Marcos Sosa, Professor de Literatura
Fazia falta um livro assim na minha estante. Um livro pequeno, meio artesanal, que tivesse fotos bonitas. Um livro bonito. Em “Crônica: o vôo da palavra”, de Walter Galvani, lançado na primeira semana de agosto pela editora porto-alegrense Mediação, as páginas de leitura têm suspensões, por meio de fotografias, que versam sobre o horizonte, o mar, barcos e reflexos de sol. E gaivotas. Muitas. Ora sozinhas ou em bandos, ora em revoada ou em comunhão. Gaivotas para a medida exata da metáfora levada a efeito pelo autor, sugerindo que, enfim, o ato de escrever precisa e exige um movimento rente às ondas, para fisgar o alimento e, justo depois, voar mais e mais.
Resultado de um curso para aspirantes a cronista ministrado pelo autor, o
livro desenvolve-se a partir de uma adequação de comentário prático e de uma linguagem acessível, menos técnica do que aquela presente em livros de crítica literária. Não por acaso, uma linguagem que aposta na simplicidade para falar desta manifestação de literatura que come o pó das ruas, bebe os cafés dos bares, cantarola versos de canção popular e vive dividindo espaço com a ficção.
Essa opção de linguagem abre espaço não só para o candidato a cronista, mas também para o leitor de crônicas – este sujeito que, da outra ponta do processo, encontra neste gênero um ponto de fuga cotidiano, entre uma fila de banco ou o intervalo do almoço. Em muitas passagens, Galvani dá atenção a este leitor que busca a fresta do dia, ávido de entrosamento com essa natureza flexível, explosiva e um tanto arbitrária que norteia a razão de ser do texto cronístico.
De onde se conclui por um caminho excelente de inserção no universo dos livros e do conhecimento. Ao ter em mãos um trabalho que aborda este caminho, o leitor agrega a seu repertório um saber que se encontra no meio-fio entre a crítica e a produção, seja no recorte histórico evocado pelo autor ao comentar, por exemplo, a literatura dos viajantes e o natural desdobramento desta à produção jornalística posterior, seja visitando, de modo especial, o quadro específico, moderno e brasileiro, da crônica.
Paradoxalmente, é justo aqui, num país com graves deficiências de leitura, que a crônica se apresenta como uma grande feira, com sabores para todos os gostos.