A pornográfica taxa de juros de 13,75%

A manutenção do pornográfico índice de 13,75%, ao ano, da taxa básica de juros, a Selic, conforme definição do presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Josué Gomes, dá a dimensão da luta que o governo Lula irá enfrentar, até o final de sua gestão, para tentar viabilizar a retomada de crescimento econômico do país. O governo Bolsonaro perdeu, mas deixou um campo minado e uma maioria ultraconservadora no Congresso.

Com o atual índice de 13,75% anuais, o Banco Central (BC) mais do que dobrou os gastos com juros pagos aos bancos com o uso das operações compromissadas, que hoje são o principal instrumento de gestão da política monetária. Somente em 2022, o BC desembolsou R$ 133,22 bilhões com juros, alta de 160% em relação a 2021, quando pagou R$ 51,1 bilhões ao sistema financeiro nacional.

Os dados foram levantados pelo jornal Valor Econômico junto ao próprio BC e ao Tribunal de Contas da União (TCU), que realizou uma auditoria inédita sobre o uso das compromissadas no controle inflacionário.

As operações compromissadas significam remuneração da sobra de caixa dos bancos. De 2003 a 2022, segundo o TCU, o custo somado para administrar a oferta de recursos disponíveis na economia foi superior a R$ 1 trilhão. Se corrigido pelo IPCA, o montante ultrapassa R$ 1,8 trilhão. Em média, são R$ 60 bilhões pagos por ano com o mecanismo. Essa operação é incluída no cômputo da dívida pública. Quanto mais dessas operações o BC realiza, mais a dívida pública é afetada.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforçou as críticas ao Banco Central e ao presidente da instituição, Roberto Campos Neto. Disse que não tem explicação “para nenhum ser humano do planeta Terra” a atual taxa de juros e deixou recado para o Senado “cuidar” do chefe do BC. “Quem tem que cuidar do Campos Neto é o Senado, que o indicou. Ele não foi eleito pelo povo, não foi indicado pelo presidente”, afirmou.

Desta vez, porém, a manutenção da taxa de juros no patamar atual provocou reações mais amplas na sociedade, principalmente pelo último parágrafo da nota do BC, que deixou no ar a possibilidade de aumentar ainda mais a taxa básica de juros no momento que o consumo está no chão e o país soma cerca de 33,1 milhões de pessoas sem ter o que comer diariamente, quase o dobro do contingente em situação de fome estimado em 2020. Em números absolutos, são 14 milhões de pessoas a mais passando fome no país, conforme a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN).

O último parágrafo da nota do BC: “Considerando a incerteza ao redor de seus cenários, o Comitê segue vigilante, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período prolongado será capaz de assegurar a convergência da inflação. O Comitê reforça que irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas, que mostrou deterioração adicional, especialmente em prazos mais longos. O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado.”

O Ibovespa fechou em forte queda na quinta-feira, perdendo o patamar dos 100 mil pontos, e o valor do dólar aumentou em relação ao real, pelas críticas de Lula a Campos Neto. No entanto, as forças produtivas mudaram o discurso. Até mesmo o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), que ainda no mês passado defendia a política de juros altos para controlar a inflação, disse em nota à imprensa que a redução da taxa precisa ser iniciada o quanto antes. Gilberto Petry reforçou que os problemas na oferta de crédito trazem um desafio adicional para a indústria, em especial pelo encarecimento das linhas ligadas ao capital de giro, fundamentais para a manutenção das atividades produtivas.

As montadoras de veículos Volkswagen, Hyundai, Mercedes-Benz, GM e Stellantis programaram férias coletivas e, em alguns casos, suspenderam a produção de suas fábricas. Com a taxa básica de juros a 13,75% no país, a média dos financiamentos de veículos gira em torno de 25% ao ano, reduzindo a demanda.

Segundo levantamento da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), as vendas à vista respondiam por 47% do total comercializado em dezembro de 2018, mas passaram a ser maioria (51%) no mesmo mês de 2020. Já no fim do ano passado, atingiram 70% do total. Se as montadoras continuarem a vender só caminhonetes para abastados, corremos o risco de tornarem-se distribuidoras de importados, como aconteceu com a Ford, que foi embora do Brasil.

A dona do Magalu, Luiza Trajano, disse que a grande preocupação do setor de varejo no momento é com a taxa de juros em 13,75% ao ano. “Todo mundo está preocupado com a falta de mercado, de venda, e sabe que juros altos são o primeiro fator para atrapalhar isso.”

Nesta semana, ao participar do seminário “Estratégias de desenvolvimento sustentável para o século XXI”, promovido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e pela Fiesp, na sede do banco, no Rio, o professor da Universidade de Columbia e vencedor do Prêmio Nobel da Economia, Joseph Stiglitz, chamou o Brasil de eterno país do futuro. “É surpreendente o Brasil ter sobrevivido ao que compara a uma pena de morte, que é a taxa de juros de 13,75% ao ano e taxa real de 8%.

No mesmo evento, o economista e professor da Universidade de Columbia, Jeffrey Sachs, ressaltou que o Brasil ficou empacado ao longo da última década, com um crescimento irrisório, e precisa ampliar as taxas de investimento público em capital humano e infraestrutura para alavancar o crescimento. Para ele, não é momento para austeridade fiscal.

Segundo Sachs, as taxas de juros deveriam ser reduzidas no Brasil para algo em torno de 8%, podendo chegar a até 6%.  “As taxas do Brasil poderiam descer, pois cada redução de 1% na taxa de juros representa 1,6% do PIB na redução do déficit do Orçamento. Se a taxa fosse 5% mais baixa hoje, o déficit seria cortado em 3%.”

 

 

 

 

Um comentário em “A pornográfica taxa de juros de 13,75%”

  1. E quanto ao pornográfico aumento de gastos pelo governo federal? Nada? Tudo bem?
    E quanto ao pornográfico provável aumento de impostos pelo governo federal? Nada? Tudo bem?
    E quanto ao possível aumento da inflação caso a selic baixe? Nada? Tudo bem?
    É. É sempre assim. Uns tentam controlar o vôo enquanto os populistas fazem o possível para que o vôo continue sendo um “vôo de galinha”.

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