PF investiga fraudes na gestão de investimentos do Cais Mauá

A Polícia Federal deflagrou nesta quinta-feira (19/4) a Operação Gatekeepers, com o objetivo de combater fraudes relacionadas a fundos de investimento envolvidos na revitalização do Cais Mauá.
Conforme a PF, estão sendo cumpridos nove mandados de busca e apreensão (cinco em Porto Alegre/RS e quatro no Rio de Janeiro/RJ, inclusive na sede do Cais Mauá,), além de ordem de busca e apreensão de três veículos em Porto Alegre e bloqueio de ativos em nome de 20 pessoas físicas e jurídicas, sendo investigados crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e de lavagem de dinheiro. Os mandados foram expedidos pela 7ª Vara Federal de Porto Alegre. Até fevereiro o fundo era administrado pela ICLA Trust Serviços Financeiros S.A.
Em março as obras do Cais iniciaram após a troca dos gestores do fundo, o empresário João Carlos Mansur, presidente do grupo Reag, assumiu a gestão do projeto licitado em 2010 e desde então emperrado por demandas ambientais, problemas técnicos e questões políticas. Como presidente do novo Cais Mauá, foi nomeado o empresário Vicente Briscio.
A investigação teve origem em 2013, com a apuração de aportes feitos por um fundo de previdência privada gaúcho em um fundo de investimentos. Este último aplicava os valores em empresas de construção civil sem que houvesse a devida execução de obras públicas.
No decorrer da investigação, identificaram-se ligações do grupo com obras de revitalização urbana em Porto Alegre. São investigadas possíveis movimentações de recursos para pessoas ligadas à administração, inclusive com a aquisição de bens de alto valor, como veículos de luxo.
O termo Gatekeeper, além do significado em inglês, porteiro ou até mesmo guardião, também tem uso no mercado financeiro, estando ligado a pessoas ou instituições de credibilidade que atuam em processos de análise de conformidade, verificação e certificação.
O projeto de revitalização do Cais terá três etapas. A primeira é a restauração de 11 armazéns do Cais (do A6, no extremo da Usina do Gasômetro, até o B3, próximo à rodoviária). Deve custar R$ 140 milhões. O investimento total é estimado em R$ 500 milhões.
 

Cais Mauá: atual revisão do plano de negócios assimila prejuízos

Em nota encaminhada ao Jornal JÁ, o presidente do Cais Mauá Brasil, Vicente Criscio, explicou que os prejuízos contabilizados nos balanços de 2016 e 2017, publicados recentemente, são normais numa empresa que, por estar em fase pré-operacional, não gera receitas.
De qualquer forma, segundo Criscio, o cenário negativo dos últimos sete anos está sendo considerado na revisão do plano de negócios do empreendimento voltado para a revitalização dos espaços ociosos do antigo porto da capital.
A nota do Cais Mauá, na íntegra, é a seguinte:
“A respeito da notícia veiculada no Jornal Já na semana passada sobre o balanço publicado do CMB S/A, cabe observar que o Cais Mauá do Brasil S/A é uma empresa ainda no estágio pré-operacional. Sendo assim, é natural que tenha gerado despesas ligadas diretamente ao projeto (estudos para aprovações de licenças, equipe interna, serviços de terceiros, centenas de plantas) e – por estar ainda nessa fase – não possui receitas. Consequentemente gerou prejuízos em todos os anos fiscais. 
Cabe ainda destacar que: i. os balanços foram auditados por uma das mais importantes auditorias do mundo, a Deloitte Touche Tohmatsu Limited, com referência clara a esses resultados em notas explicativas sobre o balanço; ii. a escrituração contábil atende a Lei das S/A (6404/76 e posteriores alterações); iii. o plano de negócios em revisão já considera esse cenário de resultados. 
Atenciosamente, 
Vicente Criscio, Presidente do CMB

Balanços do Cais Mauá acusam perdas de R$ 51 milhões em sete anos

GERALDO HASSE

Os dois balanços financeiros do Cais Mauá do Brasil S. A. publicados no Correio do Povo de quinta-feira (22/3), contendo cifras inéditas sobre os exercícios fiscais de 2013, 2014, 2015, 2016 e 2017, refletem os problemas administrativos em que mergulhou a empresa escolhida em 2010 pelo governo do RS para “revitalizar” os espaços ociosos do mais antigo e vistoso terminal portuário da capital gaúcha.

Separada em dois balanços (2016 e 2017), a prestação de contas atrasada expôs ao público em geral o que os acionistas, parceiros e autoridades já sabiam: o consórcio Cais Mauá exauriu-se financeiramente na luta contra embargos, cobranças e questionamentos levantados por movimentos civis e órgãos técnicos.

A leitura desses documentos vertidos em letra miúda e linguagem técnica é de difícil compreensão, mas no final das contas são declarados prejuízos acumulados de R$ 51 milhões nos sete anos (2011/2017) de pendências encerradas com o licenciamento ambiental concedido pela Prefeitura de Porto Alegre no apagar das luzes de 2017. Além do contador Marice Fronchetti, assinam os balanços a presidente Julia Vassalo Maia da Costa e o diretor de operações Sergio José de Lima.

À falta de maiores esclarecimentos, resulta útil a leitura do relatório da auditoria contábil Deloitte Brasil sobre as demonstrações financeiras do Cais Mauá. Lembrando que a companhia está em fase pré-operacional (ou, seja, não tem receitas, só carrega custos), o contador Ricardo Schenk Duque baseia-se em dois itens relevantes do balanço de 2017 – o passivo a descoberto de R$ 8,69 milhões e o capital circulante líquido negativo de R$ 16,5 milhões – para concluir: “A continuidade operacional da Companhia está condicionada ao suporte financeiro do seu controlador e o sucesso na comercialização dos projetos”.

O documento da Deloitte leva uma data bastante recente (5 de fevereiro de 2018), mas não faz qualquer referência à eventual mudança no controle acionário do consórcio Cais Mauá do Brasil S. A. ou à mais recente novidade – a revitalizadora entrada em cena dos novos gestores do empreendimento.

Agenda positiva

Ficou faltando esclarecer, portanto, como se configurou a negociação que resultou na transferência da gestão do projeto para o administrador de fundos José Carlos Mansur e o executivo Vicente Criscio, oficialmente apresentados em cerimônia pública no dia 12 de março passado. Há indícios de que houve um acordo operacional entre as partes responsáveis pelo projeto mas, no evento realizado sob um toldo branco armado no próprio cais, Mansur e Criscio não disseram palavra sobre o passivo do empreendimento – apenas se referiram de modo extremamente positivo ao início das obras, efetivamente colocadas em marcha nos dias seguintes.

Os principais protagonistas da cerimônia foram o prefeito de Porto Alegre, que criticou duramente os adversários políticos que “travam a máquina pública”, e o governador José Ivo Sartori, que ensaiou ali, diante de uma plateia seleta, às margens plácidas do Guaíba, os primeiros passos de sua campanha à reeleição.

Cais Mauá já busca parceiros para ocupar armazéns

Ao mesmo tempo em que iniciam as obras físicas de recuperação dos armazéns do Cais Mauá, os novos gestores do projeto começam a negociar com possíveis parceiros para ocupar os espaços comerciais na área.

Os movimentos ainda são reservados, principalmente quanto a nomes. Mas o novo executivo do empreendimento, Vicente Criscio, confirma que já há tratativas em andamento: “Já identificamos o que a cidade gosta e usa, as marcas que os gaúchos consomem, estamos conversando”.

Em 3,2 quilômetros de cais à beira do Guaíba, incluindo os armazéns, são 181 mil metros quadrados de área disponível, parte destinada a áreas públicas – ciclovias, praças, áreas verdes – parte para atividades de comércio e serviços.

“As negociações podem incluir desde um comércio pequeno, de uns 100 m², até grandes – um armazém com um supermercado, porque não?”, diz Criscio.

No dia 5 de março, depois de anos, foi concedida a licença de instalação, que permite o início das obras, do projeto Cais Mauá, empreendimento privado para revitalizar e explorar o principal espaço de Porto Alegre, berço da cidade, à beira do Guaíba.

No mesmo dia foi anunciada a mudança ocorrida ainda no ano passado na gestão do Fundo Cais Mauá, o consórcio que ganhou a concessão por 25 anos para explorar o espaço.

A ICLA Trust que geria o fundo foi substituída pela REAG, outra administradora de fundos de investimento.

O site da REAG na internet informa que ela administra 40 fundos num total de R$ 7 bilhões em ativos. “É a mais importante missão da minha vida”, disse João Carlos Mansur, presidente da REAG, ao receber a licença para o início das obras.

O Fundo Cais Mauá tem um PL (patrimônio líquido) de R$ 163 milhões. Tem pela frente uma obra de R$ 140 milhões ao longo de dois anos. As etapas seguintes, que vão precisar de mais R$ 400 milhões pelo menos. Há projetos, que ainda podem sofrer alterações, estão definidos apenas os índices construtivos (volumetria).

Tanto que o novo gestor está disposto a rever o conceito do shopping center previsto no projeto original, junto à usina do Gasômetro. Em vez de uma torre vertical, que gera protestos, uma ocupação horizontal, a céu aberto.

Vicente Criscio foi indicado como presidente para tocar o projeto do Cais Mauá. Ele falou ao JÁ.

Sobre possíveis revisões no projeto, novo presidente do empreendimento, Vicente Criscio fala “prometemos revisar e estamos buscando dá uma outra solução pro shopping do gasômetro. Pensamos um novo conceito, um Open mall, a céu aberto” / Divulgação / Cais Mauá

JÁ – Porque a mudança na gerência do projeto?

Criscio – Eu sou um executivo contratado. Tem o Cais Mauá Brasil SA que, por decisões dos investidores que controlam o fundo, decidiu que era mais conveniente trazer uma gestora voltada para empreendimentos imobiliários, diferente do antigo gestor, apto mais a captação de recursos.

Vencida a etapa das licenças, agora optaram por essa gestão da REAG, que é o maior fundo de investimentos imobiliários do Brasil e já desenvolveu inúmeros grandes empreendimentos pelo país, faz sentido essa troca.

JÁ – O que vai mudar daqui pra frente?

– Iniciamos o processo de implementação da primeira fase da obra, a área dos armazéns, que envolve aspectos de engenharia. Foram mantidos alguns diretores, mas vamos trazer pessoas e empresas que implementem esse projeto.

Naturalmente, a REAG assumiu e fez algumas mudanças na diretoria executiva, como a minha presença, que assumo o cargo de diretor-presidente, para tocar o empreendimento. Mas já temos pessoas no comercial, porque agora entre uma etapa diferente – negociar com potenciais parceiros, pra gerar um retorno sustentável. Toda essa decisão foi tomada no final do ano passado e consolidada agora.

JÁ – O Sr. possui uma consultoria, a Vincere, ela faz parte da gestão?

– Não, na verdade fizeram uma pequena lambança com meu nome, a Vincere é minha empresa de consultoria de gestão – que até já trabalhou com a REAG. Mas a Vincere não tem nada a ver com o fundo – com o Cais. Eu tenho 30 anos de vida executiva, fui presidente de cinco empresas, e, pela minha experiência, fui convidado pela REAG – que é a responsável pelo fundo imobiliário que faz a gestão, o fundo de participações, que é o Cais Mauá, que tem aí 89% das ações, a gestão do negócio é do fundo.

JÁ – Sobre os investidores do fundo, houve inquietações, principalmente de fundos previdenciários, muitos ameaçaram sair. Como resolver isso?

– Bom, na verdade, posso falar de duas semanas pra cá. Imagino que a inquietação era grande porque houve atraso em algumas licenças, de uma forma ou outra isso foi explicado, mas do ponto de vista do investidor causou inquietações. Mas agora, com o início da obra, isso fica totalmente equacionado, normalizado.

JÁ – O projeto está na primeira fase, e o restante já está definido? Pode passar por revisões?

– A primeira fase é essa dos 11 armazéns, temos um cronograma de dois anos, mas podemos antecipar, ou seja, até o último trimestre do ano que vem. Essa fase já tem projeto e é a licença que temos. O canteiro de obras está em montagem, começamos pela remediação ambiental, corrigir problemas antigos que impactavam o meio ambiente aqui.

Mais tarde teremos as fases das docas e do gasômetro, que já temos aprovações de volumetria, indicadores de construção já aprovados em todas as esferas.

Não tem revisão de projeto – tem detalhamentos desse projeto, mas não interfere nos indicadores aprovados.

Uma coisa é que prometemos revisar e estamos buscando dá uma outra solução pro shopping do gasômetro. Pensamos um novo conceito, um Open mall, a céu aberto, com alamedas e áreas de convivência, áreas comerciais, mas não uma grande caixa – é a nossa ideia. Sem ferir o que já foi aprovado em termos de volumetria. A gente acredita que essa visão melhora o projeto, é adequada ao local e a população e que faz sentido no campo econômico também.

JÁ – Paralelamente, já estão em busca de parceiros?

– Desde o momento que chegamos aqui, é que não temos nada ainda assinado, e por isso, nos reservamos o direito de não comentar. Há conversas em andamento – a gente quer transformar o Cais num local de lazer – de experiências, com artes e cultura, serviços e comércio e gastronomia.

Propomos um mix entre o que a cidade gosta e usa, gostaríamos de ter as marcas que os gaúchos consomem. E podemos ter desde um comércio pequeno, de uns 100 m², até grandes – um armazém com um supermercado, porque não?

Temos uma estratégia comercial e de quantas marca queremos, preservando os espaços para caminhar, passear, da cultura e arte. Mas como não temos nada definido, não podemos divulgar ainda.

JÁ – E o saldo do fundo, foi divulgado na mídia R$ 160 milhões, é isso?

O cais é uma empresa de sociedade anônima com capital fechado, os números são auditados, basta ver na CVM. O PL é próximo dessa casa. Só que a gente tem que olhar pra o valor da obra, R$ 140 milhões na primeira fase. E a equação financeira disso já está montada, com as contrapartidas, são R$ 49 milhões de contrapartidas, garantidas.

JÁ – E a captação do restante?

A gente tem uma tranquilidade, porque há um norte muito bom pra essa segunda e terceira fase. O projeto está ficando muito bonito, e são modelos que despertam interesse, já tem gente nos abordando sobre as torres, o hotel, são sinalizações.

O Brasil ficou carente de bons projetos, esse aqui é um grande projeto, que entrega retorno aos investidores, e respeita as características e especificações do local. A gente vê com relativa tranquilidade essa captação.

JÁ – Há movimentos na cidade contrários a obra, há uma disposição ao diálogo?

– A gente veio aqui com espírito desarmado, eu já vivi aqui, quatro anos, conheço um pouco da cultura. Uma premissa é que os envolvidos querem que o projeto seja concluído da melhor maneira possível, e vai sair, o interesse é sempre conversar, mostrar a viabilidade urbanística e econômica da obra pra região.

Sempre que a gente fala do Cais as pessoas respondem com carinho muito grande e falam dá necessidade de fazer algo no local. Há uma disponibilização de todos pra que o projeto saia, as fases de aprovação já passaram, não tem como voltar para trás, e temos que olhar pra frente. Mas críticas construtivas são sempre bem-vindas.

Uma ideia revitalizadora: criar o Museu do Cais Mauá

Geraldo Hasse
Enquanto o projeto de revitalização do Cais Mauá dá os primeiros passos concretos após superar uma série de embargos judiciais, começa a circular entre funcionários remanescentes da extinta Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH) uma ideia capaz de dar nova vida à biblioteca instalada no primeiro andar do edifício-sede do antigo Departamento de Portos, Rios e Canais (DEPRC), na Avenida Mauá.
Guardiã da história das hidrovias gaúchas desde a época da construção do primeiro cais da capital em 1911, a biblioteca possui tantos documentos, estudos e projetos que poderia se tornar o núcleo central de um museu do porto. No momento, não há clima para discutir a ideia, pois a maioria dos servidores da ex-SPH está na luta para não perder seus cargos ou aguarda o tempo para se aposentar.
No entanto, se o conceito contar com vento favorável, será fácil conversar com o pessoal do consórcio revitalizador dos espaços deteriorados do mais antigo terminal portuário de Porto Alegre, já que o escritório do Cais Mauá Brasil ocupa um conjunto de salas na ala leste do primeiro andar do edifício-sede da extinta SPH, no mesmo piso da biblioteca.
A presença de funcionários privados num espaço ainda ocupado por servidores públicos gera um clima estranho que bem pode ser convertido em algo construtivo, de conteúdo histórico e alcance popular. Afinal, o objetivo é movimentar o cais.
A biblioteca está operando com restrições desde que a bibliotecária titular Maria da Graça Coimbra Pascual aposentou-se. O acervo ficou temporariamente aos cuidados do seu fiel ajudante Jorge, que também se retirou quando a direção da extinta SPH foi deslocada para Rio Grande, em 2017.
Limpa e bem cuidada, a biblioteca do Cais Mauá é uma das mais completas do Brasil em assuntos de navegação e transporte hidroviário. Ela é frequentada sobretudo por estudantes e técnicos, mas pode ser aberta ao público em geral, sobretudo se for enriquecida por peças históricas que abundam nos portos e hidrovias do Estado.
Por exemplo: na portaria do prédio central, na parede do térreo, está preservado o enorme logotipo em metal dourado do antigo Departamento Estadual de Portos, Rios e Canais/DEPRC (1951-1989) – peça digna de figurar num museu hidroviário.

Movimento está restrito nas áreas secas do Cais Mauá

Geraldo Hasse
Os mais de 100 funcionários remanescentes da extinta Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH) em Porto Alegre foram notificados nesta quinta, 08/03), sobre as novas normas de circulação nas áreas secas do Cais Mauá, patrimônio público cedido à iniciativa privada por 25 anos.
As novas regras, visando à segurança das pessoas e à disciplina dos serviços, foram ditadas pelo consórcio Cais Mauá, responsável pelas obras de “revitalização” dos espaços (armazéns, galpões e pátios) situados ao longo da Avenida Mauá. É uma “linha dura” que conflita com o marasmo do lugar situado no centro histórico de Porto Alegre.
Foi anunciada a construção de um tapume que se unirá ao cinquentenário Muro de Contenção das Águas do Guaíba para restringir o movimento de pedestres na área seca do cais.

Circulação de visitantes está proibida / JÁ

A circulação de visitantes está proibida, conforme aviso afixado em placas no pórtico central. Em cada um dos portões da área privatizada foram colocados guardas de uma empresa de segurança.
Já o movimento de embarcações no lado das águas segue as regras da navegação, pois, como lembra o engenheiro Álvaro Melo, diretor de manutenção da hidrovia: “A verdadeira frente do porto não fica na Avenida Mauá, mas nas águas do Guaíba”.
Além dos catamarãs que transportam passageiros na linha Porto Alegre-Guaíba-Porto Alegre, o canal do Guaíba é usado por navios de carga que buscam os terminais Navegantes, de Gravataí e Triunfo.
São apenas três ou quatro barcos por dia, mas sua movimentação é uma prova viva de que, de acordo com Melo, “a hidrovia continua funcionando”.
Os serviços básicos de manutenção da hidrovia são garantidos atualmente por uma centena de funcionários concursados em 2010 e que permanecem em suas funções graças a uma liminar da Justiça do Trabalho.
Desde o ano passado, quando da extinção da SPH, aposentaram-se mais de 40 funcionários admitidos na época do antigo Departamento Estadual de Portos Rios e Canais (DEPRC), criado nos anos 1930 e extinto no final do século XX.
Os veteranos que sobraram foram anexados ao quadro de pessoal da Secretaria dos Transportes, mas respondem operacionalmente à Superintendência do Porto de Rio Grande.
A tarefa mais constante do pessoal mantido em Porto Alegre é a manutenção dos sinais náuticos, especialmente boias cegas e boias luminosas que orientam o tráfego noturno entre o Lago Guaíba e Itapuã, na entrada da Laguna dos Patos.
Cada boia de luz pesando quase duas toneladas custa R$ 50 mil. Não são incomuns os abalroamentos de boias por navegantes distraídos. Bem mais frequentes são os furtos das lanternas alimentadas por sensores de energia solar – cada uma custa R$ 13 mil.
A reposição dessas peças é obrigação prioritária do pessoal da ex-SPH.
A falta de recursos impede a implantação de uma rede completa de iluminação da hidrovia Guaíba-Itapuã.
O projeto está pronto mas, para implantar a rede de boias luminosas, é preciso fazer um levantamento por sonar multifeixe do leito do Guaíba exigido pela Marinha (para a navegação) e pela Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (para liberar a extração de areia do leito do Guaíba).
A SPH tem a embarcação apta a fazer o serviço, mas falta o equipamento multifeixe a ser providenciado pela SEMA.
Consórcio já pôs sua marca no Muro do Guaíba / JÁ

Clima de campanha eleitoral no ‘Caos Mauá’

Geraldo Hasse
Lembrando estar “no primeiro dia do terceiro mês do quarto ano do governo”, José Ivo Sartori assinou na manhã desta quinta-feira, 01/03, a ordem de início das obras de revitalização do Cais Mauá.
A cerimônia, mescla de evento empresarial e comício político, reuniu mais de 250 pessoas sob um toldo branco às margens do Guaíba, no Centro Histórico em Porto Alegre. “Este é um projeto de Estado, não de governo”, afirmou Sartori, após queixar-se de “alguns ranços” que, segundo ele, levam muitas pessoas a “puxar para trás”.
Por coincidência, no momento em que o governador falava, às 11h55m, um catamarã vindo de Guaíba saiu de sua rota habitual, no meio do canal de navegação, aproximou-se do cais e, em marcha lenta, soltou três prolongados buzinaços. Sorrindo diante da “surpresa”, Sartori abanou alegremente para o barco que, desde o final do governo Yeda Crusius (2007-2010), faz a linha Porto Alegre-Guaíba. Aparentemente casual, a cena foi aplaudida por parte do auditório, constituído por políticos, funcionários e empresários.
Antes de Sartori, que encerrou sua fala trocando sem querer a palavra “cais” por “caos”, parte do público também aplaudiu por duas vezes o discurso do prefeito Nelson Marchezan Júnior. Em tom veemente, ele verberou fortemente contra “os que travam a máquina pública por motivos ideológicos”, preferindo “focar nos seus eleitores e esquecendo a população em geral”.
Dirigindo-se aos investidores no projeto do Cais Mauá, Marchezan pediu desculpas “pela lerdeza da máquina pública” e lhes agradeceu “por não terem desistido”. E pediu que “não sejam lerdos como a máquina pública” – “pesada, atrasada, retrógrada”. Seu protesto era contra vereadores e deputados estaduais que lutam contra “as reformas necessárias”.
O deputado Pedro Westphalen, secretário dos Transportes, fez um pronunciamento extremamente ameno. “Este é um dia muito especial”, disse ele, lembrando que o atual governo “fez pouco” pela revitalização do “cartão-postal de Porto Alegre” porque está empenhado em outros projetos. Segundo Westphalen, a cerimônia no cais “encerra expectativas de 30 anos” e se configura como “uma obra coletiva” de diversas pessoas – foram citados os ex-prefeitos João Fogaça e José Fortunati e, especialmente, a equipe técnica liderada por Edemar Tutikian.
O empresário João Carlos Mansur, presidente do grupo Reag, que assumiu a gestão do projeto licitado em 2010 e desde então emperrado por demandas ambientais, problemas técnicos e questões políticas, usou várias vezes as palavras “orgulho” e “gratidão” para definir seu sentimento em relação ao que considera “um empreendimento nacional”.
A Reag, segundo Mansur, administra atualmente R$ 7 bilhões por meios de dezenas de fundos de investimentos. Em sua fala, Mansur deixou claro que o objetivo inicial é abrir o cais ao lazer da população. Após a ocupação pelo público, talvez já no Natal de 1919, serão iniciadas as grandes obras – um hotel e um centro comercial.

Criscio, diz que serão aplicados R$ 140 milhões na primeira fase / GH / JÁ

Como executivo do projeto, foi apresentado o consultor Vicente Criscio, que já trabalhou em contratos de reestruturação empresarial em Caxias do Sul e Porto Alegre. Numa tumultuada entrevista coletiva à imprensa, Criscio disse que a prioridade nos próximos dois anos é colocar em condições de frequência pública os armazéns A e B, situados ao lado do pórtico do Cais Mauá. Nesses primeiros movimentos, devem ser aplicados, segundo ele, R$ 140 milhões, incluindo desembolsos obrigatórios aos governos estadual e municipal. O investimento total é estimado em R$ 500 milhões.
Tanto Criscio como Mansur foram muito cumprimentados por empresários e políticos presentes ao evento no cais. “Eu quero assinar o primeiro alvará do primeiro concessionário do Cais Mauá”, disse o secretário do Planejamento de Porto Alegre, entregando um cartão de visita ao gestor do projeto de revitalização. Por esse gesto, entre outros, ficou claro que a administração municipal encara o Cais Mauá como um marco da iniciativa privada.

Obras
As obras começam no dia 5 de março. O projeto, sem investimento público, prevê 3,2 mil metros de orla com ciclovia, dez praças de lazer e mais de 11 mil metros quadrados de área verde, num espaço total de 181 mil metros quadrados de área revitalizada. Estima-se que gere 28,8 mil novos empregos diretos e indiretos.
O projeto terá três etapas. A primeira é a restauração de 11 armazéns do Cais (do A6, no extremo da Usina do Gasômetro, até o B3, próximo à rodoviária). Deve custar R$ 140 milhões.
A segunda fase, no setor Docas, prevê torres comerciais com serviço de hotelaria, centro de convenções e estacionamento e a recuperação da Praça Edgar Schneider. A última fase é a área do Gasômetro: um centro comercial.

Cais Mauá vai mudar controle acionário para capitalizar negócio

Naira Hofmeister
Uma nova mudança acionária está sendo operada dentro do consórcio Cais Mauá do Brasil. A alteração já foi autorizada pelo Governo do Estado e pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários e está em fase de formalização na Junta Comercial do rio Grande do Sul (Jucergs).
A informação da nova alteração foi confirmada pelo diretor-geral da Secretaria dos Transportes, Vanderlan Frank Carvalho, que atribui a mudança à necessidade de ampliar o capital da empresa para dar início às obras, formalmente autorizadas nesta terça-feira, 6 de dezembro, em uma cerimônia de entrega das Licença de Instalação: “A informação que temos é que eles já aprovaram a capitalização da empresa através da mudança do controle acionário e com isso poderão cumprir todas as cláusulas do contrato”, revela.
Desde 2013, o Tribunal de Contas do Estado cobra do empreendedor e do governo estadual uma solução para a garantia mínima de 400 milhões de reais de investimento, exigidos no contrato assinado em 2010. Até agora, apesar das várias tentativas do consórcio de convencer o órgão de que cumpre a norma, não houve entendimento. A nova alteração contratual permitirá a adequação legal, segundo Carvalho. “Não será uma mudança nos sócios, mas no controle do capital”, complementa.
Assim, a composição permanece sendo a mesma anterior (mas bem diferente da formação que venceu a licitação): a espanhola GSS deixará de ser a acionista majoritária, posição que passará para o Fundo de Investimento e Participações do Cais Mauá. A terceira acionista, a construtora brasileira Contern, que antes detinha 10% do negócio, terá participação residual: “Eles estão praticamente fora”, assegura Luiz Eduardo Franco Abreu, presidente da gestora do Fundo de Investimentos e Participações do Cais Mauá.

Licença de instalação foi entregue em evento para convidados no pórtico do Cais / Joel Vargas / PMPA

Junto com a alteração societária, virá um aporte de recursos necessário para bancar o investimento na primeira fase do projeto. Houve uma redução de quase 50% no valor previsto, mas mesmo assim a contabilidade está com déficit, pelo menos na ponta do lápis.
Há um ano, a estimativa de recursos necessários para colocar em pé o complexo de negócios passava de um bilhão de reais – seriam 900 milhões de reais para as duas fases iniciais do projeto, que contemplam a recuperação e adaptação dos armazéns para atividades comerciais e a construção das torres nas docas. Mas nessa primeira semana de dezembro de 2017, o dado que circulou na imprensa dava conta de 500 milhões.
“Entre 500 e 700 milhões”, precisou Luiz Eduardo Franco Abreu, presidente da gestora do Fundo de Investimentos e Participações do Cais Mauá, que participou da cerimônia na manhã desta terça-feira, 6, no pórtico central da área tombada.
O fundo, entretanto, ainda não conseguiu arrecadar nem a metade do valor mínimo que está agora sobre a mesa. Segundo registros disponíveis no site da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o patrimônio líquido total do fundo, em setembro de 2017, era de R$ 162.500.840,18.
Com a licença na mão, os executivos estão confiantes que a conta vai engordar bastante.
Projeto sofreu adaptações para baixar custo
O trâmite burocrático para concretizar a nova composição acionária não atrapalha os planos imediatos do consórcio, que em três meses pretende iniciar a primeira fase da obra de revitalização, reformando e reestruturando os armazéns tombados do cais do porto para receberem operações de gastronomia, lazer e eventos.
O diretor de Operações, Licenciamento e Obras da Cais Mauá do Brasil S.A, Sérgio Lima assegura que essa etapa custará aos cofres do empreendedor 80 milhões de reais. Mas o executivo do FIP, Luiz Eduardo Franco Abreu considera a estimativa conservadora. “Com o que temos no fundo agora dá para fazer essa parte, talvez precise um pouquinho mais, pouca coisa”, avalia.
Embora discorde do cálculo, Sérgio Lima se comprometeu a destinar os recursos necessários para proporcionar “o que há de melhor” para a obra do Cais. “Se for necessário mais (recursos) para apresentarmos uma obra correta, impecável, faremos”.
Os recursos serão aplicados na execução de um projeto capitaneado pelo arquiteto gaúcho Rodrigo Poltosi, que trabalhou junto com Jaime Lerner na adaptação do conceito desenvolvido pelo espanhol Fermín Vazquez, vencedor da licitação. Diante da crise econômica brasileira, a equipe buscou alternativas nacionais que barateassem custos e auxiliassem na movimentação da economia local. “O projeto original previa algum mobiliário importado, que era bem mais caro. Conseguimos fazer alterações pontuais que geraram economia e também movimentam nossa economia”, revela Poltosi.
Rebaixamento da Ramiro Barcelos já deve sair do papel
Embora esteja entre as contrapartidas exigidas apenas para a segunda etapa do projeto de revitalização do Cais Mauá, o prolongamento e rebaixamento da avenida Ramiro Barcelos para dar acesso ao empreendimento na área próxima à rodoviária deverá ser uma das primeiras obras de contrapartida executadas pelo empreendedor.
“Queremos fazer esse esforço de incluir nessa primeira etapa”, assegura Lima. A obra era a mais cara entre as previstas no rol de contrapartidas, mas durante a cerimônia de entrega da LI ninguém soube informar o valor total previsto para investimento na cidade. Segundo o secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Porto Alegre, Mauricio Fernandes, as compensações ambientais pela obra atingem 333 mil reais.

Armazém A7 do Cais Mauá será derrubado até março

A licença de instalação entregue pela prefeitura ao consórcio que vai revitalizar o Cais Mauá abrange apenas a área dos armazéns. Eles serão recuperados nesta primeira fase da obra, com previsão de início para março e entrega em dois anos. Porém o destino de um dos armazéns será outro.
A derrubada do armazém A7 será um dos primeiros passos da obra. A informação foi confirmada pelo diretor de operações do consórcio Cais Mauá do Brasil, Sérgio Lima, durante o evento.
Além da execução do projeto, já é dada como certa a demolição do armazém A7, na área onde futuramente será erguido um shopping center, ao lado do Gasômetro.
“Vamos derrubar até março. Já temos todas as autorizações da Equipe de Patrimônio Histórico e Artístico e Cultural (Ephac) do município e do Instituto de Patrimônio Histórico Nacional (Iphan) e já temos a concordância do anuente interveniente do contrato (Antaq)”, garante Sérgio Lima.
Ao contrário da maioria das construções do Cais, o A7 não é bem público tombado, apenas inventariado com compatibilização.
Tramita na Câmara Municipal, há cerca de um ano e meio, um projeto de tombamento do armazém, de autoria da vereadora Sofia Cavedon. A proposta teve parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça no início do ano e estaria apto a ser colocado na ordem do dia, mas, desde julho, está aguardando diligências.

Cais Mauá: Marchezan encontra uma bandeira para seu governo

O prefeito Nelson Marchezan decidiu tirar o máximo proveito político da entrega da licença de instalação do projeto Cais Mauá. O projeto estava encruado desde 2010. Ele acelerou o processo.
Em novembro de 2016 foi emitida a Licença Prévia (LP) para o empreendimento e agora, um ano e dezessete dias depois, sai a autorização para dar início às obras.
Os próprios empreendedores não esperavam para antes de janeiro esta licença: “É um projeto complexo que envolve muitos órgãos na prefeitura e de outros níveis de governo, o que torna o processo moroso”, havia dito a presidente da Cais Mauá do Brasil S.A, Julia Costa.
Marchezan decidiu fazer da licença um marco. Vai promover um grande ato no pórtico do Cais Mauá, no coração do centro histórico de Porto Alegre, para o qual convidou até os adversários que repudiam o projeto, como os ex-prefeito e ex-governador Olívio Dutra e o ex-prefeito Raul Pont. Nem mesmo Yeda Crusius, que disputa espaços no PSDB, ficou fora da lista.
Os empreendedores garantem que “os recursos para as obras estão apartados e tão logo tenhamos todas as licenças e a aprovação, iniciaremos com as obras”.
A primeira fase compreende a revitalização dos 11 armazéns, localizados entre a Estação Rodoviária e a Usina do Gasômetro. Seriam necessários R$ 100 milhões para cumprir essa etapa.
O contrato da Cais Mauá garante arrendamento por 25 anos da área mais valorizada de Porto Alegre, podendo ser renovado por igual período. O arquiteto Jaime Lerner, ex-prefeito de Curitiba e ex-governador do Paraná, é o avalista do projeto, que não é muito claro ainda. Até agora apareceram maquetes e indicações genéricas do que vai ser feito.
O projeto enfrenta um movimento comunitário que denuncia omissões e ilegalidades e enfrenta pelo menos três ações na Justiça. O Instituto dos Arquitetos do Rio Grande do Sul questiona o plano de trabalho.
O IAB/RS, inclusive, entrou na Justiça com uma Ação Civil Pública alegando que caducou a lei que permitia os grandes prédios previstos no projeto. O prazo estabelecido no termo de concessão para o regime excepcional naquela área venceu em 31/12/2012. A ação ainda tramita.
Assim que foi anunciada a licença a empresa liberou para os grandes veículos de comunicação um farto material de divulgação, mas que não esclarece os pontos essenciais do projeto, a começar pelo recursos.