A afasia desastrosa de um governo intimidado

Enio Squeff
Amigos que  votaram em Dilma Rousseff, acreditam, com certa  razão, que não há sentido em criticar o governo e engrossar, assim, o movimento oposicionista em curso em que, a acusações genéricas de meliantes implicados nos casos de corrupção da Petrobrás, se somam nítidos movimentos golpistas.
A crítica só acrescentaria lenha à fogueira. Faz sentido; mas a senhora Dilma Rousseff parece tomada por um surto de afasia. Ao não se defender de absolutamente nada, parece dar razão aos adversários.
E, como se não bastasse, por enquanto só tem estendido a mão à direita política. Não parece serem de todo incorretos, os que a acusam – e ao seu governo –  de ter se esquecido de tudo o que defendeu na campanha eleitoral recente, e que, afinal, a elegeu. E de arrebatar, todos os dias,  todos os argumentos da esquerda para a defenderem.
Tentemos algumas hipóteses. Kátia Abreu na Agricultura – se não for confirmada – terá se mostrado apenas mais um gesto de falta de um tática minimamente coerente por parte do governo.
Ninguém com um fio de lucidez entenderá qual a finalidade do desgaste. Se era para testar a fidelidade da esquerda – tudo mal: ela, a esquerda ou as forças democráticas do País,  já estão com os ouvidos quentes a ouvirem das sacadas, dos fundos dos bares, pelas ruas – que se era para isso, carece de qualquer sentido seu apoio a uma governante que vem fazendo exatamente o que se esperava de seus adversários.
Trata-se de um movimento tático, dizem alguns otimistas. Ao atender a poderosa direita em seus contornos inclusive nitidamente fascistas, encastelada na mídia, na justiça, e na academia, o governo Dilma se livraria do pior – o descrédito pela situação que, se não é catastrófica como pintam seus  adversários – nem por isso deixa de abalá-lo.
Tudo bem, seria isso mesmo. Mas e os que elegeram o atual governo? Onde os argumentos do mesmo governo para uso dos que até ontem estavam nas ruas, a defendê-lo?
As respostas por enquanto não têm despontado de lugar algum do oficialato.
Euclides da Cunha dizia de Floriano Peixoto que era a máscara de uma múmia.
Dilma Rousseff deve levar em boa conta a comparação. Mas se esquece de que uma coisa são os Salazares, os Francos, os Stalins e os Florianos Peixotos de todos os tempos – ditadores que se safavam das situações embaraçosas a ostentarem “caras de paisagens”.
Ainda que não seja um ditador “stricto senso”, Vladmir Putin, o todo poderoso presidente russo, pode-se dar ao luxo de relegar as acusações de seus adversários, como meras suposições.
Dilma não é Putin, não vive numa Rússia protoditatorial. Não tem como se esconder em qualquer cara de múmia de todos os ditadores de todos os tempos.
No entanto, vem sendo sistematicamente acusada de tudo de ruim que acontece no país e até agora não disse se tem alguma coisa a dizer – ainda que tenha sido eleita. Fica difícil saber qual a sua lógica, se é que ela tem alguma que não a de seus marqueteiros.
No tempo dificílimo dos debates eleitorais, digamos sem meias palavras – a presidenta se mostrou timorata, embaraçada, fraca, mal se sustinha às acusações agressivas, principalmente de Aécio Neves.
Salvou-a a solidariedade natural de parte dos brasileiros e brasileiras, com os fracos e a sua condição de mulher.
Foi por ser mulher e portanto, frágil, sujeita aos maus bofes de um homem agressivo,  e machista que ela se livrou da pecha de pusilânime.
O “tal coração valente” da propaganda oficial por pouco não deixou de bater, na condição de então candidata, a se sentir mal depois de ter sido cruelmente ofendida por Aécio Neves.
Não fosse o próprio Aécio ostentar o título de “batedor de mulheres”, acusação não desmentida que lhe fez Juca Kfouri em sua coluna meses atrás – fato jamais devidamente e explorado pela grande imprensa, mas conhecida pelo grosso dos eleitores – e o tal “coração valente”com que a presidenta se apresentou, teria se infartado definitivamente no famoso debate.
Ficou a lição pensaram os mesmos otimistas. Não, não ficou nada. Os marqueteiros – ou sabe Deus quem – convenceram-na, a ela e ao PT, de que Dilma se saiu bem por não ter respondido à altura o ter sido chamada de “omissa”, “mentirosa”e “corrupta”.
Nada de estranho, portanto, que a arenga continue. E com reações antagônicas dos dois lados.
De parte do Partido da Imprensa Golpista – o já famoso “PIG” – o PT continua a ser o partido “mais corrupto que já governou o País”.
Quanto aos marqueteiros e ao governo em geral – é aconselhável que a presidenta se guarde quietinha às acusações que lhe fazem, à vaias, aos xingamentos  e a todo o resto.
Ou seja, se o “Grande Inquisidor”Gilmar Mendes a acusar de corrupta, e de portanto merecer um “impeachment”o tal “coração valente”, a se crer em seus atuais conselheiros, irá se recolher em um convento a pedir a intercessão de Deus e de Santa Terezinha.
Entrementes, os que até ontem saíram às ruas para tentar reelegê-la, ficam a olhar para os lados, assustados dos que os vão acusar de serem, por sua vez, omissos diante de tanta pusilanimidade.
Foi assim, a propósito, durante todo o governo Dilma.
A imprensa a bater, a reforçar os acusadores sem provas dos Mensalões, o Ministério da Justiça a baixar a guarda para a Polícia Federal anti-republicana, devidamente instrumentalizada quase que exclusivamente contra o PT e tudo o mais.
A isso a assessoria de imprensa (??) do governo federal não fez praticamente nada.
Aliás, Franklin Martins, ex-assessor de imprensa de Lula, hoje devidamente aposentado – por que será? – , tentou uma resistência ainda no tempo do governo anterior, quando criou a TV Brasil.
Ela seria a “BBC brasileira” lembram-se? Passado mais de cinco anos, a TV Brasil sequer saiu da condição de TV por assinatura: continua a não ser um canal aberto para todos os brasileiros.  Inacreditável, mas é isso mesmo.
Talvez se possas conceder que muitos dos funcionários da TV Brasil seja profissionais aguerridos e que têm tentado inutilmente, ascender à condição de disputar um lugar entre as emissoras de TV do País.
Quem sabe sejam até heróicos. E desconfia- de que sejam mesmo:  sabem que servem a um governo amedrontado.
Quem sabe estejam, então, a se preparar para daqui a alguns anos – se Dilma não for derrubada até lá. E então devem estar a calcular, como nós outros, a que tipo de governo de direita irão servir.
Dizem de Dilma Rousseff que é uma mulher que gosta de ópera e de teatro.
Sua atuação na área cultural não tem demonstrado nada disso. Mas se conhecesse uma peça do suíço Max Frisch, chamada “Biedermann e os incendiários” talvez atentasse para a história  do sujeito que convida carbonários para se hospedarem em sua casa. E que, contra todas as evidências, por pura covardia, não consegue expulsá-los antes que a destruam.
Dilma gosta de quinta-colunas. Pela sua idade deveria saber  o que é que é isso. Mas sequer se deu conta de que ganhou  de um candidato comprometido com tudo o que ela diz ser o oposto de seu governo.
Ou melhor, que ela não diz ser o oposto do seu governo, por certamente não ter se recuperado ainda do mal estar que acometeu logo depois do debate em que se sentiu mal.
Desconfiava-se de que fosse um surto afásico. Hoje se sabe que talvez tenha nascido assim, ao menos que ….

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