André Rosa
Li um artigo do secretário de cultura de Porto Alegre Luciano Alabarse, que, como um bom gaúcho diria, me fez caírem os butiás do bolso.
Nele, o secretário tenta fazer o impossível: comparar a trajetória de Caetano Veloso com a do prefeito Nelson Marchezan Júnior. Algo que, com todo o respeito, ultrapassa qualquer senso de razoabilidade, ao tentar comparar o incomparável, unindo trajetórias distintas e opostas de modo simplista e sem nenhuma coerência factual.
Caetano nasceu na música com uma postura rebelde e de esquerda (às vezes, anarquista).
Junto com Gil, Gal e Bethânia, foi o introdutor da tropicália na cultura brasileira num período em que o livre-pensamento era proibido.
Tempos de ditadura militar e de uma direita reacionária que buscava assustar a sociedade com um discurso mentiroso sobre socialismo e comunismo, onde ser de esquerda era um crime passível de tortura e assassinato.
São poucos os artistas brasileiros que souberam enfrentar aqueles anos e dar voz à rebeldia tão bem como essa turma e a turma do Chico Buarque. Uma rebeldia que era contra a ditadura e a elite que a sustentava.
De volta ao Brasil após o exílio, Caetano continuou na mesma trajetória. Com algumas polêmicas, é verdade. Mas quase sempre questionando as elites. “Queria querer gritar setecentas mil vezes, como são lindos, como são lindos os burgueses e os japoneses, mas tudo é muito mais”, dizia ele em “Podres Poderes”.
Afrontou o neoliberalismo em “Fora da Ordem”, homenageou Carlos Marighella em “Um Comunista”, falou de revolução, do Haiti, dos direitos humanos.
Marchezan sempre esteve do lado oposto ao de Caetano. O músico lutou contra a ditadura; o prefeito vem de uma família que a defendeu. O músico defende a inclusão social; o prefeito vem cortando recursos para a área social.
O músico fez campanha contra o congelamento de recursos para a educação e saúde no Brasil, denunciou a entrega do pré-sal aos estrangeiros e se posiciona contra as terceirizações e as reformas trabalhista e da Previdência; prefeito é absolutamente favorável a tudo isso e aprovou no Congresso a PEC que congela os gastos em educação e saúde.
Caetano denunciou o golpe contra Dilma e defende eleições gerais; Marchezan votou pelo golpe. Caetano fala de amor e de liberdade, ataca o fascismo e fustiga a direita em suas músicas e nas redes sociais; Marchezan recebe em seu gabinete quem propaga o ódio.
Além disso, apoia o MBL, e ofende a esquerda, partidos de oposição, sindicatos e até aliados em suas redes sociais.
Essas são diferenças grandes entre eles, secretário. Não tente comparar o incomparável. Não vale a pena e soa até como desrespeito a esse grande compositor brasileiro com o qual muitas vezes não concordo. Mas o respeito e reconheço sua trajetória.
* André Rosa é secretário de Comunicação do Partido dos Trabalhadores de Porto Alegre