Doze mil pessoas morrem de fome diariamente neste mundo pandêmico de 2020. Ao encerrar o ano a fome terá matado mais do que o Covid-19.
Essas eram as estimativas do relatório “O vírus da fome: como o coronavirus está potencializando a fome num mundo faminto”*, lançado em meados do ano pela Oxfam.
O documento prevê que 122 milhões de pessoas podem enfrentar a fome este ano como resultado dos impactos sociais e econômicos causados pela pandemia de coronavírus.
O risco maior se concentra em 10 países: Iêmen, República Democrática do Congo (RDC), Afeganistão, Venezuela, Sahel da África Ocidental, Etiópia, Sudão, Sudão do Sul, Síria e Haiti.
No Brasil, milhões de trabalhadores em situação de pobreza, sem recursos para se protegerem durante o necessário período de distanciamento social, perderam sua renda devido à pandemia.
O auxilio emergencial do governo de R$ 600 reais por três meses até agora socorreu mais de 60 milhões de trabalhadores informais e deverá ser estendido, com a metade do valor, até dezembro. E depois? O emprego vai voltar? A economia vai retomar?
“Os riscos de disparada da fome no país são imensos quando o Estado brasileiro falha em garantir as condições mínimas de sobrevivência a todas as pessoas impactadas pela pandemia”, afirma Maitê Guato, gerente de Programas e Campanhas da Oxfam Brasil. “Não basta criar programas de proteção, o que muda a vida das pessoas é fazer os recursos chegarem na ponta.”
Epicentros emergentes da fome
De acordo com o documento lançado pela Oxfam, o Brasil está entre os prováveis epicentros da fome no mundo, juntamente com Índia e África do Sul, onde milhões de pessoas estão à beira da grave insegurança alimentar e pobreza extrema.
“Em 2014, o Brasil saiu do Mapa da Fome da FAO e essa foi uma grande conquista nacional. Não podemos ser negligentes e não tomar todas as medidas para prevenir a escalada da fome no país, durante e depois que a epidemia passar”, afirma Gauto.
Mulheres são as que mais sofrem com a fome
No mundo, as mulheres que em geral desempenham papel crucial como produtoras de alimentos, são as que mais correm risco de passar fome. Elas já são vulneráveis devido à discriminação sistêmica. Isso faz com que elas recebam menos do que homens pelo mesmo trabalho e detenham menor posse de terra do que eles.
As mulheres também são maioria no grupo de trabalhadores informais, que no Brasil representa cerca de 40% da população economicamente ativa. E por isso estão sofrendo as maiores consequências econômicas da pandemia.
“Os governos têm que conter o avanço dessa doença mortal, mas é vital também que tomem iniciativas para impedir que a pandemia mate ainda mais pessoas de fome”, afirma Katia Maia. “Os governos podem salvar vidas agora financiando o apelo covid-19 da ONU e cancelando as dívidas de países em desenvolvimento para liberá-los a investir em redes de segurança social.”
Impactos da pandemia
O Programa Mundial de Alimentos (PMA) da ONU, que acaba de ganhar o Prêmio Nobel da Paz, estima que o número de pessoas em nível de crise de fome – definida como nível 3 da Classificação Integrada de Fases da Segurança Alimentar (IPC) da ONU – aumentará em cerca de 121 milhões de pessoas este ano como resultado dos impactos socioeconômicos da pandemia.
A taxa de mortalidade diária estimada para o IPC a partir do nível 3 é de 0,5 – 1 a cada 10 mil pessoas. Isso equivalente a 6.050 – 12.100 mortes por dia devido à fome como resultado da pandemia até o fim de 2020.
A taxa de mortalidade diária observada globalmente para a covid-19 teve pico em abril de 2020 com pouco mais de 10 mil mortes por dia. E ficou aproximadamente entre 5 mil e 7 mil mortes diárias nos meses seguintes de acordo com dados da John Hopkins University.
- https://d2v21prk53tg5m.cloudfront.net/wp-content/uploads/2020/07/Informe-Virus-da-Fome-embargado-FINAL-1.pdf