Acorda Rio Grande (5)

Tratadas como “boas notícias”, neste cenário de guerra do pós-enchente no Rio Grande do Sul, duas medidas anunciadas nesta terça-feira indicam a visão de curto prazo, de quem toma providências paliativas.

A longo prazo, ambas são “más notícias” para o Rio Grande do Sul.

A primeira, anunciada pelo governador Eduardo Leite,  é a suspensão do pagamento da dívida que o Rio Grande do Sul tem com a  União.

O governador disse que o acordo representa “um “alívio” nas contas do governo Estadual, de 11 bilhões de reais..

Esse “alívio” é relativo, porque há sete anos o governo gaúcho não paga as parcelas da dívida com a União. Os pagamentos iriam recomeçar a partir da renegociação com o Tesouro Nacional, agora concluída com a suspensão, por conta da enchente. .

Com a suspensão por três anos, Leite salva seu mandato e empurra com a barriga uma situação insustentável, uma dívida impagável que foi gerada por contratos lesivos ao Estado.

Era uma dívida de R$ 9 bilhões em 1997, quando foi renegociada pela primeira vez. Depois de ter pago algo como R$ 60 bilhões,  nos últimos sete anos, o Estado deixou de pagar as parcelas.  Mas o saldo devedor supera os  R$ 95 bilhões.

Ao aceitar a suspensão por três anos, sem questionar as condições de pagamento da dívida, Eduardo Leite livra seu mandato, mas empurra com a barriga um problema estrutural e perde a oportunidade de uma revisão nos fundamentos dessa dívida que, segundo estudos já feitos na Assembleia, já foi paga. Deixa uma bomba-relógio para o próximo governo.

Já o prefeito Sebastião Melo anunciou a contratação de uma “consultoria internacional” para gerir a reconstrução da capital arrasada pelas águas do Guaíba.

O prefeito, segundo ele mesmo disse, foi procurado pelo diretor no Brasil da Alvarez & Marsal, que é gaúcho,  e se prontificou. Nos primeiros 60 dias, a consultoria não cobra nada, depois haverá um contrato. Algumas concessionárias de serviços públicos, como a Equatorial,  já manifestaram seu apoio ao projeto.

A Alvarez& Marsal é uma consultoria americana que tem escritório no Brasil desde 2004.  Suas especialidades são as soluções corporativas, reestruturações financeiras, gestão empresarial.  Suas credenciais para assumir a gestão da reconstrução de Porto Alegre seriam suas atuações no desastre provocado pelo ciclone Catrina, em New Órleans, e na tragédia de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais.  Mas essas “atuações” são questionadas e sequer aparecem no site da empesa.

Sejam quais forem as qualificações da A&M para atuar em desastres climáticos, sua contratação pela prefeitura de Porto Alegre  sinaliza para o caminho das soluções paliativas, pontuais. Qualificar os quadros técnicos existentes e preparar a estrutura pública, não só para  reparar os estragos de agora, mas para uma ação permanente de prevenção e redução de riscos, seria o prioritário, numa visão de longo prazo.  Em vez disso, contrata-se uma consultoria, que vai se valer do conhecimento local para montar um plano de gestão da crise e, depois da crise, quando termina seu contrato, ela vai embora, levando a expertise em seu port-folio.  Voltará na próxima enchente.

Acorda, Rio Grande.

(Elmar Bones)

 

 

Prefeitura recorre a consultoria estrangeira para a recuperação de Porto Alegre

A assessoria de imprensa da Prefeitura de Porto Alegre  distribuiu nota nesta terça-feira::

“Plano de recuperação terá consultoria que atuou nos EUA após furacão Katrina”
O texto informa que  ” A Prefeitura de Porto Alegre contará com um serviço de consultoria especializada na recuperação de grandes cidades após eventos climáticos extremos”.

Nota do Editor: A Alvarez&Marsal, a empresa contratada, não é “especializada em recuperação de grandes cidades após eventos climáticos extremos”, tanto que essa atividade sequer consta do port folio exibido em seu site.  Sua atuação nos desastres de New Orleans e  Brumadinho,  é bastante questionada. 

Segundo a nota da prefeitura, a “parceria, formalizada nesta segunda-feira, 13, engloba a gestão de recursos financeiros, regularização das operações, estruturação do plano e a gestão do comitê de crise, por meio da empresa Alvarez & Marsal.”

Quer dizer: haverá um comitê de crise para a reconstrução da capital, cuja gestão caberá à Alvarez & Marsiaj.

Segue a nota:

“A partir de estudos técnicos desenvolvidos pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) e com participação de diversos órgãos municipais, serão empreendidas medidas similares às já feitas após a destruição do estado de Louisiana, Estados Unidos, pelo furacão Katrina, em 2006.

Nota do Editor: Esse parágrafo é obscuro: como que a partir de estudos dos técnicos locais “serão empreendidas medidas similares às já feitas após a destruição do Estado de Lousiana, Estados Unidos, pelo furacão Katrina em 2006”?

A nota diz que “na ocasião (em New Orlean), a consultoria Alvarez & Marsal, atuou na identificação de oportunidades de melhorias e eficiência nos programas de assistência social”.

“A empresa já operou no rompimento das barragens de Mariana e Brumadinho e conhece os desafios que estamos enfrentando na Capital, já que aqui temos o maior desastre natural do último século no país”, explica o secretário da Smamus, Germano Bremm.

Nota do Editor: Por ter atuado em Mariana e Brumadinho, a empresa “conhece os desafios que estamos enfrentando, já que temos o maior desastre natural do último século” ? Não faz sentido.

Segue a nota:

“A empresa responsável, Alvarez & Marsal, atuará em conjunto com a administração municipal para a elaboração e gestão de um plano assertivo que promova respostas rápidas e estratégicas em momentos de crise. Os primeiros 60 dias da consultoria serão sem custo para a prefeitura”.

“A partir da estruturação realizada nos cinco eixos, será possível identificar medidas a longo prazo para Porto Alegre: estruturação do plano e gestão do comitê de crise, ações emergenciais e logística de recursos, gestão de recursos financeiros, regularização das operações e alavancas fiscais e tributárias. O plano contará com a união de competências das empresas parceiras CPFL Energia, Equatorial, Corsan e Fraport”.

Nota do Editor:  Pelo que se deduz,  um grupo de concessionárias de serviços públicos vai bancar a contratação da consultoria.

Leia mais:
https://jornalggn.com.br/noticia/como-alvarez-marsal-capitaliza-com-desordens-e-tragedias-naturais/

ACORDA, RIO GRANDE

Todo o esforço para  reconstruir o que a enchente arrasou será paliativo se não incluir  uma discussão ampla sobre o “modelo de desenvolvimento” que se implantou no Rio Grande do Sul nos últimos 30 anos.

Claro, é um fenômeno global, mas aqui temos  um recorte exemplar de um projeto econômico, hoje em crise no mundo inteiro.

O Rio Grande do Sul é um caso exemplar porque foi pioneiro no despertar da consciência ambiental.

Em Porto Alegre nasceu pela flama de José Lutzenberger a Agapan, em 1971, já alertando para as mudanças climáticas provocadas pela ação do homem.

O Estado foi o primeiro a ter um código de proteção ambiental.

A lógica dos negócios que se estabeleceu nas últimas décadas fez terra arrasada dessas conquistas. Historicamente, o desmatamento no Rio Grande do Sul é maior do que na Amazônia, nas devidas proporções.

O Estado que tinha dois terços do seu território coberto com florestas, hoje tem pouco mais de dois por cento de áreas preservadas.

O Rio Grande do Sul é um caso exemplar porque teve um parque fabril moderno e diversificado, que exportava para uma centena de países e era o terceiro polo industrial do país. Hoje tem uma indústria em crise, até de identidade. Duas commodities, soja e pasta de celulose, dominam a pauta de exportações do Estado.

O Rio Grande do Sul é um caso exemplar porque já foi chamado de “celeiro do Brasil”, pela diversidade da sua produção agrícola. Hoje vive a lógica da monocultura, na dependência da soja exportada em grão para alimentar porcos na China.

O Rio Grande do Sul é um caso exemplar porque já teve um serviço público que era modelo no país. Hoje o poder público opta pelas privatizações e terceirizações.

O Rio Grande do Sul é um caso exemplar porque um terço do seu território é pampa, bioma único, riquíssimo, que está sendo entregue às monoculturas, da soja e do eucalipto…

O Rio Grande do Sul é um caso exemplar pela diversidade social que abriga mais de 20 etnias, que vem sendo reduzida a uma única expressão, da cultura pastoril.

Por fim, o Rio Grande é um caso exemplar porque uma tragédia que comoveu o mundo aconteceu aqui. Ela  obriga à reflexão sobre o que nos trouxe até esse ponto.

Milton Santos, o geógrafo, dizia que a concretude do global se realiza no local. É o Rio Grande do Sul, caso exemplar para se perceber os estragos do neoliberalismo num estado periférico.

Acorda, Rio Grande!

(Elmar Bones, editor)

Aos 80 anos, Hospital de Pronto Socorro enfrenta superlotação e falta de investimentos

Duas tendas de lona branca foram instaladas no terreno onde será construído o novo prédio de oito andares, anexo ao  Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre.

Ali, na sexta-feira 19 de abril,  a Fundação Pró HPS reuniu convidados – diretores do hospital, antigos funcionários homenageados, autoridades e a imprensa para comemorar os 80 anos do HPS.

“Estamos pisando hoje no próximo prédio do HPS, mas ele não vai acontecer sozinho, precisaremos que a cidade abrace a causa da ampliação do hospital. A união do poder público e do setor privado dará vida às novas instalações, reforçando a confiança que cada um tem nesta instituição’’, disse o prefeito em exercício, Ricardo Gomes.

O evento de comemoração foi promovido pela Fundação HPS. Foto: Pedro Piegas/PMPA

Porto Alegre foi a primeira cidade no Brasil a ter um serviço público para emergências médicas. A Assistência Pública Municipal foi inaugurada em 1897 numa sala da antiga Prefeitura, com médicos e enfermeiros que iam a cavalo atender os pacientes.

Em abril de 1944, o serviço, já de excelência,  ganhou um prédio próprio num ponto estratégico da cidade, na confluência das avenidas Oswaldo Aranha e Venâncio Aires e passou a chamar-se Hospital de Pronto Socorro.

Tornou-se referência no atendimento a emergências, premiado pelo Ministério da Saúde,  e ainda hoje é reconhecido pela excelência do seu serviço universal e gratuito, principalmente nas especialidades de traumas e queimaduras. Integra o sistema SUS.

Tem a única UTI pediátrica para traumas do Estado. É uma das instituições de maior credibilidade na capital e mesmo além dela.

Mas aos 80 anos  o HPS está longe de seus melhores momentos. Para começar, o prédio octogenário, onde são atendias 120 mil emergências por ano, enfrenta sérios problemas estruturais.

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Além disso, como todos os serviços de emergência da capital, enfrenta um quadro de superlotação crônica,  decorrente da precarização do atendimento hospitalar no interior do Estado.

Desde junho do ano passado a Associação dos Servidores do HPS denuncia carências e falta de investimentos em áreas básicas. Divergências políticas dificultam o diálogo entre a direção e os funcionários.

Um temporal danificou o telhado e uma enfermaria  no quinto andar,  está interditada desde o ano passado.  São 30 leitos a menos.  Os pacientes com queimaduras estão sendo internados na UTI de trauma que foi reformada, no quarto andar.

A Associação dos Servidores aponta ainda a falta de funcionários em áreas essenciais.  Faltam 200 técnicos de enfermagem, segundo a ASHPS. A terceirização de serviços essenciais, inclusive médicos, também preocupa os servidores concursados.

O projeto de um anexo na avenida José Bonifácio para expansão dos serviços do HPS já tem 20 anos. Seis imóveis foram desapropriados, com as casas demolidas em 2012.

“Estamos realizando os últimos ajustes para definição do projeto. O propósito é iniciar no ano que vem e concluir ate dezembro de 2026”, disse a diretora Tatiana Breyer em outubro de 2023 em entrevista à rádio Gaúcha.

O novo prédio de oito andares, com 11 mil metros de área construída, permitiria praticamente dobrar a capacidade do HPS, com 130 novos leitos, mais os serviços complementares.

O projeto, ainda em definição, exigiria investimentos de 140 milhões de reais. É a prioridade da Fundação Pró-HPS, entidade “de caráter privado e fins públicos”, fundada em 2004, para criar meios sociais para a captação de recursos para o HPS”. Recursos para os últimos investimentos no HPS têm vindo de suas campanhas e convênios – Troco Amigo com a Panvel, Troco do Coração com o Zaffari e a Nota Fiscal Gaúcha.

Na comemoração, a Fundação, cujo solgan é “O HPS cuida da gente/ A gente cuida do HPS”, implicitamente lançou uma  campanha para bancar a expansão do HPS com parcerias privadas.

A maquete do novo prédio para expansão do HPS na av. José Bonifácio.

 

 

 

Estátua do ex-presidente João Goulart na Orla: a decisão será da GAM3

Depende da GAM3, a empresa concessionária do trecho 1 da Orla, a localização de uma estátua do ex-presidente João Goulart junto à avenida que já leva seu nome, no centro histórico de Porto Alegre.

O projeto é da Fundação Caminhos da Soberania, que arrecadou fundos para bancar a obra do escultor carioca Otto Dumovitch, o mesmo  autor da estátua de Leonel Brizola instalada  no pátio externo do palácio Piratini.

A escultura já foi feita e paga, mas há dois anos está encaixotada num depósito da Transportadora Gabardo, em Porto Alegre, porque ainda não foi encontrado um local para ela.

O presidente da Fundação, ex-deputado e Procurador de Justiça,  Vieira da Cunha, já participou de duas reuniões com o prefeito Sebastião Melo.

Na primeira o prefeito se mostrou simpático à ideia mas informou que o local pretendido está dentro de uma área concedida à iniciativa privada. Qualquer intervenção no trecho 1 da Orla tem que ser aprovada pela concessionária, a GAM3.  Na segunda, ocorrida há duas semanas, a GAM3, que estava convidada, não compareceu.

Segundo Vieira da Cunha, Sebastião Melo ficou de marcar uma nova reunião com a empresa, para avaliar a questão.

O prefeito até sugeriu uma alternativa, no trecho 2 da Orla, junto a um prédio do DMAE, mas o local demanda terraplanagem e o custo da operação foi estimado em 100 mil reais.    ´

João Goulart, o Jango, nascido em São Borja, teve toda sua trajetória ligada a Porto Alegre, para onde veio adolescente, onde estudou, onde se formou e onde iniciou sua carreira política, como deputado estadual.

Viveu em Porto Alegre seus últimos momentos como presidente da República. Em Porto Alegre ele tomou a decisão de não resistir, “para evitar derramamento de sangue”. De Porto Alegre ele partiu para o exílio de onde só voltou morto.

Neste 31 de março de 2024 completaram-se 60 anos que Jango foi derrubado por um golpe civil-militar e se exilou primeiro no Uruguai, depois na Argentina onde morreu em 6 de dezembro de 1976.

31/03/1964 : ASSIM COMEÇOU O GOLPE

Juiz de Fora, 31 de março de 1964

Uma e meia da madrugada, o general Olympio Mourão Filho desiste de tentar dormir e retoma as anotações em seu diário.

Há quase uma semana ele se considera pronto para o golpe contra o governo, mas desconfia que o estão traindo.

Esperava um manifesto do governador de Minas, Magalhães Pinto, que seria a senha para colocar as tropas na rua.

Em vez de mandar-lhe o texto antes,  o governador entregou o manifesto à imprensa. E o conteúdo não era o que haviam combinado!

“Eu estava uma verdadeira fúria”, anotou Mourão. “Meu peito doía de rachar. Tive que por uma pílula de trinitrina embaixo da língua”

Olympio Mourão Filho, general de três estrelas, comandante da 4ª Região Militar, uma das principais forças terrestres do Exército brasileiro, estava mesmo descontrolado:

“Idiotas. O Chefe Militar sou eu. Magalhães não terá desculpa perante a história… E o Guedes, um falastrão vaidoso que aceitou o papel triste… Fizeram isto, bancando os heróis, porque sabiam que eu era a própria revolução. Do contrário não se atreveriam a dar um passo. Irresponsáveis! Arriscando uma revolução tão bem planejada num momento de vaidade!”

Depois da explosão, acalma-se e anota no diário: “Acendi o cachimbo e pensei: não estou sentindo nada e, no entanto, em poucas horas deflagrarei um movimento que poderá ser vencido porque sai pela madrugada e terá que parar no caminho. Não faz mal…”

Em seu plano original, Mourão previa sair de Juiz de Fora, no início da noite, com 2.300 mil homens. Cobriria os 200 quilômetros até o Rio de Janeiro em cinco ou seis horas. Antes de clarear o dia, tomaria de surpresa o prédio do Ministério da Guerra e o Palácio das Laranjeiras, onde estaria ainda dormindo o presidente João Goulart. Depois começaria a caçar os comunistas.

Há uma semana “estava pronto”, mas vinha sendo retardado por artimanhas do governador Magalhães Pinto que, mineiramente, temia “se envolver numa aventura”.

Agora ele está decidido: “Vou partir para a luta às cinco da manhã… Ninguém me deterá. Morrerei lutando. Nosso sangue impedirá a escravização do Brasil”.

Depois se acalma novamente: “E o mais curioso de tudo isto é que, passada a raiva, (já estou normal, bebi água e café) não sinto nada, nem medo, nem coragem, nem entusiasmo, nem tristeza, nem alegria. Estou neutro.”

Anotou alguns nomes num papel e, quando o relógio marcou cinco horas, chamou a única telefonista de plantão na central de Juiz da Fora: “Quero prioridade absoluta e rápida para as ligações que vou pedir. Estou mandando a PM ocupar a Estação e a senhorita não diga palavra a ninguém”.

Considerou-se em ação: “Eu já havia desencadeado a Operação Silêncio”, anotou.

No primeiro telefonema, tentou alcançar o tenente coronel Everaldo Silva, que estava de prontidão no QG, “o telefone estava enguiçado”. Tocou, então, para o major Cúrcio e mandou desencadear a “Operação Popeye”, o plano militar que ele, Mourão, havia traçado e ao qual batizara com o apelido que lhe haviam dado no quartel pelo uso constante do cachimbo.

Em seguida, convocou os coronéis Jaime Portela e Ramiro Gonçalves para que se apresentassem imediatamente no quartel (nenhum dos dois apareceu). A seguir, ligou para o almirante Silvio Heck, comandante da Marinha, golpista de primeira hora: disse que estava partindo em direção ao Rio, para depor Goulart.

O próximo foi o deputado Armando Falcão, para que avisasse Carlos Lacerda, governador da Guanabara, o mais notório dos inimigos do presidente.

Falcão, assustado, ligou para o general Castello Branco, que era o líder militar de uma outra conspiração e que evitara sempre se envolver com Mourão.

Os recrutas de Mourão começam a se deslocar em direção ao Rio de Janeiro

Castello, que não tinha tropas, tentou falar com Amaury Kruel, o comandante do II Exército, a maior força militar do país. “Isso não passa de uma quartelada do Mourão, não entro nessa”, disse Kruel, quando foi alcançado por emissários. Kruel ainda era amigo de João Goulart.

Nesse meio tempo, Castello recebeu uma ligação do general Antônio Carlos Muricy, outro conspirador sem comando.

Muricy diz que foi chamado a Minas por Mourão, “que está rebelado”. Castello aconselha que vá “para prevenir qualquer bobagem”.

Enquanto isso, Mourão segue anunciando o golpe por telefone. Ao final de sua rajada de chamadas, fez questão de registrar que “estava de pijama e roupão de seda vermelho”. E não esconde o “orgulho pela originalidade”: “Creio ter sido o único homem no mundo (pelo menos no Brasil) que desencadeou uma revolução de pijama”.

Subiu um lance de escada até o quarto onde estava seu hóspede e cúmplice, o desembargador Antônio Neder, “que dormia como um santo”. Gritou: “Acabo de revoltar a 4ª Divisão de Infantaria e a 4ª Região Militar”.

O amigo “entre espantado e incrédulo”, perguntou: “Você agiu certo? Tem elementos seguros?”.

Mourão desdenha : “Vocês, paisanos, não entendem disso”. Eu estou certo, pode crer”. Na verdade, ele não tinha certeza de nada, nem mesmo se conseguiria tirar suas tropas do quartel.

Entrou no banheiro, fez a barba e leu alguns salmos da Bíblia, como fazia todos os dias. “Eu era um homem realizado e feliz. Não pude deixar de ajoelhar-me no banheiro e agradeci a Deus a minha felicidade, havia chegado a hora de jogar a carreira e a vida pelo Brasil!”

Abriu o chuveiro, banhou-se calmamente. Só então vestiu o uniforme de campanha e foi tomar café com Maria, sua mulher (“Não consigo me lembrar se o Neder tomou café conosco”, diz ele nos registros que fez dias depois).

A notícia de um golpe militar se espalhava pelo país, mas o comandante do levante ainda não saíra de casa.

“A insurreição estava envolta numa nuvem que se parecia ora com uma quartelada sem futuro ora com uma tempestade de boatos”, registra Elio Gaspari*.

Por volta das dez horas, ainda sem saber direito o que realmente estava acontecendo, o general Castello Branco saiu de seu apartamento, em Ipanema. Foi para o Ministério da Guerra, no centro, onde tinha seu gabinete de trabalho, no sexto andar. De lá ainda insistiu com o general Luiz Guedes, comandante da 4ª Divisão de Infantaria em Belo Horizonte, e o governador Magalhães Pinto para que detivessem Mourão. “Senão voltarem agora serão esmagados”.

Guedes, em suas memórias, tentou associar-se à ousadia de Mourão, dizendo que àquela hora também já estava rebelado, mas a verdade é que até aquele momento Mourão estava sozinho.

Mourão registra, desde o primeiro encontro entre ambos, a frase que Guedes repetia: “Quem levantar a cabeça primeiro, leva pau”.

O governador Magalhães Pinto, a quem Guedes seguia, desenvolvia um plano que permitisse recuos. Sua intenção era declarar Minas Gerais em “estado de beligerância”, contra o governo federal.

Esperava obter o reconhecimento dos Estados Unidos e, então, forçar João Goulart a renunciar. Seria instalado um mandato tampão até as eleições de 1965 , quando ele, Magalhães, seria o candidato imbatível – o libertador que afastara o perigo comunista.

O manifesto que Magalhaes lançou no dia 30 de março, escrito pelo mineiríssimo Milton Campos, defendia reformas de base e era tão cauteloso que o deputado federal Wilson Modesto, do PTB de Minas, leu a íntegra por telefone para Jango e o presidente respondeu: “Diga a Magalhães que está muito bom, estou de acordo com ele”.

As ações do general Guedes, àquelas alturas, se limitavam à Prontidão da Polícia Militar, força estadual, e a consultas ao cônsul dos Estados Unidos em Belo Horizonte, para saber se os americanos estavam dispostos a ajudar com “blindados, armamentos leves e pesados, munições, combustíveis, aparelhagens de comunicações…”.

Para “mais tarde”, precisaria de “equipamento para 50 mil homens”.

***

Enquanto isso, Mourão enfrentava dificuldades para levar as tropas à rua. O comandante do 10º Regimento de Infantaria, coronel Clóvis Calvão não apoiava o levante. Mourão contornou o impasse dando férias ao coronel.

Dois outros coronéis e o comandante da Escola de Sargento de Três Corações, também rechaçaram a ordem de botar a tropa na rua e foram para casa.

Nada disso influiu no apetite do general. À uma da tarde, ele foi para casa almoçar e não dispensou sequer a sesta. Nessa hora, já se movimentavam forças para atacá-lo a meio caminho do Rio.

“Na avenida Brasil, principal saída do Rio e caminho para Juiz de Fora, marchavam duas colunas de caminhões. Numa iam 25 carros cheios de soldados, rebocando canhões de 120 mm… Noutra, em 22 carros ia o Regimento Sampaio, o melhor contingente de infantaria da Vila Militar. De Petrópolis, a meio caminho entre o Rio e Mourão, partira o 1º Batalhão de Caçadores” (Gaspari).

“Tinham-se passado oito horas desde o momento em que se considerara insurreto. Salvo os disparos telefônicos e a movimentação de um pequeno esquadrão de reconhecimento que avançara algumas dezenas de quilômetros, sua tropa continuava onde sempre estivera: em Juiz de Fora.” (Gaspari)

Fardado, de capacete, Mourão, autointitulado Comandante em Chefe das Forças Revolucionárias, foi fotografado no meio da tarde, no QG da 4ª DI. Mas aos jornalistas ainda negava que estivesse rebelado.

O general Antônio Carlos Muricy, que Mourão chamou para chefiar a vanguarda da tropa que desceria em direção ao Rio, só foi chegar a Juiz de Fora às 18 horas.

Ao inspecionar as forças de que dispunha, Muricy comprovou que mais da metade eram recrutas mal preparados e a munição dava para poucas horas.

***

“Ele não é bem visto no Exército e provavelmente não liderará uma conspiração contra o governo, em parte porque não tem muitos seguidores. É visto como uma pessoa que fala mais do que pode fazer”, dizia um informe da embaixada americana sobre Mourão.

A maioria dos 60 generais em atividade naquele momento, achava que Mourão não conseguiria tirar os soldados do quartel. Lacerda lhe disse isso diretamente. O general Muricy, que ele convidou para comandar a vanguarda de suas forças em direção ao Rio, disse-lhe: “Você está louco? Acha que pode fazer uma operação dessas com soldados meninos com um mês de treinamento!”

Quando Morão chegou a Minas, em setembro de 1963, para assumir o comando da 4ª Região Militar, o governador Magalhães Pinto, depois da primeira conversa que tiveram, comentou: “Este general que veio comandar a Região ou é agente provocador do governo ou é louco, quer fazer uma revolução logo!”

O general Costa e Silva, a quem procurou várias vezes, sempre esquivou-se. “Não temos nada”. Para o historiador Hélio Silva, Mourão era um “homem bom, sofredor, pitoresco, capaz de assomos de cólera”.

***

O embaixador americano, Lincoln Gordon, soube da rebelião por volta do meio-dia do dia 31 de março, quase doze horas depois dos primeiros avisos de Mourão.

Imediatamente avisou Dean Rusk, chefe do Departamento de Estado. Ele não tinha Mourão em boa conta, mas ponderou: “(…) pode ser a última boa oportunidade para apoiar uma ação contra Goulart”.

A segunda vitória de Mourão aconteceu já na madrugada do dia primeiro de abril, quando o Regimento Sampaio, a mais bem treinada e equipada força militar do Rio, que saiu para atacá-lo. Ao alcançar a dianteira das tropas rebeladas, em vez de atirar, os oficiais simplesmente aderiram ao golpe. Os calejados “tarimbeiros” do Regimento Sampaio abraçaram os “soldadinhos meninos” de Mourão. “Eles passaram-se quando tudo parecia indicar nossa derrota”, anotou o general em seu diário.

Pouco depois, quando se deslocava para assumir a vanguarda das tropas que se dirigiam ao Rio soube pelo rádio do carro que não havia mais resistência. O golpe vencera e o general Costa e Silva havia assumido o Comando Supremo da Revolução, por ser o general mais velho em atividade. Não lhe restou mais que ir ao QG e apresentar-se ao novo comandante. Costa e Silva dormia e atendeu-o de cuecas. Ele quis reclamar, Costa colocou a mão em seu ombro: “Mourão, foi tudo resolvido na base da hierarquia ( …) Não se preocupe, velho, isso vai dar certo”. E recomendou-lhe ficar mais uns dias no Rio antes de regressar com as tropas. “Achei razoável , de vez que Costa e Silva não contava com quase nada, não dispunha de tropa. Minha obrigação era ficar e garanti-lo”, anotou Mourão em suas memórias. Ele já era carta fora do baralho.

Conspiração começou em Santa Maria

Olympio Mourão Filho diz em suas memórias que “acordou para o perigo comunista” em janeiro de 1962. Ele recém chegara a Santa Maria para assumir a 6ª Divisão de Infantaria.

Num jantar, testemunhou uma conversa do governador Leonel Brizola com o general Osvino Ferreira Alves, comandante do I Exército, brizolista, que passava suas férias em Santa Maria…

“Ficamos conversando no jardim interno. Foi aí que percebi que os dois acreditavam que eu pertencia ao lado político deles. Abriram o papo. Fiquei horrorizado com o que ouvi”. Brizola falou de seus planos para apressar o plebiscito para voltar ao presidencialismo, da campanha pelas reformas de base, elegibilidade dos sargentos, extensão do voto aos soldados e analfabetos…

Nada mais do que a plataforma publicamente defendida por Brizola. Para Mourão foi a explanação de “um vasto plano de subversão em todo o Brasil”.

Em casa ele anotou em seu diário: “Nada tenho contra João Goulart. Acho-o até um homem bom e simpático. Mas ele não porá fogo no Brasil”.

A partir daí, ele entra num processo de conspiração delirante, movido por uma certeza: Jango e Brizola, aliados aos comunistas, preparavam um golpe para implantar uma república sindicalista.

Tanques e jipes do II Exército descem para o Vale do Paraíba. O golpe venceu

A saída era um golpe antes. Além de aliciar adeptos entre a oficialidade, Mourão procura também lideranças do meio civil.

”Em Santa Maria articulei-me com o prefeito da cidade, médico Sevi Vieira e com o bispo Dom José Sartori, “que era um revolucionário entusiasmado”.

No dia 15 de janeiro de 1962 , foi a Porto Alegre e falou com o presidente da poderosa Farsul, Antônio Saint-Pastous, que o apoiou.

Em setembro de 1962 foi convidado para um encontro na casa do bispo para expor suas ideias e planos a um seleto grupo de líderes políticos: o governador Ildo Meneghetti, o senador Daniel Krieger, o deputado Peracchi Barcelos e o secretário de Meneghetti, João Dêntice.

Krieger anota em seu livro de memórias que “aquele foi o primeiro contato de civis com militares”, para uma conspiração anti-Jango.

Em Porto Alegre teve um colaborador entusiasta no jornalista Tadeu Onar, que  colocou Mourão em contado com lideranças e autoridades. Conseguiu até um audiência com o arcebispo, D. Vicente Scherer, que o ouviu mas evitou se comprometer.

Em março de 1963, Mourão  foi para a 2ª Região Militar, em São Paulo, “primeiro comando de prestígio.” Logo tinha um grupo, com o qual conspirava: “Reuníamos, em geral nas quartas-feiras, depois que eu vinha do meu passeio na Praça da Sé. Fazia isto muitas vezes nos dias quentes sem paletó, com um terno surrado, sem gravata e uns sapatos velhos… Sumia no meio do povo…”

Mourão, ainda embuído da Operação Popeye, ouve o governador mineiro Magalhães Pinto, “chefe-civil da revolução”. Com eles, o general Carlos Muricy

Filho de um advogado, que foi deputado e líder político em Diamantina e na região Norte de Minas, Mourão era uma figura polêmica desde os temos da Escola Militar, quando era um cadete magrinho (49 quilos) e se sentia marginalizado pelos colegas, os quais invariavelmente desprezava. “Eu fui sempre desconhecido, vivia entocado, ninguém me dava a menor importância”.

Tinha desprezo também pelos políticos: “Vil raça danada que vem desgraçando este país. Se pudesse metia-os todos na cadeia”.

Era igualmente inimigo da Escola Superior de Guerra, “escola onde se estuda uma doutrina totalitária importada dos EUA”. Achava os homens da ESG (Cordeiro de Faria, Golbery do Couto e Silva, Castello Branco) “uns cérebros doentios”.

Obcecado, Mourão Filho fez pelo menos três planejamentos para o golpe, desde que começou a conspirar. Quando ainda estava na 3ª DI, em Santa Maria, tinha um plano pronto (“Operação Junção”) para atacar Porto Alegre e prender Brizola, que ainda era governador.

Em março de 63, pouco depois de assumir a 2ª Região Militar em São Paulo, escreveu outro plano, que incluia “Serviço de sabotagem e contra-sabotagem”.

Brasília, 3 de abril: tanques ainda estacionados perto do Congresso Nacional

Via-se no poder

“Já pensei vagamente no que farei ao chegar ao Rio. Tomo o QG no peito e mando buscar o Cordeiro de Farias em casa, passo-lhe o Comando Geral e assumo o Comando das Forças em Operação (…) daremos ordem para que Mazzilli assuma a Presidência da República e formamos uma junta à parte, para tratar dos seguintes assuntos:

a) escolher o candidato que será civil para completar o quinquênio;

b) traçar diretrizes gerais para modificar a Constituição, a fim de evitar no futuro o acesso de políticos corruptos e subversivos”.

Tinha um plano para mudar o Brasil. Sua reforma tinha oito pontos, entre eles a “inelegibilidade dos atuais políticos, de seus ascendentes e descendentes e colaterais até o segundo grau”, e a criação de uma “Câmara de Planificação”, à base de concurso rigoroso de provas e títulos. “Câmara vitalícia à base dos mais altos salários da República”.

“O movimento se for vitorioso elegerá um presidente civil para completar o quinquênio, ao passo que um Conselho Militar por mim presidido estudará e apresentará as reformas à constituição com mudança da forma de governo”.

Até o fim ignorou a grande trama que envolveu chefes militares, empresários, a CIA e a embaixada norte-americana e preparou o terreno para a derrubada do governo reformista de Goulart.

Achava que tinha feito tudo sozinho. “A maior conspiração do Brasil foi feita por mim”, dizia.

A maldição do Plano Cohen

Planejar golpes parecia uma obsessão do general Olympio Mourão Filho. Quando era capitão ficou conhecido como autor do célebre “Plano Cohen”, uma das maiores farsas da história brasileira.

Era o plano de um golpe comunista, que previa atentados, sequestros e assassinato de autoridades para o assalto ao poder.

Com grande estardalhaço, o governo divulgou o plano terrorista, “descoberto” pelos serviços de segurança.

Ante a ameaça, o presidente Getúlio Vargas pediu “Estado de Guerra” e o Congresso, atemorizado, aprovou.

Os comunistas foram cassados e encarcerados e Vargas aproveitou o apoio político e popular e impôs uma nova constituição, que eliminava o parlamento. Foi ditador por oito anos, com todo o apoio das Forças Armadas.

Mourão já tinha morrido quando foi publicada a sua versão do golpe, em 1978

Em 1945, quando o ditador já estava em desgraça, o general Góes Monteiro, chefe do Estado Maior, ex-ministro da Guerra de Vargas, denunciou a farsa e acusou então capitão Mourão Filho de ser o autor. Segundo a versão de Góes Monteiro, num dia sem expediente no QG do Estado Maior do Exército, no Rio, Mourão foi flagrado por um colega datilografando o texto do que viria a ser o Plano Cohen.

Mourão não negava a autoria, mas insistiu sempre que se tratava de “um texto para estudo”, que foi usado sem o seu consentimento.

Na época, Mourão era chefe do Serviço Secreto da Ação Integralista e os integralistas (fascistas) aproximavam-se de Vargas. O plano, feito a pedido de Plínio Salgado, teria sido uma contribuição para que o presidente pudesse golpear os comunistas, que lhe atazanavam a vida. (Em seguida, depois de se livrar dos comunistas, Vargas acertou os integralistas também).

Observação : As memórias do general Mourão só foram publicadas em 1978, em plena ditadura militar, logo depois de sua morte, e por isso historiadores relativizam sua veracidade: Mourão pode, a posteriori,  ter enxertado trechos e fatos que  favoreciam  sua versão de conspirador-mor.

 

(Reproduzida da Revista JÁ, edição especial, 2014)  

 

Fontes:

Diário de Um Revolucionário (memórias do general Olympio Mourão Filho), L&PM, 1978.

A Ditadura Envergonhada, Elio Gaspari, Companhia das Letras, 2002.

1964: A Conquista do Estado, Renée Armand Dreiffus, Editora Vozes, 1981.

Reforma do Centro Histórico de Porto Alegre: a reportagem que não foi escrita

Já não tenho o Sérgio da Costa Franco para me socorrer e a memória não me dá segurança. Mas arriscaria que o centro  de Porto Alegre, onde nasceu e para onde,  ainda hoje, converge a cidade,  passa por uma das maiores reformas de sua história.

O que posso garantir: desde 1961, quando aqui aportei, nunca vi o centro tão conflagrado por obras como agora.

Meus olhos fatigados se intrigam, mas ainda não puderam ver uma reportagem sobre o que está acontecendo na vida real do centro histórico.

Ruas vazias, lojas fechadas, trânsito tumultuado, entulho pelas esquinas, obras sem operários, calçadas perigosas…

Dia desses, espero, um repórter passa por lá.

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Em discurso histórico em Porto Alegre, Lula pede desculpas a Brizola e Getúlio Vargas

Foi um lance de campanha, claro: Lula está de olho nos votos dos trabalhistas nas eleições municipais deste ano. Mas isso não tira a importância do pedido público de desculpas a Leonel Brizola e Getúlio Vargas, que o presidente fez em seu discurso histórico em Porto Alegre, nesta sexta-feira, 15 de março de 2024.

“Peço desculpas ao Brizola e ao Darcy Ribeiro pela nossa posição contra os CIEPS”, disse Lula referindo-se ao projeto de escolas de tempo integral implantados no Rio de Janeiro, durante os dois governos brizolistas. “A gente estava equivocado, hoje as escolas de tempo integral são uma unanimidade”.

Em seguida, Lula estendeu o pedido de desculpas a Getúlio Vargas, o líder máximo do trabalhismo no Brasil. “Eu já pedi também desculpas ao Getúlio pelo posicionamento  como sindicalista, sempre contra ele. Hoje a gente vê a coragem dele ao instituir em 1939 o salário mínimo, num  pais em que o regime de trabalho era análogo à escravidão, e em 1943 aprovar a Consolidação das Leis do Trabalho e mais tarde criou a Petrobrás. Foi tão grande o embate com os empresários da indústria que até hoje em São Paulo não tem uma viela com o nome de Getulio Vargas”.

As declarações de Lula em relação aos líderes trabalhistas vão além da autocrítica e incluem também o PT que sempre foi hostil ao trabalhismo varguista, porque lhe disputava os votos à esquerda, principalmente entre o operariado da indústria. Nessa postura, o partido do presidente sempre considerou Brizola um “caudilho populista” e Getulio Vargas um ditador que criou a legislação trabalhista inspirado na Carta del Lavoro, do fascista italiano Benito Mussolini.

 

 

 

 

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