* Professor Dr. Mauro Schumacher
Sob o ponto de vista econômico, a metade sul do Estado é caracterizada como “primo pobre” ou “ovelha negra” do Rio Grande, se comparada com a metade norte e a região da serra. São grandes extensões de campos sem aproveitamento, abrigando máquinas paradas, enferrujadas pela ação do tempo. Proprietários com até cinco mil hectares enfrentando dificuldades pela falta de alternativas e de recursos. Quais as vantagens em deixar um campo vazio, com absolutamente nada sobre eles? Só para citar dois exemplos, a pecuária está virando um problema para os criadores de gado e a soja perdeu mais de 50% do seu valor de mercado. Quem paga o custo de uma extensão rural para que o produtor fique meramente observando a manutenção de um bioma?
Por outro lado, vemos muitos hectares com lavouras de arroz e de soja. E por quê, então, não se discute a quantidade de veneno que vai nessas culturas? E os herbicidas que contaminam os mananciais? E os proprietários desinformados que praticam queimadas, torrando tudo que é verde? Contra isso ninguém se manifesta. Entretanto, basta que se fale em plantios de florestas para que ecoem vozes de revolta. E surgem declarações levianas de devastação, deserto verde, alteração na paisagem do pampa, entre outros absurdos. Por que não buscam entender que o reflorestamento é uma resposta às questões sociais e econômicas da Metade Sul como forma de trazer um fio de esperança a essa gente?
O Brasil dispõe da maior área de florestas plantadas de eucalipto do mundo. Entretanto, aqui no estado, a base florestal ainda é modesta: gira em torno de 360 mil hectares e ainda temos – só na Metade Sul – em torno de 15 milhões de hectares disponíveis. Caso três fábricas passem a produzir cerca de 1 milhão de toneladas de celulose por ano no Rio Grande do Sul, teremos demandas por um grande volume de madeira: algo em torno de 300 mil hectares por ano.
Logo, os investimentos em plantios devem elevar a base florestal gaúcha para 1 milhão de hectares. Em contrapartida, uma empresa que precisa plantar 100 mil hectares de “lavoura de eucalipto”, vai ter que preservar quase a metade dessa área, como reserva legal. Também é importante salientar que ninguém pode e nem vai fazer esses plantios em linha reta. Até porque, todo e qualquer projeto envolvendo o meio ambiente passa pelas minuciosas análises da Fepam (Fundação Estadual de Proteção Ambiental).
O que deve acontecer é uma pulverização em diferentes municípios e, dentro desses municípios, em distintas propriedades, seja através de parcerias, seja através de áreas próprias. Tudo isso em conformidade com as APPs (Áreas de Preservação Permanente), formando-se os chamados corredores ecológicos, entremeando espécies nativas, mata ciliar, banhados e o bioma campo. Este sistema vai quebrar a monotonia dos plantios, desfazendo aquela idéia de monocultura ou de que reflorestamento é “tapar tudo” com eucalipto, pinus ou acácia.
Outra prática que as pessoas precisam entender é a de que ninguém planta uma floresta e só retorna ao local sete ou oito anos depois para cortá-la indiscriminadamente. Antes mesmo do plantio, tem todo um cuidado com o preparo do solo, a adubação, o controle da formiga, o desbaste…. Depois, no momento da colheita, o processo ocorre por faixas, de forma escalonada, intercalada, formando sistemas conhecidos como mosaicos. Engana-se contudo, quem imagina que a colheita encerra o processo. Em hipótese nenhuma deve ser desprezado, removido ou queimado o resíduo da floresta, como cascas, galhos e folhas. Neles estão os nutrientes que vão assegurar a produtividade das futuras rotações, pois transformam-se numa camada orgânica riquíssima e fundamental ao solo.
Agora, uma nova vantagem passa a integrar o inesgotável acervo de avanços da tecnologia florestal. Quando foi estabelecido o protocolo de Kioto, pensou-se em alternativas para a redução de gases, principalmente o CO², um dos maiores responsáveis pelo chamado efeito estufa da atmosfera. E descobriu-se que a biomassa florestal tem a melhor captação e a maior capacidade de retenção de carbono, se comparado, por exemplo, com a agricultura. Isso significa que os ecossistemas florestais se constituem em mais uma solução para tantos problemas ambientais.
As primeiras pesquisas a respeito de captação de carbono no Brasil foram feitos na Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Trata-se de estudos entre a UFSM e empresas de vários estados brasileiros. Num deles, voltado à indústria do fumo, verificou-se que nas propriedades rurais, uma floresta de eucalipto armazena, até os oito anos de idade, uma média de 80 a 100 toneladas de carbono por hectare. Quando se fala em espécies clonadas, então, esse número é muito maior.
Isso nos leva a crer que, um programa de fomento, envolvendo parcerias, tornaria viável a criação de um projeto de geração de crédito de carbono. Com a alternativa, o produtor rural, ao vender a madeira após a colheita, teria incorporado carbono ao solo através da matéria orgânica produzida pela floresta.
Respeito ao ecossistema significa que podemos plantar eucalipto pela vida inteira sem que jamais tenhamos problemas. Atingimos um elevado grau de maturidade na produção de nossas florestas graças aos incansáveis anos de pesquisa, de tecnologia, de conscientização, de definição de parcerias e de informações coerentes sobre manejo para produtores rurais e todos aqueles que vivem da floresta. Agrega-se a tudo isso a geração de empregos que impulsiona a cadeia do agronegócio florestal no Brasil e no mundo.
* Professor Adjunto de Ecologia e Nutrição Florestal da UFSM