A dívida do Rio Grande do Sul

Esses peritos contadores e analistas fiscais e suas incríveis tabelas….!!! Nas contas da Previdência só veem déficit, quando eu vejo enigmas.

Agora, pipocam notícias sobre a dívida dos Estados, mostrando o RS como o que está em pior situação, ferindo a Lei de Responsabilidade Fiscal ao ter compromissos superiores a duas vezes a sua receita. Inúmeros gráficos na TV Globo mostram o Estado como campeão dos gastos. – Uma irresponsabilidade política e fiscal dos gaúchos! repetem.
Uma coisa não dizem: Que o RS tem uma má performance na arrecadação do ICMS, comparativamente a outros Estados, fruto da falta de atenção e providências de sucessivas administrações.
Outra, que não falam: um Estado que investiu muito em educação, saúde e segurança no passado, obedecendo imperativos do bom governo, terá, necessariamente, uma folha de aposentados mais pesada no futuro do que aqueles que não o fizeram. No RS este futuro chegou e não há nenhuma compensação da União diante deste fato.
Por último, ninguém fala que a “monstruosa” dívida do RS é equivalente ao que o Estado transfere, anualmente, à União, pela arrecadação federal em seu território. Afinal, o Rio Grande é uma das maiores economias do país. Destes recursos, transferidos liquidamente, uma parte fica para a União, outra vai para os Fundos de Participação de Estados e dos Municípios, vindo, no caso dos Estados “mais pobres” a compor grande parte, muitas vezes superior a 50%, de suas receitas (consideradas próprias). Paradoxalmente, por isso, uma professora no Maranhão pode ganhar mais do que uma professora no RS.
Lá, os recursos transferidos “constitucionalmente” – fora os negociados – alimentarão a oligarquia política que usa o Estado como mecanismo de dominação política, refletindo-se, ademais, no papel dominante que acabam tendo no Congresso (e Administração) Federal, mercê dos critérios que os beneficiam no cálculo de representantes. Vitor Nunes Leal tem um clássico demonstrando como isso funciona: “Coronelismo, Enxada e Voto”.
A propósito. Não sou contra a função redistributiva promovida pela União dos Estados mais ricos para os mais pobres. Mas questiono duas coisas: 1. Os critérios que definem os montantes a serem transferidos de uns para outros; 2. A transferência direta de recursos fiscais líquidos para o caixa dos Estados receptores, como recursos próprios; estas transferências deveriam se destinar a Projetos específicos para infra estrutura física e social, preferencialmente através de Bancos Oficiais como CEF e BNDES que detém longa experiência nesta questão.
Ou seja, um dos problemas de Estados como o RS, malgrado os maus governos, está no Pacto Federativo tal como ele se constitui hoje, que o espolia fiscalmente para alimentar o coronelismo vigente em áreas com menor nível de desenvolvimento. Daí os “Renãs, “Collors” etc.
Entenderam…? Ou vamos ter que reeditar a Revolução de 30 para explicar tudo melhor…?

0 comentário em “A dívida do Rio Grande do Sul”

  1. Timm, a questão do pacto federativo é uma das mais relevantes para o RS e demais estados subnacionais. Na minha opinião, é imprescindível incluir no debate também o problema do aumento das despesas financeiros nos gastos públicos federais.
    No Memorando do socorro do FMI ao Brasil em 1998, o Governo Federal se comprometeu a exigir um forte ajuste fiscal dos estados para efetivar a renegociações das dívidas dos estados e grandes municípios. Com isso, os entes federados tiveram que cumprir os seguintes compromissos: corte de gastos com pessoal e investimentos públicos; aumento da arrecadação tributária; geração de resultado primário positivo; privatização de empresas e bancos públicos; proibição de captação de financiamentos; e retenção de receitas públicas em caso de inadimplência das parcelas da dívida. Além disso, os contratos com os estados, em vez de usar um indexador de preços público como IPCA, usou um privado, o IGP-Di da FGV, bem mais suscetível ao humor dos mercados financeiro e cambial.
    Mesmo com tudo isso, num exercício que eu fiz na minha tese de Doutorado, de 1998 a 2013, a estrutura financeira da dívida renegociada do RS foi especulativa em alguns meses e Ponzi em outros. Especulativa é quando as receitas são suficientes para pagar os juros e insuficientes para pagar a amortização ou parte dela; e Ponzi, as receitas não cobrem nem os juros.
    Enfim, a renegociação da dívida do RS, além submeter as finanças públicas gaúchas à lógica da financeirização federal, não tinha nenhuma cláusula que previa flexibilização em caso de crise. Nesse período, tivemos três grandes crises econômicas/financeiras (1998, 2008/2009 e 2015/2016) e duas grandes secas (2004-2005 e 2012). Pelo contrário, a renegociação da dívida do RS nega o papel indutor do estado em qualquer cenário.

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