Raízes da crise no Estado presentes na eleição

As eleições municipais acontecem em meio a uma grave crise política no governo de Yeda Crusius, mas com conseqüências para todos os partidos.
As siglas foram duramente atingidas na sua credibilidade e a classe política como um todo está abalada.
Parece que ninguém aprendeu a lição.
As candidaturas concorrentes ao Paço Municipal repetem a fórmula das alianças pragmáticas, que, via de regra, resultam no loteamento de cargos após o pleito, como foi escancarado pelo ex-chefe da Casa Civil Cézar Busatto no governo do Estado.
Para ganhar mais tempo na propaganda eleitoral gratuita, Onyx Lorenzoni (DEM) entregou a vice-candidatura de sua chapa a Mano Changes (PP) e prometeu pagar as despesas de rádio de tevê dos candidatos progressistas na proporcional.
Manuela D’Ávila busca convencer o eleitor de que a união entre PPS e PCdoB é coerente e demonstra a vontade de superar antigas divergências entre os partidos. Corre o risco de ser ver a história do Piratini se repetir na esfera municipal, com outros personagens.
Disfarçando a candidatura de Marchezan Jr. de independência política, o PSDB não precisou entrar no jogo antes do segundo turno e poderá escolher com tranqüilidade quem apoiar quando o momento oportuno chegar.
Como seus tradicionais apoiadores optaram por candidaturas próprias em busca de um projeto de poder, a Frente Popular do Partido dos Trabalhadores foi formada com uma sigla de empresários, o PRB, que abriga o vice de Lula, José Alencar.
No meio de tudo isso, o eleitor não pode contar nem com os jornais, que desde os tempos da ditadura, desaprenderam a ter um discurso próprio, repetindo apenas o que as assessorias de imprensa escrevem nos press-releases.

“Sirvam nossas patranhas de modelo à toda terra…”

Elmar Bones
As gravações ouvidas nos últimos dias estão expondo as vísceras da política no Rio Grande do Sul. Estão pondo abaixo o mito de que no Estado se pratica uma política diferenciada – mais ética, mais comprometida com o interesse público.
Havia até uma referência histórica para isso, o positivismo borgista com seu moralismo. Agora vai ficando claro que era só para rechear discurso.
Nos anos 60, Franklin de Oliveira escreveu “Rio Grande do Sul, o novo nordeste”, livro polêmico. Dizia que o Estado estava empobrecendo e apresentava níveis de desenvolvimento equivalentes ao dos mais pobres estados nordestinos.
A profecia de Franklin de Oliveira para a economia se realizou na política. No sentido de usar a política para se apropriar do dinheiro público, o Rio Grande do Sul parece hoje o velho nordeste. Aquele dos coronéis, que confundiam o seu com o do Estado ou vice-versa.
Por mais que o deputado Cezar Busato tente explicar, o que está declarado nas gravações tem coerência total com o que realmente acontece.
O Banrisul é uma das fontes de financiamento do PMDB, diz Busato.
Todos sabem que o presidente do Banrisul é uma indicação do senador Pedro Simon, desde o governo Rigotto e que permanece no cargo por vontade do senador. O senador Pedro Simon tem se mantido distante do governo, sem abrir mão do seu campo de influência.
O Detran seria, segundo a afirmação de Busatto, a fonte de financiamento do PP, com Otávio Germano à frente. “Custa muito caro romper com Otávio Germano”, diz Busatto em seu diálogo com Feijó.
Em seguida, em demonstração de realismo político, o secretário descreve como ocorrem as relações dos grandes partidos dentro da estrutura do Estado.
Em cada momento a fonte é uma: já foi o Daer ( “Quanto tempo sustentou? Fortuna no tempo das obras”), a CEEE e, agora, o Banrisul e o Detran.
As conversas gravadas pela polícia federal na Operação Rodin mostram como os grupos operavam por dentro da máquina pública. As fitas divulgadas por Feijó mostram como se dava a cobertura política para essas operações.
Nesse ritmo, será necessário mudar o hino. Em vez de façanhas, “sirvam nossas patranhas de modelo à toda a terra”.

Cage não tem auditores para cuidar das contas públicas

Se a imprensa (a mídia) decidir ligar os fatos, vai mostrar que por trás de toda essa crise do governo está a enorme crise do Estado, ou seja, do setor público.
Por exemplo: todos esses “furos” em contratos e licitações estão de alguma forma ligados à precarização da Contadoria e Auditoria Geral do Estado, a Cage, sexagenária e respeitável instituição.
Quem conhece o assunto diz que seriam necessários pelo menos 200 agentes fiscais, mas a Cage tem menos de 80. Estão desmotivados, à espreita da aposentadoria. Por conta dessa situação, empresas como Banrisul e CEEE contratam auditorias privadas.
No final do governo Rigotto, a associação dos agentes fiscais patrocinou um levantamento com 30 casos de “ralos” por onde escoa o dinheiro público.
O que tem sido feito nessa área? Esta pergunta não é feita.
Enquanto isso, na televisão…