Brasil de mãos atadas, mas o PIB teima em crescer

No 2º trimestre de 2024, o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil avançou 3,3%, frente ao mesmo período do ano passado, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Já o Boletim Focus, do Banco Central, está prevendo para este ano um crescimento do PIB de 2,46%. As projeções do chamado mercado tendem a diminuir tudo o que for relacionado ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).  

E a mídia corporativa só reverbera as opiniões do mercado, confundindo o entendimento do público leigo. Alguns exemplos dos títulos dos veículos da rede Globo, após a divulgação do PIB pelo IBGE: “PIB reforça aposta de alta da Selic no Copom deste mês”; “Mercado ignora Campos Neto e amplia aposta de alta de 0,5 ponto na Selic em setembro após PIB forte” e “Alta do PIB: mercado passa a projetar crescimento maior para a economia, mas também espera subida dos juros”. A velha tática da ilação do aumento do PIB com inflação.

A pressão do mercado pelo aumento da taxa Selic, a taxa básica de juros da economia, é percebida todos os dias nos espaços econômicos da mídia corporativa. É um desrespeito a nossa inteligência. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é de 4,50% nos últimos 12 meses, até julho, enquanto a taxa Selic está em 10,50%. Isso representa um ganho real aos rentistas (bancos e grandes fortunas principalmente) de seis pontos percentuais ao ano. A grande maioria dos países remunera pela metade disso ou menos  seus títulos públicos.

A inflação está sob controle porque a renda da grande maioria das famílias brasileiras é baixa. Para o economista André Lara Rezende, um dos pais dos planos Cruzado e Real, a alta de preços é resultado de gargalos específicos. “Por isso, é altamente questionável e equivocada a ideia que se consiga combater a inflação com a alta dos juros.”

Portanto, é fácil perceber quem ganha com essa política definida por um Banco Central “independente” porque a remuneração da metade da dívida pública brasileira segue a Selic. Cada aumento de um ponto percentual da taxa Selic custa mais de R$ 40 bilhões para o governo federal e vai para os cofres dos bancos e rentistas.

Liberalismo anacrônico

Em momentos de crise, os governos dos países ditos desenvolvidos, principalmente os Estados Unidos, historicamente sempre responderam por meio do uso de políticas fiscal e monetária expansionistas. O crash de 1929 levou o presidente dos EUA, Franklin Roosevelt, a romper com o liberalismo em 1933 e anunciar ousadas inovações contidas em uma série de programas denominados New Deal para a retomada do crescimento.  

Na crise financeira de 2008, o presidente Barack Obama conseguiu aprovar uma expansão fiscal de quase US$ 800 bilhões, que hoje passa de US$ 1 trilhão, para estimular a demanda agregada.  No mesmo ano, na área do euro, os governos foram liberados das amarras fiscais do Tratado de Maastricht, de 1992, sendo autorizados a aumentar os déficits fiscais além dos limites impostos.

Quando foi eleito, em 2021, o presidente dos EUA, Joe Biden, anunciou o maior programa de investimento público desde o New Deal para reconstruir a infraestrutura do país e reposicionar os Estados Unidos para competir com a China.

Portanto, a defesa de um liberalismo anacrônico de Chicago dos anos 1960 por parte de uma elite conservadora no Brasil, submetida aos interesses do imperialismo, não passa de um disfarce para a manutenção de uma política neocolonial para travar qualquer possibilidade de o Brasil aumentar o poder de compra de sua população, investir em educação, crescer com uma indústria mais tecnológica e distribuir melhor a renda.

A situação do Brasil lembra o trecho famoso do romance Il Gattopardo (O Leopardo), de Giuseppe Tomasi di Lampedusa (1896/1957). Tancredi Falconeri diz ao tio, Don Fabrizio Corbera, príncipe de Salina: Se não estivermos lá, eles fazem uma República. Se queremos que tudo fique como está, é preciso que tudo mude. Fui claro?

Um exemplo é o Arcabouço Fiscal, uma imposição do Congresso para sufocar o governo Lula e controlar o endividamento focado no equilíbrio entre arrecadação e despesas. Em momentos em que o País está com capacidade ociosa e parte expressiva da população na pobreza é fundamental serviços públicos e investimentos de qualidade em infraestrutura, saneamento, saúde, educação, segurança. Deixar de lado a obsessão de equilibrar o orçamento a qualquer custo, cujo único objetivo é manter o governo federal de mãos atadas.

No entanto, o Brasil tem tantas riquezas que “eppur si muove”, frase em italiano que Galileu Galilei teria pronunciado perante o tribunal de cardeais da Inquisição no século XVII.