Marcos Sosa, Professor de Literatura
Fazia falta um livro assim na minha estante. Um livro pequeno, meio artesanal, que tivesse fotos bonitas. Um livro bonito. Em “Crônica: o vôo da palavra”, de Walter Galvani, lançado na primeira semana de agosto pela editora porto-alegrense Mediação, as páginas de leitura têm suspensões, por meio de fotografias, que versam sobre o horizonte, o mar, barcos e reflexos de sol. E gaivotas. Muitas. Ora sozinhas ou em bandos, ora em revoada ou em comunhão. Gaivotas para a medida exata da metáfora levada a efeito pelo autor, sugerindo que, enfim, o ato de escrever precisa e exige um movimento rente às ondas, para fisgar o alimento e, justo depois, voar mais e mais.
Resultado de um curso para aspirantes a cronista ministrado pelo autor, o
livro desenvolve-se a partir de uma adequação de comentário prático e de uma linguagem acessível, menos técnica do que aquela presente em livros de crítica literária. Não por acaso, uma linguagem que aposta na simplicidade para falar desta manifestação de literatura que come o pó das ruas, bebe os cafés dos bares, cantarola versos de canção popular e vive dividindo espaço com a ficção.
Essa opção de linguagem abre espaço não só para o candidato a cronista, mas também para o leitor de crônicas – este sujeito que, da outra ponta do processo, encontra neste gênero um ponto de fuga cotidiano, entre uma fila de banco ou o intervalo do almoço. Em muitas passagens, Galvani dá atenção a este leitor que busca a fresta do dia, ávido de entrosamento com essa natureza flexível, explosiva e um tanto arbitrária que norteia a razão de ser do texto cronístico.
De onde se conclui por um caminho excelente de inserção no universo dos livros e do conhecimento. Ao ter em mãos um trabalho que aborda este caminho, o leitor agrega a seu repertório um saber que se encontra no meio-fio entre a crítica e a produção, seja no recorte histórico evocado pelo autor ao comentar, por exemplo, a literatura dos viajantes e o natural desdobramento desta à produção jornalística posterior, seja visitando, de modo especial, o quadro específico, moderno e brasileiro, da crônica.
Paradoxalmente, é justo aqui, num país com graves deficiências de leitura, que a crônica se apresenta como uma grande feira, com sabores para todos os gostos.
Categoria: Análise&Opinião
Carta de Barcelona
Rivadavia Severo
Este ano comemora-se os 400 anos da publicação de Don Quijote de la Mancha. Data com especial devoção, em terras espanholas, ao livro que inaugurou a narrativa moderna e que dizem por aqui que é o mais editado e traduzido depois da bíblia. O romance escrito por Miguel de Cervantes conta as aventuras do engenhoso fidalgo Don Quijote em princípios do século XVII, durante o reinado de Felipe III, quando Espanha estava perdendo sua condição de potência global que lhe seria finalmente arrebatada, escassos anos depois, com a assinatura do Tratado de Westphalia, em 1648, que prefigurou o mundo dos estados nacionais que vivemos até hoje. Cervantes, como todo grande novelista, tece as suas 1.200 páginas sobre este pano de fundo, onde deixa transparecer as transformações da sociedade e de seu sistema de valores e crenças
Quijote é um personagem que alterna momentos de profunda reflexão, com disparates. Diz o prêmio nobel português, José Saramago, que Alonso Quijano, o fidalgo que transforma-se em Quijote para poder viver suas aventuras, não era um louco, simplesmente buscava moldar a realidade a sua maneira para poder buscar o seu próprio eu. Coisas de homens de letras. Também interessante era o seu fiel escudeiro, que acompanhava o Cavaleiro da Triste Figura, não para salvar donzelas, nem para fazer justiça como seu amo, só queria a sua porção de terras a que governar e claro, enriquecer. E tanto queria que uns duques de Aragão lhe presentearam, mesmo que por burla, uma pequena ínsula. Como a boa literatura imita a realidade, nem 400 anos puderam separar o que aconteceu com Sancho Panza e o que ainda hoje ocorre em algumas repúblicas por aí. O escudeiro era um homem baixo, gordinho e barbudo que viu-se envolvido em uma série de artimanhas engendradas por seus súditos que o levaram a demitir de seu governo. Suas reflexões sobre os meandros do ato de governar são dignas de registro. “Agora verdadeiramente entendo que os juízes e governadores devem ser de bronze para não sentir a inoportunidade dos negociantes” e logo adiante justifica a sua demissão “…subi nas torres da ambição e da soberba…”
Naquela época, os governadores eram responsáveis pelos atos de seus vassalos e só deviam obediência ao Rei e a Deus. Hoje seus pares parecem que não são responsáveis por nada e nem devem explicações a ninguém. Talvez o exemplo deste simples escudeiro que demitiu de seu governo por ter entendido não haver sido capaz de governar a seu povo deva voltar às rodas palaciegas.
Cidade não é mercadoria
Margarete Moraes, Vereadora
Art. 92. As Áreas de Interesse Cultural são áreas que apresentam ocorrência de Patrimônio Cultural que deve ser preservado a fim de evitar a perda ou o desaparecimento das características que lhes conferem peculiaridade.
Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental de Porto Alegre, Lei Complementar 434 de 1999.
As cidades vivenciam uma elaboração cultural em movimento constante, a partir da cidade real, procurando compatibilizar o novo com o existente. A partir desta concepção, estudo realizado pela Equipe do Patrimônio Histórico e Cultural (EPAHC), da Secretaria Municipal da Cultura, em 2003, em conjunto com a Faculdade de Arquitetura do Centro Universitário Ritter dos Reis, dentro de convênio firmado pelas duas instituições, considera as raízes de Porto Alegre de nossos dias, uma cidade que se mantém um tanto provinciana, um tanto cosmopolita, mas sempre hospitaleira e fiel as suas vinte e cinco etnias.
Um estudo que pretenda alçar alguns bens culturais ao patamar de patrimônio deve guardar coerência com o passado e com o presente. Sobretudo, deve ter um comprometimento ético com um futuro saudável e sustentável para as próximas gerações. Partindo destes princípios, a pesquisa apurou a necessidade de tratamento especial em oitenta áreas, divididas em quatro macro-regiões. Essas áreas, verdadeiros nichos patrimoniais, concentram-se na orla do Guaíba, no Centro, no interior da malha urbana e na área rural, neste caso, já prevista nos próprios parâmetros do Plano Diretor. Segundo as propostas, é possível construir, demolir e reestruturar edificações seguindo normas definidas universalmente que orientam a ocupação dos espaços privados e oferecem diretrizes para o espaço público, respeitando a vocação e as peculiaridades de cada área.
A Agenda 21 da Cultura, assinada por mais de 200 autoridades locais, em Barcelona, 2004, recomenda: “Os governos locais desenvolverão estudos e legislações específicas que objetivem a proteção de bens imóveis, conjuntos arquitetônicos incomuns, espaços de sociabilidade pública, bairros, quarteirões ou ruas e avenidas, lugares e ambientes que guardem relação de identidade histórica ou social com as populações, prevendo a necessidade de impedir suas descaracterizações e/ou a agressão aos mesmos pelo mercado imobiliário”.
Os porto-alegrenses podem se orgulhar do trabalho, que já vinha sendo realizado pela Administração Popular na valorização da memória e da história, incluindo o patrimônio urbano edificado. O Orçamento Participativo aprovou a restauração e reciclagem do Mercado Público, amparados por trabalho da pesquisa histórica da EPAHC, garantindo o significado e a mística daquele espaço referencial à sociedade. Em 1993, teve início a restauração da Casa Torelly, sede da Secretaria Municipal da Cultura. Antes disso, o Conselho do Orçamento Participativo aprovou a reciclagem da Escola Apelles Porto Alegre, transformada no arquivo municipal Moisés Vellinho, equipado com reserva técnica totalmente climatizada e informatizada, compatível com as normas internacionais, espaço freqüentado por escolas e pela comunidade. Já o Solar da Travessa Paraíso, talvez o exemplar “vivo” da casa mais antiga de Porto Alegre, tornou-se um centro de educação patrimonial e ambiental, desde 1997, aberto às escolas e à comunidade, com oferta de oficinas, mostras e cursos, depois de salvo pelos bombeiros de incêndio, provavelmente criminoso, e efetivada sua restauração pelo poder público. O governo municipal devolveu à cidade o viaduto Otávio Rocha restaurado, comprou e reconstruiu a cobertura da Casa Godoy, exemplar raro de arquitetura art nouveau, restaurou a Fonte Talavera e o Paço Municipal, tombou o Parque Farroupilha. A Usina do Gasômetro, um bem tombado e restaurado pelo poder público, foi reciclado como um centro cultural plural, reconhecido internacionalmente, e abriga a Galeria Iberê Camargo, o cinema P.F. Gastal, o espaço Vasco Prado.
São exemplos de trabalhos que ilustram a função constitucional do poder público, em diversos âmbitos, para valorizar, preservar e difundir a memória das comunidades expressas em sua materialidade. Os critérios de intervenção propostos pelos EPAHC, em 1994, foram respeitados pelo governo municipal, até 2004.
Infelizmente, é preciso registrar, que hoje a Casa da Travessa Paraíso encontra-se fechada ao público, para uso administrativo, portanto, espaço cultural público perdido pela cidade. A Usina do Gasômetro está loteada entre diversos grupos artísticos, sem cuidados com a preservação patrimonial e respeito às diretrizes da EPAHC. Também no Paço Municipal reformado, áreas destinadas a galerias de arte foram tomadas ao público para uso administrativo.
Não se preserva para o passado, mas para o futuro. Uma lição simples, mas difícil de ser compreendida por alguns setores. Valores culturais, morfológicos, funcionais e paisagísticos se repetem em algumas situações, mas sempre se articulam e se complementam. Em uma época em que a tendência avassaladora da globalização coloca em perigo a sobrevivência da diversidade cultural planetária, a preservação das identidades é um dever de todos aqueles que se comprometem com o futuro. Só assim Porto Alegre será saudável e sustentável.
Carta de Barcelona
Rivadávia Severo, Jornalista
Acontece que na Espanha a xenofobia segue em alta. Uma pesquisa do Centro de Pesquisas Sociológicas (CIS) divulgada esta semana, indica que o principal problema para os espanhóis é o desemprego, seguido do terrorismo e em terceiro lugar está a imigração. Isso que a imigração é o que permitiu o crescimento econômico espanhol que elevou o PIB per cápita do país para cerca de 20 mil euros por ano e aumentou a população para 44 mil pessoas. Esse impulso econômico está sustentado pelo trabalho de árabes e latinoamericanos na construção civil. Segundo o jornal El Pais, quatro das oito maiores empresas mundiais do setor são espanholas.
O que está ocorrendo no bairro onde vivo aqui em Barcelona, Poblenou, um antigo distrito industrial do princípio do século passado – no tempo em que Barcelona era conhecida como a “Manchester espanhola” pela pujança de suas fábricas – é um bom exemplo do que ocorre nas grandes cidades do país. O bairro está sendo reconvertido em um centro de tecnologia e serviços.
As chamines foram substituídas por gruas, retrato da Espanha atual, um país que se financia com a construção civil que sustenta o seu crecimento econômico na casa dos 5% anuais, os melhores índices da União Européia. O preço pago eu e os meus vizinhos, gente simples da Catalunha e imigrantes de todas as partes do mundo que temos que suportar além do calor do verão, o barulho de britadeiras, escavadeiras, gritos de operários, etc.
Mas a vida também oferece momentos de descontração e prazer. Nesta semana, jantando com um casal de professores da Universidade de Barcelona, em um aprazível chiringuito – restaurante simples à beira mar – nos comentavam da situação política do Brasil. O lodaçal de Brasília, esse que o Zé Dirceu meteu o PT, também é notícia por aqui, embora em páginas internas.
Eles conhecem bem as nossas idiosincrasias, trabalharam em projetos de educação do PT, inclusive em Porto Alegre e têm amigos próximos ao governo de Lula. Segundo o relato desses amigos, que parecem conscientes da lama que envolve o Partido dos Trabalhadores, é até bom que ocorra isso, porque obrigará o PT a apresentar programa nas próximas eleições e não comparecer somente com a plataforma política da ética. É, pode ser.
Zero Hora e os jornais de bairro
Por Elmar Bones
Zero Hora está lançando quatro cadernos de bairro em Porto Alegre – Bom Fim, Moinhos de Vento, Bela Vista e Zona Sul.
Para nós é uma vitória ver que o maior jornal do Estado reconhece a importância desses mercados.
Há quase duas décadas nós apostamos no micro-jornalismo e defendemos a importância da informação local, da cobertura aos fatos e à vida das comunidades, geralmente abandonadas pelos grandes veículos.
Agora, eles se voltam para o mercado local. A concorrência é sempre saudável e informação nunca é demais. Diversidade é a palavra chave quando se trata de comunicação.
Mas é preciso atentar para o seguinte: não é a primeira tentativa que Zero Hora faz no jornalismo de bairro em Porto Alegre. A primeira, há dez anos mais ou menos, durou dois anos e meio, o tempo suficiente para aniquilar um florescente grupo de pequenos jornais, que se firmavam nos principais bairros da cidade.
O nosso JÁ Bom Fim foi um dos poucos que sobreviveu e levou anos para se recuperar. Hoje há uma segunda leva de jornais comunitários florescendo na cidade. Serão novamente arrasados?
Acredito que as condições são muito diferentes hoje e pode ocorrer o contrário: com seu poderio, ZH chamar atenção para os mercados dos bairros, valorizando não só os seus cadernos mas toda essa rede de pequenos jornais locais – são mais de vinte.
Se a iniciativa deriva do espírito monopolista e a intenção for apenas limpar o mercado de “ervas daninhas”, pode ser mais um tiro no pé. Os jornais de bairro hoje são pequenos arbustos, bem enraizados.
Se for uma iniciativa consciente, voltada para os interesses das comunidades, poderá representar o amadurecimento e a profissionalização do jornalismo de bairro em Porto Alegre. Quem viver verá.
Cardume de invencionices
Há seis ou oito anos, no bar da Feira do Livro, ali ao lado do Museu de Artes do Rio Grande do Sul, na Praça da Alfândega, tive a honra de compartilhar de uma mesa, onde se reuniam, em alarido juvenil, o Walter Galvani, o Cídio Salatino e o Rivadávia de Souza, o nego Riva, para os mais íntimos.
Um pouco antes, a Editora Sulina havia publicado as memórias do Rivadávia de Souza, que li avidamente, surpreso com a vida multifacetada do seu autor, reconstruída, pela memória, desde os seus tempos de guri, em Uruguaiana. Ali, ao redor da mesa, envolvida pela agitação feérica da noite, eu olhava para o Rivadávia e lembrava as passagens mais encantadoras de suas memórias, que deveriam ser leitura obrigatória para os jornalistas gaúchos, entre os quais ele disputava o primeiríssimo lugar.
Acompanhado pelo amigo e fiel escudeiro Cídio Salatino e pela esposa, uma espanhola de alma libertária, que conheceu em Paris, após a Segunda Guerra Mundial, Rivadávia, já entrado em anos, mas com a memória faiscante, me contou ter sido o autor da primeira entrevista publicada na imprensa gaúcha com o Lupicínio Rodrigues.
Mais tarde, quando ele e a esposa já haviam voltado para Brasília, onde moravam, me mandou um cartão agradecendo os comentários elogiosos que fiz a respeito do seu livro de memórias. Foi, na verdade, o último contato que tive com o Rivadávia de Souza, que faleceu em Brasília, deixando na saudade uma legião de amigos.
Pois, há duas semanas, reencontrei o Rivadávia de Souza num sebo da rua Riachuelo, espargindo simpatia, ao lado do presidente Getúlio Vargas, na capa do seu livro, intitulado “Botando os Pingos nos Is – As Inverdades nas Memórias de Samuel Wainer”. Os pingos nos is, colocados por Rivadávia de Souza, nasceram da sua indignação ao ler “Minha Razão de Viver”, contendo as memórias de Wainer, organizadas e editadas pelo jornalista Augusto Nunes.
Rivadávia de Souza
Defensor incansável do jornalismo íntegro, a serviço da verdade, Rivadávia de Souza fez questão de escrever o livro para esclarecer erros imperdoáveis de informação contidos nas memórias. Editado pela Record e publicado em 1989, o livro de Rivadávia de Souza é um manancial de informações preciosas a respeito dos bastidores da política brasileira contemporânea, que ele conheceu como poucos, na condição de repórter e, mais tarde, de amigo e assessor de imprensa do presidente Vargas, após a eleição de 1950.
A seriedade com que Rivadávia de Souza encarou a profissão de jornalista não permitiu que ele silenciasse diante dos escorregões do ego inflado de Wainer. Não se conhece na história do jornalismo brasileiro obra tão demolidora, realizada com o único propósito de restabelecer a verdade dos fatos contados e imaginados.
Algumas invencionices do Samuel Wainer receberam tratamento de choque. Afinal de contas, segundo Rivadávia de Souza, as memórias do criador da Última Hora contém “um cardume de invencionices, que pulam e pululam no seu leito”. Eu gostaria de conhecer a opinião do Augusto Nunes a respeito do livro do Rivadávia de Souza. Sempre há tempo para servir à verdade. E, acima de tudo, sempre há tempo para impedir que a história se misture com a ficção.
Os Heróis estão fatigados…
Fernando de Oliveira Coutinho, Juiz Corregedor aposentado
15ª. Região T.R.T São Paulo
Nada melhor para retratar a atual situação do que a produção, na França, do filme de Yves Montand, no início da década de 1950, denominado “Os heróis estão fatigados…” De igual forma como participei do Primeiro Congresso da Paz, em dezembro de 1952, em Viena, quando proclamávamos:
“Por mais paradoxal que se nos afigure, aqui estamos nós reunidos, em seção preparatória de um Congresso Mundial da Paz, a fim de soltarmos o nosso grito de guerra. Grito de guerra contra todos aqueles que se quedam mudos e impassíveis diante do soluçar da dor da humanidade sofredora. Em terras longínquas, mas a nós irmanadas por sentimentos de solidariedade humana, corre sangue inocente e culpado. É necessário sustar-se a medonha carnificina que, em colheita horrenda, nos leva vidas humanas. É necessário por um fim aos vendilhões da dignidade humana. Não se pode mais tolerar os céticos e apáticos. Não se pode mais admitir torres de marfim onde se escondem apavorados os covardes, egoístas e indiferentes de todas as castas.
O sangue que hoje corre, amanhã correrá com maior intensidade. E o que eram partículas ficarão gotas, o que eram gotas transformar-se-ão em riachos, os riachos em rios, rios em maré e, dia haverá que seus vagalhões atingirão as mais altas torres de marfim. Nada permanecerá íntegro. A pestilência da guerra atingirá os mais recônditos esconderijos e não haverá máscara que os proteja, a não ser a derradeira máscara da morte. É necessário que nosso grito de guerra penetre através das “cortinas de ouro” onde se acastelam os “profiteurs” da guerra. E, a cada um, o povo julgará conforme seu caminho.
E o nosso grito de guerra é um cântico de Paz. E a nossa caminhada, como a dos deuses, fecundará o deserto. Porque a união e a fé divinizam o Homem.
É o grito que sai das entranhas da mãe por ver, desde cedo, na fisionomia do filho, estampada a morte inglória. É o grito de Paz do pai, que percebe e vê refletido em seu próprio filho, o destino de morrer. É o grito de Paz da noiva, que desvenda no olhar do prometido a inutilidade de construir um lar que perecerá em virtude de guerra odiosa. É o grito lancinante do infante que não quer morrer assim, dessa forma assim… É o grito gemente da criança que, ao primeiro raciocínio, percebe seu trágico destino, ditado por mercadores. É o grito do militar, do magistrado, do sacerdote, do intelectual, do tecelão, que a par do tecido, tece a grandeza da pátria, do ferroviário, que percorre em suas máquinas todos os rincões do país, do marinheiro que sulca todos os mares, do sacrificado mineiro, do aviador, que percorre céus livres e não quer tombar em inútil holocausto, dos camponeses que regam a terra que não é sua, com seu suor que é muito seu.
É o grito de Paz de toda multidão que sofre e trabalha e não quer morrer por um ideal que não comunga, qual seja, o de amealhar dinheiro recolhido às arcas de poucos com os sacrifícios de muitos. Não desejamos mais: Suor – Lágrimas – Sangue. Queremos Paz – Trabalho – Fraternidade. E o nosso grito de Paz ecoará por terras e mares, céus e subsolos, porque é mais poderoso que as bombas atômicas e hidrogênicas. Mais poderoso que todos os artifícios de guerra, porque é o grito que parte da vontade soberana e indomável do homem que sabe e quer escolher seu próprio destino. É o grito de Paz definitiva. Queremos viver e produzir. Amar e ser amados. Queremos o direito que a nossa dignidade humana exige: o direito de viver! O direito de saber porque e por quem morremos. E eu vos afirmo que a Paz não somente deve ser salva. Eu vos afirmo que a Paz não somente pode ser salva. Eu vos afirmo que a Paz há de ser salva, haja o que houver, custe o que custar, porque essa é a nossa vontade.”
Naqueles idos estava em guerra a Coréia, guerra que durou de 1950 a 1953, e por pressão mundial, terminou com a divisão daquela nação em Coréia do Norte e do Sul e cuja fronteira foi delimitada pelo chamado paralelo 37. Em 1954 a luta argelina por sua auto-determinação. As maiores barbaridades então ocorreram com crimes terríveis cometidos por franceses e argelinos, como o corte de mãos, a castração e a decapitação. Nada mais atual. Mudou o palco, outros são os participantes. A colheita ceifadora prossegue em sua faina de exterminar a vida humana. A morte, em si, é uma verdade universal. O homem originou-se do pó e ao pó retornará. O assalto à moda do “gangsterismo” operou-se no Iraque. Colocaram uma cangalha na mocidade norte americana e de cambulhada foi enviada ao matadouro. O assalto ao Iraque se estriba no tripé: ganância, ambição e megalomania “sherifiana”.
A base é lastreada em mentira deslavada e hipocrisia despudorada.
O sr. Bush, como chefe da nação norte americana, ao enviar sua juventude para uma morte inglória, heróis sem causa, diuturnamente se transforma em um filhicídio, fratricídio e resvala pelas fronteiras do genocídio.
Os heróis estão fatigados… não querem tombar vítimas de uma bala certeira ou estilhaçados. Não querem cair com os braços abertos em forma de cruz ou serem mortos como animais caçados. A boca aberta, os olhos escancarados, o sangue a jorrar. Querem a Vida que é deles. Muito deles. Só deles!
É hora de parar. Há tempo de guerra. Há tempo de Paz! Bem compreendeu a Espanha, que em sua sabedoria retirou em tempo seus filhos. Os heróis estão fatigados… começam a entender que foram enganados. Sabem que são reféns dos senhores da guerra. Se apercebem que se não forem mortos, retornarão estropiados, mutilados, aleijados, paraplégicos, recauchutados, em frangalhos. Ao retornarem, serão atirados no lixo, como é usual. Os heróis estão fatigados… em tempo compreenderam que não se implanta a democracia como quem planta batatas. Que a ceifadora é sedenta de sangue e é cega na escolha. Os heróis estão fatigados… em suas mentes começam a ressoar as palavras do poeta “Sou sempre o mesmo, o último e primeiro, assim que cresço e fico moço, morro!” E ao cair da noite sonham.
“Eu quero arar os campos para o trigo, quero vigiar os rebanhos nas encostas, cantar nos estaleiros e altos fornos. Mas me arrancam das aulas e dos teares. E me atiram no lodo das trincheiras. Não adianta chorar Malamatemia! Corta as entranhas, para que eu não nasça”.
Sr. Bush, não queira passar para a história com o cognome Mr. Butcher, que como carniceiro bem lhe assenta. Não ouse se travestir em novo Polifemo e queira prosseguir com sua manopla triturando companheiros e seres humanos. Novos Ulisses surgirão e os papéis se inverterão. Não queira em sua lápide o epitáfio “aqui jaz um fratricida universal”. Cessa enquanto é tempo. Os heróis estão fatigados… e quando fatigados se tornam uma tsunami humana com efeito devastador e imprevisível.
Os heróis estão fatigados… que se veja em todos os sites, em todos os quadrantes da terra, as palavras imorredouras de Bilac:
“Nunca morrer assim; nunca morrer num dia assim; de um sol assim!”
Por que o leitor não importa mais para os jornalistas?
Interessante como a pergunta que nos fazíamos nos “velhos tempos da Coojornal” continua atual: Os profissionais serão capazes de construir uma alternativa?
A imprensa empresarial convencional continua a mesma. Justificou arbítrio em outros tempos, hoje justifica o desemprego.
É uma situação que não vai mudar com críticas, com bla, bla, bla. Mas com ações concretas, com os profissionais que se dispuserem a se organizar e produzir uma nova imprensa.
O novo não surge de cabeças iluminadas, surge da estrutura nova.
Todos os jornais dizem que vivem para o leitor, o leitor é o seu senhor. Mas o leitor hoje para os jornalistas não tem nenhuma importância.
Os jornalistas é que são importantes hoje. São estrelas, celebridades, um pobre leitor se intimida perto deles.
Importante para o jornalista é a autoridade, o grande empresário, o figurão. Ele tem claro que esse é o sujeito que o sustenta, não o leitor. O leitor está vendido nesta parada.
[sh_poll poll_id=”4393497″ template_id=”1″]