O grande diferencial da Cúpula da Amazônia, que aconteceu esta semana, em Belém, Pará, foi o surgimento de um novo bloco político, dos países detentores de floresta amazônica. O grupo extrapolou o continente com a participação do Congo, África, e Indonésia, Ásia. É preciso ver como esse bloco vai decolar. O primeiro teste virá na conferência do clima de Dubai, a COP 28, em dezembro. Como serão as posições das potências econômicas sobre metas de parar o desmatamento ou explorar petróleo na Amazônia. Os donos de florestas conseguirão definir posições em conjunto nas negociações ambientais globais?
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva destacou que quem tem as maiores reservas florestais e a maior biodiversidade merece maior representatividade no Fundo Global, e que é “inexplicável que mecanismos de financiamento, como o Fundo Global para o Meio Ambiente, que nasceu no Banco Mundial, reproduzam a lógica excludente das instituições de Bretton Woods”. O presidente se referiu às instituições financeiras internacionais criadas na Conferência de Bretton Woods, que em 1944 estabeleceu o dólar como moeda para comércio internacional.
Lula criticou a falta de representatividade de países como Brasil, Colômbia, Equador, Congo e Indonésia no fundo, e que, a estrutura atual acaba por favorecer países como Estados Unidos, Canadá, França, Alemanha, Itália e Suécia, que ocupam cada um seu próprio assento. “Os serviços ambientais e ecossistêmicos que as florestas tropicais fornecem para o mundo devem ser remunerados, de forma justa e equitativa”, acrescentou ao defender uma espécie de certificação de produtos produzidos de forma sustentável nas grandes florestas tropicais.
O Presidente classificou como “neocolonialismo verde” a adoção de medidas discriminatórias e barreiras comerciais que, “sob o pretexto de proteger o meio ambiente”, desconsideram marcos normativos e políticas domésticas dos países que ainda detêm florestas em seus territórios.
Para Lula, “a Amazônia não é e não pode ser tratada como um grande depósito de riquezas. Ela é uma incubadora de conhecimentos e tecnologias que mal começamos a dimensionar. Aqui podem estar soluções para inúmeros problemas da humanidade – da cura de doenças ao comércio mais sustentável. A floresta não é um vazio a ser ocupado, nem um tesouro a ser saqueado. É um canteiro de possibilidades que precisa ser cultivado”, acrescentou o Presidente.
Em julho, Lula esteve em Letícia, na Colômbia, para a reunião técnico-científica dos países da Amazônia. Na ocasião, ele defendeu o fortalecimento da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) e de outros mecanismos de controle social, como o Parlamento Amazônico, além de instâncias científicas e de monitoramento da floresta para orientar políticas públicas.
Na quarta-feira (9) foi divulgado um comunicado conjunto com as considerações finais do encontro, intitulado “Unidos por nossas Florestas: Comunicado Conjunto dos Países Florestais em Desenvolvimento em Belém”, que apresenta os pontos consensuais de Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, tendo por base “aportes da sociedade civil” destacados durante o Seminário sobre Desenvolvimento Sustentável da Amazônia, que ocorreu no mês de maio em Brasília, e de órgãos do governo federal.
O documento reitera diversos compromissos voltados à pauta ambiental e pede vantagens a produtos florestais sustentáveis nos mercados dos países desenvolvidos. “Reforçamos o nosso entendimento de que o acesso preferencial para produtos florestais nos mercados dos países desenvolvidos será importante alavanca para o desenvolvimento econômico dos países em desenvolvimento”, diz o comunicado.
Reforça os compromissos voltados à preservação das florestas, à redução das causas do desmatamento e da degradação florestal, bem como à conservação e valoração da biodiversidade. Reforça também compromissos em favor de uma transição ecológica justa, partindo da premissa de que as florestas têm papel relevante para o desenvolvimento sustentável e para os desafios contemporâneos globais – o que inclui comunidades locais como povos indígenas.
“Manifestamos também nossa preocupação com o não-cumprimento, por parte de alguns países desenvolvidos, de suas metas de mitigação e relembramos a necessidade dos países desenvolvidos de liderar e acelerar a descarbonização de suas economias”, acrescenta o comunicado, ao propor, como meta, atingir neutralidade de emissões antes de 2050.
Os países signatários manifestaram também preocupação com o não-cumprimento de compromissos, por parte dos países desenvolvidos, com relação aos US$ 100 bilhões anuais prometidos para financiamentos climáticos nos países em desenvolvimento. “Conclamamos os países desenvolvidos a contribuir para a mobilização de US$ 200 bilhões por ano, até 2030, previstos pelo Marco Global para a Biodiversidade de Kunming-Montreal para a implementação dos planos de ação e estratégias nacionais de biodiversidade”, diz o documento.
O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, surpreendeu na Cúpula da Amazônia. Em seu discurso optou por não falar sobre consensos de um documento já acordado e defendeu o fim da exploração de combustíveis fósseis na Amazônia e enfatizou que o combate à emergência climática exige mais do que zerar o desmatamento. “O planeta precisa deixar de usar o petróleo, o gás e o carvão”, declarou. Apesar de virar notícia em toda a mídia corporativa, que defende outros interesses não brasileiros, os representantes de países amazônicos, porém, nem citaram a importância de limitar a indústria petroleira. O discurso isolado de Petro ocorreu no início da Cúpula da Amazônia, na terça-feira (8).
O presidente Lula ouviu as críticas de Petro e, como bom anfitrião, deixou o colega brilhar. A diplomacia brasileira driblou como pôde a falta de consenso em torno da metar regional de desmatamento zero. Emplacou, contudo, o ambicioso Centro de Cooperação Policial Internacional da Amazônia, com sede em Manaus, ideia do ministro da Justiça, Flávio Dino.
Com Agência Brasil