a Constituição Federal. Assim, nas reclamações trabalhistas futuras, diante da comprovação do descumprimento de qualquer dispositivo legal por parte dos representados pela CNT, poderão os juízes se valer desse comprometimento público, impondo sanções corretivas e punitivas da prática ilícita, nos termos das diversas leis aplicáveis à prática (reiterada) de atos ilícitos. É tempo, pois, do Poder Judiciário adotar uma postura de completa intolerância frente aos ilícitos trabalhistas – o que, aliás, já havia passado da hora, dadas as intensas práticas de ilicitude reiterada que se verificam na realidade brasileira.
O grave do assédio é o atentado explícito ao Estado Democrático de Direito que ele representa, mas que, ao mesmo tempo, revela, mais uma vez, o que determinados setores pretendem com a Lei nº 13.467/17: aumento de poder, para a imposição de sua vontade; o que joga por terra, também, a retórica da paridade e da boa-fé nas negociações coletivas.
O que fica demonstrado é que intentam usar os termos da lei, adotando os sentidos que pressupõem que seus dispositivos tenham, para assediar e ameaçar os trabalhadores, impondo-lhes condições de trabalho que geram sofrimento, redução de direitos e precarização da vida.
Considerando que os direitos, incluindo os consagrados na Constituição Federal, advieram de um longo processo histórico, repleto de conflitos e de lutas, podendo ser compreendidos, portanto, como conquistas sociais; ao tentarem impor ao Poder Judiciário a aplicação de uma única lei, que foi elaborada em menos de dois, passando por cima de todas as demais, não pretendem apenas reduzir direitos, almejam apagar toda a memória social e todos os avanços históricos promovidos.
Cumpre perceber que se esses setores de forma expressa e publicamente assediam juízes, ameaçam e chantageiam as instituições, tendo em mãos uma lei que atende exclusivamente aos seus interesses, o que não farão com os trabalhadores nos locais de trabalho?
Fato é que não pode mais haver dúvida de que sejam esses os propósitos e de que alguns setores estão dispostos a tudo para alcançá-los. Para concretizarem seus objetivos, inclusive, engendraram a tática de um enfrentamento explícito contra as estruturas responsáveis pela preservação da ordem constitucional e dos preceitos democráticos.
Então, cumpre deixar claro: os juízes do trabalho não se submeterão aos agressores do Estado Democrático de Direito e à vontade dos que desconsideram as conquistas históricas da cidadania e daqueles que desprezam os direitos fundamentais, liberais e sociais!
*Juiz do Trabalho em Jundiaí e Professor da USP
[i]. “Então quer dizer que ainda não vamos poder reduzir salários?” Inhttp://theintercept.com/2017/10/04/reforma-trabalhista-frustra-investidores-que-esperavam-mais-reducoes-de-salarios-e-direitos/
[ii]. “Emprego depende de corte de direitos, diz presidente do TST.” Entrevista do Presidente do TST, concedida a Laís Alegretti, publicada no jornal Folha de S. Paulo, edição de 6/11/17, capa e p. A-16.
[iii]. http://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2017/11/07/nem-os-juizes-chegam-a-acordo-sobre-as-novas-leis-trabalhistas.htm

Votos pró Temer custaram mais que um ano do Bolsa Familia

Vilson Antonio Romero
Uma derrota de R$ 32 bilhões.
Sim, sua Excelência, o sr. Michel Miguel Elias Temer Lulia se livrou desta. Foi mais uma vitória resultado da articulação da base governista. Houve algumas defecções, mas, passou pouco de uma dezena.
O plenário da Câmara dos Deputados derrubou, pela segunda vez, o prosseguimento de uma denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente. O placar foi mais apertado para o peemedebista do que o da primeira denúncia, por corrupção passiva, derrubada em agosto passado. Temer recebeu o apoio de 251 deputados federais, com 233 votos contrários.
Já foi cantado em prosa e verso na mídia nacional que esta vitória tem um custo para os cofres públicos, portanto para a Nação brasileira, que pode chegar a R$ 32,1 bilhões. Essa é a soma de diversas concessões e medidas negociadas com deputados federais entre junho e outubro, desde que Temer foi denunciado pela primeira vez, por corrupção passiva, até a segunda votação, pelos crimes de organização criminosa e obstrução da Justiça.
O preço para impedir o prosseguimento das denúncias supera em R$ 6 bilhões os recursos previstos por Temer para as 14 milhões de famílias beneficiárias do Bolsa Família ao longo de 2018, cujo orçamento totaliza R$ 26 bilhões. Supera também o custo da construção da Usina Hidrelétrica Belo Monte, estimado em R$ 30 bilhões.
O Planalto ainda empenhou R$ 4,2 bilhões de emendas parlamentares individuais, que têm execução obrigatória desde 2015. Como o ritmo de liberações é definido pelo governo, foi também uma das armas utilizadas, se fossem consideradas, a conta subiria para R$ 36,3 bilhões. Impopular, com aprovação abaixo da margem de erro – cerca de 3% – o governo recuou da liberação da exploração de minério na Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca), na Amazônia, depois de mobilização internacional contrária. Agora decidiu dar descontos de 60% em multas ambientais e transformar os pagamentos em compromissos de gastos dos entes privados com reflorestamento e conservação do ambiente. A medida pode tirar do Tesouro mais de R$ 2,7 bilhões. Além disto, governo sinaliza com o apoio a tentativas congressuais de criar algum tipo de contribuição para o custeio dos sindicatos
Por outro lado, o Planalto não irá mais privatizar o Aeroporto de Congonhas (SP), cujo leilão poderia arrecadar R$ 6 bilhões. Some-se a isto as os programas de parcelamento de dívidas para empresários e produtores rurais, e em atos de interesse de bancadas temáticas como a dos ruralistas, que tem 214 deputados em exercício e poderia, sozinha, garantir a salvação do mandato do peemedebista.
Os ruralistas já haviam recebido um pacote de descontos nas alíquotas de contribuição para o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural), usado para custear aposentadorias, e condições mais benéficas para quitar dívidas com o fundo, cujo prazo de adesão foi postergado para novembro. Até agora, o governo não recorreu de um projeto de resolução do Senado que anistiou um passivo de R$ 17 bilhões não pagos ao Funrural.
Além de benesses para prefeituras que devem ao INSS, o presidente também sancionou um novo Refis, deixando de arrecadar R$ 4 bilhões. Isto sem falar nos milhares de cargos de confiança, cujas nomeações enchem as páginas do Diário Oficial todo o dia. Se formos avaliar toda esta conjuntura, na realidade, não houve uma vitória, mas uma fragorosa derrota da Nação brasileira para a corrupção. E custou caro! Lamentável!

A importância das fundações e estatais gaúchas no Polo Carboquímico

No mês de setembro, o governo do estado apresentou o Projeto de Lei nº 191/2017, que cria a Política Estadual do Carvão Mineral e institui o Polo Carboquímico do RS, possivelmente uma das derradeiras oportunidades para impulsionar o uso deste bem mineral no estado de forma sustentável em seus aspectos social, econômico e ambiental.
Neste cenário, em que mais se precisa de apoio técnico, o Poder Executivo segue atacando as fundações da área tecnológica e as estatais gaúchas, abrindo mão de quadros técnicos altamente especializados em vez de se beneficiar da sua expertise nas políticas públicas propostas pelo projeto.
As fundações e as sociedades de economia mista possuem corpo técnico qualificado para trabalhar na implementação e apoio à instalação de empreendimentos carboquímicos, assegurando requisitos de viabilidade técnica e econômica, com idoneidade e compromisso social e ambiental.
A indústria carboquímica permite que produtos químicos sejam obtidos a partir do carvão mineral, assim como é possível através do petróleo na petroquímica, aplicando modernos conceitos de Engenharia e tecnologia em prol da sociedade e do desenvolvimento do estado e da Metade Sul.
Reconhecemos a importância da Política Estadual do Carvão Mineral, uma vez que o nosso estado concentra 90% das reservas nacionais de carvão, uma verdadeira riqueza a que podemos chamar de “Pré-Sal Gaúcho”. Entretanto, o Sindicato dos Engenheiros alerta para o imprescindível diferencial tecnológico que representam os quadros técnicos das fundações e empresas públicas na exploração deste potencial e para a implantação de complexos carboquímicos resilientes. Isso irá refletir diretamente no desenvolvimento desta importante cadeia produtiva.
A experiência da CIENTEC no desenvolvimento de tecnologias aplicadas ao carvão mineral e seus subprodutos está sendo desprezada, como também dados estatísticos e econômicos da FEE na elaboração da política pública e no planejamento de ações.
O desenvolvimento de políticas ambientais sem o acompanhamento de técnicos especialistas em conjunto com a Fundação Zoobotânica (FZB), por exemplo, não estão previstos nesse Projeto de Lei, tampouco os impactos do crescimento demográfico, na infraestrutura e logística nas regiões alvo do projeto, onde poderia estar presente a Metroplan. Além disso, temos a capacidade da CRM na exploração do carvão e o poder de distribuição da SULGÁS –  ambas sociedades de economia mista – levando gás natural à população e contribuindo diretamente com a indústria e o desenvolvimento econômico do estado.
A retomada do crescimento com a modernização da estrutura pública passa, necessariamente, pelo trabalho destas instituições, no sentido inverso do que está sendo proposto pelo governo. Inúmeros são os exemplos do trabalho das fundações e empresas públicas que, nos últimos anos, vêm contribuindo com o desenvolvimento.
A instalação do Polo Petroquímico do Sul há 35 anos foi decorrente dos esforços conjuntos da FEE e da CIENTEC e, hoje, o complexo conta com seis empresas e aproximadamente 6.300 funcionários, gerando riquezas em produtos e serviços, bem como impostos.
Na indústria do carvão mineral, temos importantes contribuições da CIENTEC aos estudos para gaseificação do carvão mineral de Candiota e reutilização das cinzas da sua combustão na construção civil, e ainda o trabalho da CRM no desenvolvimento da planta de beneficiamento a seco, método que evita a geração e o lançamento de efluentes líquidos em nossos mananciais.
É preciso aproximar e fortalecer ainda mais essas instituições e suas competências específicas como resposta do estado e da sociedade gaúcha às demandas para o desenvolvimento.
É fundamental o engajamento destas estruturas nas políticas públicas, sob pena de implantar o Polo Carboquímico de maneira não sustentável, com viés exclusivamente comercial, deixando de lado o necessário projeto de retomada do crescimento do estado como um todo, seguindo as boas práticas para o desenvolvimento tecnológico sem viés político.
O SENGE continuará denunciando as consequências prejudiciais dessas medidas, que representam um grave ataque às fundações, empresas públicas e seus quadros técnicos, bem como à pesquisa e à tecnologia, impactando diretamente uma área que deveria ser incentivada como propulsora de desenvolvimento: a Engenharia.
 
 

Existe amor em São Paulo! Ou: a importância da microsolidariedade

Marília Veríssimo Veronese
Estive em São Paulo neste último fim de semana e, como sempre, me assustei com a brutal desigualdade, tão visível na capital paulista. Não que nas outras capitais não seja assim, mas a forma com que se mostra na metrópole paulistana sempre me choca. Muitos moradores de rua em situação de extrema miserabilidade ao lado de carros e lugares luxuosos e ostentatórios são uma visão, para mim, quase insuportável. Tudo aquilo que eu não aceito como natural me grita na cara e me ofende os olhos e a sensibilidade.
Nesta ocasião, eu e meu marido André precisamos comprar algumas coisas esquecidas e fomos até o supermercado Extra, na Av. Brigadeiro Luiz Antonio. Quando saíamos apressados, sacolas na mão, chuva caindo, sem guarda-chuva, André foi esperar o Uber na calçada, e ao passar vejo um homem, morador de rua, que chorava copiosamente abraçado ao seu fiel amigo cão, preto como ele, com olhar resignado perdido ao longe. Olhei pra eles e, entre lágrimas, o homem me pediu ajuda. Falei pra ele esperar um pouco que iria dar uma ajuda, corri para pegar minha bolsa que André levava a tiracolo, peguei 10 reais e voltei para alcançar a ele. Olhei-o nos olhos e as lágrimas lhe escorriam enquanto chorava um choro gemido, sentido, triste de cortar o coração, acariciando o cão como a se consolar da tristeza. Estendi o dinheiro, falei algumas palavras de esperança, acariciei o cão e me virei, pois o Uber tinha chegado e André já estava entrando no carro. Chovia e a umidade encharcava tudo ao redor. Virei as costas e caminhei sem olhar pra trás, me sentindo a escória do mundo. Tão pouco fazemos, tão pouco podemos. Contra essa indignidade cotidiana do sofrimento social, do sofrimento ético-político, étnico-racial, de classe, de gênero, do vergonhoso roubo de direitos e de dignidade humana básica, tão pouco… Nós, pesquisadores, manejamos os conceitos[1] na pesquisa participativa e etnográfica, mas em pouco eles auxiliam aqueles que inspiram sua formulação: as pessoas que choram na chuva, abraçados a seus cachorros, em situação de total abandono e desesperança.
Não é só uma questão socioeconômica, é uma questão filosófica que envolve nossa dignidade individual e coletiva. Não era pra ser assim, não pode ser aceito assim. Chorei no trajeto de volta ao hotelzinho simples que ficamos na rua Sílvia, pensando que aquelas acomodações que eu considerei ruins – para nosso padrão classe média – seriam um luxo para a dupla que eu acabara de deixar pra trás. O rapaz repetiu duas ou três vezes, “muito obrigado, moça, muito obrigado…”, e eu envergonhada não via razão alguma para ele me ser grato. Queria pedir-lhe desculpas, gritar perdão!, a angústia crescia e fomos dormir com imagens desoladoras da megalópole mais rica do país. Que não consegue proporcionar um mínimo de decência e dignidade a tantos de seus moradores. “Não existe amor em São Paulo”, pensava e sentia eu, dolorosamente, não conseguindo me esquecer deles… somos ligados às outras pessoas (ou a seres sencientes como os animais) por fios invisíveis, que são a matéria etérea dos vínculos sociais que conformam a humanidade enquanto comunidade e envolvem amor em diversos formatos. Os vínculos são a nossa essência. E não o egoísmo, como acreditam alguns equivocadamente[2].
No dia seguinte – desde os 15 anos de idade, quando li “E o vento levou…”,  a máxima da egoísta Scarlett O’hara me inspira, “amanhã é um outro dia!”, – seguimos a vida e fomos a feiras de rua, eventos artísticos, tivemos contato com uma incrível diversidade cultural e de modos de ser e estar no mundo, que talvez só as grandes cidades multiculturais abriguem. Ao cair da noite, caminhando na Av. Paulista tomada de gente, de todos os tipos e jeitos, uma quantidade imensa de casais gays em completa liberdade e carinho (em duas horas, provavelmente vi mais deles do que vejo em um ano inteiro em Porto Alegre), shows, performances, artesanato e brechós ao ar livre, comidas e bebidas sendo preparadas na rua, tempos e espaços híbridos em ritmos e interações alucinantes, de repente me chama a atenção um “acampamento” de moradores de rua, catadores de materiais recicláveis. Eram pilhas de papelão ao lado do carrinho de tração humana, gente em cima de cobertores simples e… um carrinho de supermercado com seis filhotinhos minúsculos de gato, irresistivelmente fofos, aninhadinhos em cima dos panos que forravam o carrinho.
Paramos para conversar com os catadores (nesse caso também moradores de rua) e me encantei com os gatinhos. Conversa vai, conversa vem, eu acarinhando os fofíssimos felinos, e o zeloso tutor da mãezinha dos filhotes, uma gata bonita, altiva, bem cuidada e com uma coleirinha charmosa, me conta que uma mulher na rua entregou a gata pra ele e não contou que estava prenhe. Ele levou na veterinária – nos explicou que tem ONGs com veterinárias voluntárias que ajudam os moradores de rua a cuidar de seus animais, – e quando ela foi castrar, descobriu a gravidez. Ele ficou assustado, pois não tinha como manter os gatinhos. A veterinária disse que precisavam mamar 45 dias e só então poderiam ser doados. Já comem sachê, estão com um mês. Alcancei um dinheiro e ele agradeceu, dizendo que ajudaria no sachê. O cuidado com os gatinhos e a mãe deles era comovente. Todos muito bem cuidados e saudáveis. Continua ele:
-“O pessoal da zoonose também ajuda, leva a gente de carro quando a coisa aperta. Preciso comprar sachê, e quando não tem dinheiro tenho de caminhar muito até uma petshop que ajuda a gente também, mas é longe. Aqui na rua o pessoal ajuda, doa ração. Mas preciso de sachê pra filhote, agora! Só tô ganhando ração seca de adulto! A veterinária vai castrar eles e aí vou poder doar os filhotes. Não posso ficar com eles, se tivesse casa, ficava… mas na rua não dá. Se tivesse uma casa… quem tem casa pode ficar com eles.” O mundo pra ele é assim, dividido entre quem tem e quem não tem casa.
No meio daquele caleidoscópio cultural de muitas tendências, sabores e saberes, cheiros, gostos, cores, afetos e desejos, carros, gentes, fogos de artifício (até isso teve!) e alucinante movimento, ali ficamos um bom tempo, conversando com o catador sob os olhares e acenos de cabeça de uma mulher e um idoso, integrantes do grupo. Que moram ali na Paulista, dormem sobre cobertores e sob marquises e contam com a ajuda preciosa de voluntários. De qualquer modo, me senti um pouco melhor depois daquela conversa. Consegui até pensar/sentir, ao saber da rede de auxílio que eles têm com seus gatos, que existe sim amor em São Paulo.
E uma ideia ficou me martelando na cabeça e ainda continua, por isso a compartilho com vocês, concordem ou não (pois a esquerda tende a desprezar o micro e valorizar o macro, no campo da ação social): a enorme importância da solidariedade miúda, cotidiana, face-a-face, micro social e micropolítica, em tempos de retrocessos dantescos como o que vivemos. Urge estender a mão para aqueles que nos rodeiam nas marquises da vida, na chuva que cai e gela corpo e alma, corpos humanos abraçados aos não humanos, por vezes os únicos que lhes dão calor e afeto incondicional. Nas ruas das megalópoles contemporâneas homens e mulheres sem dentes, sem banho diário e sem refeições decentes e certas, abraçam cães e gatos também desvalidos e soltos na vida. Se entendem. Se apoiam. Se somam.
Como país, saímos de aproximadamente dez anos de crença relativamente otimista na macro política. Apesar dos pesares, dos mensalões, das alianças com Jucás e Sarneys e Cabrais, o Brasil saía do mapa da fome da ONU; as universidades se pintavam um pouco mais de negro e pardo; a água chegava aos sertões nas cisternas (que agora Temer quer secar); os pobres (incluindo alunos meus com seus depoimentos comoventes) podiam cursar a universidade e ter direito à ascensão social. Eu me sentia pessoalmente mais digna com isso; mais humana, mais feliz, mais gente.
Quando tudo se esboroou rapidamente, em coisa de dois anos mais ou menos, e fomos assaltados por uma quadrilha de bandidos, saindo das tocas no legislativo, executivo e judiciário (este último aparelhado pelo conservadorismo de direita de uma forma acachapante), por movimentos de extrema direita que condenam exposições de arte ao mesmo tempo em que direitos sociais (os parcos que foram conquistados) são retirados diuturnamente, nos vemos sem chão. Deprimidos, atordoados, desesperançados. E é aí que se destaca a possibilidade que existe nas miudezas do cotidiano: a solidariedade que impede a morte por inanição e o suicídio existencial.
Destacam autores, nas ciências sociais, como os que sugeri acima, que somos seres de vínculos. E que isso é o que vem nos mantendo vivos por milênios. A solidariedade – relações sólidas, – nos pode salvar da desesperança. Pratiquemos, pois, as solidariedades anônimas, cotidianas, aparentemente pequenas, mas hoje soberbamente importantes.
Amigos que passarem pelo Extra da Av. Bigadeiro Luiz Anatonio em Sampa, levem ração pra cachorro, comida para o homem triste, palavras amistosas e quem sabe até um abraço. Não tenham medo das pessoas nas ruas. Elas conversam, apertam a mão, recebem doações, trabalham, dividem o pouco que têm, são honestas e inacreditavelmente resilientes. Pelo menos a grande maioria delas. A vida de muita gente, em tempos que minguam os salários, empregos, auxílios, renda mínima, pode depender disso. E ficamos todos mais gente, mais dignos, mais completos. Porque somos seres de vínculos; também capazes de egoísmo e indiferença em nosso potencial diverso, contraditório e ambíguo, mas que sem a solidez das relações sequer sobreviveriam nesse mundo.
Pessoal que andar pela Paulista nas imediações do MASP, levem sachês para gatos filhotes na bolsa. Nosso amigo catador tem mais 15 dias para alimentar os filhotes antes de poder oferecê-los pra doação. Quem sabe vocês até adotam um, depois desse tempo?
Quando forem ali, numa exposição de arte contemporânea, ao enfrentar a caterva pseudo-moralista que hoje grassa, uma forma possível de resistência será auxiliar àqueles que, do outro lado da rua, lutam para criar gatos saudáveis. Para vocês verem como as nossas vidas são ao mesmo tempo ridiculamente pequenas e algo grandiosas; nossa existência, comezinha, vertiginosamente rápida, insignificante, pode guardar alguma importância na sua trajetória frágil; nossos grandes projetos, coletivos e pessoais, a maioria sob constante ameaça de desagregação e morte, são contudo vitais, inadiáveis. As solidariedades, pequenas e grandes, tais como a vida humana. Micro, mas também macropolíticas: porque haveremos de, um dia, retomar as instituições e fazer desse país um lugar minimamente decente. Até lá, a vida nos pede coragem, muita luta e alguns sachês de filhote de gato na bolsa.
 
[1] Sofrimento ético político e sofrimento social, ver respectivamente: [MIURA, Paula; SAWAIA, Bader. Tornar-se catador: sofrimento ético-político e potência de ação. Psicologia & Sociedade, 2013, 25.]
[VICTORA, Ceres. Sofrimento social e a corporificação do mundo: contribuições a partir da Antropologia. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação & Inovação em Saúde, v. 5, n. 4, dec. 2011.]
[2] Sobre vínculos sociais, ver: GAIGER, Luiz. A descoberta dos vínculos sociais.  Os fundamentos da solidariedade. Ed. Unisinos, 2016.

O significado de devido processo legal

Ricardo Lewandowski*
O conceito de devido processo legal aparentemente anda um pouco esquecido entre nós, especialmente, nos últimos tempos. Cuida-se de uma das mais importantes garantias para defesa dos direitos e liberdades das pessoas, configurando um dos pilares do constitucionalismo moderno.
Tem origem na Magna Carta, de 1215, através da qual o rei João Sem Terra, da Inglaterra, foi obrigado a assegurar certas imunidades processuais aos seus súditos.
O parágrafo 39 desse importante documento, ainda hoje em vigor, estabelece que “nenhum homem livre será detido ou sujeito à prisão, ou privado de seus bens, ou colocado fora da lei, ou exilado, ou de qualquer modo molestado […] senão mediante um julgamento regular de seus pares ou em harmonia com a lei do país”.
Tais prerrogativas foram sistematicamente reconfirmadas pelos monarcas subsequentes, sendo a expressão, “lei do país”, substituída pela locução “devido processo legal”, em 1354, no Estatuto de Westminster.
Com isso, os direitos das pessoas passaram a ser assegurados não mais pela mera aplicação da lei, mas por meio da instauração de um processo levado a efeito segundo a lei.
De lá para cá, essa franquia incorporou-se às Cartas políticas da maioria das nações democráticas, constando do art. 5º, LIV, de nossa Constituição, com o seguinte teor: “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.”
Trata-se de uma moeda de duas faces. De um lado, quer dizer que é indispensável a instauração de um processo antes da restrição a quaisquer direitos.
De outro, significa que o processo precisa ser adequado, ou seja, não pode ser simulacro de procedimento, devendo assegurar, no mínimo, igualdade entre as partes, o contraditório e a ampla defesa.
O devido processo legal cresce em importância no âmbito penal, porque nele se coloca em jogo a liberdade que, depois da vida, é o bem mais precioso das pessoas.
Sim, porque o imenso poder persecutório do Estado, detentor monopolístico do direito de punir, só se submete a temperamentos quando observada essa garantia essencial.
Nunca é demais lembrar que o processo atualmente não é mais considerado meio de alcançar a punição de quem tenha infringido as leis penais, porém um instrumento de tutela jurídica dos acusados.
Mas não é só no plano formal que o devido processo legal encontra expressão. Não basta que os trâmites, as formalidades e os procedimentos, previamente explicitados em lei, sejam observados pelo julgador. É preciso também que, sob o aspecto material, certos princípios se vejam respeitados.
Nenhum valor teria para as partes um processo levado a efeito de forma mecânica ou burocrática, sem respeito aos seus direitos fundamentais, sobretudo os que decorrem diretamente da dignidade da pessoa humana, para cujo resguardo a prestação jurisdicional foi instituída.
O direito ao contraditório e à ampla defesa fica completamente esvaziado quando o processo judicial se aparta dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade ou do ideal de concretização do justo.
Com efeito, uma decisão que atente contra a racionalidade, a realidade factual ou os princípios gerais do direito universalmente reconhecidos, embora correta do ponto de vista procedimental, não se conforma ao devido processo legal substantivo.
Prisões provisórias que se projetam no tempo, denúncias baseadas apenas em delações de corréus, vazamentos seletivos de dados processuais, exposição de acusados ao escárnio popular, condenações a penas extravagantes, conduções coercitivas, buscas e apreensões ou detenções espalhafatosas indubitavelmente ofendem o devido processo legal em sua dimensão substantiva, configurando, ademais, inegável retrocesso civilizatório.
* Professor titular de teoria do Estado da Faculdade de Direito da USP e ministro do Supremo Tribunal Federal

Quando o Campeonato Brasileiro tinha graça

 EDUARDO MARETTI

Na era dos pontos corridos, é bom lembrar de quando o Campeonato Brasileiro tinha graça, já que hoje o Brasileirão não interessa a não ser para “se classificar para a Libertadores”.
Na época de ouro do boxe, era costume a gente (todo mundo) se referir a um grande combate como “a luta  do século”. No futebol, como no boxe, isso é discutível, claro. Depende do ponto de vista.
Mas não importa. O “jogo do século”  aconteceu no dia 15 de dezembro de 2002, no Morumbi, quando o Santos bateu o Corinthians por 3 a 2 e sagrou-se campeão brasileiro depois de 18 anos sem ganhar um título importante. Foi o último campeonato antes da era dos pontos corridos, iniciada em 2003.
Os melhores momentos do jogo, com a narração magistral (de rádio) do grande José Silvério:

Como disse um comentarista na época, aquilo “não foi um jogo de futebol, foi uma ópera”. Independentemente de eu ser santista, foi um dos maiores jogos de futebol que vi na vida. No caso, o maior, o “jogo do século”.
Estávamos lá, a família reunida, Carmem (também conhecida como Jacaré do Rio Claro ou Eminência Parda) e Gabriel. Vimos tudo do lado esquerdo do Santos no primeiro tempo e do lado direito no segundo. De maneira que testemunhamos Robinho fazer as jogadas do primeiro e do segundo gols mais de perto (“mais” porque o Morumbi é um estádio enorme e você não fica tão perto do campo como no maravilhoso Pacaembu ou na sagrada Vila Belmiro).
Também vimos o monstro Fábio Costa, com suas defesas monumentais, numa das mais incríveis atuações de goleiro que já vi. E olha que já vi Cejas e Rodolfo Rodrigues, só pra falar de santistas. A 1 (um) minuto de jogo, Fábio Costa, que veio da Bahia, já começava a mostrar que aquele título já estava escrito nas estrelas, como talvez dissesse Nelson Rodrigues. É só ver o vídeo.
***
Não publico aqui por efeméride nem nada parecido. É que postei esse vídeo acima no Facebook e resolvi registrar aqui porque em blog se registra mais definitivamente — no face, daqui a uma semana, ninguém acha mais (a fragmentação é deliberada) — e, afinal, tenho amigos que não têm conta na rede social.
O Santos podia até perder por um gol de diferença que seria campeão (porque ganhou o primeiro jogo de 2 a 0) e vencia por 1 a 0 até 30 do segundo tempo. Mas, quando a gente começava a timidamente querer comemorar (nunca se comemora uma vitória contra o Corinthians de antemão), eles empataram, aos 30, e viraram aos 39. Sofrimento, tensão extrema, taquicardia, até falta de ar. Mais um gol e aquele maravilhoso time de meninos de Emerson Leão perderia para a equipe de Carlos Alberto Parreira, um belo time de um grande técnico, diga-se.
Mas, 3 minutos e meio depois do segundo gol corintiano, Elano marcou o segundo do Peixe, aos 43. O gol do título. Elano saindo pra comemorar o gol e o título levantando a camisa e mostrando a imagem de Nossa Sra. Aparecida, a padroeira do Brasil. Ou seja, foi um gol mágico e espiritual para coroar um título mágico e espiritual. Só santista entende isso.
Estava 2 a 2. Eram 43 do segundo tempo e o Corinthians, o sempre terrível adversário, precisava então fazer dois gols em 4 minutos. Éramos campeões! Chorávamos na arquibancada.
O gol do título, talvez o maior gol que o maior ataque do mundo já fez (o Santos é o time que mais fez gols na história do futebol, com cerca de 12.400 gols). A jogada foi um desenho geométrico (pode conferir no vídeo), um triângulo (Elano-Robinho-Elano) para a antologia do futebol.
Elano seria, aliás, autor do gol do título brasileiro de 2004 também. Mas aí já era campeonato de pontos corridos, que os brasileiros resolveram copiar dos europeus para estragar nosso campeonato nacional, para regozijo da “crônica esportiva”, que até hoje bate palmas para essa estupidez.
* Digo que o campeonato de 2002 foi o último que teve graça porque foram raros os que, a partir da era dos pontos corridos (2003), emocionaram. Curiosamente, um dos únicos foi o de 2004, quando de novo o campeão foi o Santos, numa disputa que só terminou na última rodada, aos 45 do segundo tempo.
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As escalações da final de 2002:
Santos: Fábio Costa; Maurinho, André Luís, Alex e Léo; Paulo Almeida, Renato, Elano e Diego (Robert, depois Michel); Robinho e William (Alexandre). Técnico: Émerson Leão
Corinthians: Doni; Rogério, Anderson, Fábio Luciano e Kléber; Vampeta, Fabinho (Fabrício) e Renato (Marcinho); Gil, Deivid e Guilherme (Leandro). Técnico: Carlos Alberto Parreira
(Publicado originalmente no blog do autor)