As mãos sujas

Paulo Timm
Economista
Outro dia li uma advertência de um analista dizendo que a esquerda brasileira devia ler mais Becket. : “Fracasse outra vez. Fracasse melhor!”
Prefiro recomendar Sartre, meio esquecido das gerações mais jovens mas que teve um papel fundamental na minha. Preconizava ele que não éramos apenas livres, mas seres condenados à liberdade, mas não uma liberdade vazia, uma liberdade irmã gêmea da responsabilidade. Esta ideia está muito bem ilustrada em sua peça AS MÃOS SUJAS, da qual retiro a citação abaixo. Mas aproveito para ilustrar o caso com a lembrança de um filme da Alemanha Oriental, cujo nome já não me lembro, que vi há muitas décadas. O filme retrata um campo de concentração, reduto último da barbárie humana. Nele, há a necessidade de haver alguém que organize o desespero e negocie com os nazis questões tanto cotidianas, como vitais, inclusive os escolhidos para o chuveiro da morte. Quem era este personagem? Um velho comunista. Ele, além de um homem livre e consciente, sabia que lhe cabia a dura responsabilidade do ofício que o destino lhe reservara. Sartre nos ajudou, com Malraux, mais do que os Manuais da URSS de Marxismo Leninimso, o que signficava SER COMUNISTA.
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Mãos sujas
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“Na peça de teatro “As mãos sujas”, Jean-Paul Sartre apresenta o choque entre as visões políticas pragmática e idealista. Hugo, jovem idealista, recebe ordem de seu partido para matar Hoederer, líder da mesma facção, considerado traidor dos ideais revolucionários, por ter feito conchavos com os adversários. Para cumprir sua missão, ele vai trabalhar como secretário de Hoederer. Porém, aproximando-se deste, passa a admirá-lo, embora discorde de sua estratégia política. A política, segundo Hugo, é uma ciência capaz de demonstrar que uma pessoa tem razão e que as outras se enganam. Para ele é inaceitável que um partido revolucionário chegue ao poder à custa de traficâncias, e que Hoederer se utilize do partido para fazer uma política colaboracionista, afrontando o programa partidário de implantação do socialismo por meio da luta de classes. O jovem, que não esconde sua opinião diante do chefe, ouve deste o seguinte”:

HOEDERER: (…) Como tu prezas a tua pureza, meu filho! Que medo que tens de sujar as mãos! Pois bem, fica puro! Quem é que aproveitará com isso, e porque é que vem então meter-te conosco? A pureza é uma ideia de faquir e de monge. Vocês, os intelectuais, os anarquistas, utilizam-na como um pretexto para não fazer nada. Não fazer nada, ficar imóvel, apertar os cotovelos ao corpo, usar luvas. Pois eu tenho as mãos sujas. Até aos cotovelos. Mergulhei-as na merda e no sangue. E depois? Imaginas que se pode governar inocentemente?

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