Chico Barbeiro deixa Bom Fim após 50 anos

Matheus Chaparini
Ele vem pela Osvaldo Aranha, parando a cada meia dúzia de passos para cumprimentar algum conhecido. São amigos, clientes, comerciantes, habitantes do bairro que Chico conheceu ao longo dos quase 50 anos em que trabalhou como barbeiro no Bom Fim. A conversa com o repórter na Lancheria do Parque é interrompida diversas vezes. O pessoal tem estranhado o sumiço do Chico e quer saber por onde ele anda. “Esse aqui é cidadão honorário do Bom Fim”, sentencia o garçom Ildo.
No dia 6 de julho, o Salão Líder fechou as portas e o local foi reformado para receber a nova bilheteria do bar Ocidente. Um processo relativo a aluguéis atrasados motivou o despejo. Com a perda do espaço que ocupou desde 1988, Chico teve de mudar seu salão para próximo de sua casa, na Vila Elza, em Viamão.
“Eu aluguei uma peça, ao lado de um instituto de beleza e trabalho sozinho. É um lugar bem bom, só que é longinho, né?”
A Líder continua funcionando todos os dias a partir das 8h30, exceto nas terças-feiras, quando ele vem a bairro para fazer a barba de um cliente antigo, morador da rua Cauduro.
O dono do Salão Líder é Francisco de Paula Freitas, 74 anos, barbeiro desde os 21. Nascido em Rio Grande, veio morar em Porto Alegre ainda na juventude. Começou trabalhando em um salão na Avenida Bento Gonçalves, depois passou para o Salão Elite, que na época ficava na Fernandes Vieira e hoje está na Miguel Tostes. O Salão Cruzeiro, na Henrique Dias, foi a primeira barbearia própria, comprada do antigo patrão. Quando o prédio foi vendido para receber a Confeitaria Barcelona, Chico se mudou para a esquina da João Telles com a Osvaldo Aranha e abriu o Salão Líder.

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Na ‘Lanchera’: Chico é cidadão honorário do Bom Fim/ Fotos Matheus Chaparini

“Um mês depois que eu mudei, saiu a primeira edição do Jornal Já. Fui um dos primeiros anunciantes”, recorda Francisco. “Naquele tempo era cheio de barbearia no Bom Fim, hoje devem ter duas ou três.”
Chico acredita que a barbearia é um ofício condenado à extinção. “Os barbeiros geralmente são pessoas de idade. E ninguém mais quer aprender o ofício, porque trabalhar de cabeleireiro dá muito mais dinheiro. No meu tempo, barbearia dava um dinheiro bom.” Outro fator é a falta do hábito de frequentar salões masculinos. “Hoje as patroas levam os maridos onde elas cortam o cabelo.” Nenhum dos cinco filhos herdou o ofício do pai, mas ele conta animado que a neta Jordana, de 20 anos, é cabeleireira e está fazendo curso de barbearia.
O salão não era apenas um local para cortar o cabelo ou aparar a barba, era um ponto de encontro de homens. De tudo se conversa com o barbeiro. “Menos política! Odeio política” afirma Francisco. Tradicionalmente, o assunto mais usual é o futebol. “O Chico cortava o meu cabelo e o do meu pai. E além de barbeiro, era meu assessor esportivo, eu sempre passava ali pra saber do nosso time” conta Bernardo Silbert, cliente desde 1975.
Matheus Chaparini
Salão Líder fechou as portas no dia 6 de julho

Apesar da idade avançada, Francisco não teme o recomeço no novo ponto. “Olha, eu achava que o Bom Fim era tudo pra mim. Mas agora é e não tá sendo mais. Lá no novo endereço estou começando a fazer clientela. Vai ser difícil, mas eu vou conseguir, eu sou novo, sei trabalhar.” No que depender da fidelidade dos clientes mais antigos, o barbeiro Chico não fica sem trabalho. “Eu vou continuar com ele. No fim da vida vou trocar de barbeiro? Não!” brinca Bernardo.

2 comentários em “Chico Barbeiro deixa Bom Fim após 50 anos”

  1. Obrigada Matheus pela lembrança deste homen que fez parte do Bom Fim, tenho lembrança de muitas tardes de domingo o vô sair do salão e írmos passear na redenção, antes pasando na lancheria do parque… Me emocionei de ler a matéria, linda mesmo. Parabéns!!

  2. Grande Chico. Perdi o contato com ele pois fui morar em Torres. Gostaria de saber o endereço da barbearia em Viamão para poder dar um abraço.

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