O BRASIL À BEIRA DO ABISMO

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, sai da entrevista coletiva para assinar pedido de demissão / Marcelo Casal/EBC

Atolado na crise de saúde provocada pela pandemia do coronavíus, que atinge o país no momento mais agudo de uma crise econômica que já dura cinco anos, o Brasil agora enfrenta uma das mais graves crises políticas da sua história recente.

O pronunciamento do ministro da Justiça, Sérgio Moro, na manhã desta sexta-feira, lançou uma bomba sobre as instituições que garantem a democracia brasileira – o Congresso, o Supremo Tribunal Federal e o próprio Poder Executivo.

Moro disse que seu pedido de demissão foi motivado pelas pressões do presidente Jair Bolsonaro para trocar a direção da Polícia Federal e colocar pessoas de sua confiança, às quais tivesse acesso para interferir em investigações da Polícia Federal. Seria uma tentativa de obstrução de Justiça.

Moro disse também que não assinou o ato de exoneração do diretor geral da PF, Maurício Valeixo, publicado no Diário Oficial com seu nome (veja abaixo), e que não houve pedido do delegado Valeixo para deixar o cargo, conforme consta na publicação oficial. Seria crime de falsidade documental.

Decreto com assinatura de Moro pode configurar crime de falsidade documental

A disparada da cotação do dólar e a queda recorde das bolsas de valores sinalizam o tamanho do impacto econômico que a crise política terá na combalida economia nacional.

Mesmo a imprensa que apoiou a eleição de Jair Bolsonaro e inclusive apoiadores do governo já admitem que as chances do presidente da República permanecer no cargo são ínfimas.

A deputada Joyce Hasselmann, ex-aliada do presidente, disse em entrevistas que Bolsonaro tenta proteger seus filhos, acusados de montar um esquema de fake news financiado com recursos privados e usando estrutura pública.

O impeachment de Jair Bolsonaro é aventado por opositores do presidente desde o início de seu mandato.

Nas últimas semanas, durante a crise da pandemia do novo coronavírus, a possibilidade ganhou força nos discursos públicos de políticos.

Em sua edição de domingo (22), o jornal Folha de S.Paulo listou ao menos 14 crimes de responsabilidade que teriam sido cometidos pelo presidente. As atitudes envolvem ofensas a jornalistas, abuso de poder e quebra de decoro.

Segundo analistas políticos, a “base jurídica” para o impeachment existe. O que faltava até agora era a decisão política de derrubar o presidente.

“Um presidente sabidamente criminoso pode ser poupado do impeachment se um cálculo prudencial de lideranças políticas achar que o ônus de mantê-lo no cargo é menor do que o bônus de removê-lo”, disse o professor Rafael Mafei, da Faculdade de Direito da USP, em entrevista ao Nexo publicada em 29 de fevereiro.

Apesar de haver pedidos protocolados na Câmara Federal, poucos líderes relevantes do Congresso apoiavam a abertura de processo contra Bolsonaro.

A decisão de arquivar ou dar sequência a um pedido do gênero cabe ao presidente da Câmara, cujo cargo é ocupado hoje pelo deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Responsável por aceitar ou não o pedido de impeachment, Maia disse ao Valor, em entrevista publicada no dia 16 de março, que os processos dificilmente vão prosperar. “Nós já temos muitos problemas no Brasil para a Câmara ou o Senado serem responsáveis pelo aprofundamento da crise. Nós não seremos responsáveis por isso. Às vezes, me dá a impressão que o governo quer isso. Todos nós fomos eleitos. O presidente teve 57 milhões de votos, os deputados tiveram 100 milhões de votos”.

Para alguns analistas, Jair Bolsonaro vê no impeachment a possibilidade de um acirramento de sua base eleitoral mais fiel. Ele aposta na retomada de uma polarização nas ruas que poderia lhe resgatar o apoio da opinião pública.

Com o agravamento da crise a partir do pronunciamento do agora ex-ministro Sérgio Moro,  parece existir uma única chance para que Jair Bolsonaro se mantenha na presidência: um golpe militar para fechar o Congresso e o Supremo Tribunal Federal.

As reiteradas manifestações dos chefes militares, em favor da constitucionalidade, indicam que ele não dispõe de base para isso. Mas o cenário político, com a crise de saúde e a crise econômica como pano de fundo, torna-se imprevisível.

O ministro do STF Marco Aurélio Mello em entrevistas nesta sexta-feira sintetizou a perplexidade nacional: “Aonde vamos parar? Quem viver verá”.

 

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