Contra o Retrocesso – Por uma Frente Popular e Democrática em Porto Alegre

Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo e outros
O Brasil vive um momento político extremamente grave. O Golpe parlamentar contra a Presidenta eleita foi realizado por uma potente articulação de forças contrárias aos direitos sociais, civis e democráticos. A entrega dos recursos do pré-sal para o grande capital internacional, o afastamento do Brasil de seus parceiros latino-americanos e africanos, a perda de protagonismo do país no contexto mundial, o corte de gastos nas áreas da saúde e da educação, a flexibilização das regras trabalhistas e o abuso da violência estatal e do encarceramento como políticas de Estado mostram que o golpe segue em curso, colocando para o campo democrático e popular o desafio de barrar o seu avanço.
Há um clima de ódio e de violência instalado no país. O processo de criminalização seletiva e de espetacularização das denúncias contra os integrantes de apenas um partido político, promovido por setores importantes do Poder Judiciário e do Ministério Público Federal, em aliança com as grandes mídias corporativas, tem como objetivo claro transformar as esquerdas e principalmente o PT e suas lideranças nos “grandes inimigos do povo”.
A discricionariedade na aplicação da Justiça, que desconsidera as graves denúncias envolvendo figuras destacadas do PSDB, do PMDB e do PP, bem como o engajamento do próprio STF na retirada progressiva das garantias processuais e dos direitos individuais revelam o perigo iminente da fascistização das relações sociais e das instituições públicas em curso no Brasil. É nesse contexto que ocorrerá o 2º turno da eleição para a Prefeitura de Porto Alegre, quando deveremos nos posicionar frente aos dois projetos políticos para a cidade mais votados no 1º turno.
Temos, de um lado, a candidatura de Marchezan Jr., do PSDB, aliado ao PP, que representa um programa de retrocesso em relação não só às conquistas sociais, políticas e econômicas da última década, mas também em relação aos direitos e garantias assegurados pela Constituição de 1988. Essa candidatura tenta angariar votos e conquistar o eleitorado para propostas de submissão das políticas públicas aos princípios da iniciativa privada: privatização do patrimônio público, enxugamento da máquina pública, arrocho do funcionalismo e rebaixamento dos direitos de cidadania a uma pura e simples relação de clientela entre os cidadãos e o Estado, numa postura assistencialista. A vitória dessa candidatura, que conta com forças políticas oriundas da antiga ARENA, significaria a obtenção de uma base sólida na capital do estado para o aprofundamento do golpe e a consolidação do campo neoliberal no Rio Grande do Sul, com todo o retrocesso social, político e econômico que ele representa.
A coligação Melo e Juliana, por outro lado, em que pesem problemas da cidade não enfrentados pela gestão municipal nos últimos 12 anos e, ainda, a vinculação do partido do candidato a Prefeito ao golpe perpetrado contra a democracia por meio do impeachment, é mais plural, na medida em que conta com a presença de uma liderança do PDT no cargo de vice-prefeita.  O PDT posicionou-se nacionalmente contra o golpe e reconhece a importância da participação popular na gestão pública. A origem pessoal e o vínculo de Melo com setores populares, a trajetória do Prefeito José Fortunatti, afiançador da chapa e historicamente vinculado ao campo democrático e popular, assim como a presença de Juliana Brizola como vice-prefeita, herdeira das propostas avançadas do Brizolismo para a emancipação da cidadania e a afirmação da democracia e da legalidade, não deixam dúvida sobre as diferenças entre as duas candidaturas em disputa. Frente ao retrocesso em curso no país após o golpe e o risco da fascistização crescente de nossas instituições, é fundamental que sejamos capazes, do espaço municipal ao nacional, de somar forças para a defesa da democracia e do Estado de Direito no país.
Para que Porto Alegre tenha uma perspectiva efetivamente popular e democrática, propomos a constituição de uma frente ampla para barrar o avanço do neoliberalismo mais retrógrado e elitista representado pela candidatura Marchezan, que reúne as forças mais à direita do espectro de posições políticas do Rio Grande do Sul.
Uma frente popular e democrática em Porto Alegre precisa ter como perspectiva enfrentar com mais determinação os problemas da cidade.
Porto Alegre precisa enfrentar com firmeza a gestão ambiental do Guaíba e da qualidade da água, dos resíduos sólidos e da qualidade do ar. Nas últimas administrações, a cidade tem sofrido uma espécie de falência da gestão ambiental, que precisa ser revertida diante dos desafios do aquecimento global e do desenvolvimento sustentável.
A educação municipal, que já foi motivo de orgulho, precisa avançar na qualificação dos professores e na educação de tempo integral. Os projetos de Educação de jovens e adultos (EJA) também merecem investimento e revitalização. As escolas precisam ser capacitadas para se tornarem centros de saberes locais e promotoras da identidade das comunidades.
A política urbana de Porto Alegre deve retomar o combate à retenção especulativa de imóveis urbanos, a fim de garantir o cumprimento da função social da propriedade e das funções sociais da cidade. Na política habitacional, os projetos de Regularização Fundiária de assentamentos irregulares precisam ser retomados, já que o direito à cidade depende, em boa medida, da segurança da posse na terra conquistada para fins de moradia.  As áreas ocupadas por comunidades tradicionais, como os quilombos urbanos, as terras indígenas e os povos de terreiro, são ainda mais vulneráveis ao assédio do mercado imobiliário e necessitam de urgente atenção na dotação de infraestrutura e serviços, bem como na titulação e proteção contra despejos forçados.
Da mesma forma, é importante ampliar as possibilidades de acesso regular ao solo urbano para as famílias de baixa renda por meio da oferta de lotes urbanizados em áreas já dotadas de infraestrutura. Porto Alegre precisa ampliar o debate acerca da utilização dos espaços públicos, particularmente em áreas de especial interesse ambiental e cultural, como, por exemplo, o Cais Mauá, devolvendo aos cidadãos o processo de tomada de decisão.
No plano das políticas para as mulheres, a desqualificação do transporte coletivo e as ameaças de redução de recursos para o SUS e para o ensino público afetam de forma particular as mulheres trabalhadoras da cidade, exigindo a retomada de programas da rede de assistência social e a ampliação das políticas de enfrentamento à violência doméstica e familiar.
A violência urbana reduz direitos de cidadania de homens, mulheres e jovens que têm o espaço público reduzido pelo medo e pela criminalidade organizada. É cada dia mais urgente a rediscussão do papel do município nas políticas de prevenção à violência, com a ampliação da guarda municipal, integrada com a Brigada Militar na realização do policiamento ostensivo, com características de policiamento comunitário e de proximidade, capaz de administrar conflitos e garantir a ação efetiva do Estado na prevenção ao crime. O mesmo desafio se coloca em relação aos moradores de rua, aos imigrantes e refugiados, pela vulnerabilidade de sua condição de cidadania.
Algumas políticas específicas precisam ser ampliadas e reforçadas, como o investimento em ciclovias para a criação de alternativas para a mobilidade urbana e a política de proteção animal, voltada para o controle populacional, o tratamento de doenças e o resgate e a adoção de animais em situação de rua, incorporando de forma definitiva novas demandas sociais às políticas públicas do município.
A retomada da política cultural, com o desenvolvimento de projetos avançados de ocupação do espaço urbano, com a descentralização da produção artística direcionada para os bairros da cidade, é fundamental para estimular o convívio social. Com isso, Porto Alegre poderá retomar suas cores e não sucumbir ao cinza de uma cidade desumanizada, triste e amedrontada.
Estes são alguns dos principais desafios colocados para a gestão da cidade. Para enfrentá-los, é preciso que seja construída uma frente democrática e popular, contra o retrocesso. Acreditamos que, para construí-la, o único caminho possível no 2º turno das eleições municipais é o voto em Melo e Juliana, para que Porto Alegre possa resistir ao retrocesso jurídico, político e social e se mantenha na defesa da legalidade democrática e das conquistas populares.
Assinam:
Ana Costa – Auditora fiscal do trabalho
Ângela Tavares – Programadora de computador aposentada e militante em movimentos sociais
Benedito Tadeu César – Cientista Político
Bernardo Lewgoy – Antropólogo e professor da UFRGS
Betânia de Moraes Alfonsin – Advogada e professora da PUCRS e da FMP
Carmen S. de Oliveira – Psicóloga e militante de direitos humanos
Cátia Simon – Professora da RME/PMPA
Diego Pautasso – Professor Universitário
Eny R. Dalmaso – Profa. de História e Filosofia, militante do Cpers Sindicato e movimentos sociais
Fábio Dal Molin – Psicólogo e professor da FURG
Gentil Corazza – Economista, professor da UFRGS
Ivaldo Gehlen – Sociólogo e professor da UFRGS
Jorge Garcia – Advogado
Jucemara Beltrame – Advogada
Júlio Bernardes – Professor de Filosofia, coordenador do Curso de Filosofia do Departamento de Ciências Humanas da UNISC
Luis Stephanou – Sociólogo
Maria da Glória Lopes Kopp – Historiadora, doutoranda em Ciências Sociais PUCRS
Maria Regina Jacob Pilla – Tradutora e escritora
Marília Veríssimo Veronese –  Psicóloga Social e professora da Unisinos
Mário Madureira – Advogado
Milena Dugacsek – Etnomusicóloga
Patrícia Reuillard – Tradutora e professora da UFRGS
Paulo de Tarso Carneiro – Bancário aposentado, fundador do PT
Paulo Timm – Economista
Rafael Machado Madeira – Cientista Político e professor da PUCRS
Reginete Souza Bispo – Cientista Social e militante do Movimento de Mulheres Negras
Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo – Sociólogo e professor da PUCRS
Rualdo Menegat – Geólogo e professor da UFRGS
Soraya Vargas Cortes – Socióloga e professora da UFRGS
Tagore Vieira Rodrigues – Historiador
Tamara Hauck – Jornalista
Vinicius Galleazzi – Engenheiro Civil
Walter Morales Aragão – Professor universitário
Zoravia Bettiol – Artista plástica
 

0 comentário em “Contra o Retrocesso – Por uma Frente Popular e Democrática em Porto Alegre”

  1. Texto muito bem escrito, o que é raro nos dias que correm ! E a alternativa para POA é : voto útil ou voto nulo? Pendo para o útil, com posterior exigência de cumprimento de compromissos. Acho o PMDB um lixo, mas, sendo tão estreita a margem de escolha, pior será eleger o comandante do processo golpista, a tucanagem. Não quero Porto Alegre como território do Tucanistão. Até porque, já digo isso há tempos, o PMDB golpista apenas serviu para o PSDB golpista e esse se prepara para dar o golpe no golpista PMDB. *

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