Por Pedro Lauxen
Movimento foi intenso na abertura do Centro Popular de Compras
Depois de vários adiamentos, nesta segunda-feira, 09, foi inaugurado o Centro Popular de Compras de Porto Alegre. Na boca do povo, simplesmente camelódromo. A compra de um pen-drive de R$25, efetuada às 9 da manhã pelo secretário da Smic, Idenir Cecchin, simbolizou a inauguração do espaço, que abriga 800 camelôs antes espalhados pelas ruas do centro.
Durante todo o dia de ontem, o entra e sai foi constante nos estreitos corredores do local e a iniciativa já agrada tanto os ex-camelôs, agora chamados de comerciantes populares, quanto os consumidores.
Construído sob os terminais de ônibus das praças Rui Barbosa e Tamandaré, entre as avenidas Mauá e Voluntários da Pátria, o CPC é oferece, além das lojas, praça de alimentação, estacionamento para 216 veículos, área de serviços, banheiros, seis elevadores, segurança privada e sistema de monitoramento.
Encontra-se de tudo no CPC. Predominam o comércio de vestuário e eletrônicos, mas dando um giro pelo local é possível comprar artesanato, material escolar, cosméticos, artigos tradicionalistas ou religiosos, brinquedos. Precisa comprar uma fantasia? Tem. Incenso? Também. Para os mais letrados, uma das lojas de 4m² acolhe um sebo com centenas de títulos.
Praça de alimentação apresenta variadas opções de refeição.
Quem está com fome tem muitas opções, que vão do simples pão de queijo ao buffet de grelhados. Se a preferência for por uma pizza, baguete, um salgado, sem problemas. Aqueles que apreciam um chopinho no final da tarde também foram contemplados. E tem espaço para novidades, como o Biskuit, cuja especialidade é um reforçado sanduíche com 200 gramas de mortadela e queijo derretido. O lanche custa R$ 6.
PERSONAGENS
Cerca de 1600 trabalhadores ocupam os 19 mil metros quadrados de área construída do empreendimento. Muitos deles, com apenas algumas horas de labuta, já faziam uma avaliação positiva do novo endereço.
Para Carla Simone Silva, 39 anos, proprietária da RC Games, o primeiro dia de vendas foi melhor do que a expectativa. “Não perdi nada em vendas, está muito bom e vai melhorar”, disse. Ela, que no domingo à tarde mudou-se do asfalto da Praça XV, aonde atuou por 18 anos, para a loja 414 do CPC, investiu os R$ 8 mil que arrecadou no Natal na estrutura e nas mercadorias do seu novo ponto comercial.
Além de atrair nova clientela, a vendedora trouxe a sua freguesia de fé. Taís Rocha, 26, foi conhecer o CPC e de quebra deu uma passada na RC para comprar um jogo de videogame para a filha com a Carla, sua fornecedora oficial. “Aqui tu está bem melhor, é bonito, organizado, não tem sol”, explicou. No mesmo sentido, a amiga Vanessa Porto, 26, pondera: “ficou melhor para os dois lados”.
Carla, da banca de Games recebeu os antigos clientes da rua.
Como muitos dos comerciantes populares que chegaram ao camelódromo, Carla registrou, sem custos, sua empresa no CNPJ. Até o final do ano, a Smic estima que 90% dos lojistas sigam o mesmo caminho.
Marta Pereira, 44, responsável pela “Lua Azul”, vende camisas de clubes de futebol no número 405. Camelô desde os 14, quando ajudava a mãe Eva na Marechal Floriano, Marta não arrecadou no primeiro dia o mesmo que costumava ganhar na rua, mas projeta um futuro próspero. “Graças a Deus está sendo bem melhor do que eu pensava”, comemorou.
Dono da Bali Thay, aonde vende correntes, pulseiras, anéis e outros artigos de prata, Humberto Torbes, 32 anos, desde que ouviu falar do projeto aprovou a idéia e ontem teve certeza de que terá vantagens no novo logradouro. “A estréia foi maravilhosa”, sentenciou. Há três anos ele mantinha o negócio na Praça XV, mas lembra que lá o início foi mais difícil. “No meu primeiro dia aqui rendeu muito mais do que naquela vez”, recordou. Torbes estima recuperar em seis meses o investimento de R 4 mil.
Levados ao centro pela curiosidade, Divane Dutra, 39, e o marido Francisco, 33, observavam atentamente as vitrines do CPC. Ele “namorava” os eletrônicos, enquanto ela procurava alguma blusa daquelas bonitas e baratas. “Estava curiosa, estamos gostando, mas os preços são iguais em todas as lojas, não adianta pesquisar”, advertiu. Saíram sem sacolas.
NOVO VELHO CENTRO
Com o início das operações do Camelódromo, fica proibido o comércio de rua no centro da capital. Segundo o secretário da Smic, Idenir Cecchin, haverá dura fiscalização da BM em conjunto com a secretaria e os próprios comerciantes do CPC vão ajudar a coibir os camelôs de rua. “Agora eles são nossos aliados porque também não interessa pra eles alguém lá”, disse.
Além disso, equipes da prefeitura já trabalham nos antigos pontos de camelôs transformando os locais em Área Azul – estacionamento rotativo mantido pelo município. Pelo menos no primeiro dia, as ameaças surtiram efeito.
Praça XV teve visual modificado na manhã de segunda-feira.
Desde cedo, pôde-se notar que havia um novo cenário no centro. Nenhuma banca de camelô na praça XV, tampouco na José Montaury. Na Vigário José Inácio, apenas pedestres no seu vai-e-vem habitual. Os prédios centenários, que antes passavam despercebidos, agora figuram em primeiro plano. As árvores da praça XV ganharam um colorido especial. Na Vigário, era possível observar os detalhes Igreja do Rosário.
José Montaury também amanheceu livre das bancas de camelôs.
Como nem tudo é perfeito, vendedores ambulantes de CDs, DVDs, games, tênis, óculos e até mesmo capas para colchão continuavam oferecendo discretamente seus produtos nesta tarde, na Praça XV, Marechal Floriano e Voluntários. Sem os artigos em mãos, eles vendem o seu peixe mostrando catálogos impressos em folha de ofício. “Ô amigo, CD de Play ou PC?”, “DVD, três por dez!” e “Nike, Nike, Nike!” continuam sendo frases correntes nos arredores do Chalé.
Tag: CPC
Justiça impede inauguração do Camelódromo
Por Pedro Lauxen
Uma ação civil pública impetrada pelo Ministério Público do RS impediu que o Camelódromo fosse inaugurado nesta segunda-feira, 26, como estava previsto. A medida do MP prevê que a prefeitura só possa inaugurar o empreendimento após obter a carta de habitação – o Habite-se – e a licensa do Corpo de bombeiros. Como a justiça acatou o pedido e os documentos necessários ainda não foram expedidos, fica adiada por tempo indeterminado a abertura do Centro Popular de compras aos consumidores.
O Corpo de Bombeiros fez uma vistoria na tarde de domingo e detectou alguns problemas estrururais, como a existência de um degrau na saída de emergência. Além disso, a corporação recomendou a instalação de válvulas de gás. Somente depois de cumprir as exigências, o camelódromo ganhará o alvará dos bombeiros.
Erguida sobre o terminal Rui Barbosa, a construção abrigará 800 lojas alugadas pelos comerciantes populares que hoje ocupam vários pontos do centro da capital.
Projetada para retirar das ruas os vendedores informais, a obra conta com três pavimentos, incluindo o terminal de ônibus totalmente remodelado. No segundo andar, as bancas dos antigos camelôs e a praça de alimentação. O terceiro piso está reservado para o estacionamento para 216 veículos e um restaurante com vista para o Lago Guaíba.
ÚLTIMOS DETALHES
Os proprietários fazem os últimos retoques nos seus espaços, na expectativa pelo início do trabalho no novo endereço. Leonel Dobre Costa, 53 anos, está ultimando os detalhes da sua banca de artigos religiosos. Artesão como a esposa Lolita e os três filhos, Costa vai se mudar da frente da Rodoviária – aonde vendia seus trabalhos há oito anos – para o camelódromo. Nos últimos dias, está dividido entre as vendas no antigo ponto e os ajustes no estabelecimento quase pronto. Pega o ônibus em alvorada às 6h, desembarca em POA uma hora depois e começa o rodízio entre os negócios, a marcenaria e a pintura. Entre uma pincelada e outra nas prateleiras da loja 564, ele se mostra entusiasmado com a novidade. “Somos privilegiados. Pra mim essa é a plataforma do progresso”, define.
Na área da alimentação, Vilson José da Silveira também está ansioso. Morador do bairro Floresta, ele tinha uma lanchonete no terminal Mauá e se sentiu traído quando recebeu a informação de que deveria desocupar o local e alugar um lugar no novo prédio. “O espaço era bem maior e eu tinha licença por dez anos. Completados sete tive que sair”. Mesmo tendo que investir R$10 mil para equipar sua banca e pagar mais R$2 mil de aluguel (fora da praça de alimentação o valor cai para R$500), Silveira já está se acostumando com a idéia. “Estou apostando tudo aqui, tenho boas expectativas. O lugar é organizado, tem segurança”, explicou.
NOVA REALIDADE
Coordenador da Comissão dos vendedores da Praça XY, José Montaury e Vigário José Inácio, que será dissolvida após a inauguração do Camelódromo, Alfonso Linberger acompanhou todos os detalhes do projeto. É provavelmente a pessoa que mais conhece o local e suas particularidades. Por isso, é também mais requisitado. “Alfonso, quando vai inaugurar?” é a pergunta mais escutada por Linberguer nos últimos dias. Nem mesmo ele, que tem trânsito livre na Smic, é capaz de respondê-la.
Voto vencido na época da votação da proposta, Linberger decidiu que seu papel seria ajudar os companheiros na transição. “Assimilei a derrota e resolvi colaborar no processo todo. O pessoal tem que se adaptar a essa realidade diferente. Não teremos mais o consumidor eventual, agora vai funcionar diferente e todos precisam entender isso”, frisou.
FUTURO DO CENTRO
Após a inauguração do CPC, fica proibido todo e qualquer comércio de rua no centro da cidade. Para o secretário da Smic, Idenir Cecchin, a medida vai funcionar porque haverá fiscalização rígida. “Não vai ter. Se alguém teimar vai perder a mercadoria e pagar multa.”, disse. Além disso, acredita que próprios donos de bancas no camelódromo devem colaborar neste sentido. “Eles serão nossos aliados, pois também não querem ninguém na rua”.