Cleber Dioni Tentardini
Os 780 hectares mais cobiçados da Região Metropolitana de Porto Alegre estarão em debate logo mais à noite na audiência pública da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa.
A questão central é a intenção do governo de repassar a concessão do Parque Zoológico à iniciativa privada e o desmembramento da Reserva Florestal Padre Balduíno Rambo.
O encontro também vai abordar o destino e guarda das coleções vivas e do material genético do Museu de Ciências Naturais e do Jardim Botânico de Porto Alegre, ambos vinculados à Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul (FZB), que foi extinta pelo governador José Ivo Sartori em janeiro deste ano.
A audiência foi proposta pela deputada Regina Becker (REDE), de atuação marcante em defesa dos animais. Do governo, foram convidados representantes das secretarias estaduais do Meio Ambiente, Casa Civil, Fazenda, além do governador José Ivo Sartori.
Os servidores da Fundação Zoobotânica, ongs ambientalistas, estudantes e comunidade em geral prometem lotar o Auditório Dante Barone, do Parlamento gaúcho.
Localizado em Sapucaia do Sul, quase divisa com São Leopoldo, o Parque Zoológico ocupa 160 hectares, com o espaço para os animais e prédios que abrigam as seções do Hospital Veterinário, de Nutrição, de Zoologia, de Manutenção e Conservação, o Centro de Triagem de Animais Silvestres (CETAS) e a área de visitação.
Os outros 620 hectares pertencem à reserva, que faz homenagem ao religioso e botânico gaúcho, autor do clássico A fisionomia do Rio Grande do Sul (1942). Parte da área da reserva chega às margens do Rio dos Sinos e protege a mata ciliar por mais de 10 quilômetros de extensão.
Inaugurado em maio de 1962 pelo governador Leonel Brizola, o Zoo é um dos oito maiores do Brasil em extensão e em número de espécies animais da América, Ásia, Europa, África e Oceania: ao todo, 1.024 espécimes (indivíduos), distribuídos em 125 espécies, sendo 51 mamíferos, 60 aves e 14 répteis. Não estão incluídos aí os animais em atendimento no Cetas.
Em 2016, o Zoo registrou 115 nascimentos, dentre eles animais ameaçados de extinção, como a anta, bugio-preto, bugio-ruivo, mico-leão-da-cara-dourada, entre outros. A fim de reduzir os custos de manutenção dos animais, o Zoológico dispõe de lavouras destinadas à produção de forragem que ultrapassou, em 2014, 365 toneladas/ano.
Naquele ano, as despesas com manutenção foram praticamente iguais às receitas, a partir de bilheterias e concessões. Os gastos foram de R$ 3,291 milhões e a arrecadação, de R$ 3,113 milhões.
A visitação em 2016 foi de 417.290 mil pagantes, neste total não estão incluídos aquelas entidades que possuem gratuidade.
O ingresso é acessível à população de baixa renda (R$ 10,00 para adulto e crianças até 5 anos não pagam, estudantes e idosos pagam metade. Carros pagam R$50,00, sendo que este valor inclui todos os ocupantes do veículo.
No início de 2015, o IBAMA, juntamente com o setor de fauna da Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, realizou uma vistoria e atestou a qualidade no tratamento destinado aos animais.
Um dos serviços mais solicitados do Zoo é o Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas), responsável pela manutenção, tratamento e destinação dos animais apreendidos em fiscalizações dos órgãos ambientais. No ano passado, o Cetas recebeu aproximadamente 1.000 animais em situação de risco, a grande maioria é vítima de tráfico, outros chegam até o Zoo machucados em decorrência de atropelamentos, choques elétricos, ataque de animais domésticos ou mesmo órfãos.
Área cobiçada por mais de 50 anos
A área do Zoológico pertencia à Companhia Geral de Indústrias e, em 1930, foi adquirida pelo Estado. Em 1934 o espaço foi consolidado como uma propriedade da antiga Viação Férrea do Rio Grande do Sul.
Mais de 25 anos depois, no dia 16 de março de 1957, foi promulgada pelo presidente Juscelino Kubitschek a Lei Federal nº 3.115 passando todos os bens da Viação Férrea para a União. Somente a área atual do Zoológico permaneceu sob domínio do Rio Grande do Sul.
No dia 27 de julho de 1959, João Caruso, secretário de Obras Públicas na ocasião, entregou um estudo contendo sugestões para criar um parque público. A partir de então, a responsabilidade da área ficou com a Comissão Estadual de Prédios Escolares (CEPE), sob a denominação de Grupos de Parques e Jardins. A sede era no próprio Horto Florestal.
Atualmente a Reserva Florestal tem vários problemas fundiários. Centenas de famílias moram ilegalmente em seu interior. Os funcionários da Zoobotânica temem que a especulação imobiliária acabe fatiando a reserva. A pressão para venda da área é histórica. Em 1957, a justificativa era pela necessidade de recursos para a execução do plano que previa a construção de mil escolas no RS. Em 2011, a área poderia viabilizar a expansão de um polo de tecnologia da Unisinos, a Tecnosinos, e, em 2015, levantou-se a hipótese de ter parte cedida a um congregado empresarial alemão, o Medical Valley, que reúne indústrias e centros de pesquisas na área biomédica, responsáveis por 43% da área de patentes na Alemanha.
Em 2015, uma comitiva do governo Sartori visitou a Alemanha e ouviu dos empresários a necessidade de uma área física para viabilidade logística do complexo empresarial e benefícios fiscais para as empresas deste chamado “Cluster de Tecnologias para Saúde”.
O diretor-executivo do Medical Valley, Tobias Zobel, retribuiu a visita no final de 2015. Durante palestra no Badesul, em Porto Alegre, disse que o plano de internacionalização da Medical Valley é criar uma rede de colaboração internacional entre Brasil, Estados Unidos e China. No caso do Brasil, o estado escolhido foi o Rio Grande do Sul. Os países atuarão em estreita cooperação no fomento da indústria e da pesquisa em saúde.
Audiência debate futuro do Zoológico e da área mais cobiçada da RMPA

Os bugios-ruivos tomando sol juntos para se aquecer/foto Caroliny Oliveira