O diabólico desmanche do amparo social

Geraldo Hasse

O desmanche da legislação trabalhista e a reforma da Previdência Social são dois aríetes com que o trio de gladiadores Meirelles-Padilha-Temer pretende abrir para o sistema financeiro o mercado das aposentadorias e pensões, que se configura como uma espécie de filé mignon do neoliberalismo à moda brasileira.
Rola nesse terreno uma grana monumental. Basta lembrar que, em abril de 2016, os 250 fundos de pensões ativos no Brasil tinham um patrimônio total de R$ 721 bilhões, ou 12,6% do PIB nacional.  Os maiores fundos pertencem a empresas estatais (BB, CEF, Furnas, Petrobras, Correios etc) e tiveram grande crescimento no século XXI.
No caso do Funcef, da Caixa, o patrimônio saltou de R$ 9,7 bilhões em 2002 para R$ 44 bilhões em 2010, fruto de uma boa gestão dentro de um quadro de crescimento econômico. Outros fundos também tiveram grande valorização.
Foram justamente esses grandes fundos estatais que, trabalhando em conjunto com o BNDES e outras instituições financeiras públicas e privadas, se tornaram potentes investidores em projetos de infraestrutura (usinas, portos, ferrovias e rodovias).
Entretanto, mesmo com o aprimoramento da legislação, os fundos de pensão brasileiros não assumiram a dimensão alcançada pelos similares de países mais desenvolvidos, onde eles operam em parceria/aliança com os chamados “venture capital”, que investem em empresas novas (startups) especializadas em inovação tecnológica.
Além disso, ocorreram escândalos em alguns fundos que sofreram interferências políticas ou deram margem a gestões duvidosas. O caso mais grave deu-se com o Aerus, que deixou na chuva milhares de aeronautas da Varig. No momento, há algumas acusações mais ou menos vagas e interesseiras contra o Funcef.
Para complicar a situação, a crise de 2008 desvalorizou barbaramente os ativos em que os fundos tinham aplicações, provocando perdas consideráveis.
 No caso brasileiro, em abril de 2016 o déficit total era de R$ 55,3 bilhões, com 93 fundos com resultados negativos e 133 com superávits.
Nos EUA, em 2015, já com a crise relativamente amainada, o total de ativos dos fundos públicos correspondia a apenas 69% do total de suas obrigações.
Nesse quadro de crise, o viés liberal do governo pós-Dilma se impôs nos últimos meses, configurando uma mudança radical no panorama dos investimentos públicos e privados.
Não se sabe exatamente o que será proposto, mas tudo indica que os fundos públicos não terão horizonte para crescer, pois o objetivo do ministro Henrique Meirelles (que se comporta como um soberano ajudado por Eliseu Padilha) é abrir espaço para a atuação da iniciativa privada onde quer que haja demandas reprimidas, mal atendidas ou desatendidas.
E aqui podemos ver o tamanho da jogada.
Somando o que movimentam o INSS, os fundos de pensão estatais, os fundos privados de capitalização, as poupanças particulares e o sistema de saúde/seguridade social, temos um giro de R$ 1,5 trilhão a R$ 2 trilhões por ano ou, seja, de 25% a 40% do PIB.
Boa parte dessa grana gigantesca já roda no sistema financeiro privado, que está se lambendo para engolir o prato especial servido pelo governo plantado em Brasília.
Com as mudanças em curso na previdência pública e na legislação trabalhista, só falta mesmo entregar as poupanças dos trabalhadores estatais e particulares.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“O governo, no melhor dos casos, nada mais do que um artifício conveniente; mas a maioria dos governos é por vezes uma inconveniência,e todo governo algum dia acaba sendo inconveniente”
Henry Thoreau (1817-1862), filósofo norte-americano

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