Autor: Geraldo Hasse
Rolando Boldrin, um brasileiro sem máscara
Ao completar 80 anos, Rolando Boldrin, um caipira ilustrado, liberou sua biografia escrita por Willian Correa e Ricardo Taira, jornalistas da TV Cultura de São Paulo. O livro é editado pela Contexto.
A carrapatolândia é aqui
Convergência social e democrática
É preciso resistir aos retrogovernos que trabalham contra a ordem e o progresso.
Se ganhasse na megassena, eu contrataria Aldyr Blanc, Arnaldo Antunes, Caetano Velloso, Chico Buarque, Chico Cesar, Elomar, Jorge Ben, Gilberto Gil, Moraes Moreira, Nei Lisboa, Nelson Coelho de Castro, Renato Teixeira, Rita Lee, Rolando Boldrin, Zé Ramalho e os irmãos Ramil para um show-desabafo inspirado na atual situação política brasileira.
Além do cachê, eles poderiam escolher parceiros(as), teriam comidas e bebidas à vontade, disporiam de massagistas e terapeutas, e poderiam recorrer a um plantel de arranjadores para incrementar o espetáculo, que seria documentado desde o primeiro encontro até a despedida final, quando o público poderia levar para casa o CD, o DVD, o book e outros souvenirs.
Com essa suprema convergência artística, provaríamos que o Brasil tem talento para não precisar se sujeitar ao triunfo das nulidades, como vem acontecendo. Eu, por exemplo, não tenho mais palavras ou rimas para narrar o que vem se passando.
Sai Dilma, entra Temer e as coisas pioram. Cai Cunha, sobe Maia e segue tudo igual.
Um dia é Aécio, no outro Joesley. A fraude prevalece, domina e impera.
No fundo ninguém presta. Nove entre dez brasileiros estão de saco cheio, querem Temer fora do Palácio.
Será que no Brasil não tem gente boa? Até parece que só os maus são eleitos.
Dizendo-se republicanos e democráticos, os pigmeus do bulevar (como já escreveu Chico Buarque) trabalham à luz do dia (e na calada da noite) para fazer o país retroceder socialmente à época anterior à Lei Áurea.
O comportamento dos ocupantes dos três poderes do Planalto lembra um baile suspeito cuja senha de acesso é Delenda Lula#PT Nunca Mais. É uma festa só para coniventes. Descontentes e dissidentes não entram.
Dançando a valsa do entreguismo, os frequentadores do baile, mascarados e enrolados na bandeira nacional (“Ordem e Progresso”), querem reformar a legislação trabalhista, não para modernizá-la mas para lesar os trabalhadores, que já vivem situações de extrema exploração.
Caminhamos de volta para um estágio similar ao da escravidão.
Entre a lista de maldades destaca-se uma reforma previdenciária que visa transformar a aposentadoria das pessoas em fonte de lucro para bancos e afins. O fim da picada.
Onde essa reforma foi feita, como no Chile, deu tudo errado, o povo foi lesado e nem os gringos favorecidos ficaram satisfeitos.
O estado mínimo dos neoliberais é um engodo, uma balela sem futuro.
A Previdência precisa melhorar para alcançar todos os brasileiros e não para excluir os que mais trabalham.
De agora em diante, a cada eleição os brasileiros precisam varrer do Executivo e do Legislativo a malta de governantes comprometidos com a banda podre da sociedade.
Se a administração da economia pelo Estado deixa a desejar, só resta buscar uma forma de governo com foco na solidariedade.
A democracia política, econômica e social é uma meta permanente e inarredável.
O individualismo é comprovadamente nefasto para a vida comunitária.
O capitalismo, habitualmente praticado em nome da liberdade, é socialmente injusto.
São estes os motes para o show dos artistas convidados.
(Só não posso esquecer de passar na agência lotérica pra fazer a aposta da vitória. Com 10 milhões eu faço a festa).
LEMBRETE DE OCASIÃO
Aos cegos é lícito brandir bengalas
Salgado Filho e as leis trabalhistas
Certo dia, no ano de 1934, andando no centro do Rio, o ministro do Trabalho, Joaquim Pedro Salgado Filho, viu um vendedor ambulante sendo esbulhado por um fiscal municipal, que supunha cumprir seu dever em prol da regularidade do comércio.
O pobre pediu clemência, pois estava tentando levar algum dinheiro para casa, mulher e filhos. Não teve indulgência.
Após assistir à cena, o ministro voltou ao seu gabinete e iniciou as providências para regulamentar o comércio de ambulantes. Coisa que fez nos dias seguintes, emendada em medidas que estabeleceram no Brasil as bases da legislação trabalhista – jornada de oito horas, regulamentação do trabalho feminino, entre outras – que seriam reunidas, em 1943, na Consolidação das Leis do Trabalho, cuja reforma está em discussão no Senado Federal.
Impossível não lembrar o papel histórico de Salgado Filho nesse momento em que 15 milhões de desempregados e outros tantos milhões de subempregados, biscateiros e pingentes lutam pela sobrevivência no país varrido por escândalos de corrupção nas altas esferas do poder. Recordemos, pois.
Gaúcho de Porto Alegre, onde nasceu em 1888, Salgado Filho era formado em Direito. Além de substituir Lindolfo Collor no Ministério do Trabalho entre 1932 e 1934, foi senador e o primeiro ministro da Aeronáutica, nomeado em 1941, quando passou a negociar – principalmente com o aliado norte-americano — as bases da instalação da indústria de aviões no Brasil.
Em julho de 1950, candidato a governador do Rio Grande do Sul, morreu num acidente aéreo em São Francisco de Assis, quando viajava para um encontro com seu amigo Getulio Vargas, na Fazenda Itu, em São Borja. Há suspeitas de que o acidente não foi exatamente acidental.
Dilma vê luz no fim do túnel, em 2018
Geraldo Hasse
A ex-presidente Dilma Rousseff deu um looooongo depoimento à revista Esquerda Petista em que, surpreendentemente, se declara otimista quanto à possibilidade de recuperar as prioridades do estado social a partir das eleições de 2018, desde que haja um debate autêntico sobre o que aconteceu no Brasil nos últimos anos. “Não interessa quem ganhe, mas haverá um processo político, de dimensão nacional, em que se discutirá. Vai ser uma discussão, dura, crítica, mas vai ter. Por isso a coisa mais grave é não ter eleição em 2018”, disse a ex-presidente, que dedicou a maior parte do depoimento à análise da situação econômica mundial e, no final, explicou porque o PT não ousou apresentar o projeto de controle dos oligopólios de mídia.
Para a economista Dilma, a chave da crise vigente é a “financeirização”, fenômeno global mais ou menos recente cuja principal característica é o predomínio do capital financeiro sobre todas as demais atividades econômicas convencionais – indústria, comércio, transportes, agricultura, governo. Na opinião da ex-presidente, o objetivo da financeirização, mais do que estabelecer o “estado mínimo” e destruir os mecanismos do bem-estar social, é pagar menos impostos, o que acaba gerando como resultado final o aumento brutal da desigualdade econômica e social — obra em andamento no Brasil nas mãos do vice-presidente Michel Temer.
Nem tudo está perdido, acredita Dilma. Por exemplo, ela afirma que, apesar da privatização feita pelo PSDB, o Brasil conserva uma estrutura estatal muito forte: Caixa Econômica, Banco do Brasil, BNDES, Petrobras e Eletrobras. São cinco pernas que permitem gerar investimentos em atividades produtivas, mas até mesmo essas empresas estatais caíram no vício da financeirização. Falando das grandes empresas atuantes no Brasil, ela diz que “todas têm uma variante bancária chamada tesouraria, na qual a parte financeira é, progressivamente, mais significativa que a parte produtiva”.
No Brasil, segundo Dilma, a financeirização é mais intensa porque as grandes empresas, a começar pelos bancos, tornaram-se “sócias da rolagem da dívida pública”, ou seja, “se você depositar no Banco Central, ele te paga a taxa da Selic, entendeu?” Não são apenas os bancos que fazem esse jogo. “A Petrobras também quer a mesma coisa, está endividada em dólar e quer o real ultravalorizado”, diz ela.
Além disso, o empresariado em geral tem uma boa lucratividade no mercado interno de rolagem da dívida. Eis o suprassumo da finaceirização, que a economista e ex-auditora fiscal Maria Lucia Fatorelli quer lancetar por meio de uma auditoria da dívida pública no Congresso – não no atual, natualmente, mas em algum momento no futuro.
Mídia
Em outra grande vertente do seu depoimento à revista Esquerda Petista, a ex-presidente Dilma reconheceu que faltou força (e coragem e percepção) aos governos petistas para estabelecer o controle sobre os meios de comunicação social.
Em princípio, lá no começo (2003), os governos petistas achavam que a mídia precisava ser controlada economicamente para que não se torne monopólio ou oligopólio, como ocorre com qualquer ramo de negócio. “Isso não é só contra a economia popular”, afirma Dilma, “é contra a democracia”. Ou, seja, “você não pode deixar que se formem conglomerados de jornal, televisão, rádio e revista e qualquer outro”. O órgão existente no governo, o CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica, nunca fez nada para alterar esse quadro.
Segundo Dilma, ao invés de criar uma lei antimonopólio, o que o primeiro governo petista Lula fez foi ajudar os principais grupos de mídia a sair de suas crises de sobrevivência advindas da revolução tecnológica (internet). Ingenuidade, bom mocismo e falta de visão de futuro, já que no primeiro momento ninguém do governo petista tinha uma proposta de lei de meios de comunicação, que acabou sendo formulada tardiamente, no fim do segundo governo Lula. O autor, ministro Franklin Martins, jornalista com profunda vivência dentro da TV Globo, acabou ficando fora do governo Dilma, acuado pelo argumento malicioso de que o PT queria controlar o conteúdo dos meios de comunicação, conspirando contra “um dos fundamentos da democracia”.
Dilma admite: “Nós não soubemos colocar bem essa discussão. E fomos ingênuos em relação aos meios. Eles não têm nem princípios democráticos, nem republicanos. Com eles não dá para fazer ‘senta que o leão é manso’. O leão não é manso. Come sua mão, sua perna e sua alma”.
No transição de Lula para Dilma, o governo foi ficando sem força política para sequer propor regular a mídia, . A situação ficou pior com a ascensão de Eduardo Cunha à presidência da Câmara.
Em seu depoimento, a ex-presidente conta que o deputado carioca foi à cúpula da Rede Globo e prometeu barrar a regulação da mídia pretendida pelo governo. Não só barrou todos os projetos petistas como comandou o impeachment presidencial, consumado entre abril e agosto de 2016.
Breviário da roubalheira eleitoral
Geraldo Hasse
Paraibano de Catolé da Rocha, com parentesco distante com os Maia da Paraíba, o ministro Herman Benjamin brilhou no TSE como relator da ação de impugnação da chapa Dilma-Temer nas eleições presidenciais de 2014.
Restou provado, como soem dizer os causídicos, que nas eleições presidenciais de 2014 houve abuso de poder econômico, especialmente com recursos da Construtora Odebrecht, a principal empreiteira contratada pela Petrobras. Mas a maioria dos sete ministros ignorou as provas e absolveu a chapa. Quatro a três.
Estressado por horas e horas de argumentação oral, Benjamin deixou muito mal na parada o matogrossense Gilmar Mendes, presidente do tribunal, que preferiu desempatar o jogo em favor do presidente Temer, beneficiário do golpe parlamentar contra a titular da chapa.
Ao absolver a chapa Temer(Dilma), o TSE deu aval ao golpe e aliviou a barra dos partidos e dos dirigentes partidários. Antes definidos como agências eleitorais disponíveis a quaisquer aventureiros, os partidos foram qualificados por Benjamin como “entrepostos de recolhimento de propinas”.
A interminável sessão de julgamento da ação proposta pelo candidato derrotado Aécio Neves, cuja chapa presidencial poderia ser acusada das mesmas faltas, vale temporariamente como um réquiem da democracia brasileira. Espera-se que ali adiante haja uma correção de rumos, sob pena de continuarmos vivendo num permanente valetudo político.
A decisão do TSE vai gerar um acórdão que servirá de referência para novos julgamentos. Pode ser que alguém recorra junto ao STF, mas até uma nova decisão – da qual fará parte o sagaz ministro Gilmar Mendes, que sabe de onde sopram os ventos – muita água suja haverá de passar por baixo dessa ponte.
Ora, não se pode negar que foi desvendado um dos esquemas mais comuns da vida política brasileira. Ninguém mais se espanta ao saber que a Odebrecht distribuía dinheiro a todos os políticos que podiam lhe prestar ajuda nos meandros do poder. Não deu só para a chapa Dilma-Temer, mas para as outras, especialmente para a liderada por Aecio Neves. Só em 2014?
Não sejamos ingênuos diante da histórica falcatruagem político-eleitoral. Onde e quando não houve abuso de poder econômico em alguma eleição na história deste país? Qual estatal não caiu na rede de corrupção manejada por fornecedores? Qual político não contou com dinheiro de caixa dois? Quanto mais alto o cargo, maior o volume de dinheiro.
Admitamos que um percentual dos políticos prima pela lisura, não aceita dinheiro sujo e presta contas certinho para os órgãos responsáveis. Que os (e)leitores façam suas avaliações: são 10%? Um terço? Metade? Como melhorar esse percentual, a ponto de excluir da vida política os manipuladores?
Pela Operação Lava Jato e outras investigações ficamos sabendo que um ou outro receptor de dinheiro desviam uma parte para si mesmo, colocando-a num paraíso fiscal ou comprando imóveis ou joias. As mulheres dos cariocas Cabral e Cunha fizeram farras em lojas de Paris. Uma delas alegou não saber a origem do dinheiro e foi absolvida.
Mas não há dúvida de que a maior parte das verbas de campanha eleitoral é usada para pagar serviços de assessores, consultores, redatores, cinegrafistas, fotógrafos, motoristas, cantores sertanejos, secretárias, scort girls, cabos eleitorais, portadores de bandeiras em esquinas democráticas e até eleitores sequiosos de presentinhos eleitorais.
Nas altas esferas das campanhas, há um jogo de favores e interesses se entrecruzando, tendo como denominador cargos aqui e acolá. Os mais escolados agem no sentido de garantir uma boquinha no governo eleito. Enquanto isso, nas baixas esferas, a senhora que faz o café e cuida da faxina no comitê de campanha recebe promessas singelas e depois fica penando meses para receber o que lhe devem.
Esse é um jogo conhecido por qualquer brasileiro. Todo mundo tem um conhecido que ganhou algum (ou recebeu mil promessas) numa campanha política.
Os marqueteiros-chefes manipulam milhares, milhões de reais, ficando em condições de comprar sítios, carros e depositar dinheiro no exterior.
Um bom redator de campanha ganha em quatro meses mais do que um editor de revista num ano de serviço.
Um fotógrafo diligente fica em condições de comprar um carro novo à vista no final da temporada eleitoral. A verdade é que trabalha-se intensamente nos períodos eleitorais.
Nos comitês de campanha, porém, a verdade é que ninguém pergunta de onde veio o dinheiro. O acerto de contas fica para depois e “seja o que Deus quiser”…e o Diabo sugerir, pois dinheiro de campanha escoa pelo ralo. Acumulam-se dívidas.
Nesse aspecto e nesse sentido, o relatório do ministro Herman Benjamin ao egrégio, colendo e superior tribunal eleitoral é uma peça histórica que haverá de expor eternamente as ambiguidades e contradições do Judiciário brasileiro.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“O governo mudou, mas eu não mudo. Fico com o governo”
Manuel Inacio, coronel do sertão pernambucano (in Faoro, Raymundo, “Os Donos do Poder”
Grande audiência do senador Paim na TV Senado
Geraldo Hasse
Em contraposição à atuação dos outros dois senadores gaúchos, ambos atrelados ao status quo golpista, o senador Paulo Paim (PT) está em campanha aberta e franca contra as reformas previdenciária e trabalhista, usando para isso o espaço livre nas manhãs da TV Senado. “Nossa audiência se aproxima de 3 milhões de pessoas”, disse ele, dias atrás, num comentário en passant.
Com o apoio da senadora Regina Silva, presidente da comissão de direitos humanos e legislação participativa, ele vem comandando sessões matutinas de uma audiência pública sobre o impacto da reforma trabalhista na vida do trabalhador rural. Nesta segunda-feira (5), Paim mandou passar no telão da CDH uma apresentação do cantor nativista Dante Ledesma, que defendia a previdência para o homem do campo. A canção foi aplaudida pelo público presente à audiência.
Raramente se vê em qualquer TV pública e privada um desfile de depoentes tão pertinentes e qualificados. São representantes de entidades como a Contag e a Via Campesina, Unafisco e Comissão de Justiça, Caridade e Paz da CNBB, entre outras, todas reclamando do caráter maligno dos projetos governamentais de reforma da legislação trabalhista e do sistema previdenciário.
O trabalho de Paim na CDH do Senado é um thriller do que pode rolar na CPI da Previdência recém-aprovada pelo Congresso. Se forem chamados à CPI alguns dos depoentes que vêm falando nas manhãs da TV Senado, certamente ficará demonstrada “a farsa das reformas”, como as denomina o senador gaúcho.
Um programa para equalizar o bem-estar
Geraldo Hasse
É natural que os indicadores econômicos de 2017 sejam melhores do que os de 2016, pois estes estavam no fundo do poço. E a melhora registrada no desempenho econômico foi de apenas 1%.
Bóias-frias
Geraldo Hasse
Pela vontade da maioria da Câmara dos Deputados, que aprovou a toque de caixa a reforma da legislação trabalhista, a maioria dos trabalhadores brasileiros será bóia-fria – menos, claro, os senhores deputados, os senhores de engenho e os empreendedores bem representados pelo prefeito paulistano João Dória, a mais recente piada da cidade que inventou Paulo Maluf e Janio Quadros.