Lagoa da Conceição, símbolo da tragédia ambiental anunciada em Florianópolis

Lagoa da Conceição. Foto: Tomás Walper Ruas

DUDA HAMILTON*

Um dos mais conhecidos cartões postais de Florianópolis, a Lagoa da Conceição está se tornando também um símbolo do acelerado processo de degradação ambiental que atinge toda a Ilha de Santa Catarina e a parte continental da capital catarinense.

Em 2021, a barragem de uma Estação de Tratamento de Esgotos da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan) se rompeu, despejando milhões de litros de poluentes – esgoto sanitário – nas águas, nas dunas da lagoa, atingindo também casas e ruas. Foi uma tragédia anunciada.

No início de fevereiro, pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) divulgaram um estudo que detectou em suas águas altas concentrações
de 35 substâncias contaminantes, entre elas cafeína, cocaína, antibióticos e anti-inflamatórios.

Resultado: na quarta-feira, 19/02, a Assembleia Legislativa aprovou requerimento do deputado Marcos de Abreu, o Marquito, do PSOL, e a situação ambiental da Lagoa será debatida numa Audiência Pública, prevista para março.

Deputado Marquito (PSOL): “O maior crime ambiental da história de Florianópolis”.

O deputado, que é agrônomo e presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia, diz que a poluição das águas e das dunas da Lagoa da Conceição põe em risco não só a saúde dos moradores e turistas, mas também os mananciais que abastecem os aquíferos, garantindo água para a população. A Lagoa da Conceição tem de 19,7 km2 de extensão e no seu entorno vivem cerca de 15 mil pessoas, num dos mais antigos distritos da capital catarinense, criado por uma provisão régia em 1750.
O estudo que detectou a alta carga de contaminantes na Lagoa da Conceição faz parte do Programa de Recuperação Ambiental, imposto à Casan, empresa de
economia mista, responsável pela Estação de Tratamento em que ocorreu o acidente em 2021 na Lagoa, “o maior crime sócio-ambientel da história de Florianópolis, segundo o deputado Marquito .

A responsabilidade da pesquisa é da UFSC, em colaboração com o Ministério da Agricultura e Pecuária
(MAPA) e da Fundação de Amparo à Pesquisa, Tecnologia e Inovação de SC (Fapesc)
Segundo a assessoria de imprensa da Casan, o custo dos diferentes programas é de R$ 27 milhões. Deste total, pouco mais de R$ 10 milhões foram desembolsados
em indenizações de 78 processos concluídos e relacionados à tragédia de 2021, e cerca de R$ 2 milhões estão sendo aplicados em programas de apoio científico e
tecnológico junto à UFSC, como o que encontrou drogas lícitas e ilícitas em diferentes pontos da Lagoa.

Liderado pela professora Silvani Verruck, do departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos da UFSC, este estudo tem um custo de R$ 110 mil e deve ser
encerrado até dezembro deste ano. Em entrevista ao JÁ, a professora afirmou que a equipe ainda tem um grande desafio pela frente. “Vamos tentar remover este tipo de
contaminantes, já que os níveis encontrados são altos dentro de um contexto de química ambiental, embora baixos em termos de toxicidade”, explica.
Co-autor do trabalho, o dr. Rodrigo Hoff (MAPA), ressalta que serão necessários outros estudos na área de ecotoxicidade para avaliar o impacto destas concentrações na saúde humana e no meio ambiente. “É uma tarefa importante
para as próximas etapas”, alerta, acrescentando que agora, na segunda etapa das pesquisas, passam a usar um equipamento, já testado na cidade de São Lourenço
do Sul/RS, capaz de descontaminar a água utilizando um destilador solar, que tem o nome de REACQUA.
O deputado solicitante da audiência pública lembra que, em 2022, a Casan, como medida emergencial para evitar novos extravasamentos da Estação, passou a
bombear o efluente do reservatório para as dunas do Parque Natural Municipal da Lagoa da Conceição. Quatro anos depois do rompimento da estação de esgoto, os canos continuam lá e o problema ainda não foi solucionado.

Principais contaminantes encontrados na Lagoa
Na água: Benzolecgonina, Cafeína, Azeperol, Clindamicina, Piroxicam,
Sulfametoxazol, Dietilpropriona e Flunitrazepan
Nos sedimentos: Benzolecgonina, Cafeína, Piroxicam, Clindamicina, Alprazolam, Clonazepan, Cocaína e Dietilpropriona
No pescado: Nitrazepam, Nimesulida, Temazepan, Bezafibrato, Cocaína, Tramadol, Canabidiol e Codeína

Desastre ambiental
O desastre ambiental de 2021 ocorreu dentro do Parque Natural Municipal das Dunas da Lagoa da Conceição, uma área protegida com cerca de 700 hectares. O parque foi criado em 1988 com o objetivo de conter o avanço das construções irregulares sobre as dunas entre a Praia da Joaquina e a Lagoa, a área é composta de vastos campos de dunas, cobertas por diferentes tipos de vegetação do ambiente de restinga, e por uma extensa e complexa rede de lagoas e cursos de água.
O Parque tem importância ecológica e econômica, com o intenso turismo. E já foi comparado na campanha política do atual prefeito Topázio Neto, do PSD, aos lençois maranhenses.
Sob a responsabilidade da Casan, foi construída na área a Estação de Tratamento de Esgoto, que se rompeu em 25 de janeiro de 2021, invadindo ruas, como a Avenida
das Rendeiras, cerca de 100 casas e arrastando carros e motos até chegar na Lagoa da Conceição. A Casan instaurou uma Comissão de Sindicância para
apurar o acidente, mas em novembro de 2022, a Comissão decidiu pelo arquivamento da sindicância, sem apontar responsáveis pelo dano ambiental.
Grupo de pesquisadores da UFSC, que monitora os efeitos do rompimento da Lagoa, considera que 90% do volume da barragem chegou à Lagoa.

Sedimentos (areia) e matéria orgânica depositaram-se às margens, modificando a topografia do local.
*Especial para o Jornal JÁ

(O Jornal Já vai trazer outras notícias sobre o grave problema ambiental na Lagoa
da Conceição. Acompanhe por aqui).