Schlee volta à Feira como personagem

Aldyr Schlee e Luiz Carlos Vaz no Estadio Centenário de Montevideo em jogo Uruguai x Brasil nas eliminatórias da Copa 2018 / Acervo pessoal

Cinco anos depois de viajar para o outro lado, o escritor Aldyr Garcia Schlee volta à Feira do Livro de Porto Alegre como personagem central de um livro escrito pelo fotojornalista  Luiz Carlos Vaz, seu mais constante parceiro entre 1973 e 2018. Notícias do Schlee, editado pela Ardotempo, é um carinhoso apanhado de crônicas, fotos e lembranças sobre o jaguarense que viveu a maior parte da vida em Pelotas, onde marcou época como jornalista, professor e escritor.

Com autógrafos marcados para esta quarta-feira (8/11) às 19 horas, o lançamento de Notícias do Schlee” coincide com a última visita de Schlee a Porto Alegre, no dia 3 de novembro de 2018, quando autografou O Outro Lado – Noveleta Pueblera, seu último livro. De volta a Pelotas, precisou ser levado para o hospital. Debilitado por um câncer diagnosticado em 2011, morreu 12 dias depois, em pleno feriado da República.

Nascido em 22 de novembro de 1934 em Jaguarão, Schlee era estudante de Direito e diagramador do Diário Popular quando ganhou em fins de 1953 o prêmio pelo desenho da nova camiseta da Seleção Brasileira de Futebol, a amarela consagrada como a “Canarinho”. Com apenas 19 anos, ele se tornou uma celebridade nos meios jornalísticos do Rio de Janeiro.

De volta a Pelotas, passou dois anos desfrutando da fama de artista e negligenciando a vida estudantil. Ao se formar advogado em 1959, já estava apto a abraçar a carreira de professor. Primeiro lecionou Língua Portuguesa e Literatura, depois Direito Internacional Público.
Paralelamente a essas funções públicas, dedicou-se ferrenhamente à escrita de artigos, crônicas, contos e romances. Sua obra é considerada um marco da literatura do pampa, bioma campestre compartilhado pelo Brasil, o Uruguai e a Argentina.

Casado com a professora primária Marlene Rosenthal, Schlee teve três filhos: Aldyr,  nascido em 1960; Andrey, em 1963, e Sylvia, 1973, ano em que chegou de Bagé o fotógrafo Luiz Carlos Vaz, autor da primeira foto da caçula Sylvia. Aos 21 anos, Vaz sobrevivia até então como autor de pôsteres de crianças e teve a sorte de ser contratado para trabalhar como fotógrafo da incipiente seção de impressos da jovem Universidade Federal de Pelotas, fundada em 1969. O chefe era o professor Schlee, que estava sendo processado pela Justiça Militar (só seria absolvido na década seguinte). Desde então, os dois sempre trabalharam juntos, tanto que Vaz acabou se tornando “filho adotivo” do casal Schlee, história que nasceu de uma brincadeira de D. Marlene Rosenthal Schlee diante de um visitante algo cerimonioso.

Os dois, Aldyr e Marlene, faziam sala para um repórter alemão que chegara sabendo tudo sobre o escritor, que se divertia com as perguntas do interrogador. Eis que adentra a sala, sem bater ou tocar a campainha, o Vaz, notório filho de Hulha Negra, ainda distrito de Bagé. Cumprimenta e vai para a cozinha, como se fosse da casa. O repórter quis saber quem era. Marlene brincou: “É filho de outro casamento…”

O alemão se surpreendeu com a informação que não combinava com sua pesquisa prévia, e quis saber qual dos dois, Marlene ou Aldyr, era o autor do bendito fruto recém-chegado à residência. Os Schlee deram um pouco de corda no repórter antes de esclarecer que Vaz era de fato “filho de outro casamento”, mas era tão próximo que havia se tornado, na prática, um membro extra da família. De fato, ele sempre contou com o apoio dos Schlee no trabalho e nos estudos: além de se formar em Jornalismo, Vaz fez mestrado e doutorado em memória social; e ainda foi professor de comunicação e comentarista de rádio.

Quando Schlee morreu, Vaz era visto naturalmente como a pessoa certa para escrever a biografia do velho amigo. Ele demorou alguns anos para  se convencer de que possui matéria-prima suficiente para honrar a memória do amigo e chefe. Esbanjando bom humor, lança agora Notícias do Schlee. São mais de 30 capítulos de lembranças. Portador de um arquivo imensurável, Vaz revela-se um ótimo cronista ao mostrar fragmentos da vida do profescritor jaguarpelotense. O livro tem prefácio assinado por Aldyr Rosenthal Schlee, o filho mais velho do personagem.

Quem aprendeu a apreciar a figura de Schlee como pessoa e escritor tem nesse livro mais um motivo para recordá-lo em alto astral.