Num país perplexo com a corrupção, Cunha vai em frente

P.C. DE LESTER
Os fatos dos últimos dias em Brasilia demonstram que o politico mais poderoso do pais, no torvelinho desta crise, é o deputado Eduardo Cunha, presidente afastado da Câmara de Deputados.
Até o fato negativo – o pedido de sua prisão pelo procurador Janot – revelou-se positivo na medida em que seu nome figurou numa lista entre os maiores caciques da República – Romero Jucá, ex-ministro, líder do governo no Senado; Renan Calheiros, presidente do Senado e José Sarney, senador ex-presidente.
Ou seja, seu julgamento, agora, confunde-se com o julgamento de toda uma classe política. Ou seja, seu caso de ostensiva corrupção, ganha as tintas de um caso político, como ele sempre sustentou.
Depois, teve a sessão na Comissão de Ética. Ao contrário das ruas, onde as pesquisas colhem que 92% querem sua cassação por corrupto, a comissão está dividida. Sua tropa de choque, sem qualquer escrúpulos, manobras as sessões e está a ponto de absolvê-lo.
A batata quente está na mão da deputada Tia Eron, uma aliada sua, que faz um jogo de cena para fazer crer que vota com independência.
Se ele for absolvido (ou punido brandamente) na Comissão de Ética,  mediante manobras e ameaças… quem acredita que o ministro Teori Zavaski, vai mandar prender Cunha? Lembre-se que há poucos dias, um filho do ministro denunciou nas redes sociais que sua familia se sentia ameaçada, sem dizer por quem.
 
 
 
 

Dilma cai atirando

Nesta quarta feira o Senado vota e na quinta sai o PT e entra o PMDB, levando de volta para a Esplanada dos Ministérios o mesmo séquito de partidos que compunham e ainda compõem a chamada “base aliada”.
Excluindo PT, PCdoB e PSOL, todos os antigos apoiadores sentam de novo nas suas cadeiras.
Os partidos da esquerda voltam às ruas, trabalhando os dois desafios eleitorais que têm pela`frente, as municipais de outubro e as nacionais de 2018. Este é o cenário geralmente aceito pelos analistas.
Aí está o golpe, que, embora as forças majoritárias neguem o vocábulo, deu-se dentro do Palácio do Planalto, como nos saudosos filmes de capa e espada tirados dos romances de Alexandre Dumas.
Portanto, muito simples: o PT perdeu o comando político e seu aliado PMDB passou-lhe uma rasteira. É assim que acontece.
Já a presidente Dilma Rousseff não aceitara a manobra quando rejeitou o banqueiro Henrique Meirelles como tutor, como era o desejo do líder de suas forças de sustentação, o ex- presidente Lula.
Ali ela assinou sua carta de alforria, mas selou seu destino como presidente, pelo menos por enquanto (ainda vai correr muita água por debaixo da ponte antes de tirarem definitivamente seu mando, se conseguirem).
Meirelles que naquela vez chegara triunfante ao Planalto Central, levando consigo uma queda na cotação do dólar e uma disparada ascendente nas cotações das bolsas, mas deu com a cara na porta, agora volta triunfante.
Nada como um dia depois do outro, repetiria o Conselheiro Acácio.
Os antigos aliados da presidente passam para os escaleres de salvamento, deixando aos fiéis precárias tábuas de salvação que, uma a uma, vão afundando.
Entretanto, Dilma não se entrega. Neste final ela não titubeou e foi para a rua clamar ao povo, mostrando o que acontecia.
Todos os dias ela apareceu no Jornal Nacional denunciando o golpe, mostrando um inimigo visível, o presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.
Poupou os desertores.
Entretanto, cada dia fica mais claro que os verdadeiros algozes estavam dentro de sua própria trincheira.
Agora não adianta mais esbravejar contra Michel Temer. A raposa paulista, mesmo desqualificada pelas ruas (sua popularidade é menor que a de Dilma, que amarga o fundo do poço), soube recompor as forças majoritárias que, no início do ano compunham a base parlamentar do governo.
A peça chega ao fim do primeiro ato. A surpresa que não estava no script é que Dilma não se conforma com o papel de velhinha roubada pelo trombadinha que a nova oposição pretendia colar à sua imagem.
Ela deveria recolher-se ao Palácio da Alvorada e ficar regando as plantas, abrindo a porta aos turistas e aparecer de vítima indefesa nos telejornais, beijando criancinhas. Dilma vai à luta.
Ela surpreende: esperava-se que se comportasse como uma mineira ensaboada, deixando que o governo Temer se afundasse em suas próprias contradições, e assim ganhando espaço para derrubar o impeachment no plenário, daqui a seis meses. Não será assim.
Dilma decidiu pegar o touro à unha. Fora de suas características de tecnocrata, como fez no primeiro mandato, vai para a rua. Deixa para traz a economista de falas confusas e sai como uma oradora feroz botando o dedo na cara dos golpistas.
No lugar da mineira maneirosa ela ressuscita a gaúcha de faca na bota e sai a campo para, sem medo, dar murros em facas de ponta.

Um homem bomba

P.C. de Lester
A decisão do Supremo Tribunal a respeito de Eduardo Cunha ainda está sendo decifrada. Não dá para perceber até o momento toda motivações e todo o alcance de seu afastamento do centro da cena´.
Uma vez mais, com essa decisão, fica evidente que há um script  por trás de todos esses movimentos que culminam com o impeachment da presidente Dilma.
Cunha se colocou como uma peça essencial num determinado momento, depois se tornou um incômodo, um constrangimento para os golpistas, uma bandeira para os que contestam a legalidade do impeachment.
Agora é removido num lance cheio de controvérsias. Sai dos holofotes, ninguém pode  pode falar em impunidade, fica talvez mais confortável para manobrar.
É dificil acreditar que ele vai se simplesmente descartado e entregue às feras. Ele tem muita gente na mão, a começar pelo presidente Michel Temer.
Nesse ponto é forçoso concordar com Mino Carta: Eduardo Cunha tornou-se um homem bomba no meio da crise política brasileira.
 
 
 

Meirelles para presidente

PINHEIRO DO VALE
Na entrevista que deu na tarde de sexta-feira em frente à casa do vice-presidente Michel Temer, em São Paulo, o ex-presidente do Banco Central do governo Lula falou como se já fosse o novo ministro da Fazenda.
Ato falho de Henrique Meirelles, certamente uma das pessoas mais versáteis politicamente no país, ou melhor, um pula-muro que poderia bater o recordista mundial do salto com vara das Olimpíadas.
Há poucos meses Meirelles chegou a Brasília como virtual ministro da Fazenda da presidente Dilma Rousseff, prestigiado pelo ex-presidente Lula e festejado pelo mercado, tanto que só menção de seu nome fez a Bolsa de Valores subir e o dólar despencar.
Nesta sexta-feira ele aparece no meio dos jornalistas de plantão em frente à mansão dos Temer dando receita de política econômica.
Para bom entendedor, de aliado de Lula a golpista foi uma chispa. Mais ligeiro que um raio.
Agora vai começar o seu calvário, caia ou não Dilma, pois com isto ele sinaliza que entra na corrida presencial com o apoio de Michel Temer,  vice-presidente e dono do PMDB, partido que já anunciou que vai ao pleito de 2018 com nome próprio.
Este nome seria o de Henrique Meirelles. Uma repetição de Fernando Henrique com Itamar Franco. Pega uma crise, resolve o problema e sai do ministério nos braços do povo para o Palácio do Planalto. Só falta combinar com os russos.
A ambição presidencial de Meirelles é notória. Ele não esconde de ninguém, nos meios da plutocracia internacional, que já é um homem realizado.
Nada lhe faltaria, pois tem dinheiro aos borbotões, prestígio mundial como banqueiro, nome na política como mago das finanças do presidente Lula e uma vida tranquila nos Estados Unidos, onde vivia nos últimos tempos.
Só uma coisa faria Meirelles se mexer: a presidência da República. Este seria seu prêmio. Não a cadeira de Dilma, mas a vaga para concorrer, o que, diga-se, não será fácil, pois teria pela frente vários pesos pesados e seu mestre Lula bombando como líder da oposição ao governo Temer.
Por outro lado, não seria difícil repetir a trajetória de Fernando Henrique. Seria até mais fácil, pois o tucano pegou uma economia em frangalhos. Já Meirelles herdaria uma economia plantada em fundamentos macroeconômicos sustentáveis, com inflação cadente e um potreiro de oportunidades para atrair investimentos.
Espertamente, ele vê esse páreo como uma barbada.
Entretanto, ele é um neófito em política. Nem sabe o que é colar no peito um alvo de presidenciável. Vem muita bala.
Veja o caso de Lula: saiu do governo consagrado, continuou no paraíso como ex-presidente, fazendo conferências pelo mundo e recebendo homenagens.
Bastou dizer que pensava voltar em 2018 para desabar o mundo sobre ele e sua família.
Meirelles que ponha as barbas de molho.
O paulista Antônio Mariz caiu antes de entrar por uma declaração bem menos detalhada que a de Meirelles na saída do encontro com Temer.
 

Procuradores induzem depoimento sobre “sítio de Lula”

Reproduzo texto de Marcos de Vasconcellos, do Conjur:
O cenário é uma casa humilde no interior de São Paulo. Quatro procuradores batem à porta e, atendidos pelo morador — que presta serviços de eletricista, pintor e jardinagem em casas e sítios—, começam a questionar se ele trabalhou no sítio usado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e se conhece um dos donos do imóvel, o empresário Jonas Suassuna. Ao ouvirem que o homem não conhecia o empresário nem havia trabalhado no local, começam o jogo de pressões e ameaças:
Procurador: Quero deixar o senhor bem tranquilo, mas, por exemplo, se a gente chamar o senhor oficialmente pra depor daqui a alguns dias, e você chegar lá pra mim e falar uma coisa dessas…
Interrogado: Dessas… Sobre o quê?
Procurador: Sobre, por exemplo, o senhor já trabalhou no sítio Santa Barbara?
Interrogado: Não trabalho.
Procurador: O senhor já conheceu o senhor Jonas Suassuna?
Interrogado: Nunca… Nunca vi.
Procurador: O senhor já fez algum pedido pra ele em algum lugar?
Interrogado: Nem conheço.
Procurador: Então, por exemplo, aí eu te apresento uma série de documentações. Aí fica ruim pro senhor, entendeu?
A conversa foi gravada pelo filho do interrogado, um trabalhador da região de Atibaia. Os visitantes inesperados eram os procuradores do Ministério Público Federal Athayde Ribeiro Costa, Roberson Henrique Pozzobon, Januário Paludo e Júlio Noronha.
Nas duas gravações, obtidas pela ConJur, os membros do MPF chegam na casa do “faz tudo” Edivaldo Pereira Vieira. Sutilmente, tentam induzi-lo, ultrapassando com desenvoltura a fronteira entre argumentação e intimidação, dando a entender que dizer certas coisas é bom e dizer outras é ruim.
Na insistência de que o investigado dissesse o que os procuradores esperavam ouvir, fazem outra ameaça velada a Vieira, de que ele poderia ser convocado a depor e dizer a verdade.
Procurador: É a primeira vez, o senhor nos conheceu agora, e eventualmente talvez a gente chame o senhor pra depor oficialmente, tá? Aí, é, dependendo da circunstância nós vamos tomar o compromisso do senhor, né, de dizer a verdade, aí o senhor que sabe…
Interrogado: A verdade?
Procurador: É.
Interrogado: Vou sim, vou sim.
Procurador: Se o senhor disser a verdade, sem, sem problema nenhum.
Interrogado: Nenhum. Isso é a verdade, tô falando pra vocês.
Procurador: Então seu Edivaldo, quero deixar o senhor bem tranquilo, mas, por exemplo, se a gente chamar o senhor oficialmente pra depor daqui a alguns dias, e você chegar lá pra mim e falar uma coisa dessas…
Investigado ou testemunha
Ao baterem à porta de Vieira, um dos procuradores diz: “Ninguém aqui tá querendo te processar nem nada, não”.
No entanto, o nome de Pereira Vieira aparece na longa lista de acusados constantes do mandado de busca e apreensão da 24ª etapa da operação “lava jato”, que investiga se o ex-presidente Lula é o dono de sítio em Atibaia, assinado pelo juiz Sergio Fernando Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba.
Ao se despedirem, deixando seus nomes e o telefone escritos a lápis numa folha de caderno, os membros do MPF insistem que o investigado escondia algo e poderia “mudar de ideia” e decidir falar:
Procurador: Se o senhor mudar de ideia e quiser conversar com a gente, o senhor pode ligar pra gente?
Interrogado: Mudar de ideia? Ideia do quê?
Procurador: Se souber de algum fato.
Interrogado: Não…
Procurador: Se você resolver conversar com a gente você liga pra gente, qualquer assunto?
Interrogado: Tá.

Relator da OEA defende novo marco regulatório para a comunicação no Brasil

Bia Barbosa 
Em visita ao país, Edison Lanza avaliou que o sistema de mídia brasileiro não garante a diversidade e o pluralismo político
Na última semana, o Relator Especial para a Liberdade de Expressão da OEA (Organização dos Estados Americanos), o uruguaio Edison Lanza, esteve no Brasil. Além de participar de dois seminários promovidos por organizações da sociedade civil – entre elas o Intervozes –, Lanza teve uma importante agenda de reuniões com o governo federal e com os movimentos sociais. O objetivo: contribuir para destravar a agenda de construção de um novo marco regulatório para as comunicações no país.
Em suas palestras e entrevistas, assim como nas audiências com os ministros Juca Ferreira (Cultura), Edinho Silva (Secretaria de Comunicação da Presidência da República) e Ricardo Berzoini (Comunicações – foto), Lanza reafirmou a necessidade dos Estados contarem com leis, mecanismos e órgãos independentes de regulação que sejam capazes de garantir a diversidade e o pluralismo nos meios de comunicações e o exercício da liberdade de expressão pelo conjunto da população.
“O Brasil postergou a adoção de medidas concretas. Pelas denúncias que recebemos da sociedade civil, o País tem um sistema muito concentrado, sobretudo na TV aberta. Há muitas rádios controladas por políticos e o setor comunitário permanece excluído. A legislação para as rádios comunitárias é deficitária, pois impõe limites de alcance e restringe o financiamento pela publicidade”, declarou o relator à Carta Capital. Para Lanza, a concentração da propriedade dos meios no Brasil e na região, somada à ausência de sistemas públicos de comunicação fortalecidos, “tem implicações no processo democrático, pois um dos pressupostos da democracia é o pluralismo político, a diversidade de vozes. Há uma clara necessidade de incluir mais atores”, afirmou.
Em seminário na Universidade de Brasília, Lanza destacou que o país perdeu algumas oportunidades para democratizar o setor. Ele relatou que, desde 1985, a Corte Interamericana de Direitos Humanos entende que os oligopólios atuam contra a liberdade de expressão. E que a Declaração de Princípios sobre o tema, aprovada pela Comissão, desde o ano 2000 afirma que os Estados tem obrigação de limitar a concentração dos meios. “Se isso tivesse sido aplicado, teríamos outro quadro”, disse.
A relatoria aproveitou para lembrar, uma vez mais, que a liberdade de expressão é condição para o exercício de outros direitos; porém, não é um direito absoluto, que pode ser limitado pelo que está previsto no direito internacional. “Ter um sistema plural de comunicação no país é uma dessas previsões, assim como a proteção de crianças e adolescentes e a incitação ao ódio. É falso entender qualquer regulação como censura. A discussão depende de como se constrói a proposição de regulação e como se considera os padrões internacionais”, explicou.
E acrescentou: “Este é um processo que deve ser feito com participação popular. Se o Brasil construiu de maneira tão exemplar o Marco Civil da Internet, por que não consegue fazer o mesmo para atualizar o marco da radiodifusão?”, questionou Edison Lanza.
O retorno do governo 
A pergunta acima foi feita, em formato de sugestão, ao governo federal. Com o ministro Edinho Silva, Lanza tratou da importância do fortalecimento dos meios públicos, de seu desenho institucional – que precisa ter autonomia em relação ao governo, incluindo a forma como são escolhidos os dirigentes das emissoras públicas de comunicação – e da necessidade das verbas públicas de publicidade serem distribuídas também com base em critérios de estímulo à diversidade e à pluralidade. Edinho se comprometeu a analisar um estudo da Unesco, indicado pelo relator, sobre padrões internacionais de sustentabilidade da mídia, além da lei sobre publicidade oficial recentemente aprovada pelo Uruguai, considerada um bom modelo.
Do ministro Berzoini, Edison Lanza soube que o governo pretende trabalhar com uma articulação dos ministérios da Cultura, Comunicações, Secretaria de Comunicação Social e Secretaria Geral da Presidência da República para construir “a opinião” da gestão Dilma sobre “a questão da comunicação”. A proposta já havia sido feita ao ministro pelo FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação), no início do ano. Incrivelmente, o governo como um todo parece não estar convencido de que parte significativa da crise que enfrenta é porque se acovardou, nos últimos 12 anos, a alterar a estrutura do sistema midiático brasileiro…
Berzoini é um dos poucos que tem consciência sobre isso. Para ele, uma abordagem internacional, como a da Relatoria da OEA para a Liberdade de Expressão, pode ajudar o governo a fazer o debate sobre um novo marco regulatório para o setor no Brasil. O MiniCom está organizando, para novembro, um evento internacional para ouvir especialistas e experiências de outros países sobre regulação dos meios. Edison Lanza pode voltar ao país na ocasião.
Até lá, espera um convite do governo brasileiro para uma missão oficial ao Brasil, o que lhe permitiria viajar pelo território durante alguns dias e elaborar um informe mais global sobre a garantia – ou não – da liberdade de expressão no país. Enquanto isso não acontece, as organizações da sociedade civil e movimentos que se reuniram com o relator se comprometeram a manter a Comissão Interamericana de Direitos Humanos bem informada sobre os desafios enfrentados por aqui. E eles não são poucos.
* Bia Barbosa é jornalista, especialista em direitos humanos e integrante da Coordenação do Intervozes.

Uma imprensa que defende as empresas

É inacreditável a cobertura que a imprensa de Porto Alegre dá aos dois temas mais importantes em discussão no Rio Grande do Sul neste momento: o aumento das tarifas do transporte coletivo na Capital e a questão dos pedágios. Nos dois casos ela tem uma posição inequívoca: a favor das empresas.
No caso do transporte coletivo de Porto Alegre, há uma omissão reiterada, que este ano não foi diferente. Se não fosse o jornal Metro, diário gratuito, que deu em manchete o pedido de aumento de 14% das empresa de ônibus, o assunto estaria fora de discussão, pois nenhum dos diários da cidade se ocupou dele nesta quarta-feira.
Ninguém também questionou essa coincidência de estarem os trabalhadores das empresas de transporte coletivo ameaçando greve por aumento no exato momento em que as empresa pressionam a prefeitura por um reajuste muito acima da inflação.
No ano passado, as empresas de transporte já obtiveram um aumento de 11%, quase o dobro do índice inflacionário. E no ano anterior também.
O impacto do transporte coletivo repercute em toda a cadeia econômica. Quando um jornal como a Zero Hora deixa de dar importância a isso, alegando que é um assunto que só interessa ao povão (mas o Diário Gaúcho, o jornal da Casa destinado ao povão, também não deu nada), coloca sua ignorância na vitrine. A tarifa do transporte público tem influência em toda a economia, nas empresas inclusive.
O caso dos pedágios chega a ser cômico. Os contratos de concessão de 1.800 quilômetros de rodovias feitas no governo Britto a empresas privadas (na verdade, consórcios de empreiteiras constituídos com essa finalidade) já foi definido como “o caso mais negro do Rio Grande do Sul” pelo ex-ministro dos Transportes, Cloraldino Severo, um técnico, estudioso do assunto e pessoa ideologicamente insuspeita.
A cobertura, no entanto, é toda favorável às concessionárias, mesmo quando isso exige omissão ou manipulações das informações. A esse respeito é didática a matéria publicada na ZH (18/01), na verdade um “press release” esquentado.
Antes, é didático ler o press release distribuído pela assessoria do palácio Piratini, a respeito do assunto:
“Em reunião com os representantes do consórcio Univias, que administra os polos de pedágios da região Metropolitana, de Lajeado e Caxias do Sul, o coordenador da Assessoria Superior do Governador, João Victor Domingues, reafirmou nesta terça-feira (17), no Palácio Piratini, a disposição do Executivo em reduzir as tarifas cobradas pela empresa. Além de diminuir o valor do pedágio, o Estado propõe a manutenção dos investimentos previstos.
Mais do que rechaçar a continuidade do modelo atual de cobrança, João Victor afirmou que o Governo do Estado mantém a exigência de acabar com a praça de Farroupilha, adotar um modelo mais transparente e criar um conselho de usuários. “Não queremos a continuidade de um modelo que não prevê uma prestação de serviço de qualidade por parte das concessionárias”, garantiu.
Uma consultoria deve ser contratada pelo Governo do Estado até maio para apontar um diagnóstico sobre um possível desequilíbrio nas tarifas. Em 90 dias, a consultoria apresentará os resultados dos estudos.
Vários fatores podem ser levados em consideração para a diminuição das cobranças. João Victor explica que existe a possibilidade de testar uma cobrança regionalizada das tarifas, a partir da realidade de cada região diminuir. “A proposta que nos trouxeram é de R$ 4,40, e nós achamos que podemos reduzir para R$ 3,80, R$ 4, mas sem prejuízo do volume de investimentos sinalizados de R$ 1bilhão. Isto tudo influencia, inclusive na elaboração de um novo modelo e mesmo na forma de licitação”, acrescentou.
Conforme João Victor, a primeira alternativa do Estado é a constituição de um novo modelo por licitação. “O ambiente de conversação ajuda, inclusive para que não tenhamos uma batalha judicial que inviabilize a alteração do modelo”, disse.
Advogado do Univias, Ricardo Breier afirmou que a empresa vai repensar critérios técnicos e avaliar os valores cobrados pela empresa. “Os contratos preveem alguns indicativos importantes e mexer nisso agora pode também mudar o índice e aumentar os índices de desequilíbrio”, frisou.
Agora compare a matéria de ZH ( 18/01, pg. 6):
Política: Pedágios em Jogo.
“Em negociação, Piratini sugere tarifa de Cr$ 3,80. Contraproposta do governo Tarso faz parte da discussão em torno da renovação dos atuais contratos”.
“Em reunião com representantes do Consórcio Univias, no fim da tarde em Porto Alegre, o  governo Tarso Genro pediu a redução de tarifa às concessionárias. Antes de dar mais um passo à possível prorrogação dos contratos até 2014, o executivo  quer  garantir que o valor cobrado pelas empresas  em caso de renovação fique entre R$ 3,80 e R$ 4,00, no máximo.
A retomada das negociações, iniciadas em novembro, estendeu-se por uma hora no Salão dos Banquetes do Palácio Piratini. A portas fechadas, o único representante do governo, o coordenador executivo da Assessoria Superior do governador, João Vitor Domingues sugeriu a redução nos preços e fez um segundo pedido: que as empresas também apresentem tarifas regionalizadas – por entender que nas praças de maior movimento a possibilidade de cortes é maior.
“Acreditamos que ainda há margem de negociação. As tarifas poderiam ficar em R$ 3,80 e R$ 4,00, sem prejuízo às demais propostas apresentadas – disse Domingues.
Em novembro, além de se comprometer a baixar as tarifas de R$ 6,70 para R$ 4,40, as concessionárias prometeram fechar a praça de Farroupilha, na Serra, e investir em obras.
Ao final do encontro, os três representantes da Univias – o advogado Ricardo Breier, e os diretores Mário Baltar e Radamés Cassab, do grupo Equipav, acionista do consórcio, deram sinais de que o acordo é possível. “Vamos dar início a um estudo e avaliar o que pode ser feito. Nosso interesse é fazer isso o mais rápido possível”, afirmou Breier.
Embora João Vitor tenha se preocupado em  assegurar que não existe uma definição por parte do Executivo, o avanço nas tratativas é alvo de críticas dentro do próprio PT. Ontem o deputado Raul Pont, presidente do partido no Estado, disse  ser contrário às negociações.
A postura irritou Domingues: “O que ele sugere. Eu rompa com as empresas e entre numa disputa judicial sem fim? – questionou. Em agosto, o coordenador espera ter em mãos o diagnóstico do setor que será elaborado por uma consultoria, que ainda será contratada”.
Uma  foto de quatro pessoas numa mesa, ocupando quase ¼ da página traz a seguinte legenda: “Representantes do Consórcio Univias ouviram a proposta feita por João Vitor, assessor de Tarso”.
Síntese: o jornal insiste que o governo está negociando a prorrogação dos contratos, quando o governo diz claramente que o atual modelo é improrrogável.

Jardins sem alma

Quem mora em cidades facilmente repara que as empresas contemporâneas que oferecem “serviços de jardinagem” se parecem cada vez mais com uma brigada paramilitar. São pessoas, em geral, com pouca habilidade em jardinagem propriamente dita, prontas para intervir em jardins, com todo o tipo de coisa que a tecnologia que favorece o menor esforço deu conta de criar, e que, ao que tudo indica, continuará criando
Para um ano tão pesado de lutas desiguais e truculentas em busca da proteção do patrimônio natural brasileiro, a abordagem de um tema fora do contexto rural pode ajudar a recarregar as baterias para um 2012 que também reserva muitas pressões. O que ocorre no entorno de nossas casas incrustadas no meio urbano também tem sua relevância e muitos desafios.
jardinsQuem mora em cidades facilmente repara que as empresas contemporâneas que oferecem “serviços de jardinagem” se parecem cada vez mais com uma brigada paramilitar. São pessoas, em geral, com pouca habilidade em jardinagem propriamente dita, prontas para intervir em jardins, com todo o tipo de coisa que a tecnologia que favorece o menor esforço deu conta de criar, e que, ao que tudo indica, continuará criando.
Aparelhos, na maioria das vezes, movidos a gasolina, que cortam grama, serram troncos de árvores, podam cercas vivas e até fazem vento, contaminando o ambiente com um barulho típico da modernidade. Haja paciência para suportar tanta perturbação pública calcada na pressa e na superficialidade de um trabalho que está deixando cada vez mais a desejar.
Pior do que a parafernália que torna este tipo de serviço uma atividade considerada especializada é que ficam totalmente para trás os preceitos mais simples de uma jardinagem equilibrada e que tenha por essência “cuidar” do jardim e não realizar uma ação que mais parece uma “lavagem rápida” com vistas a tirar a “sujeira grossa”.
Ser um bom jardineiro não requer só conhecimento prático, mas teórico e técnico, embora quem os contrate se considere o dono da verdade, impondo orientações estapafúrdias que consolidam o mau manejo dessas áreas.
Sem respostas…
Saber quais são espécies invasoras que devem ser evitadas, quais as nativas regionais disponíveis para uma introdução e como estabelecer um conjunto diverso de plantas para atrair mais espécies da fauna nativa são parte de uma ampla gama de perguntas que estes profissionais deveriam saber responder de pronto.
O maquinário de supérfluos avançou no já pouco elaborado serviço de jardins que é ofertado no mercado e corrobora com o varrer até a terra aflorar, atear fogo ou retirar toda a matéria verde, considerada lixo, para fora do terreno e obrigar o serviço público a transportá-la para “fora da cidade”.
Sequer considerando a existência de mudas nativas que possam ter nascido a partir de algum processo de dispersão natural de sementes, usam-se pesticidas para “matar o mato” e as formigas, em conjunto com o que mais estiver por perto.
Um jardim pode ser uma obra de arte que é construída pouco a pouco ao longo dos anos. Essas áreas são, em geral, muito simplificadas se comparadas com uma área natural bem protegida e fora do perímetro das cidades, mas não por isso são isentas de surpresas e de possibilidades. E, no caso de Curitiba, pode gerar ainda redução do IPTU e, com a criação de Reservas Naturais, possibilitar a venda do potencial construtivo das áreas a terceiros.
Faz tempo que já concluí que jardineiro sem qualificação técnica e armado de parafernália e proprietário do século passado, que acha que folha é lixo, se merecem na sua totalidade. E deveria um pagar a conta do outro, na condição de não conseguirem ver o que realmente pode ser feito da natureza potencial de um jardim.
Não fosse o prejuízo que esses cidadãos tão numerosos causam para toda a sociedade, ao ignorarem que suas visões são retrógradas e profundamente limitadas, que empobrecem um bem comum que poderíamos dispor em uma cidade mais civilizada, deveriam ser ignorados e abandonados à própria sorte.
Mesmo com a relutância categórica da maioria em acatar uma lógica menos rudimentar do que o que se faz atualmente na maioria das propriedades, públicas e privadas, de nossas cidades, deveria existir um confronto das más práticas com novas leis, que punam os que degradam, mesmo sem saber o que fazem.
Esse é o corretivo mais educativo ainda disponível no mercado, queiramos ou não. E limitem excessos que geram poluição sonora e emissões desnecessárias de gases de efeito estufa, que só trazem como resultado a perpetuação de uma condição duramente limitada pela certeza desses atores de que não existe outra forma de agir.
*Texto em homenagem a Ademar Brasileiro, o único jardineiro de verdade que conheço.
Clóvis Borges é diretor-executivo da ONG Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS).

O local e o global

Com o teto colocado, a reforma do auditório Araújo Viana não depende mais do tempo para estar concluída no prazo – março de 2012, e ser solenemente reinaugurado na Semana de Porto Alegre. Um presente para o prefeito José Fortunati, candidato a reeleição e favorito nas pesquisas até o momento.
Agora, o que está emperrando os trabalhos é a falta de mão de obra qualificada, o que se tornou nacional nos últimos anos, por conta de muitos fatores – o crescimento da economia, os pesados investimentos do governo federal e das obras para a Copa de 2014, em 12 capitais brasileiras.
A construção civil é, obviamente, o setor mais aquecido e um dos poucos que ainda não viu sinal da recessão mundial. Por enquanto, a tendência é que a mão de obra continue escassa por aqui. Nada que comprometa o prazo das obras.
O Araújo Viana, que nasceu como espaço público, está concedido a uma empresa privada, a Opus Produções, e será uma das maiores casas de espetáculos do Estado, com três mil poltronas, palco ampliado, ar condicionado e acústica de alta qualidade. A empresa vai bancar a reforma, estimada em R$ 15 milhões, e vai explorar o local por 25 anos. A prefeitura terá 25% das datas para realizar seus eventos. O calendário já está sendo feito.Sem recursos para a reforma, a prefeitura optou por transferi-lo à iniciativa privada, em 2002, na primeira gestão do prefeito José Fogaça.
Previu-se inicialmente que em 18 meses estaria funcionando. Resistências políticas à “privatização”, questões ambientais, entraves burocráticos, problemas estruturais do prédio – uma série de fatores retardou em uma década a reforma. O atraso vai beneficiar o atual prefeito José Fortunati, candidato a reeleição em 2012, que poderá reinaugurá-lo com grande pompa e circunstância. Sem o ônus de ter que explicar a “privatização”, será uma das grandes obras de sua administração, a primeira de uma série previstas na expectativa da Copa. (E.B.)

O grito da democracia contra a corrupção

A XXI Conferência Nacional de Advogados, realizada pela OAB, em Curitiba, tem por tema “Liberdade, Democracia e Meio Ambiente”. Mas a luta contra a corrupção deu o tom das discussões, que se desenvolvem desde a última segunda-feira (21) e reúne 200 palestrantes, entre eles as maiores expressões do mundo jurídico nacional.
Oxalá a semente lançada esta semana na capital paranaense frutifique e torne-se o benfazejo clamor nacional pela moralidade política e administrativa. Que as regionais e seccionais da OAB aproveitem o empuxo da conferência nacional e também chamem seus membros e respectivas comunidades a realizarem localmente o movimento anticorrupção.
Busquem outros parceiros na sociedade civil e, com isso, criem a massa crítica capaz de conduzir o país às mudanças de comportamento, ao cumprimento da ética e à penalização daqueles que insistirem em continuar praticando a corrupção nas suas mais variadas formas.
É do interesse da sociedade civil mobilizar a população pela lisura e bons costumes tanto na administração pública quanto na vida comercial e pessoal. É lamentável que, em face de corrupção, corporativismo, impunidade e outros males que recheiam os arraiais políticos e administrativos, a população torne-se apática e se contente com apenas odiar os políticos.
È preciso chamar a atenção do cidadão para a realidade de que, se apenas odiar a nada fizer, os malfeitores continuarão em suas práticas e nada mudará. A sociedade, através de suas entidades representativas e respeitáveis, como a OAB e diversas outras que não cabe aqui nominar, devem mobilizar o povo e exigir providências e punições contra todos os indivíduos que, de alguma forma, meterem a mão no cofre público. Têm de ser exemplarmente punidos autoridades e funcionários que não cumprem com suas obrigações, cobram propinas, permitem que fornecedores descumpram contratos ou fazem qualquer outro tipo de falcatrua.
Todo recurso que sair da aplicação lícita para a ilícita faltará para os serviços de interesse do povo. Essa deve ser a tônica.
Temos de deixar de ser o país do “jeitinho” e do corporativismo. Todas as irregularidades denunciadas ou pressentidas por funcionários e órgãos encarregados do controle têm de ser devidamente apuradas e levada aos tribunais. Nada pode ser varrido para baixo do tapete. Só dessa forma é que conseguiremos legar um país melhor para as novas e futuras gerações.
Texto do Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
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