Certa passagem bíblica conta que o rei Salomão, ao deparar-se com um litígio entre duas mulheres ocasionado por um bebê, não teve dúvidas em mandar reparti-lo. Não seria o justo, mas, seria o possível, para satisfazer ambas as partes.
Mas eis que uma das alegadas mães abre mão do seu direito de posse, para preservar a vida do bebê. Não seria o justo, mas, seria o necessário. Porém, através desse gesto, o rei Salomão reconheceu ali a mãe verdadeira, e, assim, ele devolveu a criança intacta à mãe de direito.
Porém, nos tempos atuais, parece que todos estão dispostos a ver a criança ser repartida.
Assim que o Temerildo assumiu a interinidade, os grandes jornais aboliram expressões como “apesar da crise” e “o pior desempenho desde mil novecentos e lá vai pedrinha”. Aliás, a “crise” vem sendo cada vez menos lembrada nas reportagens. Agora, tudo se resume em esperança, otimismo e novos horizontes. “Saímos do purgatório em direção ao paraíso”, dizem os economistas amestrados, sob o jubilo tosco de sorridentes apresentadores.
A esquerda brasileira está nas cordas e não para de apanhar. A direita está tão à vontade que uma senadora destes pagos sobe na tribuna pra acusar o PT de ter destruído a Petrobras, fingindo ignorar que o sujeito que foi preso e que delatou todo mundo foi indicado pelo partido dela, o que valeu à agremiação da senadora o alto do pódio no ranking dos partidos mais citados na Lava Jato. Haja creme Hipocrisol, senadora.
E, sob esse cenário, a criança vai sendo posta na tábua para ser repartida.
Mas, então, surge a mãe verdadeira. Ela sobe ao Senado e faz uma defesa irretocável do seu rebento. Rebate todas as acusações, uma a uma. Uma, duas, três, dez vezes. Sem perder a linha, sem perder o tom. Às vezes, atrapalhada sim com as palavras, mas, no caso concreto, ela poderia usar a linguagem de sinais que todos entenderiam. Dilma é inocente, só não entendeu isso, quem não quis entender.
Alguns dizem que isso não vai mudar nada. Que é jogo jogado, apesar da margem para aprovação ser bem apertada.
Logo saberemos se Dilma será jogada no lixo seco da História, condenada a ficar 8 anos longe da vida pública, decretando assim, sua morte política.
Portanto, logo saberemos se a criança será repartida. “Não será o justo, mas será o possível”, dizem à boca pequena alguns senadores. Levando em conta quem está atualmente no papel de Salomão, imagino que será cogitado o esquartejamento do bebê para angariar um número maior de aliados.
E nós como sociedade? Vamos esperar pela sabedoria do rei Salomão que está aí ou ficaremos contentes com a metade que vai sobrar da Democracia?