No final de 2020, o Ministério Público de Goiás já recomendava ao governador do Estado, Ronaldo Caiado (União Brasil), a realização de estudos no sentido de taxar a exportação de produtos agrícolas in natura. O órgão considerava que a medida não geraria prejuízos aos produtores rurais, já que os grãos têm suas cotações formadas no mercado internacional. A taxação foi uma reivindicação da Federação das Indústrias de Goiás (Fieg) para estimular e baratear o processamento de soja e milho pelas empresas radicadas no Estado. No dia 23 de novembro passado, a Assembleia Legislativa de Goiás aprovou o Fundo de Infraestrutura do Estado (Fundeinfra), proposto pelo governador Caiado.
Mato Grosso, que lidera a produção agropecuária no país, projeta recolher neste ano R$ 3,26 bilhões por meio do Fundo Estadual de Transporte e Habitação (Fethab), quase 20% mais do que em 2021. Criado em 2000, no Mato Grosso, o Fethab é maior entre os fundos que taxam o agro no país. Ele serviu como modelo para o projeto de Goiás.
Criado na gestão do ex-governador Dante de Oliveira, o fundo passou por alterações. Em 2015, o Fethab arrecadou R$ 868 milhões oriundos das contribuições das commodities (soja, gado em pé, algodão e madeira) e do óleo diesel (responsável, sozinho, por 60% do que é arrecadado). Deste total, aproximadamente R$ 345 milhões são obtidos com as commodities e outros R$ 524 milhões advêm do óleo diesel.
O Fethab, de Mato Grosso, enfrenta Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF). A contribuição não é obrigatória, mas é atrelada à obtenção de benefícios fiscais – em Mato Grosso, ao ICMS. A ação que envolve o Fethab no STF aguarda análise do ministro Gilmar Mendes.
Os Estados têm a necessidade de aumentar suas arrecadações porque foram afetados pela decisão do governo federal de reduzir o recolhimento do ICMS sobre combustíveis, medida adotada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) durante a campanha eleitoral. O Paraná tentou criar o seu fundo para taxar o agronegócio, mas as lideranças setoriais, por enquanto, conseguiram barrar o projeto sugerido pelo governador Ratinho Júnior (PSD).
No Rio Grande do Sul o tema ainda não veio à tona. No entanto, a projeção do governo gaúcho é de uma perda de receita da ordem de R$ 4,4 bilhões brutos, em relação à previsão da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) 2023, em razão dos efeitos da Lei Complementar (LC) 194. Em junho, a nova legislação federal reduziu as alíquotas de combustível, energia e telecomunicações de 25% para 17%, comprometendo a arrecadação do Estado e de prefeituras.
Com isso, o governo teve de rever a trajetória de equilíbrio expressa na LDO 2023 (elaborada em maio) para um novo cenário, que prevê um déficit orçamentário de R$ 3,7 bilhões no Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) 2023, refletindo os desafios impostos pela LC194.
Bem antes, a Lei Kandir, aprovada em 1996, provocou aos estados brasileiros exportadores de commodities a desoneração das exportações de produtos primários e semielaborados. Isentos de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS); Programa de Formação do Patrimônio (PIS); Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
A desoneração de impostos provocada pela Lei Kandir resultou num profundo endividamento de estados agroexportadores, como o Rio Grande do Sul, inviabilizando investimentos. O ICMS representa a maior fatia das receitas tributárias dos estados brasileiros, algo próximo a 65% das receitas totais para o Rio Grande do Sul.
Em 2020, finalmente a compensação para as perdas da Lei Kandir dos estados e municípios foi regulamentada. Só que o valor definido foi irrisório perto das perdas dos Estados. A União garantiu o repasse no total de R$ 58 bilhões, entre os anos de 2020 e 2037. No entanto, só o estado gaúcho calcula perdas na ordem de R$ 80 bilhões no acumulado.