Qual a razão da grande imprensa não apoiar claramente o Governo Temer se apoiou claramente o Golpe?

Daniel V. Sebastiani – Professor Fundação Liberato/NH
Em primeiro lugar é preciso destacar que os valores da grande imprensa são capitalistas/burgueses pelas razões a seguir:

  1. O proprietário de uma grande empresa é um capitalista, portanto a maior probabilidade é que pense como um capitalista, ou seja, ache que chegou a ficar rico pelos seus méritos ou da sua família, ache que é justo que a família passe esse patrimônio para ele, ache que as diferenças sociais e a miséria são tão naturais como a lei da gravidade e é ilusão tentar mudá-las, tenha medo de qualquer alteração social que ameace o seu patrimônio e a sua segurança, etc.;
  2. Além do mais, uma família como os Marinhos nunca teria tido todo o apoio do Governo, essencial para se tornarem um monopólio da comunicação, durante a Ditadura, se fosse uma família com ideias socialistas ou comunistas (!), isso vale para qualquer grande empresa do mundo capitalista, com ditadura ou não.

No entanto, ter e imprimir na sua empresa/imprensa, os valores burgueses, não implica, necessariamente, na mediocridade e no isolamento social. Pelo contrário, uma empresa de comunicação precisa ganhar espaço junto aos leitores “clientes”.
Isso não significa que a imprensa/empresa vá adotar uma linha de contradição com os interesses do proprietário, (nunca veremos a Globo atacar o monopólio da comunicação ou a excessiva riqueza da família Marinho, e, por analogia, qualquer princípio que atinja os interesses mais gerais da elite brasileira, à qual essa família pertence); mas significa que ela vai mediar seu interesse com a sua receptividade junto ao seu público de clientes essenciais.
O que é um cliente essencial? Ora, é aquele que é essencial a permanente capitalização da empresa.
E no Brasil quem é este cliente essencial da grande imprensa? A pergunta certa é: quem permite a capitalização permanente da imprensa/empresa?
Aquele que garante os anunciantes, que são os que, por sua vez, garantem o capital da grande imprensa/empresa: as camadas médias!
Os ricos são poucos, o mercado brasileiro não poderia sobreviver somente com eles: perceba que os anúncios na imprensa, raramente são de artigos de alto luxo. Não vai se gastar milhões para fazer propaganda, no meio da novela da Globo, por exemplo, de Ferraris ou Yates, mas sim de carros que a camada média pode comprar.
Os trabalhadores compram pouco de maior valor e, quando o fazem, seguem os padrões, (não do rico cujo mundo nem enxergam), mas das camadas médias.
Conclusão: há uma aliança intrínseca e profunda de interesses entre a grande imprensa/empresa, (propriedade dos ricos), e as camadas médias brasileiras.
Primeiro isso implica num profundo compromisso ideológico com o sudeste e sul do Brasil, onde se concentra o essencial da burguesia e das camadas médias.
Segundo, para proteger os interesses da burguesia, sobretudo rentista, ameaçados pelos governos populares em tempos de crise, a elite abriu mão de um dos meios tradicionais no Brasil, (desde o Getúlio de 1951-54), de atrair as camadas médias para o seu lado: a caça à corrupção endêmica e histórica do estado brasileiro que, desde as capitanias hereditárias, confunde o público e o privado, e que subsiste em um regime que prioriza a riqueza, como o capitalismo, gerador de corrupção dos EUA ao Japão, mas que se torna particularmente forte no Brasil, por várias razões históricas, como a citada.
O problema é que a grande corrupção beneficia essencialmente os ricos, que a usam para garantir seus interesses junto ao estado brasileiro e, subsidiariamente, aos integrantes das camadas médias que gerem o estado/carreiras de estado e se deixam corromper: políticos, militares (sobretudo na ditadura) e integrantes do judiciário.
Mas, a maioria das camadas médias nada ganha com a grande corrupção, (embora, de forma hipócrita, muitas vezes se beneficie da pequena, como evadir impostos, colar em provas, estacionar onde não pode, etc.).
Por isso, a camada média compra o discurso e a cruzada santa contra a corrupção com muita facilidade, o mesmo espírito que lhe faz desprezar o igualitarismo e o povo: uma profunda e calvinista ideia da realização pessoal pelo trabalho que, cientificamente, se mostra ridícula, falsa e base da mais abjeta hipocrisia. Mas isso eles não sabem ou reconhecem.
A grande imprensa/empresa usou e abusou deste fenômeno para atrair as camadas médias contra o Governo Dilma e da esquerda, em particular do PT.
O problema é que, ao contrário da Ditadura, que cerceava toda e qualquer informação, o que restou da democracia brasileira demonstra o óbvio: o Governo Temer e seus asseclas foram, são e serão filhos do tipo de política feito pela elite brasileira desde as capitanias hereditárias, ou seja, vinculadores do interesse particular com o do estado, ou seja, mais uma vez, corruptos.
Para a grande empresa/imprensa não é tão fácil simplesmente mudar o discurso, ainda mais em relação a uma camada social com elevado grau de escolarização e algum conhecimento e um mínimo de cultura, como são as camadas médias brasileiras, seus clientes essenciais.
Essa imprensa/empresa é obrigada a se distanciar do Temer, mais do que gostaria, e flertar com o Judiciário, mais do que gostaria. Quem acompanha a mídia e seus principais colunistas percebe o esforço em salvar o Projeto do Temer, não deixando desmerecer um com o outro, o que é difícil, e para reduzir o ímpeto fanático da “República do Paraná”, MP e judiciário, sem parecer conivente com aquilo que seus clientes cultuam, incentivados pela sua própria propaganda anterior.
Evidente, analisamos aqui um dos aspectos que compõe a complexa realidade. Há outros:

  • A deriva autoritária, que certos setores das classes dominantes gostariam de ampliar, e que se fortalece com a ação do Judiciário, do MP e da “República do Paraná”, que desmerecem a “política” e, por óbvia extensão, a democracia e, tão grave quanto, os interesses da soberania nacional;
  • Os particularismos de alguns políticos da direita de garantir mais espaços, talvez derrubando o PMDB;
  • A compreensão de setores da elite política e das classes dominantes de que é preciso ter um Governo Federal mais forte e ilibado politicamente para aprofundar as reformas contra os trabalhadores e a massa salarial;
  • A tentativa de deixar fragilizado o atual Governo para evitar que veleidades políticas ou eleitoralistas dos políticos não comprometam a força das reformas, etc.

O problema é que o Governo está fazendo o que as classes dominantes querem, mas está desgastado, e sendo desgastado pelos fanáticos do Paraná.
Eleger alguém, (menos queimado pela corrupção ou medidas impopulares), mas eleito pelo Congresso (!), daria mais legitimidade e/ou estabilidade para continuar as reformas anti-povo? Quais contradições gerará uma mudança de governo na elite política e na união direita-centro no Congresso?
Essas dúvidas devem ser as deles nesse momento. Veremos o que nos aguarda em 17.

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