Na primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), sob o comando de Gabriel Galípolo a taxa básica de juros, a Selic, foi elevada esta semana em um ponto percentual, para 13,25% ao ano. Galípolo foi indicado pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para substituir, na presidência do banco, Roberto Campos Neto, escolhido pelo governo Bolsonaro. Em nota, o Copom explica que a decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante…essa decisão também implica suavização das flutuações…” Uma ducha de água fria para quem esperava mudanças de rumo.
E a nota complementa: “Diante da continuidade do cenário adverso para a convergência da inflação, o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, um ajuste de mesma magnitude na próxima reunião. Para além da próxima reunião, o Comitê reforça que a magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerá da evolução da dinâmica da inflação”.
Sempre o argumento do “perigo” da inflação, que na verdade está muito abaixo das taxas de juros. Juros em elevação significam ainda maior concentração de renda, crédito caro para aumentar a produção e o consumo, crescimento da dívida pública e da pobreza, além de um processo de recessão econômica em andamento.
O neocolonialismo no século XXI não envolve ocupação militar direta, mas mantém a desigualdade global por meio de estratégias econômicas, políticas e culturais. Isso perpetua a dependência dos países do Sul Global em relação às potências ocidentais, tornando difícil a busca pela soberania real.
Lula disse à imprensa em entrevista coletiva que num país do tamanho do Brasil, o presidente do BC não pode dar um cavalo de pau de um dia para outro. “A alta dos juros já estava demarcada. Nós temos consciência que é preciso ter paciência. Eu tenho certeza de que o Galípolo irá entregar para o povo brasileiro uma taxa de juros menor. Tenho certeza de que ele vai entregar uma inflação mais baixa.”
Em entrevista à TV 247, o economista Guido Mantega, ministro da Fazenda nos dois mandatos do presidente Lula e no primeiro mandato da presidenta Dilma Rousseff, explicou a arapuca preparada para Galípolo por seu antecessor, que impossibilitou um cavalo de pau na primeira reunião. Para ele, houve uma “armação” de Campos Neto, ao longo de 2024, ao não tomar providência alguma para que houvesse uma certa tranquilidade no mercado, provocando um “terrorismo” econômico. “Ele fez de tudo para que o câmbio subisse, aceitando passivamente a pressão do mercado financeiro”, disse.
Segundo Mantega, se Campos Neto tivesse tomado providências quando o dólar estadunidense valia R$ 5,50 e começasse a atuar em sentido contrário, teria contido o câmbio. Campos Neto foi provocando uma desconfiança no mercado que o governo não estava cumprindo a meta fiscal. Não fez as operações de swap cambial, que tem como objetivo proteção contra variações excessivas da moeda estadunidense em relação ao real, além de liquidez ao mercado de câmbio doméstico.
A partir disso, inventou o novo ciclo de aumento de juros, com a Selic passando de 10,50% a.a., em julho, a 12, 25%, em dezembro de 2024. De fato, quando o real se desvaloriza e os juros aumentam o processo inflacionário é criado. A desvalorização cambial repercute de forma direta na inflação de alimentos e isso tira o sono de qualquer governo, o presidente perde popularidade e as mais recentes pesquisas mostraram isso.
A desvalorização do real foi forte. No início de 2024, o real estava R$ 5,00 por dólar, depois passou para R$ 6,20 e chegou a R$ 6,27. “Tiveram outras razões, mas não inflação de consumo, quando o Banco Central realmente deve agir”, completou Mantega.
Com o BC pagando aos bancos e grandes fortunas 13,25% ao ano como taxa básica pelos títulos púbicos, descontando a inflação do IPCA de 2024 de 4,83%, o ganho real do investidor é de 8,42 pontos percentuais. Como o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, um ajuste de mesma magnitude na próxima reunião, os ganhos dos rentistas se aproximam dos 10 pontos percentuais acima da inflação. Quem vai correr riscos e investir em produção no Brasil com um consumo interno nada animador, com grande parte da população vivendo da mão pra boca?
Com as atuais taxas básicas de juros, o ganho é tão extraordinário que está criando um certo constrangimento no mercado, que aconselha ao investidor não inventar muita moda e aplicar em papéis de renda fixa que acompanham o CDI (uma taxa que anda colada na Selic) e na própria Selic, os mais seguros, especialmente os isentos de Imposto de Renda. Para que inventar, não precisa.
Com as taxas de juros futuras a 15%, 16%, é óbvio que o dólar tende a se acomodar num nível mais baixo. O dólar se acalma não havendo más notícias para os rentistas, com total apoio da mídia corporativa e neocolonial. Quem não gosta de juros de 15% a.a. no CDI livre de imposto?
O preocupante é que nos últimos anos as decisões do Copom lembram um movimento de moto-contínuo. Durante o governo Bolsonaro a taxa Selic ficou em 13,75% a.a. de julho de 2022 até junho de 2023. Depois começou a baixar para 13,25% até 11,75% em dezembro de 2023 por causa das eleições presidenciais.
A partir de janeiro de 2024, o governo Lula continuou a redução da taxa Selic de 11,25% até 10,50% em agosto. Em setembro sobe para 10,75%, acaba o ano em 12,25% e janeiro de 2025 passa para 13,25%. Na próxima reunião deve chegar a 14,25%. Em algum momento o Galípolo deve começar a baixar, mas os números não devem mudar muito. O mercado agradece.