O que muda no jornalismo com a entrada da CNN no Brasil

A entrada do grupo americano CNN  no Brasil, anunciada esta semana, vai redesenhar o mercado da informação no país, estabilizado há mais de meio século sob o domínio de seis grupos familiares, com a hegemonia absoluta da Rede Globo e suas afiliadas.
Se, além disso, o governo Jair Bolsonaro cumprir suas promessas de rever a distribuição das verbas federais, a mudança será grande. Se, além disso, acabar com a Bonificação por Volume, como prometeu o presidente, será uma revolução.
A Bonificaçao por Volume, o famoso BV, que regula a relação das agências de propaganda com os veículos, é o instrumento que promoveu a concentração nos meios de comunicação que hoje existe no Brasil. Uma mudança nessas regras atingiria em cheio a  Globo, escandalosamente beneficiada nesse esquema.
A CNN chega ao Brasil como marca licenciada para uma empresa brasileira, formada pelo empreiteiro Rubens Menin, fundador da Construtora MRV, que se uniu ao jornalista Douglas Tavolaro, diretor de jornalismo Rede  da Record.
Segundo nota divulgada, o novo “canal de notícias multiplataforma” será produzido “por brasileiros para brasileiros”. A CNN Brasil será lançada nacionalmente com redações em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Brasília e correspondentes no exterior.
“A CNN é um ícone global e a parceria com essa marca é o sonho de um jornalista se tornando realidade”, disse Tavolaro, que estava há 17 anos no grupo Record e é autor de uma biografia autorizada do bispo Edir Macedo.
Ele vai tocar a operação da CNN Brasil. “Nosso objetivo é contribuir para a democratização da informação no Brasil”, afirmou.
Com uma equipe de 400 jornalistas, a CNN Brasil estará disponível para assinantes da TV paga como um canal 24 horas e também com plataformas digitais.
Rubens Menin é dono da empreiteira mineira MRV, que se tornou a maior construtora de imóveis residenciais da América Latina, realizando projetos do  programa Minha Casa Minha Vida. No ano passado, foi considerado o ‘empresário do ano’.
A postura da CNN nos Estados Unidos, bastante crítica ao governo Trump, e o fato de  o dono da MRV ter feito muitas obras do Programa “Minha Casa, Minha Vida” em governos do PT, renderam especulações à direita: a emissora americana viria fazer oposição ao governo Bolsonaro.
O empresário Luciano Hang, das lojas Havan, bolsonarista de carteirinha, postou: “Mais uma tevê comunista no Brasil?”
O próprio filho do presidente, Flávio Bolsonaro,  questionou a vinda da nova concorrente para o Brasil, no momento em que se inicia um novo governo.
À esquerda, porém, muitos viram o oposto, baseados nas relações de Tavolaro com o bispo Macedo, apoiador de Bolsonaro, e nas manifestações recentes do empresário Rubens Menin.
No dia 5 de dezembro, por exemplo, em entrevista ao Correio Braziliense, ele declarou que a equipe econômica do atual governo é  “o sonho de consumo de qualquer brasileiro que entende minimamente do assunto”.
Elogiou a presença de os militares no primeiro escalão do poder e os filhos de Bolsonaro; “Eles apresentam comportamento 100% ético. Vamos parar de criticar”.
Em entrevista ao 247, Rubens Menin negou que a operação brasileira da CNN terá vínculo com Edir Macedo.
“Eu vinha conversando com diversos grupos de empresários e muita gente estava preocupada com a situação dos grupos de comunicação aqui no Brasil, com problemas financeiros. Isso é muito ruim”, disse o empresário.
“Através de amigos em comuns fui apresentado a esse projeto da CNN Brasil e achei que era hora de investir. Nosso objetivo é contribuir com a democratização da informação no Brasil. Um país com uma sociedade livre e desenvolvida só é construído com uma imprensa plural”, afirmou Menin.
Segundo o vice presidente de Vendas e Parcerias da CNN, Greg Breitchman, o acordo faz parte de uma estratégia global de expansão da CNN:
“Este anúncio é parte de uma estratégia global para trabalhar com parceiros que pensam da mesma maneira e que enxergam uma clara oportunidade para produtos e serviços de notícias locais da marca CNN”, disse ele.
A situação da Globo parece ser a mais vulnerável. É a que mais tem a perder com a redistribuição de verbas. Bolsonaro, desde a campanha eleitoral, vem dando demonstrações de que a Globo em seu governo o prestígio de outros tempos. E se forem mudadas as regras, com o fim do BV ela será atingida em cheio.
A Globo, apesar de apoiar as medidas econômicas do governo, como a reforma da Previdência, tem sido bastante crítica a Bolsonaro.
O capítulo mais recente foi o editorial do jornal O Globo contra o decreto que libera a posse de quatro armas de fogo para cada brasileiro. Para o jornal, a medida é “temerária” e uma “aposta enganosa”. “Difícil desmentir a relação entre mais armas e mais mortes”, defende o texto.
“Feliz em saber que 400 vagas para jornalistas serão abertas no mercado brasileiro com a chegada da CNN. Se o telejornalismo seguir os padrões de qualidade da informação, independência e imparcialidade, que são características da emissora norte-americana, teremos motivos para comemorar”, disse o jornalista Florestan Fernandes Júnior, um dos maiores críticos da Globo.
O projeto de ter um canal próprio no Brasil era antigo na CNN.

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