Os novos pobres

Geraldo Hasse
Saiu no jornal O Globo do Rio um relatório do Banco Mundial sobre o recrudescimento da pobreza do Brasil.
O revés recomeçou em 2015, intensificou-se em 2016 e deve manter-se em 2017 e nos próximos anos, caso não sejam adotadas medidas que levem à recuperação da economia, sem o que não se abrirão novamente as portas dos mercados de trabalho.
Segundo o estudo, que na realidade se baseia em dados da Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (PNAD 2015), do IBGE, o número de pessoas vivendo na pobreza no Brasil aumentará entre 2,5 milhões e 3,6 milhões até o fim deste ano.
A diferença de 1,1 milhão entre as duas estimativas depende do comportamento da economia.
Se a recessão continuar, o número de pobres chegará a 20,9 milhões, sendo 9,4 milhões em estado de miséria. Se a economia der uma arribada, os pobres ficarão em 19,8 milhões (8,5 milhões de miseráveis).
Os “novos pobres”, assim chamados porque estavam acima da linha da pobreza em 2015 e já caíram ou cairão abaixo dela neste ano, são na maioria adultos jovens, habitantes (90%) de áreas urbanas e 58,8% deles estavam formalmente empregados até 2015.
É uma situação que se configura como tragédia num país marcado historicamente por gritantes desigualdades sociais e regionais.
O perfil dos “novos pobres” é bastante diferenciado dos “estruturalmente pobres”, aqueles que já viviam em condição de pobreza em 2015 e continuam nessa situação, no conceito formulado pelo Banco Mundial.
A parcela dos “pobres estruturais” é 10% mais velha (média de 41 anos de idade entre os chefes de família), menos escolarizada (17,5% com ensino médio ou mais, contra 37% dos novos pobres), e tem presença importante na área rural (36%), onde as atividades agrícolas vêm mantendo as pessoas empregadas.
Entretanto, graças ao seu perfil (destaque para o melhor nível educacional), os “novos pobres” podem ser mais facilmente alcançados por políticas de geração de renda, acredita o Banco Mundial, que se alia ao Fundo Monetário Internacional no combate às desigualdades econômicas.
Se quiser reduzir a pobreza extrema aos níveis de 2015, base mais recente de dados oficiais sobre renda, o governo terá que aumentar o orçamento do Bolsa Família este ano para R$ 30,4 bilhões no cenário econômico mais otimista e para R$ 31 bilhões no quadro mais pessimista, segundo o relatório do Banco Mundial.
Para 2017, o BF dispõe de R$ 29,8 bilhões, consolidando uma redução de 10% nos últimos dois anos (a última cifra sobre o BF no final de 2014 era de R$ 33 bilhões).
Se o programa não for ampliado, a proporção de brasileiros em situação de miséria subirá para 4,2% este ano no cenário otimista e para 4,6% no pessimista.
Em resumo, o número de miseráveis no Brasil está perto nove milhões de pessoas – o mesmo que a população do Estado de Pernambuco.
Conclusão: enquanto o Brasil vive o primeiro aumento da pobreza após uma década de ascensão generalizada da renda das camadas mais baixas da população, nem o governo nem a sociedade se deram conta de que a crise social se tornou mais aguda nos últimos dois anos.
E tudo indica que a situação vai continuar se agravando, como se a miséria fosse um mal necessário e inerente à história da humanidade. Pelo que se vê nas ruas, as pessoas se comovem mais com um cãozinho sendo maltratado do que com ser humano passando fome, frio ou sede.
Por isso é bom lembrar que aos pobres não falta só comida. Eles não têm habitação decente e carecem das condições mínimas da cidadania: acesso ao mercado de trabalho, a uma instrução melhor, a transporte coletivo de qualidade e bom atendimento de saúde pública. Roupa nova, esporte, lazer e viagens de turismo são fantasias irrealizáveis a curto ou médio prazo.
Se não quiserem catar lixo ou pedir esmola, talvez lhes reste recorrer às drogas, um caminho praticamente sem volta.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“Nunca conheci ninguém podre de rico. Mas já vi milhares de pessoas podres de pobre.”
Millor Fernandes (1923-2012)

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