Quem ganha e quem perde com o aumento da dívida pública

De acordo com o Plano Anual de Financiamento (PAF), apresentado pelo Banco Central no fim de janeiro, o estoque da Dívida Pública Federal deve encerrar 2022 entre R$ 6 trilhões e R$ 6,4 trilhões, próximo de 80% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Em  2018, primeiro ano do governo Bolsonaro, o valor era de R$ 3,877 trilhões, conforme a Secretaria do Tesouro Nacional. Portanto, o valor da dívida pública em 2018 vai quase dobrar em 2022.  
O relatório de estatísticas fiscais, nos 12 meses encerrados em março passado, mostra que o superávit primário (resultado positivo de todas as receitas e despesas do governo, excetuando gastos com pagamento de juros) do setor público consolidado atingiu R$ 122,8 bilhões. Todo o esforço do governo federal para um superávit fiscal tem como objetivo principal pagar os juros da dívida.
As despesas totais do governo este ano com o pagamento de juros vão ficar em torno de R$ 700 bilhões, aumento de 56% sobre os R$ 448,2 bilhões gastos em 2021, segundo projeções de mercado. Resultado das altas da taxa básica de juros, a Selic.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu em 3 de agosto, por unanimidade, elevar a taxa Selic de 13,25% ao ano para 13,75% ao ano – alta de 0,5 ponto percentual. É o 12º aumento consecutivo na taxa de juros. A taxa básica estava em 2% ao ano em março de 2021.
Inflação
 A política monetária adotada pelo Banco Central de aumentar a taxa de juros tem como objetivo oficial derrubar a inflação. Para definir o nível dos juros, o Banco Central se baseia no sistema de metas de inflação. Quando a inflação está alta, o BC eleva a Selic. Quando as estimativas para a inflação estão em linha com as metas, o Banco Central reduz a Selic. 
Ao subir o juro básico, a autoridade monetária justifica que o objetivo é encarecer o crédito e desestimular o consumo pelas empresas e famílias e assim baixar os preços. Como encarecer o crédito e reduzir consumo neste momento, se a inflação não é de demanda, mas de custos do petróleo e seus derivados, da energia, que atingem toda a cadeia produtiva. O empresário sempre vai repassar nos preços suas despesas ou não terá lucro.

O economista André Lara Resende, um dos pais dos planos Cruzado e Real, já repetiu várias vezes “que a atual política econômica do governo brasileiro está asfixiando e destruindo o Estado, o que elimina a chance de se criar uma economia de mercado saudável. “Esse viés fiscalista é fruto de mitos e de um liberalismo anacrônico de Chicago dos anos 1960.” Recado direto ao Chicago boy, ministro da Economia Paulo Guedes.

Segundo Lara Resende, com o quantitative easing [afrouxamento monetário], a expansão monetária que todos os bancos centrais dos países desenvolvidos fizeram depois da crise de 2008, a teoria neoliberal foi completamente desmoralizada.

A inflação é fundamentalmente uma luta entre grupos pela redistribuição da renda real. A elevação do nível de preços é apenas uma manifestação exterior desse fenômeno, conforme Celso Furtado, em seu livro clássico Formação Econômica do Brasil. Isso significa que a inflação beneficia as camadas que podem repassar seus custos, ao contrário do assalariado, ainda mais num país com milhões de desempregados e informais.

Na prática, o aumento da taxa básica de juros proporciona uma maior remuneração para os bancos e investidores em títulos públicos, facilitando a rolagem da dívida pelo governo federal. Além disso, os bancos recuperam os   investidores mais conservadores, que buscam os produtos básicos dos bancos destinados a esse perfil, como títulos do Tesouro Direto atrelados à Selic, fundos DI (também chamados de fundos simples) e Certificados de Depósitos Bancários (CDBs) com rentabilidade perto de 100% do CDI, que segue a taxa Selic.
As instituições financeiras seguem como principais detentoras da Dívida Pública Federal interna, com 29,6% de participação no estoque. Os fundos de investimento, com 23,2%, e os fundos de pensão, com 23%, aparecem em seguida na lista de detentores da dívida.

Endividamento das famílias

Uma das consequências recai sobre a taxa de juros do cartão de crédito, chamada de Juros e Custo Efetivo (CET), que era de 297,60% ao ano, em março de 2021, e pulou para 422,87%, em agosto de 2022.
A parcela de inadimplentes – aqueles que têm contas ou dívidas em atraso – chegou a 28,7% das famílias brasileiras em maio passado, de acordo com a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (CNC). O percentual de famílias endividadas, ou seja, aquelas que têm dívidas (em atraso ou não), ficou em 77,4%. O tipo de dívida mais comum continua sendo o cartão de crédito, responsável pelo endividamento para 88,5% das famílias.
A coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida (ACD) Maria Lucia Fattorelli afirma que cada 1% de aumento na taxa Selic gera um prejuízo anual de R$ 34,9 bilhões aos cofres públicos. Em seu livro Auditoria Cidadã da Dívida Pública, ela escreveu sobre a existência de um conjunto integrado de elementos que conformam um verdadeiro Sistema da Dívida. “O funcionamento desse sistema garante perpetuação do endividamento público externo e interno, pois as dívidas crescem de maneira acelerada devido à imposição de condições onerosas que exigem, continuamente, a assunção de novas obrigações para pagar dívidas anteriores, em processos reiterados, sem transparência, cujo resultado é a dominação financeira e econômica e uma ofensa à soberania nacional.”
Ela lembra que são recursos que poderiam ser direcionados para qualificar as instituições de ensino, mas que acabam servindo apenas para explodir os gastos com a dívida pública e enriquecer banqueiros, já que a inflação brasileira não é controlada com o aumento dos juros.
Segundo Fattorelli, não podemos mais apenas sentar e assistir a continuidade de uma política monetária que joga contra o povo brasileiro. “O que o Banco Central tem feito com as sucessivas altas da taxa Selic sem ter qualquer fundamento técnico, econômico ou moral para isso, aprofunda ainda mais uma crise que foi fabricada a partir de 2014 e traz consequências graves até os dias de hoje.”

Um comentário em “Quem ganha e quem perde com o aumento da dívida pública”

  1. Inacreditável nossos economistas, só sabem aumentar com facilidade, a taxa de juro e salvar o lucro bilionário dos bancos . Depois exige que o governo dê superávit fiscal, se Ele BC é quem ferra com as contas públicas. Por outro lado os bancos, detonam o crescimento do país, com os juros acima de 400%aa sobre a população. 1% de juros, deve corresponder Reais 60 bilhões. Estamos pagando cerca de R 780 bilhões ao ano. É muito dinheiro do povo mal empregado. Meu Deus, melhor conviver com a inflação, desde que preços e salários subam ela se neutraliza. O Brasil necessita de economistas brasileiros, para defender o país contra essa turma que pensa que defende uma classe. No entanto vamos todos juntos para o brejo. Os bancos convertem seus lucros bolhas em USD e manda para fora do país. Fica aqui só a massa dos inadimplentes, criados artificialmente, para gerar grandes lucros mesmo que não paguem. Com tudo isso o País fica centenas de anos em crescimento vegetativo. Como a economia pode crescer se ninguém têm dinheiro para gastar? É tanta aberração, que economicamente só se explica pelo ilustre método económico brasileiro, aumentar os juros ou diminuir os juros. Falta pouco para cair o pau da barraca. Esse diz que estuda tanto, pra quê se fazem sempre a mesma coisa. ECONOMIA SEM CRIATIVIDADE, SEM POPULACAO na equação = crescimento Zero. Estranho, que só economistas, com perfis sobe juros sempre desce
    juros raramente, que são aceitos para presidir o BC. Coitado de nós povão, um grande barco a deriva!

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