Governo Leite planeja pacote de concessões de pouco interesse

Nesta semana, a entrevista de Pedro Capeluppi, secretário estadual de Parcerias e Concessões do governo Eduardo Leite (PSDB), à repórter Taís Hirata, do jornal Valor Econômico, que estava em São Paulo, traz informações  preocupantes.  

Capeluppi,  mineiro de Ituiutaba, em janeiro de 2021 assumiu o cargo de Secretário Especial Adjunto de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes, no governo Bolsonaro e, em julho de 2022, tornou-se Secretário Especial. No ministério, os principais projetos dos quais participou foram o Marco Legal do Saneamento, a privatização da Eletrobras.

O governo  neoliberal de Eduardo Leite não abre mão de privatizar o que for possível e fazer Parcerias Público-Privadas (PPPs) no que restar. Como diz o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, o debate precisa ser deslocado das oposições binárias entre público e privado, mais ou menos Estado, para a dialógica, que consiste em construir uma reflexão sob forma de diálogo democrático, que questione a qualidade das políticas públicas. 

Desde o governo de Antônio Britto (1995/1999) as estatais gaúchas mais rentáveis  começaram a ser privatizadas, além das PPPs, e o estado continua endividado e cada vez mais perde importância política e econômica.  O novo pacote de concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs) do Rio Grande do Sul está raspando o tacho do que restou e prevê investimentos na ordem de R$ 11 bilhões, em um cálculo preliminar do governo estadual. A quase totalidade do valor das obras deverão vir de dois projetos rodoviários, em torno de R$ 10 bilhões de investimentos. Portanto, até o momento o restante das concessões projetadas soma somente R$ 1 bilhão.

As duas concessões de rodovias foram herdadas da gestão passada, que chegaram a ter licitação marcada, mas acabaram não atraindo interesse. O leilão do Bloco 2 inclui cerca de 400 km de estradas entre Erechim e Venâncio Aires. Já o Bloco 1 envolve 445 km de um trajeto de difícil compreensão, partindo do Balneário Pinhal,  no litoral, passando por Gravataí, na Região Metropolitana e subindo a serra até Gramado.

No setor de transportes, o plano é a concessão de dois aeroportos regionais, de Passo Fundo e Santo Ângelo. A previsão para publicação do edital é entre setembro e outubro deste ano.

O edital recém-publicado é de uma PPP para operar o presídio de Erechim. Este é outro projeto que chegou a ser lançado nos últimos anos, mas que também não teve sucesso.

Outra concessão de difícil solução é a do Cais Mauá, em Porto Alegre. Deve-se ressaltar a sua complexidade com uma discussão envolvendo o arrendamento que já perdura por mais de uma década, visto que a matéria implica na participação de diversos partícipes, tanto públicos, das esferas federal, estadual e municipal, como também da iniciativa privada e sociedade civil. O Ministério Público de Contas do RS acompanha o processo do Contrato de Arrendamento.

No caso de saúde, a ideia inicial é viabilizar a construção de um novo hospital, na região metropolitana de Porto Alegre. Em educação, o plano é formar um lote com cerca de cem escolas, para delegar a um parceiro privado a gestão da infraestrutura. O secretário informou que o estado ainda está definindo o escopo e fazendo o diagnóstico da situação atual. A definição de como os concessionários das PPPs terão retorno nas áreas de educação e saúde é complexa.

Finalmente, o governo Eduardo Leite projeta concessões no saneamento em cidades não atendidas pela Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan).  São cidades pequenas, com retorno menor, que provoca, muitas vezes, desinteresse do setor privado, sem envolver no negócio municípios economicamente mais fortes. 

Até mesmo a privatização da Corsan está emperrada. A expectativa da Aegea, empresa que arrematou a Corsan no leilão em dezembro de 2022, de assinar o contrato de compra e venda uma semana depois não aconteceu. O último obstáculo foi no dia 10 de abril passado, quando o desembargador federal do Trabalho Manuel Cid Jardon determinou que fica vedada provisoriamente, até a solução final da Ação Civil Pública, a realização de qualquer ato que envolva assinatura do contrato de compra e venda das ações detidas pelo Estado do Rio Grande do Sul no capital social da Corsan ou a efetiva transferência de tais ações ao adquirente.

Portanto, a constatação é que as concessões realmente vantajosas para os investidores já ocorreram e o que sobrou ou não provoca interesse ou têm complicações jurídicas.

Regime de Recuperação Fiscal

A tentativa do governo Eduardo Leite de viabilizar PPPs de pouco interesse dos investidores provavelmente tem a ver com as amarras criadas pelo Regime de Recuperação Fiscal (RRF) homologado ainda no governo Bolsonaro, com vigência entre 1º de julho de 2022 e 31 de dezembro de 2030. O Rio Grande do Sul, em 2023, voltou a pagar as dívidas suspensas por liminar do Supremo Tribunal Federal desde julho de 2017. Em troca, o governo gaúcho deve executar um programa de ajuste fiscal que prevê desestatizações e reformas para reduzir os gastos locais.

A contrapartida é que o RRF permitirá o congelamento de investimentos em educação, segurança, saúde, assistência e todas as demais áreas de atuação do poder público.  Pela primeira vez, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) foi construída com o conceito do Teto de Gastos aprovado pela Assembleia Legislativa em 2021 e que prevê que as despesas primárias empenhadas estarão limitadas à variação do IPCA por Poder e órgão autônomo até 2031.

Para complicar ainda mais as contas do Estado, em junho de 2022, o Congresso Nacional aprovou a Lei Complementar 194, reduzindo de 25% para 17%, no caso do RS, as alíquotas do ICMS de combustíveis, energia elétrica e comunicações. Com isso, as perdas estimadas de arrecadação para 2023 foram projetadas em torno de R$ 4,4 bilhões, em relação à previsão de receitas da Lei de Diretrizes Orçamentárias.