As máquinas estão parando: crise dos jornais impressos atinge em cheio o Interior

Com um dos maiores parques gráficos do Estado, a Gazeta do Sul tenta reinventar o jornal e se manter como polo de impressão. Foto: Rafaelly Machado/ Divulgação Gazeta do Sul

Pelo menos sete impressoras rotativas estão paradas e empacotadas no interior do Rio Grande do sul.

São máquinas potentes e modernas capazes de imprimir milhares de exemplares em poucas horas, mas que, de repente, perderam a função: os jornais impressos estão fechando ou reduzindo tiragens e periodicidade, as impressoras estão ociosas.

Uma das alternativas que resta aos donos dessas máquinas é vendê-las para a Siderúrgica Gerdau, como sucata, para fundir e fazer aço.

Um dos casos emblemáticos é o do maior diário do interior do Estado, o Diário Popular de Pelotas, fundado em 1890, que desativou o seu parque gráfico e passou a ser impresso em Porto Alegre, na gráfica da Zero Hora.

O mesmo fez há mais tempo A Plateia, de Santana do Livramento, com mais de 90 anos, que já foi o principal diário da Fronteira Oeste, com circulação em vários municípios da região. Passou a cobertura diária para o digital, desativou o parque gráfico e tornou semanal a edição em papel, impressa em Porto Alegre.

Na mesma região, a Gazeta de Alegrete, que é o terceiro mais antigo do Brasil, fundado em 1882, mantém-se por conta dos editais da prefeitura local, com escassas chances de sobrevivência. A gráfica local foi desativada ainda nos anos 90, quando o secular jornal passou a ser semanal.

Em Bento Gonçalves, na industrializada Serra Gaúcha, onde circulavam dois jornais diários, um fechou e o outro virou semanário. Em Caxias, o diário Folha de Caxias virou semanário, e outro mantém-se com cortes. O tradicionalíssimo Correio Riograndense suspendeu sua edição impressa e se mantém no online.

Em Santa Maria, o jornal A Razão sucumbiu ante a crise e a concorrência do Diário de Santa Maria, que a RBS lançou na cidade em 2002. Com mais de 80 anos, um rotativa própria e um grupo que chegou a ter 90 funcionários, A Razão fechou as portas em 2017. Tinha então 12 jornalistas na Redação.

Quando a crise apertou, também a RBS vendeu o Diário de Santa Maria para um grupo de empresários locais.

Em Santa Cruz, a poderosa Gazeta do Sul tenta se reinventar. Reduziu cadernos para compensar a perda de anúncios, mas criou páginas temáticas e busca manter-se como parque gráfico regional que chegou a ter mais de 50 títulos impressos em sua rotativa de 25 metros, capaz de imprimir 20 mil exemplares de 40 páginas, por hora.

O tamanho real desta crise ainda não pode ser medido, os números são imprecisos, as mudanças estão acontecendo. Nem a Associação dos Jornais do Interior, a Adjori, tem os dados exatos.

Estima-se que tenham registro cerca de 400 jornais nos 525 municípios do Rio Grande do Sul. Quantos sumiram, quantos reduziram a tiragem ou o número de páginas ou simplesmente sumiram do mapa?

A Adjori, que tem 70 sócios ativos, estima que no total uns 190 jornais ainda estão em atividade no Estado, a maioria apenas na internet.

A Associação dos Diários do Interior, que reúne os jornais de cidades-polo, hoje tem 24 membros, e espera a inscrição da Folha de São Borja e Diário de Santa Maria. Até o final do mês o grupo pretende realizar um encontro virtual e debater alternativas ao momento de crise.

A professora Beatriz Dornelles, da PUC-RS, que pesquisa o assunto há 20 anos, calcula que pelo menos dez jornais impressos deixaram de circular este ano no Rio Grande do Sul.

Quantos diários, quantos semanários, quantos bi-semanários? São dados que a professora está levantando para um livro.

A crise econômica prolongada, a expansão da internet e das redes sociais, já haviam ferido de morte o jornal impresso. A pandemia do coronavírus está dando o golpe final.

A maioria já migrou ou está migrando para o meio digital. A perda com o fechamento dos jornais impressos em cidades médias e pequenas pode  ser estimada pela redução dos profissionais nas redações.

O sindicato ainda está consolidando os números, mas há indicativos bem claros: redações onde trabalhavam 20 jornalistas, restaram apenas quatro. Sem contar que os remanescentes estão com os salários e jornadas reduzidos em até 70%.

No caso dos parques gráficos que estão sendo desmontados, ainda há que somar os trabalhadores especializados ocupados na cadeia que moviam estas impressoras agora paradas.

3 comentários em “As máquinas estão parando: crise dos jornais impressos atinge em cheio o Interior”

  1. Bons tempos em que se tomava café da manhã lendo o jornal. Hoje, twitter faz sucesso porque tem um número limitado de letras. As pessoas, cada vez mais, vão deixando de lado o hábito de ler. Tudo isto após o advento dos computadores. Profissões desapareceram e o linotipista parece ir para o mesmo caminho. Novos tempos. Tempos estranhos.

  2. A Associação dos Diários do Interior enviou a seguinte mensagem:
    “Há apenas um dado errado na matéria. A ADI nunca teve 40 associados. Nosso grupo hoje nunca foi tão numeroso. E estamos próximos de admitir mais 2 jornais: Folha de São Borja e Diário de Santa Maria.
    Temos que reconhecer que o momento é mesmo dramático.
    Em 15 dias estaremos todos reunidos para debater nossos caminhos de amanhã. Inscrevam-se!”

  3. O mundo da fotografia sofreu com a extinção da revelação e impressão em lojas especializadas. Por um tempo, impressoras de auto-atendimento fizeram a impressão em pontos comerciais, mas eram limitadas e sumiram. No caso dos jornais impressos o modelo de negócio é diferente, mas o destino parece ser o mesmo. Tanto no caso da fotografia, como no caso do jornal impresso os clientes ficaram orfãos de conteúdo e meio de distribuição. Não é a mesma coisa ler um jornal no computador ou no jornal. Meu sonho seria termos acesso a uma tecnologia em pontos comerciais que permitissem imprimir um jornal a qualquer hora com conteúdo atualizado até aquele momento. E talvez um serviço de entrega em casa como os motoqueiros por aplicativo. Seguramente eu pagaria R$ 10, R$ 15 ou até mais por um exemplar de jornal ou revista nesse modelo. Seria um bom serviço para reativar as bancas ou até implantar em lotéricas.

Deixe uma resposta para Jornal JÁCancelar resposta