Bastidores da liberação dos skinheads

Guilherme Kolling
Na manhã da quinta-feira 25 de agosto, o movimento começou cedo no saguão de espera da 2a Vara do Fórum Central de Porto Alegre. Dava para notar que algo de importante estava por acontecer ali. Às 8h30 da manhã, uma equipe de TV estava a postos.
Um segurança vigiava qualquer movimento no local, ostentando seu revólver na cintura. Parecia tenso. Não parava quieto, jogando o peso do corpo de um lado para o outro, como se fosse um joão-bobo.
A espera era pelo depoimento dos três judeus que foram vítimas do ataque de skinheads em 8 de maio no Bar Pingüin, na Cidade Baixa. Eles iriam falar do caso que levou à prisão de quatro suspeitos: Israel da Silva, Valmir Macahdo Jr., Leandro Braun e Laureano Vieira Toscani.
A sessão começava às 9h, mas bem antes já tinha gente esperando. Uma das primeiras a chegar foi a esposa de Israel. Ficou quieta num canto até ser abordada. Garantiu a inocência do marido. “Na hora do crime, ele estava comemorando o nosso aniversário de casamento e o aniversário da mãe dele”, balbuciou.
Mais jornalistas chegaram e formaram uma rodinha. Havia estranheza sobre a já divulgada mudança de rumo no caso. “Mas eles não tinham sido reconhecidos?”, perguntou um repórter. “Não entendo o que aconteceu”, disse o colega. “A gente fez a matéria, as vítimas reconheceram os caras”, comentava, mostrando o xerox do jornal da época.
Um outro círculo logo reuniu parentes dos acusados. Na maioria, mulheres, que vinham esperançosas, otimistas, como se soubessem da reviravolta no caso. Cochichavam informações a todo o momento para em seguida trocar abraços e até chorar de alegria.
Às 9h05, um rapaz e um senhor passaram reto por todos sem desviar o olhar do horizonte. Posicionaram-se bem em frente à porta da 2a Vara. Logo, a dupla entrou. O jovem era uma das vítimas do ataque dos skins. Foi o único dos três a se apresentar. Em seguida, entraram os advogados dos presos.
Duas senhoras que vieram dar apoio ao único depoente ficaram aguardando do lado de fora. Trocavam um olhar de desconfiança mútuo com parentes dos acusados. O ápice da tensão ocorreu quando o pai de Laureano, um dos presos, resolveu tirar satisfações. Houve um início de bate-boca, mas a esposa logo tratou de tirar o marido da confusão.
O homem justificava a revolta. “Meu filho ficou 100 dias preso. E ele é um cara bom. A gente ia lá na cadeia e ele dizia: ‘Pai, só quero um pedido de desculpas’. Imagina. E o rapaz perdeu o semestre na faculdade. Um absurdo”, protestava.
Às 9h15, 9h20 e 9h40, a funcionária do Fórum chamou os outros dois judeus atacados. A ausência da dupla causou temor entre os familiares dos presos. “Eles não vêm?”, perguntavam-se. A expectativa era pela confirmação do testemunho de uma das vítimas, que inocentara os skinheads ao não reconhecê-los, conforme estampava a manchete do Jornal JÁ Porto Alegre.
Dona Zeonlida, mãe de Valmir Machado Jr., outro acusado, carregava um exemplar. Ao ser abordada por repórteres, exibia a matéria como prova da inocência do filho e, em meio à leitura dinâmica dos jornalistas, comentava o caso. “Meu filho foi crucificado!”, protestava.
Nesse meio tempo, o advogado Clodes Bernardes deu uma escapada da audiência e confirmou que a juíza iria soltar os presos. A notícia foi dada aos cochichos para parentes. Depois confirmada em tom triunfal:“A farsa caiu”, anunciou Bernardes.
A frase foi repetida por familiares dos presos, que imediatamente começaram a ligar para parentes e amigos. E para os pais de Leandro Braun, que moram em Caxias e não foram ao Fórum. A esposa de Israel correu para um orelhão para contar tudo para o pessoal de Guaíba, onde mora.
Não demorou até a juíza chamar a imprensa para uma coletiva.
“Experimentem a liberdade!”
Somente a imprensa e os advogados das vítimas tiveram acesso à sessão em que foi comunicada a liberação dos skinheads. Ao receber os repórteres, a juíza Marta Borges Ortiz explicou a confusão que foi feita em tom de pesar, salientando que a semelhança entre os presos e os novos acusados é incrível, até em detalhes do rosto. Depois, organizou a sessão em que a liberação dos réus foi oficializada.

Juíza instrui os réus (Fotos: Naira Hofmeister)

Por volta das 10h30, os quatro entraram na sala algemados, em silêncio e de cabeça baixa. A juíza perguntou o nome de cada um e solicitou que os guardas tirassem as algemas. Incentivou os fotógrafos a registrar o momento.
Em seguida, explicou a suspensão da audiência que previa o depoimento das vítimas, já que na véspera (24/08), o delegado (Paulo César Jardim) havia entregue novos elementos da investigação. Por isso, ela iria conceder liberdade provisória aos acusados. Justificou que a prisão fora legítima, pois havia indícios suficientes com o que havia sido apurado até então.
O promotor Sílvio Miranda Munhoz falou da correção do trabalho da polícia, que seguiu na busca pelos responsáveis do crime. Insistiu na impressionante semelhança entre os novos acusados e os presos – “parecem gêmeos”. Adiantou ainda que os rapazes agredidos serão chamados novamente para depor e fazer o reconhecimento dos novos acusados.
Em nome da defesa, o advogado Marcelo Bertolucci observou que todos podem errar, mas pediu que a imprensa restabeleça a dignidade dos acusados e familiares, ao dar uma cobertura na mesma proporção da que foi feita na época da prisão. Ainda deu uma alfinetada na conduta do Movimento de Justiça Diretos Humanos neste caso.

Depois de 105 dias na prisão, jovens confirmam a liberdade

Finalmente, os jovens foram chamados pela juíza para receber o alvará de soltura. Antes ela deu um recado: “Experimentem intensamente a liberdade. Vivam próximos do bem. Vocês ficaram presos esses 100 dias por um desígnio maior, nada é por acaso. Experimentem intensamente a liberdade!”, repetiu. Os libertos, apenas acenaram com a cabeça.
Investigação paralela A juíza Marta Borges Ortiz elogiou a polícia, afirmando que não tem dúvidas sobre a eficiência do trabalho: “Na próxima semana deveremos ter os nomes dos possíveis autores da agressão”. O promotor Sílvio Miranda Munhoz fez coro a ela.
Mas os jovens presos mostravam revolta. Eles teriam indicado os reais agressores. “Na rua todo mundo sabia quem eram os responsáveis, só a polícia que não”, disse Laureano Vieira Toscani. Segundo ele, os autores do crime, que se rotulam skinheads, vangloriavam-se publicamente do feito, e debochavam “dos otários que foram presos”.
“Não foi a polícia quem descobriu, fizemos nossa investigação. Minha mãe procurou na rua, no bar, na internet. Se não fosse isso ainda estaríamos presos”. Sobre a explicação de que os quatro novos acusados seriam muito parecidos com eles, Laureano é direto: “Essa história não bate”, resume, lembrando que só uma vítima os reconheceu.
O advogado do jovem, Marcelo Bertolucci, diz que um fato novo já estava no inquérito há bastante tempo, mas que não havia sido observado. É que uma das testemunhas não reconheceu os quatro como os agressores. O promotor Munhoz observa que os jovens não tinham delatado os autores para não passar por dedo-duro, mas acabaram identificando outros possíveis atacantes. “Agora dizem que éramos parecidos com os outros caras. Mas a verdade é que desde junho já podiam ter nos liberado. A polícia sabia que nós não éramos os culpados”, garante Leandro Braun, que contou estar num show em Caxias do Sul na hora do crime. “Tenho 27 testemunhas”.
Valmir Machado Jr. falou que a polícia é incompetente, “principalmente o delegado que tentou se promover em cima de nós”. Ele justificou que só fazia estudos sobre Segunda Guerra Mundial e que criaram uma confusão.
“Nos venderam como culpados e pegou. Olharam o nome pelo outro processo (agressão de skinheads a um punk, no qual o jovem foi indiciado) e como estávamos mais acessíveis nos levaram”, afirmou o jovem que acredita em armação e afirma que só não os liberaram em seguida por pressão da comunidade judaica.
Israel da Silva preferiu ser diplomático. “Não tenho nada a falar da Justiça, nada contra comunidade nenhuma. E posso dizer que dentro da cadeia a gente aprende a perdoar”. Solidariedade na prisão Os quatro acusados de ter agredido jovens judeus na Cidade Baixa passaram mais de 100 dias presos. Eles são unânimes ao classificar a cadeia como um inferno. Mas tiveram o apoio de parte dos colegas de Presídio Central. “Sofremos represália da polícia. Só os presos nos respeitaram”, contou Valmir Machado Jr. Depois da exibição do vídeo de uma banda skinhead no programa Fantástico, da Rede Globo, que está entre o material apreendido pela polícia, não houve retaliações na cadeia.
“Os presos da nossa ala eram legais. Viram que éramos inocentes, não havia cobrança. O problema era um outro setor, chamado ‘país livre’, onde há leis próprias. Lá era perigoso”, testemunha Leandro Braun.
“Sofremos várias ameaças. Ninguém sabe o que é estar lá dentro”, conta Laureano Toscani. Ele soube pela televisão que seria preso e resolveu se entregar. “Fiz isso porque tinha certeza da minha inocência”, disse.
A mãe de Valmir, Dona Zenilda, revela que até quando os rapazes foram depor, no Fórum Central, a Susepe fez represálias. “No meio de 60 presos eles anunciaram que os quatro eram skinheads. Não aconteceu nada para o meu filho nesses dias porque eu estava em cima o tempo todo”.
Leandro revela que a polícia fazia pressão psicológica para “ferrar” com os outros. “Nos interrogatórios, o delegado dizia: ‘Entrega 5 ou 6 nomes que a gente te libera'”. Valmir confirma a história.
Fora isso, as tradicionais precariedades da estrutura carcerária. “A comida é um lixo. A Brigada te trata que nem lixo, para eles tu é um animal”, compara Valmir. “Enfermaria não existe. Tá com dor de dente? Pega um AAS infantil e volta para cela”, relata o ex-detento.
Pelo menos agora o jovem vai desfrutar do comida da mamãe. O cardápio do dia da volta era bife à milanesa, prato predileto de Valmir.
Agora, os quatro voltam a tocar a vida. “Vou retomar minha rotina, voltar para Caxias, mas o trauma, o dano psicológico fica, é para sempre”, observa Leandro Braun.
Os advogados falam em pedir reparações, entrar com uma ação na Justiça contra o Estado e exigir a responsabilização dos atos das autoridades que cometeram equívocos, “estragando a vida dos rapazes e trazendo essa humilhação”. Apenas o representante de Laureano, Marcelo Bertolucci, disse que vai aguardar o encerramento do caso e esperar a definição da família.

A reversão da história

Luiz Carlos Maciel
O advento de um novo inverno em nossa civilização – para lembrar a metáfora que usei em meu livro As Quatro Estações – se apresenta como, no mínimo, desconcertante. Todos os avanços que vivemos, por várias décadas, em termos de liberdade existencial, percepção social e política, aprofundamento da vida espiritual e, numa palavra, expansão da consciência, parecem abandonados como se simplesmente nunca tivessem acontecido. O progresso do espírito parece ter estancado, num mundo sanguinário, dividido entre Bush e Bin Laden, no qual o único instinto ativo para ser o da morte.
Parou por que? Por que parou?
Uma das idéias mais interessantes surgidas na reflexão de Jean Baudrillard sobre o nosso tempo é a de que assistimos a uma reversão da própria História que tendo imperceptivelmente ultrapassado o próprio fim inverte o seu sentido para o passado. Ele cita um texto de Elias Caneti, publicado em 1978, época em que se definiria a precipitação de nosso mundo no virtual.
A partir de um certo ponto, a História não era mais real. Sem que se percebesse, toda a humanidade subitamente abandonou a realidade; tudo o que aconteceu desde então supostamente não foi verdadeiro; mas nós supostamente não percebemos. Nossa tarefa agora seria encontrar esse ponto e enquanto não o localizarmos, estaremos condenados a mergulhar em nossa destruição presente.
A História ocultou de nós o seu fim e começou o caminho de volta, na direção oposta. Por disso, o tempo não é mais contado progressivamente, por adição, a partir da origem mas por subtração, a partir do fim. Não temos mais o futuro a nossa frente mas uma dimensão anoréxica na qual se estende uma realidade virtual. Nela, o simulacro precede o real, a informação precede o acontecimento. Estamos imobilizados entre nossos fósseis e nossos clones.
Ou seja: estamos diante do desaparecimento da História real, dominada por uma memorização fanática. Em vez de nascerem e morrerem, os seres surgem já como fósseis virtuais. A História teria sido infectada por um retrovirus e seu novo movimento privilegia a retaguarda. Isso explica, segundo Baudrillard, o fenômeno do desaparecimento das vanguardas e o ressurgimento de formas passadas e arcaicas, utopias retrospectivas que engendram uma História espectral, feita de acontecimentos-fantasmas. Foi o advento da chamada era da mediocridade. De repente, algum dejá-vu qualquer ressurge como uma assombração imprevista. Como isso foi possível? Ele não pertencia ao passado? Só o retrovirus explica.
Nos tempos atuais, a humanidade anda de marcha ré. Os sinais desse inesperado movimento, considerado simplesmente impossível ou absurdo pelo pensamento estratificado durante séculos de especulação racionai, podem ser percebidos hoje pelo olhar atento. Essa inversão é apenas disfarçada, mas não desmentida, pelo progresso científico e tecnológico, que não cessa de inventar novos brinquedos, muitos deles mortíferos.
Não é de admirar, por exemplo, que a dialética da História humana tenha sido substituída por um estruturalismo petrificador, num movimento de recuo do pensamento, de acordo com a metáfora de Sartre, da imagem dinâmica do cinema para a fotografia parada. Ou que as perspectivas de uma nova organização econômica, política e social tenha sido abandonadas em favor de um neoliberalismo selvagem que, como contrapartida, precipitou nossa civilização num terrorismo fundamentalista. Ou que a ética seja fundamentada na restauração de valores iluministas, pré-marxistas. Ou que a experiência espiritual genuína tenha sido sepultada por igrejas e seitas igualmente fundamentalistas. Os sinais de inversão da dinâmica coletiva estão por toda parte.
Assistimos, por toda parte, a um triunfo deprimente da caretice – ou seja, do formalismo sobre a espontaneidade, da aparência sobre a essência, dos títulos, comendas e medalhas sobre o mérito legítimo, da hipocrisia burguesa num ápice surpreendente sobre a vida natural e autêntica. A reversão da História permitiu às classes médias assegurar a sobrevivência de seus deuses ao mesmo tempo que condena seus saudáveis demônios ao esquecimento. Essas tarefas foram confiadas às armas com que ainda conta, em especial, na mídia e na academia. Essas duas instituições alavancaram o processo de reversão.
Primeiro exemplo: a moral tradicional, baseada na hierarquia indiscutível, na prepotência e na submissão, na obediência e no conformismo – ou seja, numa palavra, na repressão – teve de enfrentar a emergência de uma moral libertária que cresceu durante a maior parte do século passado, de uma maneira aparentemente irresistível.
Com raízes na psicanálise de Freud, que desmascarou essa moral repressiva como origem da neurose, ou na subversão de valores de Nietzsche, que a denunciou como contrária aos interesses da própria vida, a nova perspectiva moral ganhou uma enunciação aguda no pensamento de Sartre, que viu claramente seu fundamento na liberdade. O auge desse processo de manifestação da nova moral libertária foi alcançado, na prática, pelo movimento que se convencionou chamar de contracultura. Sua reversão restaurou alguns dos mais renitentes preconceitos da moral tradicional.
Mas a situação atual, segundo Baudrillard, não é simplesmente contraditória ou irracional – ela é paradoxal. Há uma ironia objetiva no processo recente: quanto mais os sistemas políticos, sociais e econômicos progridem mais geram a própria descontrução, a realização deflagra a reversão automática, pura e simples. Essa reversão provocou euforia na cidadela da classe média, o que enfatizou paradoxos simplesmente escandalosos. Com a reversão da História, o mais recente é o mais remoto; o mais distante é o mais avançado.
Assim, apesar dos avanços de Wilhelm Reich, Herbert Marcuse e Norman O. Brown, ou contra eles, a psicanálise acomodou-se em sua missão de promover a adaptação passiva e portanto o conformismo. A pretexto de contestar a dependência de Sartre ao cogito cartesiano, o estruturalismo o declarou superado, numa manobra logo abençoada pelas universidades. O Sistema cujo poder fora denunciado é, então, consagrado como insuperável, uma estrutura inabalável. Com tal fundamento teórico, as novas gerações são facilmente convencidas da verdade suprema do realismo cínico.
Ao mesmo tempo, a mídia encarregou-se da diluição da contracultura, apressando sua retração. Substituiu-a, no espírito das novas gerações, pelo culto ao aparecimento incessante de novas maravilhas do entretenimento, graças à nova tecnologia digital. Um computador e um celular de última geração são apresentados – e o que é pior: acreditados – como suficientes para assegurar a felicidade final.
O estado de consciência vigente foi reforçado por meios mais sutis, subliminais. Assegurou-se, assim, nas novas gerações a auto-hipnose e o emparedamento mental que inibe a liberdade original da consciência e tende a congelá-la, como diria Sartre, na rigidez do ser em-si.
O panorama atual provoca espanto. Como compreendê-lo?
Baudrillard sustenta que uma História virtual, na qual a informação substitui o acontecimento, está ocupando, hoje, o lugar da História real, e que isso resulta em nossa falta de responsabilidade, tanto individual quanto coletiva. Assim, por exemplo, o apelo de Sartre pela liberdade e conseqüente responsabilidade, é considerado, para todos os efeitos da reversão, uma mera ilusão do passado.
No plano econômico, político e social, a reversão foi ainda mais espetacular. O desaparecimento da União Soviética e o triunfo do capitalismo selvagem, na nova encarnação neoliberal, serviu de pretexto para a desconsideração do pensamento teórico marxista. O objetivo, naturalmente, é a supressão radical da rica tradição do pensamento crítico, mais uma vez beneficiando a aceitação passiva e o conformismo.
O deus da classe média, ao qual ela deve sua existência, o fundamento metafísico do capitalismo, é o dinheiro. Nos dias que vivemos, experimenta sua promoção a uma espécie de deus, glorificado em prosa, verso e uma enxurrada incessante de tratados de economia, organizações econômicas e seus templos máximos que são os bancos. Esse fetiche abstrato, o vil metal, a culpa materializada da Humanidade, segundo Norman O. Brown, passa por obra de Deus ou da Natureza – e parece existir como o céu e o mar, o Sol e a Lua, as montanhas e as árvores existem. A mera existência do dinheiro, portanto, é a verdadeira origem da alienação, segundo Marx, da reificação, segundo Lukacs, ou da serialização, segundo Sartre. Estes três conceitos descrevem, de diferentes ângulos, o mesmo fenômeno mórbido que caracteriza nossa vida em comum – o endeusamento do vil metal.
Mas Baudrillard vai, hoje, mais longe. Ele considera termos como alienação,. reificação e serialização, obsoletos demais para indicar o que acontece hoje – e descreve nosso mundo em termos de excrescência tecnológica, obscenidade e obesidade proliferantes e virtualidade desenfreada. Com um humor e um sarcasmo necessários à filosofia de hoje, Baudrillard é implacável. A nossa situação, já se encontra além da física e da metafísica, é totalmente patafísica – uma paródia que, segundo seu criador Alfred Jarry, é “a ciência das soluções imaginárias”.
A contestação mais enérgica, no século passado, foi feita, além do marxismo e do existencialismo, por este outro demônio que assombrou a classe média – a contracultura. Foi preciso exorcizá-lo de todas as maneiras. Ele acenava com uma liberação sexual natural, saudável, uma emancipação das falsas necessidades materiais, uma libertação do espírito. Retomava a inspiração anarquista no que ela tinha de mais positivo e mais fértil. Seus arroubos juvenis pareciam anunciar, de fato, uma nova era.
A reversão se manifesta nesse ponto em que a ameaça da contracultura começava a parecer irresistível. Foi o ponto de mutação para a degeneração presente. A mudança qualitativa inverte então seus vetores, uma inversão diabólica. A liberdade sexual torna-se permissividade e obscenidade; as necessidades materiais são absolutizadas, numa distorção maligna que deifica o mercado capitalista; o crescimento espiritual regride para as formas petrificadas das igrejas tradicionais e das novas seitas. E por aí vai. A “nova era” caminha para trás.
Tudo tem a ver com tudo, na paisagem sombria da reversão. Só é preciso, em cada caso, encontrar o ponto em que a conexão maligna se faz.
O recuo deliberado que estamos vivendo hoje apresenta suas justificativas e desculpas em nome da ciência e da tecnologia e de seus progressos aparentemente maravilhosos. Os alertas de Heidegger são solenemente ignorados, como devaneios místicos. A ciência não pensa e a tecnologia é o estágio final do esquecimento do ser. A metáfora da primeira parte dos filmes sobre a Matrix, a que interessa, ilustra artisticamente esse abismo
Beaudrillard chama ao processo de “Assassinato do Real”; trata-se de um “Crime Perfeito” um extermínio do qual nada resta, nenhum traço, “nem mesmo um cadáver”. Neste ponto cego da reversão da História, nada mais é verdadeiro ou falso, e tudo perambula indiferentemente entre a causa e o efeito, entre a origem e sua finalidade, uma mutação crucial de um estado crítico para um estado catastrófico.
Hoje, toda reflexão sobre a realidade é, no máximo, uma precária hipótese de trabalho, justificada apenas por tentar satisfazer nosso misterioso instinto especulativo – ou, no máximo, uma criação de índole artística, uma edificação imaginária.
Como isso aconteceu?
O engenho da feitiçaria científica e tecnológica acabou por criar essa tal de realidade virtual – e quando suas características e sua própria essência foram comparadas com as da suposta verdadeira realidade, as diferenças efetivas não podiam mais ser detectadas. Eram tão similares que se confundiam. Uma espantosa equação entre o real e o virtual, foi inevitável.
A realidade na qual a Matrix, do filme, existe e opera é, em tudo, similar à realidade virtual que ela cria. As categorias de tempo e espaço, matéria e energia são rigorosamente as mesmas. Não há “realidade” substancial em nenhum dos casos.
Eis o que Baudrillard chama de Crime Perfeito.
Quando se fala em História, não se trata da História vivida no modo do ser para-si, no sentido de Sartre, mas a História registrada no modo do em-si. Esta “História”, objeto de filósofos e historiadores, é uma criação mais ou menos arbitrária, largamente subjetiva – e, como tal, mais próxima da obra de arte do que da medição científica. Seu carácter numinoso, sempre envolto em mistério, contudo, não impede que, à sua maneira, também se apresente como um desvelamento do ser pois, como sustenta Heidegger, o próprio ser é histórico, a aletheia é tempo..
Entretanto, tal fábula – a pretensa História – , embora reveladora como os antigos mitos, não pode ser contemplada com uma crença factual, ingênua. A alegada “reversão da História” é uma metáfora para um declínio evidente que macula, hoje, o instante. Da mesma maneira, pode-se falar de um Assassinato do Real, ou de um Crime Perfeito, como uma metáfora relevante para a consciência de nosso tempo. Baudrillard chega ao âmago da questão quando percebe que o Assassinato do Real significa, no fundo, o Assassinato da Ilusão, o extermínio dessa “ilusão radical e objetiva do mundo”.
A situação descrita por Baudrillard, uma visão que muitos julgam pessimista, é uma oportunidade para o despertar espiritual. Sua compreensão simplesmente exige o desvanecimento dos véus de Maya.
Diz Baudrillard:
Afinal de contas, pode ser que a humanidade, por intermédio de uma compulsão enigmática, esteja envolvida intimamente nesse processo catastrófico e portanto esteja condenada a desaparecer. :Se for este o caso, seria muito melhor tratarmos nosso desaparecimento como uma forma de arte –exercitá-lo, representá-lo, criar uma arte do desaparecimento. É melhor que a alternativa, que seria desaparecer sem deixar traços, sem sequer o espetáculo de nossa destruição.

A beleza da morte

Naira Hofmeister
O homem de camisa azul e gravata cinza está de mangas arregaçadas, mãos cruzadas, parece estar descansando depois de um dia de trabalho. As pessoas que chegam no velório dizem que ele está com um ar “sereno, repousado”.
A boa aparência do defunto é obra do agente funerário Paulo Coelho, um artista que torna a morte menos feia. Ele é considerado pelos profissionais do ramo como um dos melhores embalsamadores da cidade – seu toque delicado ajuda a reduzir a dor da família.
Funerária moderna é assim. Só coveiro, motorista e atendente não bastam. Hoje, muitas lojas oferecem qualidade no embalsamamento, serviço de psicóloga, assistente social, direito funerário e até filósofa, para ajudar a entender a morte e enfrentar o luto. Além do apoio psicológico, os agentes funerários contam também com o avanço de técnicas de preparação de cadáveres que garantem resultados surpreendentes.
Aos 54 anos, mulher e duas filhas, cristão não-praticante e sem medo de morrer, Paulo Coelho é um dos profissionais que dá aos mortos o aspecto ‘saudável’ dos velórios. Usando massas, óleos, argila e até silicone, Paulo pode transformar um rosto decrépito e sofrido em uma alegre expressão de paz. A tecnologia é eficiente: “Não há mais necessidade de velório com urna fechada, mesmo em morte violenta”, diz.
Paulo trabalha no porão da funerária. É uma sala fria, úmida, com cheiro de formol. Ele descreve a coisa de forma impessoal, diz que sua atividade “minimiza os aspectos decorrentes de doenças e acidentes que tenham levado a pessoa ao óbito”.
O embalsamador acredita que pode, se não devolver vitalidade ao morto, garantir à família que não haverá traumas decorrentes da imagem de seu ente querido após sua morte: “Ela pode ser mais bonita do que pensamos”, filosofa.
O que acontece dentro da sala de preparação Paulo Coelho não revela: “Alguns métodos podem ser traumatizantes e exigem o sigilo profissional”. Para o agente, o que importa não é como o serviço é feito, mas sim, que assegure à família simplesmente o direito de sofrer nessa hora, sem outras preocupações. O lema seria “a funerária cuida de tudo para que o choro seja só pelos mortos”.
Geralmente, o serviço é feito buscando o aspecto natural da pessoa – uma imagem próxima de quando viva: “Não estamos preparando a pessoa falecida para uma festa, mas caso a família queira, é possível fazer uma maquiagem mais marcante ou unhas pintadas com detalhes especiais”.
Paulo Coelho se corrige: “Maquiagem não, restauração facial”. É feita inclusive nos homens, e segundo ele, imperceptível, de tão discreta.
Quando entra na sala de preparação, abandona todos os outros pensamentos e se dedica com exclusividade ao defunto. “Peço para estar iluminado, trabalhar adequadamente, obedecendo os preceitos técnicos e intuindo o que há de mais importante naquele momento”.

Sucesso entre os vivos
Há nove anos, quando entrou no mercado funerário, Paulo Coelho se motivou pelo lado humano da morte. Inovou os serviços da época, oferecendo amparo à família, esclarecendo seus direitos, qualificando sua equipe. “A vida é a marca de nossa existência, nossa tentativa de perpetuá-la. O momento da morte exige ritos de celebração de tudo o que fomos”.
Hoje, Coelho encara com profissionalismo a lida diária com o outro lado. “Eu não posso chorar, não posso me dar esse luxo. Aquela dor não é nossa, é da família”. Toma cuidado para não se sensibilizar com a morte, mas ao mesmo tempo, tenta não banalizá-la.
Não faz julgamentos de quem está na sua maca. Já preparou os corpos de seus avós, mas também de bandidos, todos com a mesma dedicação. “Não trabalhamos só com anjos. Os marginais também têm um pai, uma mãe ou um filho que vão querer um enterro decente”.
Seu trabalho à frente da funerária rendeu-lhe mais três cargos: o de Presidente do Sindicato dos Estabalecimentos de Serviços Funerários do Estado do RS, Presidente da Associação Brasileira de Tanatopraxia e Diretor da Associação de Tanatopraxistas do Mercosul. Nesses postos, Paulo trabalha para mudar a visão que a população tem do segmento, segundo ele, repleta de preconceitos.
Seguro de morte?
Entusiasta da profissão, Coelho pretende ampliar os canais de formação dos colegas da área e terminar com o medo que ronda a profissão.
Os anos em que viveu tão perto dos mortos o fizeram aprofundar o pensamento sobre o significado da morte para a humanidade. Por que ainda é tão difícil se programar para a morte? Porque não aceitamos o fato – sabido por todos – de que um dia vamos morrer?
“Todos cremos na imortalidade, independente de religião. O ser humano acredita que tem alma, ela é o sentido da nossa preservação”. E argumenta: “Quando fazemos seguro do carro é porque ele será roubado ou batido? Porque então não nos somos previdentes também nessa hora?”.
Orgulhoso do trabalho que realiza, ele não tem medo de que alguma alma penada venha puxar seu pé enquanto dorme: “Tenho certeza que se pudessem, até me agradeceriam”, acredita.

Campo do Força e Luz deve dar lugar a projeto imobiliário

Sócios querem vender área no bairro Santa Cecília(Tânia Meinerz)

Duas grandes construtoras estão tentando botar abaixo um pedaço da história do futebol gaúcho. O projeto delas é comprar o tradicional Estádio Timbaúva e erguer um espigão no terreno.
Os sócios do clube esportivo estão divididos sobre a venda do espaço. Alegando falta de dinheiro para manter as instalações, a diretoria já deu sinal verde para a transação, embora tema reação da comunidade. Só falta acertar o preço.
O time de futebol participa apenas das competições oficiais da Federação Gaúcha de Futebol na categoria juniores. Usa um time de alunos do colégio Anchieta, sem gastar um tostão com a iniciativa: o objetivo é garantir a isenção de IPTU dada aos clubes.
O campinho já foi um terreno do governo. A comunidade usa o espaço há 70 anos. Hoje ele pertence à Associação dos Funcionários da CEEE. Seus donos são os 379 sócios da entidade. Nem todos concordam com a venda, mas a pressão das construtoras pelo terreno é grande.
Corretores imobiliários da área avaliam o terreno em R$ 10 milhões. As empresas estão oferecendo menos do que isso à diretoria do clube. Se a venda sair, o dinheiro deve ser distribuído entre os sócios – na hipótese de R$ 10 milhões, cada um levaria R$ 27 mil.
O campo do Força e Luz é a última área aberta de lazer do bairro Santa Cecília. O presidente Jorge Nunes, eleito em 2002, fica no cargo até dezembro, quando se realizam novas eleições – ele quer a venda até o final de seu mandato. A diretoria não quer dar publicidade à possível venda, temendo a rejeição da vizinhança e dos usuários do espaço.
Na versão do presidente Nunes, o clube estaria tendo prejuízo para manter o local. Sem revelar os valores arrecadados com as contribuições dos sócios e do aluguel do campo, ele garante que não é o suficiente para as despesas, reforçando a necessidade da venda.
O Timbaúva ocupa 16 mil m2 de uma área já densamente construída, na rua Alcides Cruz, entre as avenidas Ipiranga e Protásio Alves.
Tchilla Helena Kuhn, vizinha do estádio há 20 anos, está preocupada: “Se fizerem outro espigão vão acabar com o meu sol, eu me mudo na hora”.
Num típico domingo ensolarado, famílias fazem churrasco e peladeiros profissionais jogam futebol no local. Ademir Costa é um dos que freqüenta o Timbaúva toda a semana: “Para a gente é muito ruim perder o estádio”.
Foram funcionários da CEEE (então chamada CEERG) que fundaram o clube, em 1921, no tempo em que a empresa, com a Carris, fazia parte de um grupo estrangeiro. O estádio foi erguido em 1934. A união da Carris com a CEEE, hoje novamente desmembradas, é que originou o nome Força e Luz. O estádio se chama Timbaúva devido às árvores desta espécie que existem no terreno.
Jorge Gomes Delfino, membro do conselho deliberativo do clube, é apontado por todos como a memória viva do time. Entre as histórias pitorescas, a mais famosa ocorreu na década de 60, quando o “Forcinha” cedeu ao Grêmio o zagueirão Airton Ferreira da Silva, apelidado “Pavilhão”, justamente porque foi trocado pelo pavilhão que ainda hoje está no local. Airton? Foi o Figueroa da época.
Reportagem Eduardo Jung

A Blitz do cabo Rosinha estréia hoje na capital

Adriana Lampert

Medo, angústia, desconfiança. O clima tenso faz parte do espetáculo Blitz, nova produção do Depósito de Teatro, escrita por Bosco Brasil e dirigida por Roberto Oliveira. A história conta o drama de um policial militar que tenta provar para a mulher que é inocente da morte de um garoto baleado em uma blitz no colégio. Apesar das súplicas do marido, Heloísa prefere acreditar no que está escrito nos jornais.
Antes disso, o cabo Rosinha era admirado no bairro por buscar sempre a harmonia entre os moradores. Com as notícias sobre a blitz na escola, deixa de ser herói e passa a ser criticado pelos vizinhos. Para piorar a situação, ele ainda carrega a dor e a culpa de ter sido responsável pela morte de seu próprio filho, que nasceu com uma doença hereditária. A esposa, que antes era a simpática atendente da padaria, passa a ser tratada com frieza pelos clientes.
Ao mesmo tempo que o cabo tenta conter seu lado agressivo, desesperado com a falta de confiança da esposa, ela, revela que tem alucinações, por conviver com os “mortos” do marido. Entre uma cena e outra, aparecem “flash backs” de momentos felizes do casal. O jogo dos dois atores do elenco é intenso e dramático. Homem e mulher aos poucos vão se distanciando dos sonhos que tiveram na juventude.
O diretor do espetáculo chama a atenção para o fato de que por trás de um policial militar existe um ser humano. “A forma como todos nós vemos a ação da polícia acaba sendo até preconceituosa”, opina Roberto Oliveira. “Este é um espetáculo que vê a condição humana do brigadiano e da mulher do brigadiano (termo que usamos pejorativamente). Pretendemos transcender este preconceito”.
Elenco: Charlie Severo e Sofia Salvatori
Diretor: Roberto Oliveira
Assistência de Direção: Sandra Possani
Local: Studio Stravaganza (rua Olinto de Oliveira, 66)
Quando: de 18 de agosto até 05 de setembro.
Temporada: quintas, sextas e sábados, às 21h e domingos e segundas, às 20h.

Carta de Barcelona

Rivadavia Severo
Este ano comemora-se os 400 anos da publicação de Don Quijote de la Mancha. Data com especial devoção, em terras espanholas, ao livro que inaugurou a narrativa moderna e que dizem por aqui que é o mais editado e traduzido depois da bíblia. O romance escrito por Miguel de Cervantes conta as aventuras do engenhoso fidalgo Don Quijote em princípios do século XVII, durante o reinado de Felipe III, quando Espanha estava perdendo sua condição de potência global que lhe seria finalmente arrebatada, escassos anos depois, com a assinatura do Tratado de Westphalia, em 1648, que prefigurou o mundo dos estados nacionais que vivemos até hoje. Cervantes, como todo grande novelista, tece as suas 1.200 páginas sobre este pano de fundo, onde deixa transparecer as transformações da sociedade e de seu sistema de valores e crenças
Quijote é um personagem que alterna momentos de profunda reflexão, com disparates. Diz o prêmio nobel português, José Saramago, que Alonso Quijano, o fidalgo que transforma-se em Quijote para poder viver suas aventuras, não era um louco, simplesmente buscava moldar a realidade a sua maneira para poder buscar o seu próprio eu. Coisas de homens de letras. Também interessante era o seu fiel escudeiro, que acompanhava o Cavaleiro da Triste Figura, não para salvar donzelas, nem para fazer justiça como seu amo, só queria a sua porção de terras a que governar e claro, enriquecer. E tanto queria que uns duques de Aragão lhe presentearam, mesmo que por burla, uma pequena ínsula. Como a boa literatura imita a realidade, nem 400 anos puderam separar o que aconteceu com Sancho Panza e o que ainda hoje ocorre em algumas repúblicas por aí. O escudeiro era um homem baixo, gordinho e barbudo que viu-se envolvido em uma série de artimanhas engendradas por seus súditos que o levaram a demitir de seu governo. Suas reflexões sobre os meandros do ato de governar são dignas de registro. “Agora verdadeiramente entendo que os juízes e governadores devem ser de bronze para não sentir a inoportunidade dos negociantes” e logo adiante justifica a sua demissão “…subi nas torres da ambição e da soberba…”
Naquela época, os governadores eram responsáveis pelos atos de seus vassalos e só deviam obediência ao Rei e a Deus. Hoje seus pares parecem que não são responsáveis por nada e nem devem explicações a ninguém. Talvez o exemplo deste simples escudeiro que demitiu de seu governo por ter entendido não haver sido capaz de governar a seu povo deva voltar às rodas palaciegas.

Ou vai ou racha

Guilherme Kolling
Se ainda resta alguma esperança à sobrevivência do Partido dos Trabalhadores (PT), ela passa pelo dia 18 de setembro, quando ocorrem as eleições para o comando de diretórios municipais, estaduais e nacional.
As tendências de esquerda do PT – insatisfeitas com os rumos do partido já antes do escândalo do mensalão – apostam em assumir o poder e dar uma guinada no partido, buscando a volta às origens, com uma defesa radical da ética e dos valores que formaram a sigla.

“O PT vive sua mais grave crise histórica. Esses dias que antecedem o pleito são decisivos”, avalia o deputado estadual Flávio Koutzii, líder da bancada do PT na Assembléia Legislativa. “Tenho falado na imprensa diretamente para os militantes, porque nem todos perceberam a dimensão deste momento. Só a eleição direta pode dar uma mexida nesse quadro”, completa.

Waldir Bohn Gass, presidente do diretório do partido em Porto Alegre também aposta na militância para salvar a sigla. “É fundamental a insurgência da base, que ela assuma o PT para que haja uma redemocratização do partido”, aponta.
O chamado Campo Majoritário, ala moderada que comanda o partido há anos, sofreu um abalo com o envolvimento do ex-ministro José Dirceu e de toda cúpula – Genoino-Delúbio-Silvio Pereira e Marcelo Sereno – nos escândalos de corrupção e caixa 2. Todos caíram.
Para botar ordem na casa, foi chamado o ex-ministro da Educação, Tarso Genro, que assumiu o partido num mandato tampão. Ele é o candidato do grupo moderado para as eleições de setembro.
“O Campo Majoritário, direta ou indiretamente, é responsável pelo que aconteceu. Temos que mudar a co-relação de forças, reformular o PT. E o PED (Processo de Eleições Diretas) é a grande oportunidade para mudar a direção do partido”, afirma o ex-prefeito de Porto Alegre João Verle.
De fato, a crise pode ser a chance para outras tendências do partido chegarem ao poder. “Com certeza, se não tivessem sido expostos esses fatos envolvendo o PT, a reeleição do José Genoino seria um passeio. Esse tsunami foi tão violento que deslocou as forças no partido”, acredita Koutzii.
Entre os candidatos de oposição, estão Valter Pomar, Plínio de Arruda Sampaio e os gaúchos Raul Pont e Maria do Rosário. Uma vitória da ala light, assumindo ou não o nome de Campo Majoritário (que Tarso falou que não existe mais), pode ser o estopim para uma debandada do PT. O racha deve afastar até quadros históricos.
“Já perdemos gente no início do governo Lula, na Reforma da Previdência, na definição do salário mínimo, na expulsão dos companheiros que formaram o P-SOL. Até os intelectuais que líamos se afastaram. Se a eleição for muito frustrante, pode provocar algumas perdas importantes”, aponta Flávio Koutzi.
O deputado estadual Edson Portilho tem a mesma impressão. “Pessoas descontentes com o rumo do partido já estão se desfiliando. E a continuar nesse ritmo, muitos militantes e dirigentes vão deixar o Partido dos Trabalhadores”, acredita. João Verle também prevê baixas, mas não aceita o “se perdermos, vamos sair”. “Isso não tem sentido”.
Quem destoa nesse ponto é o deputado Raul Pont, que evita falar em racha em caso de derrota. “Eu vou continuar militando no PT, construindo o partido, e defendendo que quem tenha algum envolvimento com corrupção ou malversação de recurso público, seja expulso e indiciado criminalmente”.
O presidente do Diretório do PT na capital gaúcha, Waldir Bohn Gass, por outro lado, chega a afirmar que, se houver vitória do Campo Majoritário e esta tendência comandar sozinha o partido, com um possível desânimo da militância, o PT pode não se recuperar mais.
Alguns já fazem comparações com outras siglas. É caso do deputado federal Chico Alencar (RJ). Desiludido com a reunião do Diretório Nacional, em 6 de agosto, ele afirmou que o PT vai virar um partido de massas sem identidade. “Um fenômeno parecido ao que aconteceu com o PMDB, que hoje serve para abrigar alguns políticos de nome, mas sem um programa”.
Um grupo de parlamentares federais, insatisfeitos com a orientação da liderança do partido, lançou o Bloco Parlamentar de Esquerda, que vai atuar com autonomia no Congresso.
Petistas pedem expulsão dos companheiros
Ninguém. Nem Delúbio Soares foi expulso do PT depois da reunião do Diretório Nacional, em 6 de agosto. Representantes do partido no Rio Grande do Sul cobram medidas mais fortes. “Chega de panos quentes! Há evidências devidamente comprovadas. Não consigo entender como ninguém ainda foi expulso”, ataca o deputado Flávio Koutzii.
“O PT está com seus valores em crise, é um patrimônio que pode ser destruído. As pessoas expressam dor, vergonha, indignação. E depois de um período de perplexidade, dirigentes petistas e quadros de expressão estão falando em fazer um corte nisso. Se não mudarmos a política, não resolveremos a questão. Queremos ganhar a direção do partido aqui e lá (no RS e no país)”, declara Koutzii, líder da bancada do partido na Assembléia.
O ex-prefeito de Porto Alegre João Verle também defende a saída de integrantes que cometeram atos ilícitos. “Falha no caráter é uma característica humana e o maior partido do país não ficou imune a isso. Agora devemos expurgar essas pessoas que ferem a nossa ética partidária, um ponto forte que ostentamos. Se isso não acontecer, vamos nos igualar aos demais partidos”, prevê.
Sete vereadores da bancada do PT na Câmara de Porto Alegre (Aldacir Oliboni, Carlos Comassetto, Carlos Todeschini, Margarete Moraes, Maria Celeste, Maristela Maffei, Sofia Cavedon) enviaram nota ao Diretório Nacional, na véspera do encontro de 6 de agosto. Eles se uniram ao coro dos que clamam pela saída de filiados comprovadamente envolvidos com irregularidades.
Outra voz dessa causa é o deputado Edson Portilho. “Não podemos comprometer 800 mil filiados, militantes que doaram a vida para a construção desse projeto, por irresponsabilidade e descompromisso de alguns dirigentes”, protesta.
“O PT é maior do que qualquer uma dessas pessoas. Se elas estiverem de fato envolvidas, que sejam expulsas, não importa que tenham 20 anos, 5 anos ou 5 meses de partido”.

As causas da crise

É consenso entre lideranças que o Partido dos Trabalhadores vive uma crise sem precedentes, que as denúncias devem ser apuradas e que os culpados devem ser punidos. Mas não há concordância sobre as causas, a origem do problema que afeta o PT.
O presidente nacional, Tarso Genro, analisou a conjuntura em artigo publicado na Folha de S. Paulo, em julho. Além da questão histórica (o buraco que se abriu com o fracasso de experiências de esquerda pelo mundo), e a política econômica do país, que não teve o avanço esperado no governo Lula, o ex-ministro critica a tese do partido dono de uma moral superior aos demais.
“Esquecemos que qualquer organismo da sociedade civil, por mais vontades positivas que contenha, reproduz, sempre, algo da moralidade média da sociedade na qual este organismo está imerso”. Tarso apela para uma renovação, sem arrogância, para defender a democracia e continuar a construção de um novo projeto para o país. “Precisamos, no PT, de uma reforma política, programática e de métodos de direção”.
Outro ponto de vista veio também em artigo publicado na Folha. Duas lideranças gaúchas, o ministro Miguel Rossetto e o deputado Raul Pont, contestaram a tese da arrogância do partido, que teria uma moral superior a dos demais.
“Numa notável inversão, pede-se desculpas pelo PT ter tido no passado uma postura intransigentemente ética. Responsabiliza-se os paradigmas de esquerda e de igualdade fundadores da nossa identidade pelos fatos que, agora, são a sua negação. Numa espécie de autocrítica do outro, critica-se o que fez o PT ser diferente, sem criticar nada que o faz ficar agora igual ao deformado sistema político brasileiro”.
Os dois apontam que a crise tem como origem a ruptura com a tradição do partido, pela “fratura entre discurso e prática, o distanciamento das bases e dos movimentos sociais, a hegemonia da lógica eleitoral, a despolitização da política, as alianças não-programáticas e, especialmente, a auto-suficiência das decisões de cúpula”.
Pont e Rossetto falam claramente que as explicações sobre a crise devem partir do grupo que agiu em nome do PT, “mas sem compartilhar essas decisões com o conjunto do partido ou sequer comunicar-lhe suas deliberações, afogando uma história de 25 anos num lodaçal de suspeições”. A dupla afirma que “a história do PT não acaba assim”. E projeta um futuro “com um rigoroso ajuste de contas com o presente, para ter uma agenda radicalmente republicana, democrática e popular para o Brasil”.
Outro texto que teve repercussão, neste mea culpa público feito pelo PT, foi o do jornalista Marcos Rolim, publicado em Zero Hora. Ele aponta que “o partido foi substituído por uma máquina de poder capaz de legitimar práticas tradicionais como o aliciamento e a demagogia, o aparelhamento do Estado e o canibalismo interno”. Rolim denuncia a “omissão diante de casos de abuso de poder econômico em campanhas eleitorais e de indícios de enriquecimento ilítico. E conclui: Mais que criminosos, “são ladrões de sonhos”.
Esperança no futuro
Alguns petistas sonham com a volta por cima ainda no Governo Lula. O 1º vice-presidente da Assembléia Legislativa, deputado Ronaldo Zulke, aposta na mudança de rumo, a ponto de possibilitar que críticos hoje desiludidos com o presidente apóiem a reeleição. Na visão dele, seria necessário vencer três pontos do debate: a ética partidária, a política de alianças do Governo, e a política econômica. “Defendemos mais recursos para programas sociais e uma redução no superávit, que está exagerado. Outra medida é a redução drástica da taxa de juros, para estimular a criação de empregos e o crescimento econômico”, explica.
Sobre o papel do partido nesta empreitada, quem fala é o otimista Waldir Bohn Gass, presidente do diretório de Porto Alegre. “Se chegamos ao poder num governo de coalizão, tudo bem. Mas o PT tem que tencioná-lo para a esquerda. O partido deve ter autonomia, não pode ser o menino de recados da presidência, como era no tempo do Genoino”.
David Stival, presidente do PT/RS também acredita que o partido pode dar perspectivas positivas para sua base. “Todos os partidos erram. Devemos levantar a cabeça e resgatar os valores éticos e morais do PT”, sugere. “Temos que ser inflexíveis na punição dos culpados e retomar o programa do partido no Governo Lula, abrindo canais para a participação social”, aponta.
Stival lembra ainda a “experiência vitoriosa no Governo Olívio-Rossetto, com uma diferença abissal em relação ao Governo Lula. O Rio Grande do Sul é uma referência para o projeto do partido, e pode influenciar o PT nacional, o que não significa romper”, acredita.
Bonh Gass fala em brigar pela história do PT, também citando as experiência em Porto Alegre e do Governo Olívio. “Mostramos um novo jeito de governar, com uma participação social – Orçamento Participativo – que dá força e garante um controle do governo”, opina.
O deputado Ronaldo Zulke concorda que o PT/RS, pelo acúmulo de gestões importantes, é um capital político importante para o PT nacional. “Não é a toa que temos três candidatos gaúchos na disputa pelo Diretório Nacional”, lembra.
Olívio pode assumir o partido no Estado
Os setores mais à esquerda do Partido dos Trabalhadores continuam trabalhando para que o ex-governador Olívio Dutra seja aclamado presidente do Diretório Estadual, em setembro, quando ocorrem as eleições do PT.
A mudança no rumo da disputa pelo diretório gaúcho surgiu após a demissão de Olívio do Ministério das Cidades. Ele teve uma volta triunfal, sendo recebido por centenas de militantes, empunhando bandeiras do PT e gritando palavras de ordem.
Mas disse “que não tem vocações individuais”, sobre uma possível candidatura à presidência estadual do PT. Na semana seguinte, não descartava assumir o partido no Estado para a alegria de militantes como Maurício Zimmermann, da Juventude do PT, que foi recebê-lo no aeroporto. “O partido deve ser ‘salvo’ por figuras como ele”, acredita.
O deputado Raul Pont, presente na recepção, reconheceu que “o companheiro tem o respaldo da militância e representa o partido”. O vereador Adeli Sell estava tão entusiasmado que declarou que “a refundação do partido aconteceu aqui, nesse ato” (no aeroporto), e que Olívio deveria aceitar conduzir o PT estadual.
“Queremos construir um consenso em torno do nome de Olívio, que tem todas as condições para construir uma nova direção para o partido”, conta o deputado Ronaldo Zulke, da Democracia Socialista, uma das tendências que apóiam o ex-governador.
O deputado Edson Portilho também aprova a idéia, assim como os presidentes do diretório de Porto Alegre, Waldir Bohn Gass e do RS, David Stival, que considera Olívio um símbolo de honestidade.
Entre os sete candidatos, quatro já abdicaram em nome do ex-governador. Mas pelo menos um concorrente não admite renunciar, a não ser que haja consenso em nível nacional – e não há. É o deputado Estilac Xavier que deve polarizar a disputa com Olívio.

Estilac representa o PT Amplo e Democrático e outras três tendências na disputa pelo Diretório Estadual do Partido dos Trabalhadores. O deputado justifica que o partido deve usar o mesmo critério em nível nacional e regional. “Se não conseguirmos unificar o partido nacionalmente, porque adotar esse modelo só no pleito do Rio Grande do Sul?”, questiona.

Estilac admite conversar sobre uma possível renúncia apenas se houver chapa única ao Diretório Nacional. “Aí podemos discutir o plano local da mesma forma, mas antes de renunciar teria que falar com as tendências que represento”.

O parlamentar do PT revela que é do grupo que defendeu realizar as eleições do partido só em 2007, mas que foi voto vencido. “Acho que seria importante um encontro preparatório agora, quando indicaríamos para direção uma chapa de unidade política, para a transição do partido. Em 2006 não haveria clima, já que é ano eleitoral, por isso, o ideal seria 2007”, analisa.
Colaborou Helen Lopes

Gás natural chega ao Moinhos em outubro

Guilherme Kolling
A Sulgás realiza hoje (15/8) testes finais na primeira rede de gás natural que vai atender comércio e residências no bairro Moinhos de Vento. O engenheiro Luiz Antonio Monza Koller (foto), gerente de Distribuição Urbana da Companhia, estima que o fornecimento comece em outubro.
A estatal já pediu licença de operação para a Secretaria de Meio Ambiente do Município. Além da autorização da Smam, a empreitada depende da contratação de uma empresa para fazer a ligação da rede com as residências – o edital da licitação está sendo preparado.
Quatro edifícios já contrataram o serviço – três estão na rua Santo Inácio. O outro fica na Hilário Ribeiro, via não contemplada nesta primeira fase. Mas a Sulgás fez uma extensão de 25 metros para atender ao prédio, que é novo, e não vai precisar de adaptação, pois já foi construído pensando no uso de gás natural.
Outros cinco condomínios estão em tratativas finais para assinar contrato. A idéia da Sulgás é entrar no mercado aos poucos, como uma alternativa ao GLP (gás de cozinha). O retorno já está garantido por clientes âncora – o Hospital Moinhos de Vento, que já recebe gás natural, e os clubes Grêmio Náutico União e Associação Leopoldina Juveinl, que já assinaram contrato. A Companhia negocia ainda com o complexo Sheraton-Moinhos Shopping.
Em 2006, a idéia é ampliar a rede para uma grande área do bairro. O projeto ainda está sendo desenvolvido, e deve ser entregue para análise da Prefeitura ainda este ano.
Um dos fatores que vai influenciar na adesão ou não ao gás natural é o preço. A Sulgás trabalha com outras companhias para que a Petrobrás não aumente a tarifa. Hoje, a Companhia garante um valor 5% a 20% mais baixo que o GLP, dependendo do tamanho e da estrutura do prédio.
“Mas alguns edifícios concordam em pagar mais caro. A lenha, por exemplo, é bem mais barata. Mas as pessoas não querem mais ter que administrar o combustível”, afirma Koller.
O engenheiro também descarta um eventual desabastecimento, em virtude da crise na Bolívia. Ele diz que a Petrobrás reorganizou o calendário de funcionamento da Bacia de Santos, que deve oferecer o combustível a partir de 2008.
Paralelamente, a estatal negocia com Peru um novo gasoduto, para abastecer também ao Chile e a Argentina. Num eventual corte da Bolívia, antes dessas alternativas estarem em funcionamento, haveria ainda um plano de contingência, interrompendo o abastecimento de grandes clientes que podem utilizar outros combustíveis, como carvão e energia elétrica, saída que não é possível nas residências.
“De qualquer forma, o cliente residencial é cativo, e terá o fornecimento garantido”, sustenta o engenheiro.

Lixo da construção civil é depositado clandestinamente em Porto Alegre

Ingrid Holsbach
O processo de verticalização pelo qual passa a cidade de Porto Alegre – com a construção de um sem número de condomínios residenciais e comerciais – finalmente gerou alguma preocupação aos vereadores. O depósito clandestino de resíduos da construção civil.
Até novembro de 2003 existiam dois aterros legalizados para essa finalidade, o João Parise, na zona norte e outro chamado de Terras do Exército, na zona sul. De lá para cá, com o esgotamento do João Parise, sobrou apenas o aterro na zona sul como alternativa para as empresas de caçambas.
Em decorrência da distância da maioria das obras até o aterro, muitas empresas começaram a depositar seus dejetos em locais clandestinos, fato que gerou denúncia à Câmara Municipal e, na manhã do dia 9, foi motivo de reunião da Comissão de Saúde e Meio Ambiente (Cosmam).
Cerca de 90 empresas de caçambeiros estariam despejando resíduos em vários locais clandestinamente na zona norte da cidade. Os responsáveis pelo encaminhamento das denúncias e pela reunião foram os vereadores Sebastião Melo e Haroldo de Souza, ambos do PMDB. Melo abriu os trabalhos constatando o óbvio ululante. “O despejo acontece em áreas clandestinas por causa da saturação dos aterros existentes na capital”, afirmou.
Convidado pelos vereadores, o Departamento Municipal de Meio Ambiente (DMLU) prometeu, em conjunto com várias entidades do setor, a ampliação do aterro João Parise e a abertura de um outro local apropriado próximo ao aeroporto Salgado Filho, na divisa com o município de Canoas.
Conforme o secretário municipal do Meio Ambiente, Beto Moesch, o problema não é responsabilidade exclusiva dos órgãos públicos: “A prefeitura está cumprindo sua parte, porém falta uma parceria com a construção civil. A lei é clara, o destino final dos resíduos é de responsabilidade de quem gera, e o setor da construção civil não está fazendo o que lhe cabe”, protestou. Mais uma vez, o vereador Melo caiu na obviedade. “O Poder Público tem de fazer cumprir a lei”, destacou.
O presidente da Associação dos Transportadores de Caçambas Estacionárias e Similares de Porto Alegre (ATCE), Ivan Pedrotti, afirmou que o maior problema não é a falta de aterros, mas sim de um local onde possa ser separado o material colocado nas caçambas.
Segundo ele, não há locais para triagem dos resíduos, e nas construções todo o lixo é colocado misturado na caçamba, junto com galhos de árvores e até mesmo lixo doméstico. De acordo com Pedrotti, os aterros, na maior parte das vezes, não aceitam os resíduos misturados, pois desta forma contaminam o lençol freático.
“Nós não geramos os resíduos e não podemos ser penalizados”, defendeu-se Pedrotti. “O que seria da cidade sem a opção da caçamba? Nós, na verdade, estamos ajudando o DMLU, realizando um trabalho que seria de responsabilidade deles”, afirmou.
Solução paliativa
Frente a este problema, o diretor-presidente do DMLU, Garipô Selistre, propôs uma solução paliativa para ser adotada ainda esta semana até a reabertura do novo aterro, que terá um centro de triagem. Selistre planeja colocar duas ou três caçambas e uma retroescavadeira na entrada do João Parise para fazer a separação correta dos resíduos.
As caçambas seriam obtidas com a Empresa Pública de Transporte Coletivo (EPTC), com custo zero à prefeitura e aos donos das empresas responsáveis pelo recolhimento dos entulhos. A previsão é de que na próxima semana o novo aterro já esteja funcionando.
Também está sendo estudada a hipótese de abrir um quarto aterro com um centro de triagem em uma área localizada na frente da empresa Vonpar, também na zona norte. A empresa responsável pela obra já teria inclusive encaminhado o licenciamento ambiental.
Muito lixo
Segundo dados da Smam, Porto Alegre produz cerca de 1000 toneladas de lixo por dia proveniente da área da construção civil. Logo, a construção de aterros não é a solução, mas sim uma medida temporária, já que os mesmos têm um tempo de vida útil de aproximadamente um ano.
A solução, segundo o secretário Beto Moesch, seria um plano de reaproveitamento dos dejetos da construção civil, medida proposta em 2002, porém nada foi feito desde então. “Na gestão passada a Smam não participava desta questão, ficando apenas a cargo do DMLU, que fazia a separação por amostragem”, lembrou.
Parceria com Sindicato da Construção
No encontro, também foi proposta uma parceria com o Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon), que ainda não foi chamado para participar da busca por soluções.
A entidade afirmou que apenas de 10 a 15% dos entulhos produzidos em Porto Alegre são oriundos da construção civil e que cerca de 70% são das obras do conduto Álvaro Chaves, que usou dois aterros para destinação dos resíduos produzidos, um deles localizado em Canoas e outro na Zona Sul de Porto Alegre.

Itinerários da cultura brasileira

O Projeto Copesul Cultural 2005 pretende fazer um balanço das transformações da cultura brasileira nas últimas quatro décadas. Debates sobre artes visuais, literatura, música, cinema. O que aconteceu nos rebeldes anos 60? A ditadura dos anos 70, a abertura política nos 80, fora Collor nos 90. Luiz Carlos Maciel, Nelson Motta, Fernando Gabeira, Affonso Romano de Sant’Anna, no jornalismo e literatura. Hermeto Pascoal, Francis Hime, MPB 4, Renato Borghetti, na música. Mais artes plásticas e mostra de cinema. O nome do projeto é Itinerários da Cultura Brasileira e acontece em setembro, em Porto Alegre.
Seminário 4X Brasil
A programação inicia no dia 13 de setembro, na Casa de Cultura Mario Quintana, com dois lançamentos e um seminário: o livro de ensaios 4X Brasil, organizado pelos professores Gunter Axt e Fernando Schüler, e a exposição de mesmo nome que tem curadoria do filósofo, jornalista e escritor Luiz Carlos Maciel.
Um grupo de reconhecidos intelectuais brasileiros, liderados pelo filósofo, jornalista e escritor Luiz Carlos Maciel, conhecido como “guru da contracultura”, vai fazer um balanço das transformações da cultura brasileira nas últimas quatro décadas. Acompanhado de Nelson Motta, Fernando Gabeira(foto)e Affonso Romano de Sant’Anna, Maciel vai indagar sobre a originalidade das manifestações, das utopias e vanguardas culturais que se desenvolveram na década de 60 no país.
Exposição
Na quarta-feira, dia 14 de setembro, terá abertura na Galeria Xico Stockinger, da Casa de Cultura Mario Quintana, a exposição 4 X Brasil – Itinerários da Cultura Brasileira. O objetivo é apresentar uma visão panorâmica dos movimentos, obras e artistas representativos do teatro, música, poesia e literatura das décadas de 60, 70, 80 e 90 que foram fundamentais para as metamorfoses do pensamento e do comportamento que forjaram o Brasil contemporâneo.
Movimentos como Bossa Nova, Tropicalismo, Manguebeat; grupos como Arena, Asdrúbal, Oficina, Vertigem; escritores como Rubem Fonseca, Carlos Heitor Cony, João Ubaldo Ribeiro, Moacyr Scliar, Milton Hatoum; poetas como Augusto e Haroldo de Campos, Murilo Mendes, Alice Ruiz, Manoel de Barros, Chacal, entre inúmeros outros, estarão presentes com suas brilhantes e inesquecíveis obras. Haverá também uma exposição de fotografias históricas apresentando importantes acontecimentos políticos ocorridos no país durante o período.
A exposição tem direção de arte de Andréia Vigo, apoio de Marcelo Ferla (música), Alexandre Brito (poesia), Luis Augusto Fischer (literatura), Lílian Santiago (teatro) e produção do Bureau de Cinema e Artes Visuais. Haverá também uma mostra de fotografias históricas apresentando importantes acontecimentos políticos ocorridos no Brasil nesse período.
Até o dia 16 de outubro, o público terá a oportunidade de ver imagens inéditas, clássicas, conhecer, relembrar e interagir com todo esse universo, refletindo as últimas quatro décadas do nosso país. A exposição terá visitação pública e visitas programadas de escolares.
Show
Na quinta-feira, 15 de setembro, às 21 horas, no Teatro do Sesi, acontece o espetáculo musical do Projeto Copesul Cultural 2005 – 4X Brasil. Além do show, o projeto apresenta no mês de setembro várias outras atividades.
A noite mesclará o som dos violinos, do piano, da viola e da gaita-ponto com a sinfonia da Orquestra Camerata Porto Alegre e com os diversos instrumentos do gênio Hermeto Pascoal. Duofel, Francis Hime(foto), MPB 4, Renato Borghetti, Zeca Collares, Fernando Deghi e João Tavares Filho também se apresentam no espetáculo que homenageia as últimas quatro décadas brasileiras.
O show apresentará o retrato de quatro décadas brasileiras – os anos 60, 70, 80 e 90. As principais músicas populares brasileiras e os movimentos de maior sucesso dessa época estão no repertório. Os músicos vão mostrar 26 canções, entre elas, obras da Tropicália, dos Festivais, da Bossa Nova e do Rock Rural. Cantores como Elis Regina, Jair Rodrigues e grupos como os Novos Baianos serão homenageados.
Mostra de cinema
Finalizando a série de atividades do Projeto Copesul Cultural 2005 – 4X Brasil, acontecerá de 27 a 30 de setembro, na Sala Paulo Amorim (na Casa de Cultura Mario Quintana), a terceira edição da Mostra Copesul de Cinema.
A mostra tem como objetivo refletir a forma estética e temática das décadas de 60, 70, 80 e 90. Filmes de ficção, documentários, obras clássicas e contemporâneas inéditas estarão compondo três programas nacionais e um internacional. Junto à mostra de filmes haverá uma exposição de imagens e registros dos principais acontecimentos ocorridos nestes 40 anos de trajetória brasileira no cinema.
A mostra é uma realização da Copesul, através do sistema LIC, com a coordenação de Andréia Vigo e Marcus Mello e produção do Bureau de Cinema e Artes Visuais.
Programação:
TERÇA-FEIRA, 13 de setembro
O QUE: Lançamento da Exposição “4X Brasil”
QUEM: Curadoria de Luiz Carlos Maciel.
QUANDO: 13 de setembro, às 18h30min, para imprensa e convidados.
Aberto ao público de 15 de setembro a 16 de outubro, de terças a sextas, das 9h às 21h. Sábados, domingos e feriados das 12h às 21h.
ONDE: Galeria Xico Stockinger – Casa de Cultura Mario Quintana – (Rua dos Andradas, 736)
QUANTO: Entrada franca
TERÇA-FEIRA, 13 de setembro
O QUE: Lançamento do livro “4X Brasil” (Editora Artes & Ofícios)
QUEM: Luiz Carlos Maciel, Affonso Romano de Sant’Anna, Fernando Gabeira, Nelson Motta, Artur de Faria, Flávio Kiefer, Francisco Carlos Teixeira da Silva, Luís Augusto Fischer, Luis Zanin, Miltão de Maia Ricardo, Ricardo Silvestrin, Santiago Nazarian, Suzana Gastal e Zilda Gricoli Lokoi.
QUANDO: Terça-feira, 13 de setembro
ONDE: Sala Sotero Cosme – Casa de Cultura Mario Quintana – 6º andar (Rua dos Andradas, 736)
QUANTO: a definir
HORÁRIO: 18h30min
TERÇA-FEIRA, 13 de setembro e
QUARTA-FEIRA, 14 de setembro
O QUE: Seminário 4X Brasil
QUEM: Luiz Carlos Maciel, Affonso Romano de Sant’Anna, Fernando Gabeira e Nelson Motta, com mediação de Fernando Schuler.
QUANDO: 13 e 14 de setembro.
ONDE: Casa de Cultura Mario Quintana – Teatro Bruno Kiefer – 6º andar
QUANTO: R$ 30 (dá direito ao livro de ensaios 4X Brasil).
ONDE COMPRAR: Casa de Cultura Mario Quintana e Livraria Siciliano do Shopping Praia de Belas, a partir de 20 de agosto.
HORÁRIO: das 19h30min às 22h.
QUINTA-FEIRA, 15 de setembro
O QUE: Show 4X Brasil
QUEM: Hermeto Pascoal, Duofel, Francis Hime, MPB 4, Renato Borghetti, Zeca Collares, Fernando Deghi, João Tavares Filho e Orquestra Camerata Porto Alegre.
QUANDO: quinta-feira, 15 de setembro.
ONDE: Teatro do Sesi
QUANTO: R$ 15
ONDE COMPRAR: Lojas Multisom dos shoppings Iguatemi, Praia de Belas, Moinhos e Total, a partir do dia 20 de agosto.
HORÁRIO: 21h
DE TERÇA-FEIRA, 27 de setembro a
SEXTA-FEIRA, 30 de setembro
O QUE: Mostra Copesul de Cinema 4X Brasil
QUEM: curadoria de Andréia Vigo e Marcus Mello.
QUANDO: de terça-feira, 27 de setembro a sexta-feira, 30 de setembro
ONDE: Cinemateca Paulo Amorim – Casa de Cultura Mario Quintana
QUANTO: R$ 5
ONDE COMPRAR: a definir
HORÁRIO: a definir