Entrevista com Luiz Fernando Cirne Lima
POR Geraldo Hasse
Dificilmente se encontra no Brasil de hoje uma autoridade técnica tão qualificada quanto o ex-ministro Luiz Fernando Cirne Lima para falar sobre o cruzamento da agricultura de grãos com a criação de gado, um dos assuntos do momento no mundo dos negócios rurais.
Aos 81 anos, ele já doou a fazenda em Dom Pedrito (RS) para os filhos, mas continua trabalhando como consultor e palestrante em zootecnia – sua maior especialidade, desenvolvida desde meados dos anos 1950 como livre docente da Faculdade de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, primeiro cargo de uma carreira brilhante.
Com pouco mais de 30 anos, Cirne Lima foi o primeiro brasileiro a julgar bovinos de raça na Inglaterra, berço da genética que deu impulso à pecuária do sul da América.
Era presidente da poderosa Farsul em 1968 quando a Secretaria da Agricultura decidiu fazer a primeira Expointer em Esteio, abandonando o parque do Menino Deus, no centro de Porto Alegre, onde desde o início do século XX se realizavam as exposições da pecuária gaúcha.
Como ministro da Agricultura no período 1969/1973, assinou a lei da fundação da Embrapa, um dos vetores do boom da soja no Brasil.
Neste depoimento, Cirne Lima fala não apenas da história da Expointer, mas do futuro do agronegócio brasileiro. “Podemos dobrar nossa produção sem tocar na Amazônia”, diz ele, sintetizando a confiança no desempenho dos agricultores brasileiros.
“A EXPOINTER ESTÁ NUMA ENCRUZILHADA”
O senhor se lembra do início da Expointer?
CIRNE LIMA – A Expointer nasceu no fim da década de 60, quando as exposições estaduais do Rio Grande do Sul, que eram apenas feiras de gado, tornaram-se praticamente inviáveis diante das limitações do parque de exposições do bairro Menino Deus, em Porto Alegre. Havia ali quatro hectares da Secretaria da Agricultura. Era um parque muito bonito, muito bem conservado pelo governo do Estado. Os criadores faziam uma exposição de bom nível técnico em termos regionais, mas muito limitada em termos nacionais e diante dos países vizinhos, que historicamente nos forneciam reprodutores.
Como se deu a mudança?
CIRNE LIMA – A mudança ocorre depois que o primeiro brasileiro é convidado a julgar na Inglaterra e um grupo de criadores o acompanha para visitar a Royal Show…
Quem foi esse brasileiro?
CIRNE LIMA – Eu.
Quantos criadores gaúchos visitaram a exposição inglesa?
CIRNE LIMA – Uns 10 ou 12. Na volta ao Brasil, já havia um pensamento dominante: “Temos de sair do parque do Menino Deus e procurar um outro local”. O secretário da Agricultura era Luciano Machado, um bacharel em direito que havia sido um brilhante deputado federal. Ele era muito identificado com o setor agropecuário e acatou a mensagem trazida pelos visitantes da Royal Show. Isso significava uma mudança na própria concepção da exposição.
O que significa “mudança na concepção”?
CIRNE LIMA – No parque de Porto Alegre não se podia fazer mais do que uma exposição de animais. A Royal Show era uma feira de 55 hectares em que a pecuária ocupava apenas um segmento dessa enorme exposição, no centro geográfico da Inglaterra, perto da cidade natal de Shakespeare. A maior parte da área era para exposição de máquinas agrícolas e demonstração de tecnologias pecuárias e agrícolas.
O secretário Luciano Machado e uma comissão de produtores, uns três ou quatro, entre eles Dorval Ribeiro e Lauro Macedo, começaram a procurar um local e logo se fixaram numa propriedade da família Kroeff, em Esteio, junto à BR-116, defronte à refinaria Alberto Pasqualini, da Petrobras. Como era amigo da família Kroeff, não participei da negociação. Mas o parque de Esteio, com 141 hectares, é fruto do trabalho de Luciano Machado e do veterinário-sanitarista Evelino Arteche, então diretor de produção animal da Secretaria da Agricultura.
É verdade que muita gente foi contra a transferência da feira de Porto Alegre para Esteio?
CIRNE LIMA – A realização da primeira Expointer foi muito polêmica porque algumas pessoas consideravam que a mudança fora precipitada. Naquela época se achava que Esteio era longe demais. Alguns criadores se negaram a expor seus animais. É verdade que faltava concluir caminhos dentro do parque e havia pistas de exposição em situação precária, mas desde a primeira vez se fez ali uma exposição diferente, com muitas máquinas e estandes de tecnologia agrícola. E o fato é que a Expointer se transformou num grande sucesso, é uma das maiores do mundo, sem dúvida a maior da América do Sul, em amplitude. Se existem hoje no mundo cinco grandes centros de negócios agrícolas, a Expointer é uma delas. A Royal Show, que foi modelo, não se realiza mais no mesmo local por causa dos custos. Hoje na Inglaterra se realizam exposições menores no interior.
No momento o parque de Esteio está em crise existencial: ser ou não ser um grande recinto de exposições…
CIRNE LIMA – Hoje o parque de Esteio precisa encontrar um modelo para administrar esse espaço que, fora a Expointer, é pouco utilizado ao longo do ano. A Expointer dura dois fins de semana. Os outros eventos do correr do ano não utilizam toda a potencialidade do parque, que se tornou um patrimônio público pouco aproveitado.
Fala-se muito em parceria público-privada.
CIRNE LIMA – Não tem outro caminho senão esse. Tem que se achar uma vocação a fim de dinamizar o parque. Hoje já existem umas tentativas. Muitas associações de criadores têm sede ali durante o ano, mas isso é pouco para o tamanho da área, a infraestrutura de energia elétrica e fornecimento de água.
É uma “cidade” que fica vazia a maior parte do ano.
CIRNE LIMA – Tem-se que achar um modelo de gestão. A Associação dos Criadores de Cavalos Crioulos está fazendo um projeto de ter lá dentro uma pista coberta para utilizar mais vezes durante o ano. É um desafio. Até agora Esteio cumpriu largamente sua missão como difusor de tecnologia, mas está numa encruzilhada.
Apesar da crise existencial do parque, a Expointer continua batendo recordes todos os anos.
CIRNE LIMA – A Expointer é muito representativa do momento que vive o agronegócio como um todo. A exposição de máquinas agrícolas de Esteio é um verdadeiro “salão do automóvel” da maquinaria agrícola do Brasil. Ainda que tenhamos em Não-Me-Toque uma exposição excepcional de tecnologia e de máquinas agrícolas, a Expointer é a grande feira brasileira de lançamentos de máquinas, novos modelos etc.
O fato de estar dentro da Grande Porto Alegre é uma vantagem?
CIRNE LIMA – Historicamente, para o então chamado setor produtivo, a Expointer tinha um objetivo subliminar – servir como um ponto de encontro cidade-campo. Em 1970, a população brasileira estava distribuída meio a meio no campo e nas cidades, mas não havia uma integração, principalmente no aspecto psicológico. O citadino enxergava o rural como um elemento menos qualificado, menos educado etc.
JUNTO COM A EXPOINTER, OCORREU A ASCENSÃO DA SOJA
O senhor acha que houve uma integração cidade-campo?
CIRNE LIMA – O objetivo subliminar foi alcançado. No início a Expointer era visitada apenas pelas populações próximas de Esteio. Em seguida ela passou a ser visitada pela população de todo o Rio Grande. Hoje vêm ônibus de regiões longínquas que viajam 500 quilômetros para passar um dia no parque de Esteio. Num sábado ou domingo de sol entram na Expointer 150 mil pessoas. A Expointer contribuiu para uma melhor compreensão entre esses dois segmentos sociais. Hoje a população que trabalha na terra é altamente minoritária, mas a aproximação se fez de maneira mais fácil e, sentimentalmente, mais favorável, mais simpática. Hoje se pode dizer que o citadino brasileiro é simpático ao homem rural. No máximo é indiferente, mas antagonismo ou antipatia…não vejo mais. Há 50 anos não era bem assim. A própria literatura tratava o homem rural pejorativamente.
Por coincidência, no início do parque de Esteio, a soja ensaiava sua expansão no Rio Grande do Sul.
CIRNE LIMA – No início dos anos 1950, quando me formei agrônomo, a soja era uma mera curiosidade para os estudantes. Naquela época a população consumia gordura animal. Havia um pouco de óleos vegetais – o linho incentivado pela indústria Renner e um pouco de girassol na região de São Borja e Itaqui, no oeste gaúcho. A substituição da gordura animal pelos óleos vegetais provocou uma revolução na suinocultura, que derivou para o porco-carne. Em 1970, a soja mal alcançava uma produção anual de um milhão e meio de toneladas, a maior parte no Rio Grande do Sul, mas já começava a se tornar uma lavoura industrial que se expandiria do sul do Brasil até o extremo norte. Aliás, dentro dessa revolução temos de colocar como geradora de tecnologia a Embrapa, fundada em 25 de abril de 1973.
Este ano a produção de soja chegou a quase 90 milhões de toneladas. Qual pode ser o teto para a expansão dessa lavoura?
CIRNE LIMA – Eu tenho dito que a soja está constituindo para o Brasil o mesmo que o milho foi para os Estados Unidos, mas a lavoura de soja não deve ser encarada isoladamente. Hoje é importante considerá-la ao lado do milho e do algodão como parte da integração lavoura-pecuária, que é a coisa mais importante hoje no agronegócio brasileiro.
Por que a integração lavoura-pecuária é tão importante?
CIRNE LIMA – Nós temos um rebanho bovino estimado em 190 milhões de cabeça e que utiliza uma área de 190 milhões de hectares, mas nossa pecuária não precisa dessa área toda. Talvez com a metade disso podemos manter nosso rebanho de forma produtiva. Naturalmente, a área dispensada pela pecuária poderá ser usada pela agricultura, que está concentrada em 72 milhões de hectares – 55 milhões de hectares de culturas anuais e 17 milhões de hectares de culturas permanentes. Os quase 90 milhões de toneladas de soja saem dessa área de lavouras anuais. Fora isso, ainda falta incorporar ao processo produtivo 70 milhões de hectares não utilizados nem para pastos nem para lavouras. São áreas espalhadas por todo o país e com problemas de uso, como encostas etc., mas parte disso pode virar produtiva. Hoje o incremento da produção de soja, milho e algodão está ocorrendo em áreas de pastagens degradadas. Dos 190 milhões de hectares de pastagens, 30 milhões são degradadas. A implantação de lavouras é barata, basta usar fertilizantes. É assim que podemos dobrar a produção do nosso agronegócio.
Sem tocar na Amazônia?
CIRNE LIMA – Na Amazônia tem 400 milhões de hectares que não precisam ser tocados. A ideia do desmatamento zero não é unânime no meio rural, mas tende a se tornar dominante.
Mas na Amazônia temos uma pecuária implantada com incentivos fiscais do governo…
CIRNE LIMA – O que aconteceu na Amazônia nos anos 60 e 70 tem que ser pensado de acordo com o pensamento de Ortega Y Gasset – “o homem e sua circunstância”. Naquele tempo, havia uma campanha para transformar a Amazônia em território internacional, patrimônio da humanidade… A reação brasileira foi grande, nasceu o projeto militar de estabelecer uma mínima ocupação humana da região e uma série de outras coisas, inclusive o Projeto Radam, que descobriu campos de aviação clandestinos etc. Nessa esteira foi feito um desmatamento irregular, nocivo e lamentável. A pecuária na Amazônia foi implantada de forma desordenada, mas do ponto de vista de política pública era impossível fazer diferente.
No cerrado a ocupação agrícola também foi feita de maneira predatória.
CIRNE LIMA – Na floresta amazônica houve abusos e os solos foram degradados porque os projetos eram menos tecnificados. No cerrado, os solos foram melhorados pela agricultura. A integração gado-soja é tremendamente importante. A soja faz uma rotação extraordinária.
O senhor considera positiva a entrada da soja em áreas de arroz do Rio Grande do Sul?
CIRNE LIMA – Eu como agrônomo não tenho vergonha de dizer que ainda não sei plantar soja. Na minha fazenda, que já passei para os filhos, produzimos 40 a 50 sacas de soja por hectare em terras de coxilha. Em terras baixas ainda não temos a tecnologia adequada, mas a Embrapa de Pelotas está mergulhada nisso. A gente precisa escolher a variedade certa, plantar na época correta, corrigir o solo… Há pouco fui dar uma palestra para agricultores em Santa Rosa, o berço da soja no Brasil. Na conversa depois do almoço, perguntei qual a expectativa deles para o rendimento da soja. Um produtor disse que um agrônomo que produza menos de 70 sacas por hectare baixa a cabeça pra não passar vergonha. Esse mesmo produtor disse que a meta em Santa Rosa é chegar a 100 sacas por hectare ou, seja, 6 mil quilos.
Isso é o dobro da média regional.
CIRNE LIMA – No oeste do Mato Grosso, onde chove muito bem, estão colhendo 60 sacas por hectare, o que é mais do que se produz em Illinois e Iowa. Mas não podemos esquecer que os Estados Unidos produzem 330 milhões de toneladas de milho. Ou, seja, só de milho produzem quase o dobro do que o Brasil produz de grãos. E um terço do milho americano é usado para fazer etanol. Enfim, o Brasil se consolida como a segunda maior produção do mundo e tem áreas a incorporar ao processo produtivo. Todo isso sem tocar no bioma amazônico.
O Brasil não se tornou por demais dependente da soja?
CIRNE LIMA – De 180 milhões de toneladas de grãos que produzimos, 90 milhões são de soja. Sim, mais de 50% do valor é soja. Mas não vejo riscos. A mesma coisa acontece nos EUA, com o milho. A China, nosso grande mercado para soja, tem optado por produzir mais milho do que soja. Todos os programas de governo da China seguem anunciando compras de 10, 20, 30 milhões de toneladas por ano de soja. Os chineses não querem ficar dependentes dos EUA em milho. Em relação à China, acho que o Brasil tem 10 a 20 anos de tranquilidade. Se você considerar que todo ano 30 milhões de chineses entram no mercado consumidor, não há dúvida de que a soja brasileira vai continuar sendo comprada.
O Brasil vai continuar avançando na exportação de carne?
CIRNE LIMA – O Brasil é o maior exportador do mundo. Vende para 130 países. Conquistamos mercado vendendo carne barata mas estamos nos preparando para exportar carne mais cara. Em 1970 o rebanho brasileiro era de 80/90 milhões de cabeças. Chegamos a 190 milhões de cabeças graças a três elementos. Primeiro, a capacidade desbravadora do criador brasileiro. Segundo, os capins do gênero brachiaria tremendamente adaptados a quase todas as latitudes brasileiras. Terceiro, a raça bovina nelore, que se adaptou ao clima brasileiro e cruzou bem com todas as raças existentes no Brasil. O gado pé duro do Brasil Central ao norte, cruzado com o nelore, em duas gerações passou a produzir carne de boa qualidade.
Nesse contexto, qual o papel da pecuária do Sul?
CIRNE LIMA – O Rio Grande do Sul é uma região subtemperada dentro de um país tropical e se especializou em produzir uma carne diferenciada. Trabalhar sob extremos climáticos oferece dificuldades, mas o produtor gaúcho tem conseguido desenvolver coisas próprias como o trigo, a maçã, carnes, laticínios e a integração lavoura-pecuária, que começou no Rio Grande e virou um modelo para todo o Brasil. A experiência do Rio Grande do Sul mostra o quanto é importante a diversidade genética para produzir carne de boa qualidade. Veja o que aconteceu com as galinhas. Nos aviários industriais não se cria mais uma raça definida e, sim, o resultado de cruzamentos genéticos altamente sofisticados. Hoje você importa ovos de avós dos elementos produtivos. Nesses cruzamentos entram raças como a nossa carijó, nome nacional de uma raça inglesa chamado Plymouth Rock Barrach. A carijó tem alguns gens que fazem parte de um segredo comercial da avicultura. Quando a Embrapa foi fundada, um frango comia 4,5 quilos de ração para engordar um quilo. Hoje tem frango que come 1,1 kg para engordar um quilo. O progresso que houve nisso é uma coisa extraordinária. Nas raças bovinas é a mesma coisa.
PELA PRIMEIRA VEZ O ANGUS VENDEU MAIS SÊMEN DO QUE O NELORE
Mas como se explica o recente sucesso comercial da raça angus?
CIRNE LIMA – A explicação para o sucesso da raça aberdeen angus está no esforço brasileiro para deixar de vender carne barata e vender carne mais cara. No ano passado pela primeira vez no Brasil o angus passou o nelore em venda de sêmen. É quase inacreditável. Há dez anos atrás ninguém seria capaz de imaginar isso. As raças angus, devon e hereford predominam nos cruzamentos que buscam carne mais macia. Mas, das raças inglesas, o angus é especializado em produção de carne de alta qualidade. Ele não tem o tamanho do hereford, a conformação perfeita do shortorn, não tem a velocidade de crescimento do charolês. Mas a qualidade de carcaça é o apanágio do angus, que levou 100 anos para chegar nisso.
Há quem diga que é mais um fenômeno de marketing.
CIRNE LIMA – Os pioneiros do angus pareciam visionários há 50 ou 60 anos, quando eu comecei minha vida profissional. Eles diziam que um dia o angus teria qualidade de carne e ia vender bem. Hoje já existem preços diferenciados para essas carcaças – cruza angus, cruza devon, cruza hereford.
O que aconteceu no Brasil com aquela beleza – o shortHorn?
CIRNE LIMA – É o mais perfeito, na conformação, mas é pouco rústico, acumula muita gordura, não tem a fertilidade dos outros…
E por que o charolês saiu de moda?
CIRNE LIMA – O charolês tem velocidade de crescimento e peso vivo. Não acumula gordura. Sua carne seca não dá bom assado de grelha ou de fritura. A carne de charolês é boa pra caçarola, especialidade da cozinha francesa.
Mas o charolês esteve na moda no Rio Grande do Sul…
CIRNE LIMA – Houve um momento em que o charolês vendia mais do que o angus para cruzar com o nelore. Na década de 70, sem dúvida. Naquela ocasião se queria carne e tamanho. Hoje se quer qualidade de carne para vender por preço melhor. O charolês está esquecido, mas vamos matar tudo que é gado branco? Nada disso, é uma genética para dar tamanho que, amanhã ou depois, pode ser útil.
É verdade que a vaca charolesa tem maior dificuldade para parir?
CIRNE LIMA – Sim, por causa do tamanho dos filhotes, por isso é preciso selecionar animais de cabeça pequena para não dar problema de parto. No Mato Grosso do norte, aquelas criações de 10 mil vacas no pasto…Imagine ter de atender vaca, puxar bezerro. Impossível. Aqui no Rio Grande do Sul, numa fazenda de 30 vacas, o proprietário vai lá e puxa o bezerro, mas lá em cima morrem a vaca e a cria, não é? Como zootecnista, digo que o charolês tem que ser conservado porque pode ser necessário. Porque décadas atrás o angus estava numa situação muito pior do que o charolês hoje. Muito pior. O angus parecia um deleite de meia dúzia de fazendeiros ricos que criavam aqueles animais apostando que um dia haveria remuneração por qualidade de carne. E houve.
LEMBRETE HISTÓRICO
LF Cirne Lima
“A pecuária brasileira começa em 1532 com a introdução por Martim Afonso de Souza das primeiras cabeças de gado trazidas de Portugal para a capitania de São Vicente, de onde Álvaro Nunez Cabeza de Vaca difunde o gado para o interior do continente. No Rio Grande do Sul a pecuária começa com os jesuítas em 1632. Os padres Cristóvão Jacques e Pedro Mendonça atravessam gado vicentino da Argentina para as Missões. A pecuária se expande graças às boas condições mesológicas da metade sul do Rio Grande do Sul e se espalha por esse território que vai até as margens do Prata, hoje o Uruguai. As lutas fronteiriças tinham por objetivo o gado, que era o alimento para as tropas. Daí a noção de que muitos dos nossos guerreiros eram ladrões de gado. Na verdade o gado era o grande produto econômico da região. E os cavalos eram armas de guerra, máquinas vivas. Cavalos e gado são os móveis da Expointer.”
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Agronegócio exportará mais de US$ 100 bilhões em 2012
O ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro Filho, disse hoje (10) que o agronegócio brasileiro deve exportar, em 2012, mais de US$ 100 bilhões em produtos.
“Para chegar a US$ 100 bilhões precisamos apenas de um crescimento de 5,7% das exportações, que é um número que temos como alcançar”, disse o ministro ao se referir aos US$ 94,6 bilhões vendidos para outros países no ano passado.
O resultado de 2011 é o melhor desde 1997 – quando iniciou o registro da série histórica – e supera em 24% o alcançado em 2010, quando foram vendidos US$ 76,4 bilhões em produtos agropecuários.
Os complexos soja, sucroalcooleiro e carnes fizeram as maiores contribuições para o crescimento das vendas. Os principais destinos foram a União Europeia, China, os Estados Unidos, a Rússia e o Japão.
Brasil precisa de consolidação das leis ambientais
Geraldo Hasse
Se tivesse autoridade para orientar o debate sobre a reforma do Código Florestal, eu obrigaria todas as instâncias governamentais a promover o cruzamento do tema florestal com a política agrícola, a gestão das águas, o uso das propriedades rurais e assuntos correlatos, entre eles a reforma agrária, “esquecida” pelo governo em respeito ao zelo patrimonialista dos provedores do Agronegócio.
Tudo que diz respeito ao Código Florestal e assuntos afins deveria ser juntado numa espécie de Consolidação das Leis Ambientais, tendo por objetivo e referência a sustentabilidade de cada bioma ou ecossistema. Isso ainda é possível pois o projeto do novo Código Florestal vai ficar no Senado por cerca de quatro meses, durante os quais passará por três comissões (meio ambiente, agricultura e constituição-e-justiça). É provável que a votação final ocorra apenas na primeira quinzena de dezembro, isso se os senadores não empurrarem o desfecho final para o primeiro semestre de 2012.
Na real, é bom que se estique o prazo para discussão, pois a urgência em mudar o Código Florestal atende exclusivamente à ânsia empreendedora dos senhores rurais associados aos segmentos industriais e comerciais situados a jusante e a montante de lavouras e criações.
Essa correria capitaneada pela senadora “faca-na-bota” Kátia Abreu virou um deus-nos-acuda que desvia a atenção de outros problemas intocados nas áreas agrícola e ambiental. Entre eles destacam-se a poluição dos cursos d’água por venenos agrícolas, dejetos industriais e esgotos domésticos. Além de licença para desmatar, os agronegociantes querem liberdade para plantar sementes transgênicas e aplicar impunemente nas lavouras produtos tóxicos que contaminam até os aquíferos subterrâneos.
Ao focar apenas o manejo da vegetação, esquece-se deliberadamente que toda floresta, pequena ou ampla, rala ou densa, é um manancial de água.
Tendo por base a última versão do código, que dispensa de recuperação vastas áreas desmatadas, um recente estudo do IPEA concluiu que haverá um aumento de áreas degradadas e do passivo ambiental. Segundo o estudo do IPEA, a área isenta de preservação chegaria a 79 milhões de hectares, mais do que a área ocupada por lavouras no país (60 milhões de hectares).
Se permanecer tal como foi aprovado em 24 de maio pela Câmara dos Deputados, o novo Código Florestal vai permitir a manutenção de atividades agrossilvopastoris, de ecoturismo e de turismo rural nas áreas de preservação permanente (APPs) desmatadas até 22 de julho de 2008. Entre outras alterações, a nova lei retira a proteção de topos de morros, restingas e altitudes inferiores a 1.800 metros. Além disso, admite culturas lenhosas perenes (árvores madeireiras), atividades florestais e de pastoreio nas APPs de topo de morro, encostas e de altitudes elevadas (acima de 1.800 metros). Em manguezais com função ecológica já comprometida, o texto permite a urbanização e a regularização fundiária.
“A manutenção de plantios e pastagens em áreas de APPs é absurda, pois significa eternizar o dano ambiental provocado”, disse ao Jornal da USP o professor de botânica Sergius Gandolfi, da Escola Superior de Agricultura de Piracicaba. Para ele, está se garantindo assim o assoreamento dos rios, lagos, açudes e represas com o sedimento produzido pela erosão das áreas de agricultura e pecuária.
Outra mudança importante é a redução pela metade (de 30 para 15 metros) da obrigação de se manter a vegetação original nas margens de cursos d’água de até 10 metros de largura, que constituem a grande maioria (90%) dos rios. “Isso significa colocar áreas agrícolas mais próximas dos rios e assim aumentar o seu assoreamento”, afirma Gandolfi.
Outro professor, Marcos Vinícius Folegatti, recomenda a adoção do conceito de bacia hidrográfica e a observação dos ciclos hidrológicos em cada região, sem o que a nova lei continuará sendo uma ameaça ao meio ambiente. O conceito de bacia hidrográfica foi introduzido originalmente no Paraná nos anos 1980 por técnicos franceses, iniciando uma revolução que se espalhou por algumas regiões do país graças à adesão de técnicos do governo. Não há uma palavra sobre bacia hidrográfica em quaisquer dos códigos florestais, novo ou velho.
É consenso que o atual Código Florestal, criado em 1965, não conseguiu preservar nem recuperar áreas degradadas, já que prevalece entre a maioria dos brasileiros a noção de que a preservação ambiental prejudica os agricultores. Com seu novo formato feito às pressas para atender aos anseios do Agronegócio, o código de 2011 tende a intensificar o modelo tradicional de ocupação do solo.
Nas próximas décadas, ocupando principalmente áreas de pastagens degradadas (ex-florestas), as lavouras brasileiras tendem a ocupar 100 milhões de hectares, 10% dos quais irrigados. Se essa expansão não for feita sob uma legislação ambiental mais arejada, com certeza se aumentará o grau de insustentabilidade da nossa agricultura e, por extensão, do modo de vida de toda a sociedade brasileira. Por isso é necessário consolidar um conjunto de leis ambientais capaz de sepultar o modelo de terra arrasada.
Brasil ignora perigos de agrotóxicos proibidos na Europa por mortandade de abelhas
Mariano Senna da Costa | Ambiente JÁ
Colaborou Carlos Matsubara
A guerra não declarada entre apicultores e gigantes dos agrotóxicos na Europa teve mais um round semana passada. Na quinta-feira (18/09), o Ministério da Saúde da Itália suspendeu a licença de quatro substâncias (Clotianidina, Imidaclopride, Tiametoxam e Fipronil) presentes em inseticidas para plantações de milho, colza e girassol. Elas são apontadas pela Federação Italiana de Apicultura como responsáveis pela morte em massa de abelhas verificada no início do ano.
As três primeiras pertencem ao mesmo grupo químico. O dos neonicotinóides, originados da molécula de nicotina. Foram desenvolvidos na década de 70 e considerados uma revolução, pois são biodegradáveis e menos tóxicos que outros para indicações similares. Entre agricultores, se apresentam mais notoriamente como os inseticidas “Poncho”, “Gaucho” e “Adante”.
Já Fipronil é o princípio ativo de uma vasta gama de pesticidas usados contra formigas, cupins, pulgas e até baratas. Comercialmente é encontrado com o nome “Regent”, “Termidor”, “MaxForce”, ou “Frontline”, entre outros.
Os quatro têm grande importância para três dos maiores fabricantes de agrotóxicos do mundo, BASF (Fipronil), Syngenta (Tametoxam) e Bayer (Clotianidina e Imidaclopride). As empresas não informam o faturamento por produto, mas sabe-se que só o Gaucho, feito à base de Imidacloripride, é vendido em 120 países, rendendo 600 milhões de Euros/ano para a Bayer CropScience, braço agroquímico da holding. Mas o aspecto econômico parece não fazer parte do conjunto de fatos, contradições e omissões que justificaram a decisão das autoridades italianas.
Incidentes
Não se trata de novidade. Em maio, o Poncho, também da Bayer CropScience, mas tendo Clotianidina como princípio ativo, provocou o colapso de mais de 11 mil colméias em pelo menos dois estados no Sul da Alemanha, sendo “suspenso” imediatamente pelo governo. A fabricante bota a culpa nos agricultores, alegando “erro na aplicação”.
Por ser um inseticida de “ação lenta”, a Clotianidina tem um efeito nefasto sobre as comunidades de insetos. As abelhas, por exemplo, não morrem de imediato ao entrarem em contato com a substância. Os indivíduos intoxicados conseguem, na maioria das vezes, retornar à colméia. Assim contaminam todo o grupo, causando o colapso das comunidades.
Mesmo assim, pressionado pelo agrobusiness, e sob ameaça de perda da safra, o governo alemão reautorizou, em agosto, o inseticida para a lavoura de colza. “Colocaremos avisos no produto com instruções claras para aplicação. Ao mesmo tempo faremos experimentos técnicos para garantir a segurança e efetividade do produto”, declara Dr. Hermann-Josef Baaken, “cabeça” de política corporativa e relações com a mídia (Head of Corporate Policy & Media Relations) da Bayer CropScience. Com esse argumento a empresa espera reautorizar o uso do Poncho para plantações de milho alemãs ainda no mês de outubro.
Dr. Baaken não nega que as abelhas tenham morrido por entrar em contato com o produto, mas insiste na tese do “incidente”. “Na cultura de milho o Poncho é indicado para tratamento de sementes, sem contato direto com o meio ambiente, como em pulverizações. É a primeira vez que isso acontece”, garante. O Poncho passou a ser usado no ano passado pelos subsidiados plantadores de milho, que há décadas não fazem rotação de culturas.
No início de setembro a Bayer CropScience lançou um comunicado oficial reafirmando a segurança da Clotianidina. “Todos os estudos de laboratório e em ambientes fechados confirmam claramente que a Clotianidina é segura para abelhas e pássaros quando usada para o tratamento de sementes”, traz o comunicado.
O texto ainda explica que no incidente na Alemanha “as sementes foram tratadas incorretamente”, permitindo que “partículas de poeira contendo o ingrediente ativo chegassem ao ambiente”. Além disso, o problema “apenas aconteceu porque o tempo extremamente seco, os ventos fortes e o tipo de equipamento utilizado pelos agricultores possibilitaram a contaminação”.
Contradições
O press release da Bayer esquece de mencionar que a Clotianidina não é usada apenas para tratamento de sementes. No Brasil, por exemplo, ela é a base do Zellus SC, um inseticida da Sumitomo Chemical, que compartilha a patente do princípio ativo com a Bayer. Indicado para combater o pulgão-do-algodoeiro, ele é pulverizado nas folhas dessa cultura. E o Zellus SC não é exceção. Segundo o Sistema de Agrotóxicos Fitossanitários (Agrofit) do Ministério da Agricultura há outros com a mesma forma de aplicação em diferentes plantações.
Numa perspectiva mais abrangente, o fato é que acidentes, ou erros, com as quatro substâncias acontecem há muito mais tempo. Mesmo nos países com os melhores sistemas de controle sanitário do mundo. No início de 2004, o Gaucho, irmão mais velho do Poncho, e o Regent (Fipronil) da BASF foram proibidos na França acusados de causar uma queda de 60% na produção de mel. Os dois continuam proibidos lá, mas parece que quase ninguém lembra disso.
Em nível mundial, há anos estudos demonstram que há redução na população de abelhas em todo o mundo, e os poucos cientistas debruçados sobre o problema afirmam que ele está associado à agricultura industrial, especificamente ao uso intensivo de agrotóxicos.
Segurança ambiental
A “Coalizão contra os Perigos da Bayer” (CBG), uma rede de ativistas que há 30 anos monitora os “acidentes” envolvendo a empresa, está entre as que não esquecem, e não deixam esquecer. “O fenômeno também está acontecendo nos Estados Unidos, onde a Bayer luta para manter no mercado um dos seus principais produtos”, afirma Philipp Mimkes, da CBG na Alemanha.
Ele se indigna ao ser confrontado com a explicação da companhia para o problema, como que obrigado a dizer o óbvio: inseticidas matam insetos. “Você sempre tem resíduos de agrotóxicos nas áreas em que eles foram usados. Para esse grupo específico, há estudos mostrando que após quatro ou cinco anos eles ainda estão presentes. Não há como garantir a segurança ambiental do uso desses venenos”, completa Mimkes.
A CBG, inclusive, está processando o presidente da Bayer AG, Werner Wenning, por abuso do poder econômico e negligência. “Para liberar esses agrotóxicos a empresa apresentou estudos atribuindo baixa toxidade para abelhas, e mesmo depois de comprovado o contrário, continua utilizando seu poder para evitar sua proibição”, acusa o advogado da ONG, Harro Schultze. A Bayer AG é um gigante químico e farmacêutico mundial. Possui 106 mil funcionários nos cinco continentes, e com um capital de 42 bilhões de Euros.
Após a morte das abelhas em áreas próximas a plantações de milho, o Instituto Julius-Kühn, uma espécie de Embrapa da Alemanha, analisou as evidências e confirmou que a causa da morte das abelhas foi a Clotianidina encontrada no Poncho.
Desinformação
No Brasil, onde a Bayer CropScience é líder no mercado de inseticidas (44%), a mortandade de abelhas intriga mais pelo silêncio do que pelo barulho causado. “Não há motivos para alarmar os produtores brasileiros, pois o que ocorreu na Alemanha não está relacionado ao produto e sim a uma série de fatores”, responde a coordenação de comunicação da Bayer CropScience em São Paulo.
A posição das autoridades ambientais brasileiras parece corroborar com a versão da empresa. “Não temos nenhuma denúncia sobre mortandade de abelhas relacionadas a esses produtos”, informa a engenheira agrônoma Marisa Zerbetto, da Coordenação Geral de Avaliação e Controle de Substâncias Químicas do Ibama.
Ela explica que as denúncias, assim como a verificação dos casos, são responsabilidade das superintendências estaduais do órgão. E esse detalhe ajuda a explicar a ficha limpa dos inseticidas em solo tupiniquim.
Ainda nos primeiros dias de setembro mais uma mortandade de abelhas foi registrada no Norte do Rio Grande do Sul. Também não foi a primeira vez. Como em ocasiões anteriores, o uso de formicida era o principal suspeito de causar o problema.
A Emater/RS, que atendeu a emergência, informou não poder assegurar o motivo da morte das abelhas. A instituição não dispõe de equipamentos e técnicos para esse tipo de análise. Sem falar, que pela lei, esse papel é da superintendência regional do Ibama.
Mas se depender da estrutura do Ibama no RS esse tipo de incidente jamais será esclarecido. “Em algumas regiões, como na fronteira Oeste, temos apenas um biólogo para atender a todos os tipos de denúncia. Sem falar, que para casos envolvendo agrotóxicos as análises devem ser feitas em Brasília, sendo necessária, muitas vezes, a vinda de um técnico de lá”, justifica um funcionário da superintendência gaúcha.
Omissão
Em paralelo à precária estrutura, faltam informações sobre os perigos desses químicos para insetos benéficos e pássaros. São produtos usados em uma vasta gama de plantações, e com diversas formas de aplicação. A Imidacloripride, por exemplo, é indicada no site do Ministério da Agricultura para:
– Tratamento de sementes – plantações de algodão, amendoim, arroz, aveia, cevada, feijão, milho, soja e trigo.
– Pulverização foliar – plantações de abacaxi, abóbora, abobrinha, alface, algodão, alho, almeirão, batata, berinjela, brócolis, cebola, chicória, citros, couve, couve-flor, crisântemo, feijão, fumo, gérbera, jiló, melancia, melão, pepino, pimentão, poinsétia, repolho, soja e tomate.
– Tratamento do solo – plantações de cana-de-açúcar, café, fumo e uva.
– Aplicação no tronco de citros.
– Aplicação no controle de cupins, conforme aprovação em rótulo e bula.
Só alguns inseticidas feitos a partir da Imidacloripride, Clotianidina, Tiametoxam ou Fipronil trazem advertências sobre a toxidade para abelhas. No Agrofit uma das exceções é o Adante, feito à base de Tiametoxam.
“Este produto é ALTAMENTE TÓXICO para abelhas, podendo atingir outros insetos benéficos. Não aplique o produto no período de maior visitação das abelhas”, traz o campo “precauções de uso” do produto na página do Agrofit.
Ele é produzido e comercializado pela Syngenta, sendo uma das armas contra inimigos mortais das plantações de Soja, tais como a ferrugem asiática e a mosca branca.
De maneira geral, as quatro substâncias compartilham um receituário padrão. Indicações, precauções, advertências, acidentes e embalagens, além dos alertas de praxe. Coisa do tipo: “Preserve a Natureza.
Não utilize equipamento com vazamento. Não aplique o produto na presença de ventos fortes ou nas horas mais quentes”. Curiosamente, nenhuma das variantes do Gaucho, do Poncho, ou do Regent presentes no Agrofit trazem advertências sobre a toxidade para abelhas.
Links
– Sobre os efeitos da Clotianidina / Poncho (em inglês)
– Alemanha suspende autorização de agrotóxicos acusados de matarem abelhas (em alemão)
– Clotianidina é altamente tóxica para abelhas e polinizadores (em inglês)
– Corelações entre a morte de abelhas nos EUA e na Alemanha (em inglês)
– Presidente da Bayer é processado pela morte de abelhas (em inglês).
Braskem quer cinco usinas de biomassa no RS a partir da casca do arroz
Por Carlos Matsubara, Ambiente JÁ
A Braskem iniciou no dia 1º, as tratativas com produtores de arroz do Estado para comprar matéria-prima que irá mover cinco usinas de biomassa. Toda produção gerada servirá para consumo próprio. A expectativa é que elas gerem 50 megawatts, o suficiente para abastecer uma cidade com 350 habitantes.
Mapeamento inicial da empresa apontou os cinco municípios para receber as usinas. São Borja, Itaqui, Pelotas, Dom Pedrito e Camaquã. O Rio Grande do Sul já conta com quatro delas movidas à casca de arroz que geram um total de 13 MW. Todas são empreendimentos de produtoras de arroz em Itaqui, Alegrete (2) e São Gabriel.
O diretor de Energia da Braskem, Marcos Vinicius Gusmão do Nascimento, justifica o investimento. “Somos o terceiro maior consumidor de energia do país e queremos ampliar nosso mix de fontes. O Rio Grande do Sul nos dá a chance do reaproveitamento de resíduos agrícolas”.
A empresa baiana, que controla a Copesul e Ipiranga Petroquímica no Estado, consome energia gerada por óleo diesel, gás natural e carvão mineral e ainda vem estudando a possibilidade de outras fontes, até mesmo a hídrica.
Para o deputado federal Luis Carlos Heinze (PP-RS) os gaúchos sempre sentiram falta de investidores para que esse tipo de energia finalmente fosse alavancada. Ele lembrou que as usinas da Braskem também poderão aproveitar cavacos e outros resíduos de madeira. “Temos também na Metade Sul do Estado essa possibilidade com os investimentos das empresas de papel e celulose”, destacou.
Floriano Isolan, consultor florestal da CaixaRS, aprova a iniciativa da empresa. Ele defende que seja ampliada para o setor florestal como um todo. “Podemos agregar empresas menores em torno das grandes para produzir uma gama ampla de sub-produtos para a Indústria da Madeira. Para o especialista, essa geração energética através de resíduos da madeira seria como “fechar o ciclo”.
Distância pode ser entrave
Ana Carla Petiti, gerente de comercialização da Braskem, explicou aos produtores presentes ao evento em Porto Alegre que estudos de viabilidade econômica exigem que a distância da geração de resíduos até as usinas não pode ultrapassar um raio de 10 quilômetros.
Para o produtor Alcir Buske, da Cooperativa Agrícola e Mista de Agudo, a intenção da empresa “parece uma ótima oportunidade”. O problema, segundo ele, seria realmente essa limitação de distância. “Nós (arrozeiros) temos dificuldade em encontrar solução para a casca de arroz”, afirma ele, que vai participar da rodada de conversações durante a semana. A cooperativa de Agudo conta com 500 produtores que geram cerca de 30 toneladas por mês desse resíduo, que hoje é utilizado como cobertura morta (adubação no solo).
Depois de receber muitos questionamentos sobre essa limitação, os técnicos da empresa admitiram a possibilidade de ampliar a distãncia em razão das tecnologias de compactação dos resíduos. “Tudo isso será conversado no decorrer das negociações que teremos com os interessados”.
Marcelo Wasem, coordenador Sul de Energia da Braskem, explicou que 100% do risco dos investimentos serão de responsabilidade da empresa, mas os produtores terão de comprovar capacidade de fornecimento pelo período mínimo de 15 anos.
A empresa pretende firmar protocolos de intenções com interessados já com a definição da capacidade de fornecimento e do preço a ser pago aos produtores ou cooperativas. O valor, no entanto, não foi divulgado. Conforme Ana Carla Petiti, a petroquímica ainda não tem como afirmar qual valor poderá pagar. “ Vai depender da quantidade, do tempo e da distância no transporte da matéria-prima”. Também não há definição de quantidade mínima para compra da matéria-prima de cada produtor.
As usinas
A expectativa da Braskem é que seja possível construir cinco usinas, cada uma com capacidade de, no mínimo, 10 MW, o suficiente para abastecer uma cidade de 70 mil habitantes. Para o funcionamento de cada uma são necessários 5 ml toneladas/mês de casca de arroz. Conforme o diretor de Energia da empresa, as usinas serão projetadas para queimar tanto casca de arroz quanto resíduos de madeira.
Para o produtor que desejar vender esse resíduo à empresa ainda existe a possibilidade de receber um repasse referente a créditos de carbono. “Isso também será estudado pela empresa”, explica Marcos Vinícius.
Embora já seja um tipo de resíduo, a casca de arroz ainda pode gerar um sub-resíduo (cinza) durante sua queima, que os técnicos da empresa admitem ainda não ter resolvido como destiná-lo.
Albuquerque critica “novelização” das florestas de eucalipto no Estado
Carlos Matsubara, AmbienteJá
“Com toda inteligência empregada em anos de pesquisa, fico chocado que ainda existam pessoas que possam ser contra tais projetos”. A afirmação foi feita ontem (20/08) pelo deputado federal Beto Albuquerque (PSB-RS) sobre os plantios de eucalipto para produção de celulose e papel previstos no Rio Grande do Sul.
Relator da Lei de Florestas, aquela que prevê a concessão de florestas públicas brasileiras, lembrou para a platéia do 10º Congresso Florestal Estadual e 1º Seminário Mercosul da Cadeira Madeira que o país tem pesquisadores e cientistas que trabalham seriamente na sustentabilidade ambiental da Silvicultura.
Citou que deixou bem claro na Lei de Florestas que Silvicultura é uma atividade agrícola como qualquer outra, que gera emprego e renda. A importância das florestas, conforme o deputado, tem sido cada vez mais reconhecida pela Sociedade, seja pela função natural ou pela produção de bens.
“Se fosse ruim como alguns dizem, a Finlândia não existia mais. Sou a favor da Silvicultura sim, mas contrário à monocultura dela”, ponderou. O plantio, segundo o deputado, é controlado e possibilita a existência de outras culturas. “Por isso defendo que seja feito cada vez mais em pequenas propriedades”. A meta, conforme Beto, é plantar 1 milhão de hectares por ano a partir de 2011.
ONGs e Movimentos Sociais
Apesar das críticas ao eucalipto, o parlamentar disse respeitar a oposição das ONGs e dos Movimentos Sociais. “Todas essas instituições são legítimas e os respeito, mas não posso acreditar na ‘novelização’ do problema”, destacou.
Lembrou que há alguns anos, a polêmica era em torno do plantio de maçãs. Se o Rio Grande do Sul podia plantar ou não a fruta. “Os gaúchos são assim, espicham a novela. Por um lado pode ser bom, mas por outro pode fazer o Estado perder o ‘time’ do mercado”, afirmou.
Fundo para Amazônia
Apresentado pelo presidente Lula durante a COP 9, o Fundo para Amazônia só foi lançado oficialmente no início deste mês. Mesmo assim, o deputado salientou a importância do mesmo. Quando foi apresentado, diz ele, teve apoio da Noruega que tinha uma proposta parecida.
O fundo terá as decisões de execução centralizadas no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Beto disse que, apesar da participação financeira de outras nações, a gestão do fundo não irá sofrer influências externas.
As doações dos noruegueses serão realidade mediante apresentação de resultados concretos como redução significativa dos níveis de desmatamento da Amazônia. E será por meio do Serviço Florestal Brasileiro (SFB) que esses recursos serão administrados. “As doações da Noruega podem chegar a 100 milhões de dólares por ano”, acredita Beto.
Concessões de florestas públicas
O SFB se comprometeu a alcançar tais metas através de concessão das florestas públicas brasileiras. “Vamos cadastrar e escriturar todas. A meta em agosto é atingir 200 milhões de hectares demarcados por monitoramento de satélite”, promete.
O político comenta que outros países podem aderir ao plano, que “não tem nada a ver com outro, o Plano Amazônia Sustentável (PAS)”. Embora o objetivo seja o de cadastrar e regularizar 100% das florestas públicas, nem todas serão concedidas. A lei hoje permite apenas 3% delas. “Se houver êxito, esse número pode ser repensado, mediante alteração na lei”, explicou.
Na segunda-feira (18/08) foi concluído o processo de licitação da primeira concessão. Três empresas terão do direito de explorar, de forma sustentável, a Floresta Nacional (Flona) do Jamari, em Rondônia, por 40 anos, além de ter a responsabilidade de não degradar a floresta.
O consórcio vencedor é liderado pela empresa Alex Madeiras, que ofereceu o preço de R$ 759,7 mil anual. A segunda, com 33 mil hectares, pela empresa Sakura, por R$ 1,6 milhão por ano, e a empresa Amata terá o direito de explorar a terceira unidade, de 46 mil hectares, pelo preço de R$ 1,3 milhão anual.
A Flona Jamari localiza-se no norte do estado de Rondônia, situada ao lado do Rio Jamari, e possui 220 mil hectares dentro dos municípios de Candeias do Jamari, Itapuã do Oeste e Cujubim.